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quarta-feira, 14 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26800: Historiografia da presença portuguesa em África (481): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1917 e 1918 (35) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Dezembro de 2024:

Queridos amigos,
É o período tormentoso da Primeira Guerra Mundial, tormentoso também na vida política nacional, com forte incidência é na instabilidade de governação da Guiné: Manuel Maria Coelho é governador interino em 1917, em julho toma posse o tenente-coronel Carlos Ivo de Sá Ferreira e cerca de 13 meses depois regressa Josué de Oliveira Duque. O Boletim Oficial regista predominantemente os acontecimentos nacionais, transcreve numerosos regulamentos e portarias. Ainda me ocorreu, sem querer concorrer com o livro de Armando Tavares da Silva citar o que escreve o chefe da delegação de Bolama neste período sobre a vida na Guiné, mas contive-me. Peço ao leitor que leia uma nota do Estado-Maior a pedir às forças militares que procedam com bom-senso e não se esqueçam da sua missão civilizadora. Persistem nos Bijagós, mormente em Canhabaque, atitudes de rebelião, aqui se dá nota também de um ato de submissão, mas a chamada pacificação total só irá acontecer em 1936, é quando se dá como pacificada toda a colónia.

Um abraço do
Mário


A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1917 e 1918 (35)


Mário Beja Santos

Continuamos no período conturbadíssimo da guerra, a economia da Guiné está profundamente abalada, a dança das cadeiras governamentais faz com que haja no princípio de 1917 um governador interno, Manuel Maria Coelho, em julho é nomeado o Tenente-Coronel Carlos Ivo de Sá Ferreira, em Agosto de 1918 regressa Josué de Oliveira Duque. O Boletim Official, como é óbvio, reflete os acontecimentos nacionais e internacionais, vive muito cingido ao expediente burocrático e administrativo, aqui e acolá temos algumas notas do pensamento colonial, fala-se na perceção do risco da pregação islâmica e surge um novo clube, o Clube Fraternidade de Farim.

No Boletim Oficial n.º 46, de 17 de novembro de 1917, o Chefe do Estado-Maior interino, o Major Joaquim Maria da Costa Monteiro expede uma circular para os comandantes de unidades, comandantes militares, comandantes militares de regiões desanexadas, comandantes de postos e comandantes de postos militares administrativos:
“Do domínio público é que a Guiné tendo iniciado uma época de desenvolvimento na paz a que o indígena se subordina, precisa de efetivar todas as manifestações de uma vida produtiva e essencialmente progressiva.

A Guiné nascendo das trevas em que tem vivido, precisa de demonstrar evidência da sua grande riqueza, na seiva que enche às suas veias opulentas e salutares, na pujança que expande dos seus membros musculosos e fortes.
Para isso necessário se torna que o indígena desperte do seu letargo, trazendo-lhe a sua útil colaboração em todos os problemas da vida social; necessário é que nele se incuta a confiança absoluta na justiça dos seus chefes europeus, e necessário ainda é que ele saiba apreciar toda a nossa leal e frança coadjuvação nas aspirações que por direito próprio ou por justificada razão lhe possam surgir. Reprima-se com energia qualquer ato que demonstre o espírito de rebelião ou de intencional criminalidade, mas nunca se pratique a pretexto de qualquer incidente, mais ou menos fútil, a imediata ou premeditada subjugação pelas armas.

A ponderação deve estar sempre como factor principal na solução dos problemas sujeitos à apreciação dos chefes; o bom critério, assisado e franco, deve ser o apanágio do brilho que reveste o prestígio da autoridade; e finalmente bom exemplo dá ao chefe a força da sua dignidade e da sua autoridade. É nesta conformidade que eu, autorizado por Sua Excelência, o Governador, chamo à atenção dos senhores oficiais todos os graduados para a sua missão civilizadora e educadora perante os mesmos indígenas que lhes estão confiados e subordinados.
Nunca este Quartel-General sancionará, e antes tomará as respetivas e inteiras responsabilidades, a manifestações de veleidades com pruridos de força, a que não assistam da imprescindível urgência de uma repressão imediata, em crimes que afectem a dignidade e prestígio da soberania portuguesa pelo respeito pela autoridade constituída.”


No Boletim n.º 47, de 24 de novembro, temos uma circular da Secretaria dos Negócios Indígenas da Guiné, vale a pena transcrevê-la:
“Sua Excelência, o Governador Interino, encarrega-me de chamar a atenção de todas as autoridades administrativas, civis e militares, para os inconvenientes e perigos que representam para a segurança e moral pública a presença, nos territórios que estão sob a sua jurisdição, de quaisquer entidades tituladas xerifes ou marabus, que professam a religião do Islão. Essas personagens, filiadas todas em confrarias muçulmanas, dizendo-se quase sempre descendentes do Profecta, vão de povoação em povoação pregando às populações a observância estrita das cinco grandes obrigações da lei muçulmana, entre elas a guerra santa.

A par destas prédicas, invocando a sua santidade, vão extorquindo aos indígenas tudo quanto podem, intimidando-os e ameaçando-os com a cólera do Madhi, recebendo por esse meio presentes valiosos. Por vezes provocam desacatos, como muito recentemente ocorreu na circunscrição civil de Geba, onde um desses intrujões pretendeu incutir nas povoações onde passava a santidade, dizendo-se portador do Alcorão mas fazendo também transportar consigo, às ocultas, armamento que dele se serviu quando se viu perseguido pelas forças da polícia da Circunscrição Civil de Geba. Actos desta natureza tinham de ser punidos pela força, como efectivamente o foram, até à captura do famigerado Marabu, que internando-se no território francês de onde viera, ali foi expulso pelas respectivas autoridades, e depois de extraditado, deportado para a Província de S. Tomé e Príncipe por dez anos.

Logo que tenham conhecimento de que na área da sua jurisdição se encontrar qualquer xeque, xerife ou marabu, mandá-lo-ão intimar a apresentar-se imediatamente na sede, a fim de ser submetido a um interrogatório sumário. Se se provar que não tem modo de vida regular, enviá-lo-ão ao poder judicial, para que, depois de julgados possam cumprir a pena de trabalhos públicos ou trabalho correcional. Cumprida a pena serão reenviados aos seus países de origem.
Todos os administradores e comandantes militares devem, contudo, ter sempre presente que as medidas indicadas não têm por fim entravar o livre exercício da religião muçulmana mas tão somente proteger os indígenas que seguem esta religião contra os actos de burla e de abuso de confiança dos xerifes e marabus que venham de terras estranhas explorá-los na sua simplicidade.”


No Boletim n.º 48, de 1 de dezembro, noticia-se que foram aprovados os estatutos do Clube de Fraternidade de Farim, o seu fim é de promover a harmonia dos associados, proporcionando-lhes distrações e divertimentos como jogos lícitos, desportivos, leituras, música, soirées, récitas e palestras.

