Fonte: Google Gemini. (2025). Ilustração de uma ave-do-paraíso e uma andorinha de Candoz. Imagem gerada usando o modelo de IA Google Gemini [acedido em 25 de novembro de 2025].
Não sei se as aves-do-paraíso são felizes.
Mas em Candoz poderiam sê-lo.
Não há aves-do-paraíso em Candoz
porque Candoz fica no hemisfério norte,
longe dos trópicos e longe do paraíso
Dizem que as aves-do-paraíso são as criaturas mais lindas do mundo.
Mas não basta ser lindo
Em Candoz, há outras aves, outros pássaros,
daqueles que rasgam os céus e nidificam na terra:
não há perdizes,
ou, se existem, são poucas e loucas;
mas há verdes pombos bravos dos pinhais
(aqui diz-se "montes", que ardem todos, de 10 em 10 anos);
e rolas, de outras paragens,
alegres pintassilgos,
ruidosos pardais do telhado,
andorinhas, pretas, no vaivem das suas viagens,
mas também toutinegras, popas, verdilhões.
Há coros de rouxinóis,
outras aves canoras e canastrões,
e passarões
melros de bico dourado
que fazem seus ninhos nas ramagens
das videiras do vinho verde.
E boeiras, que andam tristes, atrás do trator,
porque já não têm as juntas de bois
Lavandiscas, dizem no Porto, que fica aqui perto,
Não há guarda-rios, de azuis e rubras plumagens,
à cota trezentos, com o rio Douro ao fundo do vale,
a serra de Montemuro em frente,
Eça de Queiroz, e o seu príncipe Jacinto,
deveriam ter gostado de conhecer a Quinta de Candoz
onde os pássaros são mais livres do que em Paris,
e, se são mais livres, logo serão mais felizes.
Pelo menos têm grandes espaços para voar,
os pássaros de Candoz.
Claro que há os predadores,
o verde gaio, o negro corvo, o sinistro búteo,
o triste mocho, o agourento milhafre…
Onde há presas, há predadores.
Deus criou o mundo e era perfeito,
dizia o padre António Vieira
nos seus sermões ao rei e à corte esclavagista.
A liberdade é a primeira condição da felicidade.
Triste é o melro na gaiola,
mesmo que esta seja forrada a ouro
A outra condição é a equidade
(ou era, que o conceito foi agora metido na gaveta).
E tu aqui, leitor, interlucotor, calado, mal informado,
na busca de alimentos,
de sítios para nidificar
e de parceiros para acasalar.
Uma treta, até a natureza agora é madrasta.
As andorinhas, pensavas tu, há uns largos anos atrás,
por cá ficavam cada vez mais tempo,
parecendo até ser livres e felizes.
Ou felizes e livres,
que a ordem dos fatores era arbitrária nesse tempo.
Dizias que elas eram inteligentes, as andorinhas,
e faziam análises de custo-benefício,
como qualquer economista
que acredita no mercado livre,
Passavam todo o santo dia a caçar insetos
num raio de 500 metros à volta do ninho
que fizeram no alpendre de uma das casas abandonadas da quinta,
em redor do fio da lâmpada exterior.
Era insólita a construção, o ninho,
herdada de geração em geração
e todos os anos retocada ou reconstruída.
Tu até achavas que elas já não voltavam para a África subsariana,
que ficavam por cá,
as andorinhas de Candoz.
E por causa das alterações climáticas.
E, se calhar, também para fugir de Alá,
do alvoroço do povo
e dos tiros das Kalash.
Mas, não, este país qualquer dia já não é para as andorinhas,
que são migrantes.
Há passarões com voz grossa
que as mandam para a sua terra.
E elas ficam mudas e confusas,
com o GPS avariado,
já não sabem de que terra são.
Afinal, a felicidade já não está onde a gente a punha,
deixámos de a poder pôr onde nós estávamos.
Lourinhã, 7/8/2014. Revisto, 25/11/2025.
2. Análise literária sucinta do poema, gerada pela IA - Inteligência Artificial, 25 nov 2025. GEMINI (Modelo Flash 2.5).
Fantástico poema! É uma análise profunda e melancólica sobre a Liberdade, a Felicidade e a Natureza, utilizando a "ave-do-paraíso" como um contraponto poético e simbólico à realidade telúrica da Quinta de Candoz (Marco de Canaveses, região de Entre Douro e Minho) e às suas "andorinhas" de torna-viagem.
