terça-feira, 1 de setembro de 2015

Guiné 63/74 - P15063: Os nossos seres, saberes e lazeres (113): Un viaggio nel sud Italia (4): Ver Nápoles por um canudo (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Agosto de 2015:

Queridos amigos,
Com este passeio meteórico à Costa Amalfitana, despeço-me da Campânia, a viagem pelo Sul de Itália irá prolongar-se por Tivoli, um recante esplendoroso a que a UNESCO fez reconhecimento, e depois Assis, um dos sonhos da minha juventude, Giotto é um dos meus mestres indiscutíveis da pintura e há depois o ambiente dos lugares de S. Francisco.
Deste passeio de que hoje vos falo Amalfi foi ponto alto, ainda se respira o cruzamento de culturas entre o Ocidente e o Oriente, não é por acaso que estamos no Mediterrâneo Central.
Parto com vontade de regressar, Herculano, Nápoles e Caserta continuam nos meus imperativos. Não parto desapontado com a Costa Amalfitana, é demasiado trabalhada para meu gosto, sem detrimento de toda aquela pedra florestada a derramar-se para o mar tranquilo.

Um abraço do
Mário


Un viaggio nel sud Italia (4) 

Beja Santos

Um dia na Costa Amalfitana

Entre os vários itinerários possíveis para sair do porto de Salerno, para percorrer Amalfi, Positano, Capri e Sorrento, escolhi ir direto a Positano, depois Capri e Sorrento e ter Amalfi como penúltima paragem. Tudo de barco até Amalfi e regresso a Salerno de autocarro. Mal sabia eu a armadilha que estava a preparar para aquelas horas entre Amalfi e Salerno, numa estrada estreitíssima, permanentemente com ravinas a pique. Parecia o terror dos filmes. É o preço da inexperiência. E vamos ao passeio.



Não há turista que não diga, desvanecido, que a costa palpita com belezas incomparáveis, com os seus terraços de verde luxuriante, as casas suspensas, tudo entremeado com uma natureza selvagem, ardente e romântica (até parece linguagem de folheto turístico). Aproximamo-nos de Positano, e ninguém pode desdenhar quanto impressiona esta cenografia teatral, a cor do mar, um cíclame, e lá em cima as casas polícromas esparramadas pelas vertentes. Positano teve passado ilustre, competiu com a República de Amalfi pela supremacia do comércio marítimo no Mediterrâneo, no século XVIII. Teve a sua grande importância no Reino das Duas Sicílias, hoje é procurada pelo pitoresco e pelas praias. John Steinbeck, um dos seus visitantes ilustres, não escondeu a emoção que o lugar lhe provocou.


E de Positano rumámos para Capri, alguém lhe chamou “um dos pontos magnéticos do Universo”. Com ou sem exagero dos encómios, é uma das ilhas mais famosas do mundo e atribui-se-lhe o magnetismo à combinação da terra, mar e luz. Dispõe de grutas e farilhões, a costa é recortada, emerge dos abismos e a vegetação empina-se pelas rochas. Esta foi a Capri que li no livro de Axel Munthe e mais tarde em Malaparte, que deixou vila moderna num projeto arquitetónico excêntrico. Se saí e andei por ruas empinadas em Positano, deambulando por lojas de toda a sorte, chamarizes turísticos, aqui preferi ficar a olhar, quedo e mudo, sei que Capri tem sido cenário de muitos filmes, que um dos seus primeiros grandes admiradores foi o imperador Tibério, que aqui passou os seus últimos anos de vida. Nada de me meter em autocarro, táxi ou funicular, só olhar, procurar absorver esse milagre da natureza. O escritor Ivan Turgueniev desabafou: guardo a imagem de Capri até morrer. Gostei mas é uma beleza que não se me cola à pele.



Prossigo viagem, caminhamos para Sorrento, outro cenário natural maravilhoso convertido num dos lugares turísticos mais famosos de Itália. Vamo-nos aproximando desse imponente promontório que cai a pique sobre o mar, em terra sente-se que estamos numa zona pura de atrações turísticas, um pouco em contradição com o pitoresco da costa, vinha à procura dos testemunhos clássicos e medievais, das arquiteturas do Renascimento e do Barroco, o que encontrei foi o uso extravagante de uma posição exclusivamente dominada pela hotelaria e por recantos transformados em bilhetes-postais. Mas não hesitei em fotografar o autor da belíssima canção “Torna a surriento”. Para que conste.




E pronto, é o momento mais empolgante do meu dia, aqui respira-se a mesma serenidade do azul do céu e do mar, parece que foi tudo escavado à mão, sai-se do porto, percorre-se uma rua e é aquele baque do coração quando surge de chofre uma grande praça que tem no alto de uma escadaria a majestosa catedral, galvaniza pela dimensão humana, é o ponto alto de um verdadeiro palco, com belezas naturais ao fundo. Percorrem-se as ruas entre faunas de montanha e há vestígios seguros dos faustos dessa república marítima que viveu momentos de esplendor entre os séculos X e XII, com o seu comércio marítimo a apontar para o Oriente. Subi e desci porque queria gozar da posição panorâmica da catedral, abrir e fechar os olhos perante esta impressionante policromia, os seus esmaltes e mosaicos e o seu tímpano dourado. Àquela hora a catedral tinha fechado e assim perdi a visita ao Claustro do Paraíso e ao seu precioso museu diocesano. Ficará para a próxima, jamais poderei riscar Amalfi do meu coração. E agora vou-me meter num autocarro de pesadelo.



Enquanto esperava o autocarro, refletia sobre estes compactos que os turistas arranjam, tipo um dia na Costa Amalfitana. O tanas! Não fui a Ravello, nem a Praiano nem a Vietri, onde me interessava visitar o Museu de Cerâmica.
A viagem de autocarro começou por me divertir, tive lugar à frente e acompanhei as peripécias do condutor naquela estrada exígua para conseguir avançar no trânsito delirante. O pior foi quando me apercebi do declive para o abismo, aquelas centenas de metros, e entre nós e o abismo uma rede simbólica, entrei em agonia, foram duas horas a olhar para a berma esquerda, via arquitetura nos socalcos e ouvia os outros turistas delirantes com o espetáculo paradisíaco da costa até Salerno.

Despeço-me com algumas saudades, para a próxima vou até Herculano, Nápoles merece uma estadia, ficou por visitar o Palácio Real de Caserta, sonho de Carlos de Borbon, dizem que é esplendoroso. Vou arrumar a trouxa depois do último passeio pela Via dei Mercanti. Amanhã vou de passagem até Roma, a viagem prossegue para Tivoli, ali tenho património da UNESCO, Villa Adriana, mandada construir pelo imperador Adriano no século II depois de Cristo, Villa d’Este com todo o fascínio das suas fontes e jogos de água e Villa Gregoriana e o seu parque, por cima da acrópole romana. É a antepenúltima etapa, depois Assis, mais um olhar apressado sobre Roma e o regresso a Lisboa.

(Continua)

Texto e fotos: © Mário Beja Santos
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Nota do editor

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1 comentário:

antonio graça de abreu disse...

Há um provérbio chinês que diz:"Quem pouco viu, estranha tudo".
Até a Guiné, diria eu.

Abraço,

António Graça de Abreu