O ano de 1918 é muito parcimonioso, mas ocorre que no Boletim de 2 de fevereiro publica-se um ato de submissão, este ocorrera no dia 23 de janeiro, na residência do Governo da Guiné, estavam presentes os membros do conselho de Governo, oficiais militares, funcionários públicos, todos para assistir ao ato de submissão prestado pelos régulos de In-Orei, de Ancamane, de Ambior, de Menéque, de Béne, de Bani, Combá e de Bani e de Juliana, todos de Canhabaque. “Interrogados por Sua Excelência, o Governador, por intermédio do Alferes de 2.ª Linha, Mamadu Sissé, sobre as causas determinantes da guerra, responderam que vinham pedir perdão ao Governo, por terem feito fogo sob a força que desembarcou em Canhabaque, sem esta lhes ter feito coisa alguma. Que se não tivessem culpa não vinham pedir perdão, estando prontos a entregar todas as armas que possuem, e a pagarem a taxa de guerra, mas pediam ao Governo que lhes desse um prazo para pagarem a mesma taxa, porque agora não têm dinheiro para pagar. Sua Excelência, o Governador, concedeu o prazo de 6 meses para o pagamento da taxa de guerra, declarando mais que podiam ir descansados reconstruir as suas casas e amanharem as suas terras.”

Assassinato de Sidónio Pais
A I República estremece, notícia sobre o golpe que destitui o Presidente da República e dá a presidência a Sidónio Pais
Manuel Maria Coelho, Governador Interino da Guiné, 1917
Bombeiros da Guiné, imagem retirada de Casa Comum/Fundação Mário Soares
Dançarinos Mancanhas, 1910

(Fotos editadas por CV)

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 7 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26776: Historiografia da presença portuguesa em África (480): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1916 e 1917 (34) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 7 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26776: Historiografia da presença portuguesa em África (480): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1916 e 1917 (34) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 28 de Novembro de 2024:

Queridos amigos,
Quero resistir à tentação de introduzir nestes relatos os comentários do chefe da delegação do BNU em Bolama que incluí no meu livro Os Cronistas Desconhecidos do Canal de Geba: O BNU da Guiné, confesso que até podiam trazer mais esclarecimento ao que procuro juntar com as transcrições que faço separadamente do acervo que Armando Tavares da Silva recolheu no Arquivo Histórico Ultramarino, este é usado para evidenciar o que no Boletim Oficial é omisso. Seja como for, nota-se que a atmosfera de guerra suscita novas exigÊncias de comunicação, por exemplo: não se pode esconder o facto que há exportações proibidas, por contingência da guerra; há novas insubmissões nos Bijagós, mormente em Canhabaque, formam-se colunas, só vinte anos depois se consegue alcançar a chamada pacificação; e foi publicado o Estatuto Orgânico da Província da Guiné, está montada a ideologia que separa o civilizado do indígena. E, como veremos adiante, o final do ano traz um golpe de Estado, vai chegar Sidónio Pais e a sua cruzada.

Um abraço do
Mário



A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1916 e 1917 (34)


Mário Beja Santos

Já estamos em guerra, vão ser tomadas medidas para garantir os abastecimentos, aparecerão listas de géneros cuja exportação para as colónias portuguesas é proibida ou que depende de autorização superior. Em 1917, chegámos à Flandres, segue-se o Sidonismo, no final do ano, chegara o primeiro homem providencial, sabe ao que vem e quer ordem e autoridade. Chega à Guiné o coronel de Infantaria Manuel Maria Coelho, nomeado governador interino, partiu Andrade Sequeira; em julho, toma posse o governador efetivo, Tenente-Coronel Carlos Ivo de Sá Ferreira.

No Boletim Oficial n.º 42, de 14 de outubro de 1916, dá-se conta da decisão do Governo em Lisboa para se saber o que pode ser exportado para as colónias portuguesas. Foi proibido exportar: arroz, açúcar, bacalhau, batatas, cereais e as suas farinhas, feijão, gados, minérios, cimento. Aparece em nota que poderá ser superiormente autorizada exportação para a colónia de Moçambique de todos os géneros e mercadorias destinadas a expedições militares ou às necessidades da guerra. É uma lista de géneros e mercadorias cuja exportação para as colónias depende de autorização superior: conservas de vaca e porco, lãs em qualquer estado, ovos, peles ou couros, veículos (exceto automóveis e seus pertences), aves de criação, enxofre. E ficam proibidas as exportações para o estrangeiro de todos os géneros alimentícios, com exceção do açúcar.

Entrámos em 1917, no Boletim Oficial n.º 11, de 17 de março, temos a seguinte publicação do Quartel-General:
“Tendo-se tentado por meios suasórios chamar ao convívio da civilização e à subordinação ao Governo os indígenas da ilha de Canhabaque, impondo-se apenas a entrega das armas em seu poder e o pagamento do imposto de palhota e até mesmo só esta última condição; e
Sendo cada vez mais acentuadas as provas de desrespeito para com a nossa soberania dadas por aqueles povos, o que constitui uma situação que não pode nem deve continuar; Mas sendo também de presumir que dado o estado de indisciplina em que eles se encontram, que é do domínio público, haja primeiro necessidade de os reduzir por meios violentos à obediência, a fim de os obrigar a acatar a nossa soberania e para o que será preciso tomar medidas excecionais…”


E na continuação declara-se o estado de sítio do arquipélago, fica proibido todo o género de comunicação entre Canhabaque e Bubaque, Rubane e João Vieira, interdito o comércio com as mesmas ilhas, organizada uma coluna de polícia à ilha de Canhabaque comandada pelo Tenente de Infantaria Henrique de Sousa Guerra, dá-se a lista da composição das tropas, dos auxiliares e das unidades de Marinha.

Estamos em plena guerra, teme-se as consequências da população andar armada, há ainda a reminiscência do que aconteceu na ilha de Bissau em 1915, procura-se agora uma regulamentação do comércio de armas, munições e pólvora, Manuel Maria Coelho decreta, recordando os inconvenientes que resultam para a fiscalização das relações existentes entre os negociantes que se estabelecem no mato e os indivíduos dessas regiões, atendendo à necessidade de regularizar os processos de transacionar com o gentio, fazendo-os ter confiança na probidade dos comerciantes, etc., etc., determina-se que os administradores das circunscrições e dos concelhos, bem como os comandantes militares não concedam licenças a quem quer que seja para se estabelecer com o comércio fora das povoações formadas e aos chamados negociantes ambulantes ser-lhes-ão concedidas licenças para comerciar desde que não sofismem as intenções do que aqui se determina.

