domingo, 27 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2797: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (29): Lá estarei em Bissalanca à tua espera!


Missa Luba, por Os Trovadores do Rei Balduíno. Nos anos 50 e 60,as missões em África procuraram conciliar a mensagem religiosa comos usos e costumes tradicionais.A Missa Luba é um desses resultados, em que os ritmos dos Luba entrelaçaram maravilhosamente na estrutura convencional de um missa em latim.Foi um êxito à escala mundial, os jovens congolenses emocionaram inúmeras plateias.Tiveram um grande acolhimento na ponte de Udunduma... (BS)


Fotos (e legendas): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.
Texto do Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1), enviado em 4 de Fevereiro de 2008:



Luís, já seguiu a capa da 9ª Sinfonia de Mahler, juntarei a carta do Ruy Cinatti, uma imagem que tenho aqui da Missa Luba (lembro-te que tens aí o disco para digitalizar) juntarei também os livros do Vergílio Ferreira e da Elsa Triolet. Almocei com o Virgínio Briote, inevitavelmente falámos do 6 de Março [de 2008]. O programa cultural, das 14h30 às 15h30, será uma surpresa para muitos: A conservadora irá mostrar aos visitantes tesouros da arte nalu, balanta e bijagó, isto para além dos grandes clássicos, já que a entidade científica detém um património em livros e mapas que faz da Sociedade de Geografia o mais valioso arquivo do período imperial. Para a semana terás aí o episódio n.º 30, e começo a acreditar que este livro qualquer dia chegará ao fim. Um abraço do Mário.

Operação Macaréu à Vista – II Parte > Episódio n.º XXIX: VEM, VEM, VEM! (1)


por Beja Santos

(i) Uma proposta de Jovelino Corte Real

A região do Xime está agora no centro das atenções do comando de Bambadinca. O relato que lhes fiz do potencial humano do PAIGC existente em Ponta Varela, Poindom e Foz do Corubal não os deixou surpreendidos mas não puderam esconder a preocupação, logo prevendo novas operações para esta região, ainda em Março e depois Abril. Em parte nenhuma do sector L1 o inimigo estava tão perto das nossas tropas. Tão perto e tão forte.

Conhecedor do meu desejo de ir casar a Bissau, Pamplona Corte Real convidou-me a conversar no seu gabinete para sondar as minhas pretensões . Regressara do Xime derreado, considerava, no entanto, que tínhamos escrito no Pel Caç Nat 52 uma bela página de audácia, afinal o morteiro 81 é uma arma eloquente e indiscutível, mesmo com todas as suas dificuldades de transporte. Eu não cabia em mim de contente e escrevo à Cristina:

“Vou enviar-te o relatório da operação mas peço-te que não deixes sair um só instante o documento de casa. Seria para mim altamente comprometedor vir a saber-se que mandava material tão delicado, de carácter confidencial, à mulher. Não te telefonei no teu aniversário, estou cheio de vergonha, amanhã vou à D. Leontina ver se é possível telefonar-te”.

A 16 [de Março de 1970], estou eufórico e volto a escrever à Cristina:

“Estou muito contente de queres vir em Abril, falei com o comandante, ele aceita a sugestão do David Payne em eu sair daqui para ir à consulta externa, escrever-se-á no relatório que eu estou doente e a necessitar de uma baixa ao hospital. Não conformo de ter que ir para a psiquiatria, mas foi-me dito que não tenho outra doença possível que justifique uma baixa...”

Depois, como se estivesse a programar a acção, começo a orientar as actividades: já estás casada, vais utilizar o nosso dinheiro, quem paga a passagem de avião sou eu, és livre de escolher ou não a cerimónia religiosa, diz o que pensas sem preconceitos, vem, vem, vem!, como diz o tenente Pinkerton à sua jovem esposa Madame Butterfly.

Estava mesmo eufórico, incapaz de perceber que ia interromper os estudos da Cristina num período crucial, só falo em lua-de-mel nos Bijagós e Bolama, como se eu estivesse endinheirado e com liberdade para viajar.

