sábado, 14 de agosto de 2010

Guiné 63/74 - P6851: Estórias cabralianas (63): As Sereias do Rio Geba... ou a violência doméstica subaquática (Jorge Cabral)...


Guiné-Bissau > Regiião de Bafatá > Bafatá > Rio Geba > 15 de Dezembro de 2009 > A magia do Rio Geba que o nosso Jorge Cabral, aquando da sua longa viagem por estas paragens, em 1969/71, povoou de sereias...  (Na foto, o músico e médico João Graça; editada por L.G.).

Foto: © João Graça (2009). Todos os direitos reservados


1. Mensagem do Jorge Cabral, com data de 12 do corrente:

Amigos,

Com este calor, só no fundo do Geba, brincando com as Sereias…

Abraços

Jorge Cabral



2. Estórias cabralianas  > AS SEREIAS DO GEBA: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA SUBAQUÁTICA
por Jorge Cabral (*)

Foi na Guiné que aprendi a contar estórias às Crianças. Comecei lá e nunca mais parei. Ainda ontem conheci uma Menina. Disse-me que tem um gato e eu falei-lhe das minhas duas moscas, uma de cama, coitada, cheia de febre… Em Missirá, na Escola, comecei com a Branca de Neve e os 7 Anões, mas logo desisti.
- Neve? O que é Neve?
- Muito branca!
- Então era Branquinha, irmã do Furriel.
- E Anão? O que é?
- É um Homem Pequenino!
 - Suma, Alfero?

Impossível continuar…

Parti então para a invenção. No fundo do Geba viviam as sereias, metade mulheres, metade peixes, que de noite abandonavam o rio e vinham brincar para a floresta. Há muitos, muitos anos, levaram um rapaz, que hoje ainda lá vive…
O sucesso foi imediato.

Gostaram tanto que contaram às Mães e estas aos Pais, os quais consultaram os Homens Grandes, que obviamente garantiram a veracidade do relato. Agora de noite as sentinelas redobravam a atenção… e passei a contar com muitos voluntários nas idas ao Mato Cão…

Na altura andava muito zangado com o meu Soldado Daíro que batia na Mulher… Ainda por cima era atrevido e apresentava justificações absurdas…
- Alfero, Boi bate na Vaca, Galo na Galinha, Homem na Mulher…É assim!

Ameacei-o com uma valente porrada e parecia ter acalmado, até que numa tarde, oiço os prantos da Mulher.

Regressado, ele e os outros do Mato Cão, vinham muito excitados. Tinham assistido ao Macaréu.
- Desta vez não escapas, Daíro -  avisei logo.
- Alfero, pergunta ao Furriel, se não ouviu no Macaréu, as sereias a gritar… Elas também levam dos Maridos… É assim.

Jorge Cabral

___________
 
Nota de L.G.:
 
(*) Vd. último poste desta série > 26 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6787: Estórias cabralianas (62): À Tesão, Pelotão!... Este é o Alfero Souza, meu amigo (Jorge Cabral)

7 comentários:

Luís Graça disse...

Jorge: Que havia sereias no Geba, havia... Posso jurar. Nunca as vi, mas não posso negar o seu poder de sedução... Não páras de nos surpreender com o teu pensamento mágico... É um lenitivo para esta canícula de verão, dupla, a dos incêndios e a do tempo... Vou fazer o meu jogging pela praia, na baixa-mar às 11h14... Daqui, do Atlântico, um Alfa Bravo. Luís

Juvenal Amado disse...

Jorge

Não tenho palavras para comentar este teu belo escrito.
Cheio de intensões e beleza.
O resultado final, é que não há motivo para a violência doméstica, no entanto ela acontece em todas latitudes.
Obrigado por mais esta lição.

Um abraço

Juvenal Amado

Luís Graça disse...

Jorge:

Já regressei da praia (da Areia Branca, pela primeira vez, com bandeira azul), já regressei do meu passeio até ao Paimogo, na autoestrada deixada pela baixa-mar, e já regressei do almoço na praia com vista para o Mar do Cerro (onde se pescam as melhores sardinhas do mundo), o Paimogo, o Cabo Carvoeiro e as Berlengas.

Se algum dia vieres à Praia da Areia Branca, experimenta o Restaurante Foz, construído em cima da rocha (construção dos anos 60, hoje impensável) e pede, se for a um sábado (!), o polvo panado com arroz de feijão vermelho (2 pessoas / 15 €)... A cozinheira é angolana, casada com um amigo meu do tempo do escola... Vai depois tomar o café o digestivo no Bar dos Cinco Paus, no edifício do VIGIA... Há dias (embora poucos) fabulosos no ano, que compensam o horror, o tédio, a angústia, a tristeza, a desesperança... que às vezes sentimos o resto do ano!

Parabéns por mais esta joia que irá brilhar no firmamento das "estóriuas cabralianas".

Luís

Anónimo disse...

Que magia ! Haja mais Geba para tanta inspiracao e criatividade !

Adorei !

Nelson Herbert
USA

Joaquim Mexia Alves disse...

Caro Jorge

Grande, grande, grande conto!

E eu posso "jurar" que havia sereias no Geba, pois ouvia-as todas as noites em sonhos no Mato Cão!

Um grande e camarigo abraço

Anónimo disse...

Se dizeis que as havia no Geba!

Que poderei dizer eu, se as vi nos 10 de Junho em Belem, junto do Alfero?

És aquela máquina Jorge!

Trata bem a Tina.

Do tamanho do Cumbijã para ti o abraço de sempre.

Mário Fitas

manuelmaia disse...

CAMARADAS:

HAVIA SEREIAS E MUITAS NINFAS QUE INSPIRARAM O JORGE CABRAL PARA NOS PRESENTEAR COM ESTE PRAZER DE LER AS SUAS MEIAS DÚZIAS DE LINHAS TÃO CHEIAS DA QUALIDADE QUE O CARACTERIZAM E QUE ÁVIDAMENTE SORVEMOS.
OBRIGADO JORGE