Em portaria subsequente, o governador lembra que é proibido o comércio de armas e pólvora na província e escreve-se assim:
“Sendo certo que entre o gentio ainda existem muitas espingardas, impõe-se aos administradores de circunscrições e de concelhos, assim como aos comandantes militares, que procurem recolhê-las todas e no mais curto prazo. Mas sucedendo que as populações gentílicas carecem de defender-se dos animais ferozes e de fazer caça a esses, assim como é justo que se respeite o uso dos tiros de pólvora seca nas suas festas, determino que aquelas autoridades forneçam um certo número de armas a cada chefe da tabanca, que por ele é responsável, e a pólvora suficiente para aqueles efeitos.”

No Boletim Oficial n.º 23, de 9 de junho, nova portaria do Quartel-General ressaltando que é necessário estabelecer um posto na ilha de Canhabaque, volta-se a declarar o estado de sítio no arquipélago dos Bijagós, a proibir todo o género de comunicações das ilhas de Canhabaque, Bubaque, Rubane e João Vieira e organiza-se uma coluna móvel que tem como comandante o major Carlos Ivo de Sá Ferreira, e designam-se as respetivas tropas.

O suplemento ao Boletim Oficial n.º 26, de 4 de julho, insere o Estatuto Orgânico da Guiné, é do meu mero interesse fazer uma referência ao artigo 305:
“O governador da província é por si e por intermédio dos funcionários seus subordinados, o protetor nato dos indígenas da Guiné Portuguesa, e ainda daqueles cujo estado de civilização lhes seja idêntico, embora de naturalidade diversa. Compete ao governador dirigir as relações políticas com os chefes indígenas, de maneira a conseguir e manter, tanto quanto possível, por meios pacíficos, a sua submissão e integração na vida geral da colónia.”

Os artigos seguintes caracterizam a figura do indígena, é todo o indivíduo natural da Guiné que não tenha alcançado ainda o uso pleno dos direitos civis e políticos distribuídos aos cidadãos portugueses. Estes indivíduos podem entrar no pleno uso dos direitos civis e políticos próprios aos cidadãos portugueses desde que satisfaçam as seguintes condições: "ter dado provas de dedicação pelos interesses da Nação Portuguesa; saber ler e escrever ou pelo menos falar a língua portuguesa.”

Para finalizar, encontramos também uma outra não menos curiosa nota no Boletim Oficial n.º 33, de 18 de agosto, portaria que emana na Repartição Militar. O ministro das Colónias determinara que vão ser publicados no Boletim Official os louvores propostos pelo comandante da coluna de operações de Bissau em 1915, a diversos indivíduos e casas comerciais pelos serviços prestados à coluna durante as referidas operações, excluindo desses louvores aqueles que dissessem respeito a indivíduos ou casas comerciais alemãs ou pertencentes a nações com as quais Portugal tivesse interrompido as suas relações diplomáticas.

Para os louvores propostos figuram vários indivíduos naturais da Síria, província da Turquia, nação pela qual Portugal tem as suas relações diplomáticas interrompidas, mas que estão atualmente debaixo da proteção da França, e por isso deixaram de ser considerados como súbditos inimigos. Assim, é de justiça que se cumpra com respeito aos naturais da Síria e louvam-se Jorge Karam, pelo valor que patenteou durante os combates em que tomou parte e as casas comerciais Jorge Karam, Soda Fréres, Moustapha Jonad e Simon Thyan, pela oferta de vários géneros alimentícios, colas e dinheiro para o hospital de sangue e auxiliares da coluna.

O inquérito à atuação do Capitão João Teixeira Pinto
Já estamos a combater na Flandres
Capitão de Infantaria João Teixeira Pinto, o pacificador da Guiné, edição da I Exposição Colonial Portuguesa, 1934
Mercado de Mansabá, imagem restaurada no projeto Casa Comum/Fundação Mário Soares
Barracas de palmeiras, Mansabá. Imagem restaurada no projeto Casa Comum/Fundação Mário Soares
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Nota do editor

Último post da série de 30 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26746: Historiografia da presença portuguesa em África (479): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1915 e 1916 (33) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 9 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26668: Historiografia da presença portuguesa em África (476): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1911 e 1912 (30) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Novembro de 2024:

Queridos amigos,
Só lamento que tenham sido publicadas três "radiografias" aos quesitos apresentados pelo governador Carlos Pereira ainda em 1910, ele pretendia que em todos os lugares da administração lhe fornecessem elementos para ele conhecer não só aos povos da Guiné, a sua economia, as vias de comunicação, ter alguns dados precisos sobre a etnografia e a etnologia, por exemplo. Cacheu, Buba e Bissorã, de modo diferenciado, responderam. O tenente Ramos da Silva de Bissorã, vê-se que procurou oferecer ao governador mais do que era pedido. E publica-se também uma nota de louvor de uma expedição para castigar Balantas e Baiotes de que não há qualquer referência no Boletim Official, é por isso que acho que fiz bem em conjugar referências ao Boletim Official com o vastíssimo acervo documental recolhido por Armando Tavares da Silva no Arquivo Histórico Ultramarino.

Um abraço do
Mário



A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1911 e 1912 (30)


Mário Beja Santos

A singular iniciativa do governador Carlos Pereira, pouco tempo depois de chegar a Bolama, em enviar às autoridades da administração então existente um conjunto de requisitos que, todos conjugados, lhe poderiam oferecer a gravura real da colónia vista do lado do colonizador, não teve, infelizmente, a sequência desejada. Vimos anteriormente que responderam Cacheu e Buba, só detetei no suplemento n.º 3 ao Boletim Official n.º 21, de 27 de maio de 1911, o relatório sobre a região de Bissorã, escrito pelo tenente de Infantaria Viriato Ramos da Silva, que abaixo se sintetiza.

Começa por dizer que os habituais habitantes de Bissorã eram descendentes de Balantas cruzados com gente do Oio, onde outrora estivera estabelecida a tabanca Bissorã. Não podendo resistir às constantes correrias dos Oincas, viram-se os de Bissorã na necessidade de fugir para a margem esquerda do rio Armada, em território de Balantas. O espírito irrequieto dos Soninqués do Oio e o ódio profundo que estes votavam aos Balantas seria a causa primária de frequentes desaguisados por suporem que os de Bissorã acolhiam os que iam roubar ao Oio. E dentro desta apreciação sobre a ancestralidade de Bissorã, o tenente Ramos da Silva observava que das três primitivas famílias que se estabeleceram na região descendiam dos atuais habitantes.

E mais comentava o relator que dias antes do estabelecimento do posto de que ele era comandante tinham os de Bissorã sido atacados duas vezes consecutivas, mas infligido grande derrota aos inimigos que eram representantes de quase todas as tabancas do baixo Oio. Insiste-se que se pode dizer que todos descendem de Balantas cruzados com gente do Oio. Mouros e Soninqués falam a língua Mandiga, os primeiros não bebem, os segundos são bebedores. Mandigas e Soninqués vivem juntos na mesma tabanca separadamente.