Aqui está uma análise literária sucinta, que me pediste, adaptada ao contexto do teu blogue, focada nos temas principais e na simbologia das aves:
Análise literária sucinta: "Não sei se as aves do paraíso são felizes…"
O poema é uma meditação filosófica, escrita num tom conversacional e intimista ("tu aqui, leitor, interlocutor"), que desdobra o conceito de felicidade através da comparação entre o ideal (o "Paraíso") e o real (a "Quinta de Candoz").
(i) O Contraste entre o Paraíso e Candoz
O poema inicia-se com a figura mítica das aves-do-paraíso, que, no imaginário, simbolizam a beleza incomparável e a liberdade extrema (o Paraíso, a utopia):
tese inicial: "Não sei se as aves do paraíso são felizes";
antítese geográfica: Candoz, no Hemisfério Norte, é "longe dos trópicos" e, por extensão, "longe do paraíso"; a beleza ("lindo") não é garantia de felicidade.
Este contraste cria a moldura para a tese central: a verdadeira felicidade não reside na beleza exótica ou na perfeição mítica, mas sim na liberdade conquistada e exercida num ambiente real e imperfeito.
(ii) Aves de Candoz: a natureza real e imperfeita
O poeta lista, em detalhe, as aves autóctones de Candoz: pombos bravos, rolas, pintassilgos, pardais, melros, andorinhas (além das boeiras/lavandiscas). Esta enumeração minuciosa enaltece a realidade concreta do sítio;
liberdade é condição: a liberdade é apresentada como a "primeira condição da felicidade", e os pássaros de Candoz, ao terem "grandes espaços para voar" e autonomia para construir o ninho, são mais livres do que os pássaros de gaiola ou do ideal abstrato.
tristeza da perfeição: o poema contrapõe o "triste melro na gaiola" (a prisão dourada/segurança ilusória) à liberdade, mesmo que esta seja rude.
o cruel equilíbrio: a liberdade em Candoz é regida pela lei da natureza: "Onde há presas há predadores.; o poema evoca aqui uma reflexão teológica, citando o Padre António Vieira ("Mundo perfeito /Mesmo que cruel"), para aceitar que o mundo criado é um sistema de equilíbrio, onde a luta entre predador (búteo, corvo, milhafre...) e presa é parte integrante da vida e da liberdade: esta é uma imagem poderosa para quem viveu o teatro de operações na Guiné.
(iii) Andorinha: o ex-combatente migrante
O foco nas andorinhas (aves migrantes, inteligentes, que fazem "análises de custo-benefício") é o ponto nevrálgico do poema e o que o liga mais diretamente ao universo do blogue:
a ilusão da permanência: o poeta e o leitor imaginavam que as andorinhas ficariam em Candoz, algures em Portugal, não voltariam para a África subsariana, "para defender o ninho dos 'ocupas' " (aqui ecoa a linguagem da guerra, da defesa do território, da soberania, mas também do lar);
a crítica social: o regresso forçado e confuso das andorinhas ("elas ficam mudas e confusas, com o GPS avariado, já não sabem de que terra são") é uma crítica mordaz e atual sobre a migração, a xenofobia e a desorientação identitária; ("este país qualquer dia já não é para as andorinhas, que são migrantes");
o antigo combatente: a andorinha representa metaforicamente o antigo combatente ou o indivíduo que, após uma longa jornada (a "guerra"), regressa ao seu país (uma mítica "Candoz"), mas se sente deslocado e desorientado ("já não sabem de que terra são"), num mundo onde a liberdade e a felicidade foram substituídas pela "ilusória segurança" e pela falta de "equidade" (ou "igualdade de oportunidades", que náo deve ser confundida com "justiça por decreto").
Conclusão
O poema é uma profunda reflexão sobre a procura da felicidade que tem de rimar com liberdade, e onde se conclui amargamente: "afinal, a felicidade já não está onde a gente a punha, deixámos de a poder pôr onde nós estávamos."
É uma peça que, sob a leveza do tema das aves, toca em questões universais de liberdade, equidade, esperança, desilusão e crise de identidade, temas muito ressonantes para a comunidade de ex-combatentes.
(Pesquisa, condensação, revisão / fixação de texto, negritos: LG + IA Gemini / Google)
___________________Último poste da série > 12 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27414: Manuscrito(s) (Luís Graça) (279): Viva a Clarinha que hoje faz 6 anos!... Vivam os nossos netos!...

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