“Lá estarei em Bissalanca à tua espera, agora paro de escrever porque amanhã, ao raiar da aurora, vou levar petróleo, bolachas, açúcar, arroz e conservas às gentes do Xitole. Toma atenção que a seguir vou passar alguns dias a Sansacuta, na construção de abrigos. Olha, imagina que descobri o 'Hamlet' nas arrecadações de material, aqui em Bambadinca. O livro estava cheio de pó e sujidade, ninguém se lembrava dele. Já estou a lê-lo, voltei ao reino da Dinamarca”.

Voltemos a Pamplona Corte Real. Depois de me felicitar pelo o que acontecera no Poindom, abre a conversa desta maneira:
-Coitadita da sua mulher, que vem por aí fora, você na guerra, casa e regressa a esta fonte de trabalhos.

Depois, com a voz modulada, enceta a proposta:
-Enquanto casa e não regressa, o pelotão fica entregue aos sargentos, nessa altura lanço-o na ponte de Udunduma, nas visitas às tabancas, colunas e emboscadas, compreenda que até partir sinto que posso contar incondicionalmente com o seu esforço, o seu total empenho, o major Sampaio está a preparar um conjunto de operações com várias companhias, você vai alinhar, se lhe dou a possibilidade de partir para Bissau ao menos volte a fazer coisas como as que aconteceram na bolanha do Poindom.

Garanti-lhe que estava pronto a seguir com os meus soldados para onde me mandassem, nunca me recusara a combater, até partir para Bissau contariam indeclinavelmente comigo.

Confesso que não gostei desta proposta contratual, mas não exteriorizei a indignação. Ficara claro na proposta de Jovelino Corte Real que me daria a vanguarda em várias operações mas que não voltaria a comandá-las. E recomeçaram as fainas triviais, logo a seguir ao Xitole coube-nos montar a segurança à volta do Bambadincazinho, onde o Ministro do Ultramar, Spínola e Felgas visitaram o reordenamento, em 14. Por esta altura, sentia-se uma certa acalmia, havia, é certo, as minas, já se picava regularmente entre a ponte de Udunduma e Amedalai, um contigente da CCaç 12 passou a estacionar em Missirá e em Fá, surgiram rumores que o PAIGC se preparava para pregar uma amarga surpresa à 1ª Companhia de Comandos Africana, em preparação, em Fá, chegaram a ser levantadas algumas minas à volta de Missirá. Mas sentíamos que era uma bonança a preceder uma tempestade.

Cópia da carta do Rui Cinatti, de 7 de Março de 1970.
Guardo a recordação de uma bonita carta que o Ruy Cinatti me enviou neste tempo. Dizia que se sentia dolorosamente atingido quer pela morte do Carlos Sampaio quer pelas guerras em Ponta Varela. Como eu não tinha chegado a 19 de Fevereiro, a Lisboa, como era suposto, levara os feridos do Hospital Militar Principal a uma bifalhada no Cais do Sodré: “Creia, Mário, que não posso ser mais amigo do que sou. Espero agora que você se conforme com a perda do seu amigo e transforme o sacrifício em solução positiva”. Por essa altura, o Almeida Faria ajudava-o a corrigir alguns textos e o Cinatti mostrara-lhe os meus. Fiquei orgulhoso e contente.

Trouxe imenso conforto esta carta. Consegui telefonar-lhe de Bambadinca, leu-me ao telefone um admirável poema. Falámos em D.H.Lawrence, a seguir escrevi-lhe acerca de O Amante de Lady Chatterley.Eu gostava da Lady, ele detestava-a.


(ii) Começam os preparativos para Bissau

A cerca de um mês do meu casamento, disparo mensagens para Bissau e arredores: o Emílio Rosa está formalmente convidado para ser meu padrinho, oferece os seus préstimos para levar as certidões à igreja, preparar os banhos, cede a casa para a lua-de-mel; a Isabel e o David [Payne] serão os padrinhos da Cristina, receberão a Elzira e o Emílio lá em casa durante a lua-de-mel; são expedidos convites para a Inês e o Alexandre Carvalho Neto, que prontamente aceitaram; também aceitou o Rui Gamito, como o capitão Laranjeira Henriques e a mulher; o comando autorizara a deslocação de quatro praças, assentou-se no Benjamim Lopes da Costa, Domingos da Silva, Cherno e Teixeira (irão igualmente aparecer o Barbosa e o capitão Maltez, do Xime, o primeiro gozava férias, o segundo fazia tratamentos).