E vai dissertar sobre nascimentos, funerais, crenças e superstições. Dirá que durante o tempo que dura a aleitação o homem não faz vida comum com a mulher, compete ao pai pôr o nome às crianças. Nos funerais, os Balantas e os Soniqués costumam dar tiros para o ano consoante a grandeza do morto. É usual os Soninqués rapar o cabelo em sinal de luto. A viúva entre os Mandigas veste-se de branco durante três meses. No que respeita a crenças e superstições, os habitantes de Bissorã, como em geral todo o preto, é extremamente supersticioso. E observa que os mouros têm um verdadeiro horror ao Inferno, e faz uma apreciação cultural dizendo que os mouros conhecem algumas constelações.

Lança-se seguidamente numa descrição sobre a fauna e a flora. Quanto a animais ferozes apenas regista o lobo e a hiena. Refere depois antílopes, o gato bravo, a lebre, o porco espinho, os javalis, os ratos de palmeira, macacos de diversas qualidades. Não esquece obviamente as cobras. E quanto à variedade de insetos elenca a formiga cadáver, a bagabaga, moscas e mosquitos, abelhas e libélulas. Na lista de aves inclui: o jagudi, o milhafre, o falcão, grande variedade de rolas, pombos verdes, galinha do mato, chocas, melros, periquitos, papagaios, andorinhas, mas diz também que a lista é mais extensa. Na fauna aquática a sua lista é composta pelo cavalo-marinho e pelo jacaré-lagarto. Mais ampla é a listagem dos peixes, começando pelo bagre, a ventana e a tainha.

Passando para a flora, elenca: bissilão, pau-carvão, sibe-palmeira, farroba e as árvores da borracha. Não esquece as árvores de fruto, logo a laranjeiro, o limoeiro e a papaeira. Lembra que uma parte da riqueza guineense assenta na palmeira e na mancarra. Passando para os cereais, logo as diferentes qualidades de arroz, o milho, inclui nos tubérculos a batata-doce, a mandioca e o inhame. Disserta sobre as plantas tintureiras e as plantas medicinais. Falando da horta que se fez no seu posto, alega se semearam: couve, nabiça, chicória, feijão, batata, rabanetes, tomate e alface; o observa que talvez por serem velhas as sementes, as couves não deram resultado. Dá informações sobre as vias de comunicação: não há estradas na região, a principal via de comunicação é o rio da Armada ou de Bissorã. Quando é necessário levar correspondência ou mensagens por portador esclarece que a pé são três horas até Mansoa e para Bissau são precisos dois dias.

Estamos chegados a 1912 e no suplemento ao Boletim Official n.º 7, com data de 17 de fevereiro, a União Colonial Portuguesa anuncia a realização de um congresso colonial e para o efeito envia um questionário abrangendo os diversos aspetos que a moderna ciência colonial aconselha a debater, apelando à colaboração e participação e ao envio de memórias, comunicações ou teses. E estabelece oito secções para estes trabalhos. A primeira abrange a geografia física e económica, a geografia médica (quais as localidades das nossas colónias que oferecem condições para o estabelecimento de sanatórios), etnologia e etnografia; a segunda secção prende-se com o comércio e indústria, agricultura, vias de comunicação, pautas aduaneiras e navegação; na 3.ª secção temos a sociologia colonial (esclarece-se a definição da condição jurídica dos indígenas não civilizados, quais as melhores soluções para a política indígena na Guiné, quais as vantagens das missões científicas na cultura da raça negra); a 4.ª secção abarca a instrução pública, missões, colonização, regime penal. Trabalho e regime das terras; a 5.ª secção é referente às questões militares (há a possibilidade de ocupar pacificamente a colónia da Guiné?); a 6.ª secção é referente a finanças, banca, crédito predial e agrícola e regime tributário; a 7.ª secção compreende a administração geral, questões jurídicas e questões constitucionais; e por último a 8.ª secção tem a ver com a história da colonização. Procurei até agora sem sucesso a documentação alusiva a este congresso colonial que a União Colonial Portuguesa pretendia empreender.

O Boletim Official n.º 12, de 23 de março de 1912, informa que o encarregado do Governo achou por conveniente louvar os oficiais e as praças constantes de uma relação que vem em anexo pelo valor e disciplina manifestados durante as operações levadas a cabo para castigar os Balantas de Binhone e Baiotes de Jobel e Elia. Lista extensa que começa pelos capitães José Carlos Botelho Moniz e Joaquim Simões da Costa, vem depois uma relação de militares europeus e uma extensa lista de soldados da 1.ª e 2.ª Companhia Indígena.

Mandigas de Farim, 1910
Uma rua de Bafatá, 1910
Duas imagens retiradas do site Coleccionar com História, com a devida vénia
Farol da Ponta do Biombo, em 1910
Bissau do antigamente, imagem retirada de Casa Comum/Fundação Mário Soares, com a devida vénia

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 2 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26642: Historiografia da presença portuguesa em África (475): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1911 (29) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 19 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26597: Manuscrito(s) (Luís Graça) (267): No dia do pai... Aos nossos pais, nossos velhos, nossos camaradas... a quem nunca tratámos por tu



Luís Graça, Quinta de Candoz (2011)



Gâmbia > Bathurst > 1953 > Comemorações da entronização da Rainha Isabel II, de Inglaterra (n. 1926) > Foto da seleção de futebol da Província Portuguesa da Guiné:

(i) De pé, da esquerda para a direita, Antero Bubu (Sport Bissau e Benfica; capitão), Douglas (Sport Bissau e Benfica), Armando Lopes (assinalado a vermelho,  pai do nosso amigo Nelson Herbert) (UDIB), Theca (Sport Bissau e Benfica), Epifânio (UDIB) e Nanduco (UDIB); 

(ii) de joelhos, também da esquerda para a direita: Mário Silva (Sport Bissau e Benfica), Miguel Pérola (Sporting Club de Bissau), Júlio Almeida (UDIB), Emílio Sinais (Sport Bissau e Benfica, Joãozinho Burgo ( Sport Bissau e Benfica) e João Coronel (Sport Bissau e Benfica).

No 1º jogo, a seleção da Guiné ganhou à seleção da Gâmbia por 2-0, com golos de Joãozinho Burgo (falecido há 6 anos em Portugal 22/1/2019); no 2º jogo, as duas seleções empataram 2-2 (com golos, pela Guiné, de Mário Silva e Joãozinho Burgo). Antiga colónia inglesa, a Gâmbia acederá à independência em 1965.