O Vidal Saraiva avisou que havia uma surpresa por parte dos oficiais, como veio a acontecer. Escrevi longamente aos meus sogros, falando de despesas e da minha tristeza de eles não estarem presentes. Escrevi à minha mãe, aos meus irmãos, às minhas tias, até o Pimbas e a mulher receberam a participação, a todos comuniquei a festa de felicidade que me aguardava na capital das bolanhas. Sinto-me tão desafogado de sentimentos que começo desabridamente a explicar à Cristina que me aguardam três operações até chegar a Bissau: Jaqueta Lisa, Tigre Vadio e Pavão Real, perdi a consciência que há coisas indizíveis, há sustos que se devem evitar, ainda por cima a caminho do casamento.

Capa da 9ª Sinfonia, de Gustave Mahler
No entretanto, Cherno vem anunciar que gostava de, no final da minha comissão, vir trabalhar para Portugal. É nessa altura que escrevo ao Cinatti a pedir-lhe que esclarecesse a situação na Junta de Colonização Interna. Apareceu o substituto de Uam Sambu, apareceu o furriel Pina com o seu dedo entortado e partiu para o Pel Caç Nat 63. Houve discussão acesa com Pamplona Corte Real acerca de uma proposta de promoção por distinção para o António Queirós, dados os seus inequívocos dotes para a chefia. O comandante estava reticente, achava que lhe faltava um ferimento em combate ou uma proeza muito acima daquele fogo de morteiro 81 na bolanha de Poidom.
Escrevo febrilmente a todos: peço à Cristina que visite a D. Maria José de Sampaio e lhe peça uma fotografia do Carlos, uma fotografia que ele tenha tirado nas últimas férias; escrevo à Amélia Lança, ao Paulo Costa, até o Mário Braga foi importunado com o meu casamento. Eu parecia o noivo mais feliz do mundo. Nas próximas semanas vou prolongar este delírio dos preparativos, haja as guerras que houver.


(iii) Conversas “históricas” com D. Violete

Um dia, quando regresso de Sansacuta no Unimog com restos de cimento, rachas de cibe, pregos de vários tamanhos e motosserra, Bala, o ordenança do comando, faz-me um sinal, aproximo-me e ele diz-me mostrando todos os seus dentes de ouro:
-D. Violete tem perguntado por si. Parece que já tem respostas para lhe satisfazer a sua curiosidade.

O sargento Cascalheira que procurava intimidades fáceis, não resistiu a observar, com o olho amarotado:
-Então o meu alferes tem uma professora que lhe satisfaz a curiosidade, hem?
Lancei-lhe um olhar gelado e pedi ao Bala que transmitisse que teria muito gosto em passar lá em casa depois do jantar. Como aconteceu.

D. Violete parecia exuberante com os resultados das suas investigações. Enquanto beberricávamos chá verde, e na companhia de D. Ema, foi desfiando o produto das suas descobertas. Num anuário da Guiné dos anos 40 tinha encontrado referência à Sociedade Agrícola do Gambiel, com capitais exclusivamente portugueses, sucessora da antiga Companhia de Fomento Nacional, fundada em 1921. E mostrou-me uma fotografia com várias construções, apeteceu-me logo atravessar o rio Gambiel e saber se era ali que tinha trabalhado o Prof. Armando Cortesão. Deste, recordava ter encontrado um artigo num boletim da Agência Geral das Colónias, com data de Julho de 1928, e impressionara-me o que ele escrevera naquele tempo:

“Ainda há dez anos Bissau era um pequeno povoado, cercado por uma muralha, e ai do europeu que dele atrevesse a afastar-se umas centenas de metros - o menos que lhe sucedia era o gentio cortar-lhe a cabeça... Hoje, as muralhas de Bissau de há dez anos desapareceram”.