Legenda de João Burgo Correia Tavares: vd. livro Norberto Tavares de Carvalho - "De campo a campo: conversas com o comandante Bobo Keita", Porto, edição de autor, 2011, p. 4

Armando Lopes (também conhecido como o "Búfalo Bill") fez o seu serviço militar no Mindelo, São Vicente, Cabo Verde, em 1943, na altura em que também lá estava, como expedicionário, o meu pai, meu velho e meu camarada, Luís Henriques; ambos nasceram em 1920 e,  naturalmenmte, já faleceram os dois, o meu, em 2012, o pai do Nelson Herbert,  em 2018. Ambos tinham igualmente uma paixão pelo futebol... 

Foto: © Armando Lopes / Nelson Herbert (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].

Foto (e legenda): © Hélder Sousa (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Ângelo Ferreira de Sousa (1921-2001), pai do nosso camarada Hélder Sousa, natural de Vale da Pinta, Cartaxo, ex-1º Cabo n.º 816/42/5, da 4ª Companhia do 1º Batalhão de Infantaria do RI. 23... Tem a data de 18 de Outubro de 1943 e na legenda refere ser "recordação de S. Vicente"                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                        Foto (e legenda): © Hélder Sousa (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Cabo Verde > Ilha do Sal > Pedra de Lume > 1º Batalhão Expedicionário do RI 11  (Setúbal) > 1ª
Companhia > 1942 > 
 pai do nosso camarada Augusto Silva Santos.


Foto (e legenda): © Augusto Silva Santos  (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas daGuiné]







Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > 1942 > "No dia em que fiz 22 anos, em S. Vicente, C. Verde. 19/8/1942. Luís Henriques " [, 1º cabo inf, 3º Companhia, 1º Batalhão, RI 5, Mindelo, São Vicente, Cabo Verde, 1941/43, entretanto integrado no RI 23]. Nasceu (1920) e morreu (2012) na Lourinhã.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas daGuiné]



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 >  c. 1941/44 > RI 23 >  O sold aux enf, Porfírio Dias (1919-1988), 1º Batalhão Expedicionário do Regimento de Infantaria nº 5, que partiu para Cabo Verde no T/T Mouzinho em 18/7/1941, juntamente com o Luís Henriques (ambos eram do mesmo regimento e batalhão). Esteve lá dois anos anos e dez meses.



Foto (e legenda): © Luís Dias (2012). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Os nossos pais, nossos velhos, nossos camaradas... teriam mais de 100 anos, se fossem vivos... No Dia do Pai, dá-me uma saudade danada... 

Lembremo-nos deles... Tal como os nossos filhos se lembram de nós, agora tratando-nos por tu:

 "Obrigado, pai, por tudo o que me tens dado (...). Gosto muito de ti e quero-te cá por muitos mais anos. A tua inteligência, empatia e  jogo de cintura, quero levá-los sempre comigo" (...). 

Escreveu o meu filho no dia de hoje. Espero que vocês, camaradas,  também tenham recebido palavras bonitas como estas... Nêm têm que ser verdadeiras, apenas bonitas. E sobretudo reveladoras da gratidão filial. Para eles, seremos sempre os melhores pais do mundo... Eu gosto que eles me tratem por tu... Desde sempre.


Tuteio ou tratamento por tu

por Luís Graça

Aos nossos pais, nossos velhos, nossos camaradas...


Fiquei com pena da fräulein Tina Kramer, antropóloga,
entretanto entronizada como  nossa tabanqueira,
a quem, chegada da austera e luterana Germânia,
lhe impuseram o tratamento por tu,
como se fora uma praxe de gangue.

Depois desta receção da Tabanca Grande,
ela deve ter ficado confusa, quiçá perturbada e até intimidada,
ao pensar que os camaradas da Guiné,
antigos combatentes,
são todos uma cambada de velhos malucos
a quem saltou a caixa dos pirolitos...

"Portugueses, pocos, pero locos"
(diria ela se fosse uma altiva castelhana,
daquelas que vinham casar com príncipes portugueses,
futuros donos de Portugal, dos Algarves e de além-mar em África,
na mira de acertar em cheio no jackpot)...

Tu próprio detestavas a palavra fräulein,
nunca trataste nenhuma colega ou amiga alemã por fräulein...
Podes a estar a ser injusto, mas tem, para ti, 
uma conotação pejorativa, prussiana, militarista...
Como teria se tu a tratasses por menina Tina Kramer,
como nos bons velhos tempos do Portugal dos nossos pais e avós
Ao menos, tratemo-la, não por miss (cheira-te a babydoll)
mas por bajuda,
que é mais doce, mais crioulo, mais luso-tropical…


E tu Zé Belo, luso-lapão, agora "amaricano",
sujeito a ser deportado pelo Tio Sam,
tuga da diáspora outrora na terra 
onde o cidadão tratava o cidadão por tu....
bem sabes que não foi preciso fazermos uma revolução
à moda dos sovietes de Petrogrado,
nem do Grande Irmão Urso Sueco,
nem dos Camaradas (salvo seja!) do PAIGC, do MPLA ou da FRELIMO...
(Lembram-se das milhares de anedotas
que se contavam do camarada, salvo seja!, Machel,
e da sua mania de reeducar e recuperar o diabo branco colonialista
com o trabalho manual na machamba?!)...

Com o 25 de Abril,
a distância social e afetiva,
a começar na família, entre pais e filhos,
foi encurtada,
e o tratamento por tu impôs-se sem ser por decreto...

Com tanta naturalidade (ou só aparente ?)
que a gente nem sequer se questiona hoje
sobre o quando, o como e  o porquê...
(Alguns questionam-se, e têm toda a liberdade para o fazer,
viva a liberdade que só pode ser livre.)

Em contrapartida, foi retomado
(ou nem sequer foi interrompido)
o tratamento, tradicional,
aparentemente mais distante e formal, de você,
de pais para filhos,
de esposa para esposo,
em certas famílias,
em certos meios sociais
(que tu não vais adjectivar,
porque não gostas de adjetivar os outros,
e fazes um esforço por respeitar todas as diferenças,
mesmo as mais difíceis de engolir).

O tecido social é isso mesmo,
é um pano, de trapos, de linho, de algodão, de serapilheira, de seda,
que se puxa conforme o frio, as pernas e as mãos,
as chagas, as misérias e as grandezas de cada um…

Os nossos filhos, pelo menos os teus, tratam-nos por tu,
mas tu tratavas os teus pais à moda antiga...
quando eles ainda eram vivos.
Ainda eras do tempo do respeitinho-que-era-muito-bonito!

Há algum mal nisso,
nessa coisa dos filhos tratarem agora os pais por tu ?
São apenas mudanças de paradigma
na convivialidade sociofamiliar,
diria o sociólogo de serviço, que já não há,
descartado pela mãe de todas as crises...

Tu, o Hélder Sousa, o Nelson Herbert,
o Luís Días, o Augusto Silva Santos,
foram capazes de tratar os vossos velhos,
o Luís Henriques  (1920-2012),
o Ângelo Ferreira de Sousa (1921-2001),
o Armando Lopes (1920-2018),
Porfírio Dias (1919-1988),
o Feliciano Delfim Santos (1922-1989),
veteranos da II Guerra Mundial,
expedicionários em Cabo Verde,
com a ternura da expressão
“Meu pai, meu velho, meu camarada”

Liberdades ou libertinagens bloguísticas, 
dirão os sisudos dos  críticos…
Daqui a uns anos
(esperas bem que não, cruzes canhoto!...)
voltaremos a tratar-nos com distância e reverência,
quiçá por Vossa Senhoria,
meu fidalgo, meu amo,
como no tempo da(s) outra(s) senhora(s)…

Tu sabes que o tratamento por tu,
republicano, económico, frugal, com duas letrinhas apenas,
o tratamento à romana na Tabanca Grande,
nem sempre era fácil nem natural, em 2004/2005,
quando começámos a blogar
para mais num país, ainda bastante estratificado,
em que se continuava a usar e a abusar dos títulos,
nomeadamente no Estado, nas empresas e demais organizações,
onde o trabalho era pouco e a distância grande,
tão grande como a rede clientelar:
senhor presidente, senhor doutor, senhor engenheiro, senhor prior...

Nunca foi nem o é ainda hoje:
tiveste a prova disso, há uns anos atrás
,
numa das memoráveis quartas feiras
do almoço semanal da 
Tabanca de Matosinhos,
quando cumprimentaste um a um a meia centena de convivas...
Boa parte, já teus velhos conhecidos e amigos...
mas ainda havia gente que se retraía,
invocando a educação que tiveram,
o desconhecimento do outro,
a falta de intimidade e de convívio,
a distância física (sempre são 300 km entre Lisboa,
a capital do reino,
onde o Paço tem Terreiro,
e o Porto é a capital do trabalho,
onde o povo tem o São João e o alho porro)...

Quando impuseste  (passe o termo...)
o tratamento por tu no blogue,
entre camaradas da Guiné,
quiseste  deliberadamente fazer o curto-circuito
entre as distâncias militares, hierárquicas, do passado
e as eventuais distâncias sociais e profissionais, do presente...
Hoje consideras uma honra poder ser tratado por tu
por um camarada da Guiné,
independentemente do antigo posto,
da idade, da naturalidade, da nacionalidade, da cor da pele,
ou da atual posição na sociedade portuguesa...
E vice versa:
consideras um privilégio poder tratar por tu
um homem ou uma mulher
que aceitam os valores e as regras do jogo do nosso blogue...

Há sobretudo uma cumplicidade (saudável) entre nós,
que não seria possível se aqui, no blogue
e nos convívios da Tabanca Grande,
e das demais tabancas que entretanto foram aparecendo,
se a gente continuasse a tratar-se 
como em casa, na escola, na tropa, no parlamento:
"Sua benção, meu pai, meu amo...
"Dá-me licença, vossa senhoria, meu capitão ?...
"Como vai, senhor Doutor ?...
"Vossa Excelência, senhor engenheiro,
permite-me que eu discorde da sua douta opinião ?
"O meu furriel é que sabe,
mas o vagomestre é que dormia com a mulher… do Baldé
quando o Baldé ia para a Ponte do Rio Udunduma...
"E, você, nosso instruendo, ó sua besta quadrada,
não sabe que a Pátria é hermafrodita,
é pai e mãe ?
"Ó meu tenente,
é mais do que isso, é Pátria, é Mátria, é Frátia!"...

Para que o tu continue a escrever-se com duas letrinhas apenas,
o tu de pai, de tuga, portuga, 
irmão, cidadão…
o tu de companheiro, camarada, amigo, 
O tu do abraço, do alfabravo, do quebra-costelas,
o tu de Tango Uniform...
e não se torne o tu
de intumescência, da tumefacção, 
da turbulência, da estupidez, da intolerância…
nestes dias de Charlie Romeo India Sierra Echo,
da CRISE que continua dentro de momentos...

 ©  Luís Graça (2012). (**)

Revisto em 19/3/2025, dia do Pai...
___________

quarta-feira, 12 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26577: Historiografia da presença portuguesa em África (471): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, até 1907 (26) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 31 de Outubro de 2024:

Queridos amigos,
Longe vaI o tempo em que o Boletim Oficial permitia tomar o pulso a uma Guiné que começava a dispôr de uma vida orgânica colonial, um mapeamento administrativo, uma débil ocupação, o despertar de atrativos comerciais, isto apesar de uma imensidade de conflitos interétnicos e outros relacionados com os impostos e a perda de influência das chefaturas locais. Folhear agora este Boletim Oficial é procurar uma agulha no palheiro, e o contraste é por vezes brutal quando se ouvem as descrições que nesse exato momento perpassam pela Guiné, como conta Armando Tavares da Silva do seu acervo monumental A Presença Portuguesa na Guiné, que aqui se publica separadamente. O governador Muzanty, como veremos nas descrições de Armando Tavares da Silva, conseguirá meios para desembaraçar a navegação do Geba, que estava sujeita à hostilidade do régulo do Cuor e penetra a fundo na ilha de Bissau, esta será uma vitória temporária, entretanto o aventureiro Abdul Injai já está ao serviço das tropas portuguesas, rouba que se farta, é exilado para S. Tomé, voltará para mais altos voos, ao lado do capitão Teixeira Pinto, terá depois a sua queda.

Um abraço do
Mário



A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, até 1907 (26)

Mário Beja Santos

Creio que o leitor que acompanha esta tentativa de sequência cronológica de encontrar no Boletim Official da Guiné elementos válidos para melhor conhecer a realidade socioeconómica e cultural da época já se apercebeu de que as autoridades reduziram a atividade do Boletim a um documento praticamente inócuo; numa tentativa de procurar os dados da realidade da história política, militar e socioeconómica e cultural voltamos ao convívio do acervo monumental organizado por Armando Tavares da Silva em "A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar, 1878-1926", edição Caminhos Romanos, 2016, é o modo que julgo mais facilitado para se procurar iluminar uma época.