D. Violete não se recordava quando fora extinta a Sociedade Agrícola do Gambiel, mais uma curiosidade que iria transferir para o comandante Teixeira da Mota. Depois, a professora de Bambadinca sorriu e informou-me:
- Sr. alferes, confirmo o que lhe disse acerca da Guiné quando se separou de Cabo Verde, o território era uma desgraça, não tinha praticamente brancos, era constituído mais por presídios e casas comerciais que por agentes do Estado. Havia presídios em Zeguinchor, em Farim e em Geba, praças em Cacheu e Rio Grande, bem como Bissau, Bolama e ilhéu do Rei, a tropa era mínima e só se via a bandeira portuguesa na capital e nos presídios, o resto era a ordem definida pelos régulos. Outro dia falávamos de Sambel Nhanta e estou um pouco confusa, para mim Sambel Nhanta era Caraquecunda mas já ouvi também dizer que era um nome de um régulo antes da chegada dos Soncó, vou procurar confirmar. Quanto a São Belchior, antigamente escrevia-se Sambel-Chiór, era uma povoação biafada onde não havia bandeira nem autoridade portuguesa, tornou-se uma importante localidade de comércio no fim do século XIX, daqui partia muita comida do Oio, do Enxalé e do Cuor, aqui chegavam as mercadorias e mantimentos de Bissau e Bolama, aqui se fazia comércio com Aldeia Formosa. Vamos agora falar dos mandingas. Penso que também tem o livro sobre os mandingas do António Carreira, um livro do Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, de 1947. Tirei aqui umas notas que não resisto a ler-lhe: “Os mandingas têm boa vistas, bom ouvido, razoável olfacto, paladar pouco apurado e mau sentido do tacto”. Ou: “Os mandingas são sentimentais, pouco expansivos e pouco aduladores”. Tirei aqui umas notas para si sobre o vestuário e os costumes. Creio tratar-se de um longo retrato desta etnia, se amanhã escrever sobre eles, e como eu os conheço, tenho todos os elementos para dizer a verdade.

Começava a admirar esta gentil senhora que ocupava os seus tempos livres a catar-me alguma informação histórica, abençoava a praxe maquinada por Jovelino Corte Real que me fizera estribeiro-mor de D. Violete. Sabedora do meu interesse por Infali Soncó, a sua traição e a sua redenção, a filha do administrador Aires referiu-me que fora a Bafatá falar com o tio que trabalhava para o Governo da Província, e que conseguira apurar que a guerra do Cuor começara entre os biafadas e os balantas, ao que parece devido às incursões destes últimos no território dos Soncó, a fim de roubar mulheres e gado, depois, quando os representantes de Bolama foram a Sambel Nhanta, tabanca de Infali, começaram as desconsiderações e a guerra.

É nesse preciso instante em que D. Violete narrava as intrigas de Infali envolvendo os régulos de Badora, Xime, Corubal e Cossé que bateram à porta, era o Ocante a pedir-me para vir cá fora, tratava-se de assunto urgente:
- O Cascalheira embebedou-se em Nova Lamego, parece que agrediu um major, veja o que é que se deve fazer.

Pedi desculpa a D. Ema e a D. Violete, saí furioso naquela narrativa cheia de clímax. O Cascalheira entrara definitivamente numa era de turbulência, tinha um sargento combativo e ferrabrás, urgia procurar um compromisso antes de partir para Bissau, o Pires em breve iria colaborar na CCS, não podia deixar o Ocante sozinho a tomar conta do barco.

(iv) As leituras surpreendentes do mês de Fevereiro

Enquanto estou na ponte de Udunduma procuro, dentro das disponibilidades, ouvir a música que não é grata no quartel. A 9ª Sinfonia de Mahler é bem agradável, se bem que o gira-discos a pilhas distorça a grandiosidade interpretativa de Sir John Barbirolli. Quem veio obter aplauso unânime foi a Missa Luba, na interpretação de Os Trovadores do Rei Balduino. O Kyrie, o Sanctus e o Agnus Dei são de uma enorme beleza, alturas houve em que os soldados pediam para bisar.