Os anos passam, a rotina administrativa mantém-se impassível, assim chegamos a 1905 e no Boletim Official n.º 9 de 25 de fevereiro encontramos os elementos de corografia da Guiné exigidos pelo Conselho Inspetor de Instrução Pública para inserir no compêndio Corografia de Portugal. Abrira-se um concurso, quem concorria devia preencher com as seguintes bases aprovadas pelo dito Conselho Inspetor. Em termos de geografia física: situação geográfica, limites e superfície, rios, canais, ilhas, etc.; clima, regime das chuvas, fenómenos atmosféricos frequentes e produções naturais; em termos de geografia económica: a importância do comércio nacional e estrangeiro, os principais artigos de importação e exportação, agricultura e indústrias subsidiárias, meios de desenvolvimento e indústrias indígenas; em termos de geografia política: população, esboço etnográfico, organização política das diversas raças, suas aptidões e organização política e administrativa da província. O Conselho Inspetor exigia para este concurso noções de cultura tropicais, uma resenha das principais produções naturais da província: plantas alimentares, industriais, essências florestais mais comuns e espécies exóticas. É visível neste programa didático o juntar o útil ao agradável: davam-se informações de caráter geral e também orientadoras a possível investidores e comerciantes.

No Boletim Official n.º 52, de 23 de dezembro desse ano, a Secretaria Geral do Governo emite o seguinte determinação: “Tendo chegado ao conhecimento de Sua Ex.ª o Governador Interino que algumas casas comerciais vendem ao público substâncias medicinais sem que para isso tenham competência, e sendo certo que tal facto, além de representar uma desleal concorrência aos estabelecimentos que a lei protege, pode acarretar perigosas e desastrosas consequências para a salubridade pública, encarrega-me o mesmo Exm.º Sr. de chamar à atenção dos senhores administradores do concelho e comandantes militares para tão importante assunto, e de lhes dizer que procedam como é de lei contra os infratores, na certeza de que lhes atribuirá a responsabilidade de qualquer desaire que possa dar-se no futuro, quando se prove a sua negligência no cumprimento desta determinação.”

Estamos agora em 1907, no Boletim n.º 14, de 6 de abril, o governador João Augusto d’Oliveira Muzanty, farto das traquibérnias do ex-alferes Graça Falcão (de quem ainda se muito falará) publica a seguinte portaria:
“Tomando na maior consideração que me expôs o Residente de Cacheu, o que se confirma pelo auto levantado e pelo conhecimento pessoal dos péssimos precedentes do negociante Jaime Augusto da Graça Falcão;
Considerando a permanência deste negociante nas circunscrições de Cacheu e Farim constitui um desacato permanente à autoridade, que nestas circunscrições mais do que em quaisquer outras precisam de maior prestígio, visto o caráter pouco submisso de grande parte dos indígenas que as povoam, e não estar ainda concluída a sua ocupação militar;
E, como julgo a permanência deste negociante nas referidas circunscrições como podendo comprometer a segurança e ordem pública, com a propaganda que tem feito contrária às determinações de autoridade, propaganda que não desiste de fazer apesar de todos os concelhos e outros meios de brandura empregados:
Hei por conveniente determinar que seja intimado a sair da circunscrição de Cacheu no prazo de 30 dias a contar da data de intimação, ficando-lhe interdita esta circunscrição, bem como a de Farim, até que o seu procedimento futuro e as boas informações dos Residentes nas outras circunscrições, indiquem o permitir-se-lhe a livre circulação em toda a colónia.”


No Boletim Official n.º 24, de 15 de junho, somos informados de que se iniciou o reinado da Gillette. Informa-se o pedido de registo que fora feito em 4 de setembro de 1906 efetuado em 13 de março do ano seguinte, a favor da sociedade anónima americana Gillette Safety Razor Company. A marca é destinada a navalhas de barba, folhas de navalha de barba, cutelaria e instrumentos cortantes.

E despedimo-nos com uma daquelas raríssimas notícias em que se dá conta que há profundas tensões na Guiné, vem no Boletim Official n.º 36, de 7 de setembro, assina o governador Muzanty:
“Tendo o Residente de Cacheu terminado o serviço de cobrança de imposto na sua circunscrição com o aumento de receita tão considerável que demonstra um trabalho insano e uma dedicação digna do maior elogio:
Considerando que parte da região se encontrava insubmissa, o que obrigou o Residente a arriscar a sua vida sempre que a percorreu no desempenho dos serviços que lhe estavam confiados:
Considerando ainda, que se houve com um critério tal, que, apesar de se ter feito acompanhar de um limitado número de auxiliares, evitou sempre os conflitos que pudessem pôr em cheque este Governo: hei por conveniente louvar o Residente de Cacheu, tenente do quadro da Índia, Rodrigo Anastácio Teixeira de Lemos, pelo valor, dedicação, zelo e lealdade com que se houve no desempenho das funções do lugar que exerce.”

Governador da Guiné Alfredo Cardoso de Soveral Martins (1903-1904)
Queimada da tabanca de Intim, na guerra de 1908. Imagem da Coleção Jill Rosemary Dias, com a devida vénia
A fazer esteiras, imagem retirada da Casa Comum/Fundação Mário Soares, com a devida vénia
Bissau em 1910

(continua)

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Nota do editor

Último poste da série de 5 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26557: Historiografia da presença portuguesa em África (470): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1900 e 1901 (25) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 5 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26557: Historiografia da presença portuguesa em África (470): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1900 e 1901 (25) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Outubro de 2024:

Queridos amigos,
Não posso esconder que é quase num completo desfastio que ando a folhear estes Boletins Officiais de fim de século, os trâmites administrativos parecem dominar tudo, quem lê número após número pode ficar na ilusão de que a província está pacificada e gradualmente ocupada pela administração portuguesa. Até em 1900 se dá a notícia de que vai haver o primeiro recenseamento da população. Procurando tirar a prova dos nove, procurei ler ao pormenor que Armando Tavares da Silva escreve no seu trabalho gigante intitulado A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar, 1878-1926 quanto à governação de Herculano da Cunha, percorre a província de um lado para o outro, informa o ministro que é saudado em todos os pontos entusiasticamente, foge às expedições militares, tem pouquíssimos efetivos e em geral gente desordeira. Se é verdade que em determinados períodos o Boletim Oficial constitui um documento esclarecedor no caso presente é um puro encobrimento das tensões e dificuldades sem número em que vivia a Guiné.

Um abraço do
Mário



A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1900 e 1901 (25)


Mário Beja Santos

Tenho dado a saber ao leitor que os últimos anos da década 1890 e o início do novo século registam com estranhíssima parcimónia os acontecimentos políticos que a Guiné teve. Os Boletins Officiais estão enxameados da legislação do Governo Central, tratados internacionais, e quanto ao que se passa no burgo são as costumadas nomeações e exonerações, chegadas e partidas, publicação do orçamento da província, relatos sanitários das principais povoações, etc. Vou aqui registar o que me parece mais curioso de 1900 e do início de 1901 e contrapor com a listagem de eventos que Armando Tavares da Silva elenca no seu importante acervo documental intitulado "A Presença Portuguesa na Guiné, História Política e Militar, 1878-1926", 2016.

No Boletim n.º 10, de 10 de março de 1900, o boletim recolhe uma portaria do Governador Álvaro Herculano da Cunha que reza o seguinte:
“Tendo-me o régulo de Antula em abril do ano findo tido para se levar a efeito a ocupação do seu território, o que eu lhe havia prometido; e
Tendo, quando agora me veio cumprimentar, por ocasião da minha visita a Bissau, renovado o seu pedido e solicitado o cumprimento da minha promessa;
Atendendo às vantagens de ordem económica, política e administrativa, e do prestígio que, para o nosso domínio, advém da referida ocupação: hei por conveniente determinar que se ocupe o referido território, estabelecendo-se ali um posto militar de força oportunamente determinada.”


Em Lisboa, era aprovado o regulamento disciplinar das forças militares ultramarinas que veio publicado no Boletim Official n.º 31, de 4 de agosto desse ano. Não deixa de ser curioso o que ali se escreve e como tais preceitos chegaram aos nossos tempos de oficiais, sargentos e praças naquelas décadas de 1960 e 1970: a disciplina consiste na estrita e pontual observância das leis e regulamentos militares; para que a disciplina constitua a base em que judiciosamente deve firmar-se a instituição armada, observar-se-ão rigorosamente as seguintes regras fundamentais – obediências pronta e passiva, ficando o superior responsável pelas ordens que der; em ato de serviço a obediência é sempre devia ao mais graduado e na concorrência de militares com a mesma graduação ao mais antigo; todo o militar deve sofrer com resignação as fadigas e privações, conservando-se intrépido dos perigos, generoso na vitória e ciente na adversidade; todo o militar deve regular o seu procedimento pelos ditames da religião, da virtude e da honra, amar a pátria, ser fiel ao Rei, guardar e fazer guardar a constituição política da monarquia, etc. etc.

Estamos agora em 1901 e o Boletim n.º 13, de 30 de março, publica um conjunto de portarias que nos levam a saber que houve uma operação em Jufunco. O 1.º tenente da Armada, Bernardo de Melo e Castro Moreira, comandante da canhoneira Cacongo, prestou relevantes serviços aos Governo, coadjuvando-o com inexcedível zelo na expedição contra o gentio rebelde de Jufunco, bombardeando eficazmente as povoações dos revoltosos, facilitando assim o desembarque dos Grumetes e concorrendo, portanto, para a vitória obtida; o 2.º tenente da Armada, Artur Ernesto da Silva Pimenta de Miranda, comandante da lancha-canhoneira Flecha, prestou relevantes serviços ao Governo, bombardeando eficazmente as povoações do revoltosos; são louvados os oficiais e praças da canhoneira Cacongo e lancha-canhoneira Flecha pela dedicação e boa vontade com que concorreram para o bom êxito da expedição contra o gentio rebelde de Jufunco. Os louvores não ficaram por aqui, foram extensivos ao comandante militar de Bissau, ao comandante militar de Cacheu e até ao diretor da alfândega em Bolama.

Fica-se com a noção de que lidos desgarradamente estes pontos aqui e acolá ao longo destes anos a Guiné parece trilhar na serenidade, foram minimizados os conflitos, pacificado o Forreá, crescem os postos militares, enfim, a ocupação do território vai de vento em pompa. Hora as coisas não se passam exatamente assim como conta Armando Tavares da Silva a partir da página 431. Herculano da Cunha não tem meios para se envolver em qualquer operação militar, viaja muito pelo território. A ilha de Bissau mantém conflitos interétnicos, rivalidades entre os régulos. O Governador fugiu sempre à resolução dos problemas da província que pudessem envolver as operações militares, escreve para Lisboa que procura exercer um magistério de influência para evitar guerras, sobretudo nos regulados da margem direita do Geba. Quando visita o Forreá, recebe queixas dos régulos; no regresso de Geba viaja até ao Xime, cujo régulo foi por ele repreendido asperamente por ter batido a uma sua mulher com um chicote e que agora vinha reclamar que fugira, tinha o desplante de pedir ao Governado que atuasse.

E assim chegamos à questão de Jufunco de que registei os louvores. Tudo começara quando se admitiu a possibilidade de impor à população o pagamento de tributos, a resposta foi o descontentamento. Herculano da Cunha queixa-se sempre que não tem tropas em qualidade e quantidade, a indisciplina é geral, as forças da província são compostas de deportados, há poucos oficiais, quando se pretende punir Jufunco, a estratégia foi bombardear as povoações e só depois intimidá-las, nada de combates em campo aberto.

As queixas contra o estado em que se encontrava a administração da província eram muitas. A população de Bolama enviou ao rei uma petição na qual pediam que Bolama fosse novamente administrada por uma câmara municipal. Os Bolamenses consideravam que estavam votados ao abandono. Eram inúmeras as carências em tudo o que era público: arruamentos, pavimentação, muros, iluminação, cemitério, prisões.

Vindo de Lisboa, Herculano da Cunha continua as suas visitas e cumprimentos de régulos. Os governantes em Lisboa devem-se ter fartado desta inoperância, Herculano da Cunha será exonerado em maio de 1900. Na véspera de deixar a Guiné envia para Lisboa um oficio em que, devido aos ataques dos Balantas de Nhacra aos Brames, pedi autorização para bombardear o território dos Balantas, isto na véspera de partir.

É nos meses finais desta governação que se inicia uma nova fase dos trabalhos de demarcação da fronteira com os territórios vizinhos de administração francesa. Tudo correu mal logo no início, isto em 1888, os delegados franceses pretendiam que se fizesse uma alteração à Convenção de 1886, substituindo o Cabo Roxo pela Ponta Varela, de onde partiria a linha de fronteira, os delegados portugueses rejeitaram a proposta. Em 1899, há novos trabalhos de demarcação, do lado português estão Oliveira Muzanty e Telles de Vasconcelos, começam pela fronteira sul, nova rutura nas negociações, os franceses queriam entrar em territórios no Forreá, só em finais de 1902 os trabalhos de demarcação serão retomados, mas o mais importante, a fronteira entre o Casamansa e o rio Cacheu será objeto de uma nova missão, em janeiro de 1904.

Como o leitor pode constatar entre a linguagem cinzenta da burocracia e o que se passava na província política, militar e económica, a distância era um abismo.

Nomeação do Governador em 1900, Judice Biker
Em 1897, o novo Governador chama-se Álvaro Herculano da Cunha
Oficinas da Sociedade Comercial Ultramarina, imagem restaurada e que consta da Casa Comum/Fundação Mário Soares
Serração do Sonagui, imagem restaurada e que consta da Casa Comum/Fundação Mário Soares
A Casa Gouveia em Bissau, 1920

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 26 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26530: Historiografia da presença portuguesa em África (469): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1897 e 1898 (24) (Mário Beja Santos)