Nº 8 da Colecção Contemporânea, da Portugália Editora, capa de Sebastião Rodrigues, 2ª edição. Aparição foi uma obra de quase ruptura na literatura portuguesa, o estilo realista e neo-realista ficam decidamente para trás com esta aventura pelo romance existencialista. Recebeu o Prémio Camilo Castelo Branco, a mais alta distinção literária do tempo. (BS)



Mas quero dar ênfase a dois livros que li logo a seguir a vir do Poindom. Primeiro, Aparição, de Vergílio Ferreira. Alberto Soares, colocado como professor de Português e Latim em Évora, vai ser confrontado com os seus problemas de consciência e o relacionamento com as filhas do Dr. Moura. João Gaspar Simões considera este livro notável. Gosto muito da estrutura estilística e do tumulto interior, deve ser da guerra, passa-me à margem o problema existencial deste professor zangado com Deus, cheio de angústias e com dificuldade para controlar os ímpetos de uma adolescente. Gosto do discurso directo e da relembrança, a banalidade do quotidiano e o posterior juízo:

“Boa noite, reitor. Falo-te daqui, da montanha, ouvindo os cepos a estalar na chaminé, ouvindo as vagas do vento. Nada soube de ti, amigo. Nunca. Mas dos teus pecados ou virtudes, o que me relembra agora é essa amável perfeição de uma face cansada de quem esgotou a vida e essa boa tolerância para quem a estava anunciando”.
É como se depois da estética neo-realista se estivesse a progredir para um existencialismo através da aventura da revelação interior, a brutal iluminação do ser e do mundo, a fatalidade da paixão de Sofia e o seu assassinato às mãos de um jovem ciumento. Gosto da língua, das imagens, da mistura dos tempos, da condição do apego às lembranças, mas não percebo o temor da condição humana, um quase sentido de condenação, como se a aparição fosse a descoberta da solidão definitiva do homem. Mas é literatura do nosso tempo, Vergílio Ferreira é incontestavelmente um grande prosador.


1º livro de Elsa Triolet traduzido em português, 1º livro do ciclo A Idade do Nylon. Tradução de Maria Helena da Costa Dias, capa de Maria Keil,s/data.Assinala o triunfo do consumo de massas, alerta para a escravidão de viver permanentemente, e em todas as situações,a crédito. Até ao suicídio... (BS).


Rosa a prestações, de Elsa Triolet, é um olhar diferente. A protagonista chama-se Martin, veio da barracas, vai subir a pulso no mundo, será uma cabeleireira de prestígio, sentir-se-á seduzida pelos bens, a tal ponto que começará a comprar a prestações, de roupas a propriedades. Será nesse inferno de viver a crédito que toda a sua vida se irá desmoronar, perdendo o amor, a dignidade, os bens avidamente acumulados. Os credores batem à porta levam-lhe a máquina de lavar, o faqueiro a mobília, tudo. Depois, incapaz de se adaptar às realidades, Martin suicida-se, exactamente na cabana onde tinha começado. É a primeira vez que leio Elsa Triolet, nunca me tinha apercebido aonde nos pode levar a servidão das coisas, a paranóia das prestações. Portugal não é uma sociedade de consumo, mas temos aqui uma poderosa e comovente reflexão sobre os seus danos, quando não se controla o corpo das necessidades.

Amanhã, haverá uma reunião com o major Sampaio. Já ouvi falar na Jaqueta Lisa e Colete Encarnado. Parece-me um disparate pôr cerca de trezentos homens a remexer de Ponta Varela ao Poidom, novamente, de Gundaguê Beafada até à Ponta do Inglês, é fatal como o destino que um dos destacamentos vai ser referenciado e anular a actividade do outro. Como, desastrosamente, veio a acontecer

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Nota de L.G.:

(1) Vd. poste de 18 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2771: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (28): A euforia de comandar cem homens na Op Rinoceronte Temível

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