1. O nosso Camarada José Eduardo Reis de Oliveira (JERO), foi Fur Mil da CCAÇ 675 (Binta, 1964/65), enviou-nos a sua 13ª estória divertida, que integra o seu livro "Golpes de Mao's - Memórias de Guerra", com data de 29 de Agosto de 2009, que mais uma vez muito agradecemos.
Camaradas,
No seguimento do envio das minhas histórias para publicação, aqui está uma delas mais bem disposta e alegre.
O oficial Foitinho foi condecorado com a Cruz de Guerra enquanto Tenente, ainda na Guiné. Sei que comandou mais tarde o Regimento de Tomar.
Alferes Foitinho, Comandante Interino da C.Caç. 675
Quarenta e tal anos depois... o nosso Coronel Fernando Gonçalves Foitinho (na foto ao lado).
Na sua longa carreira de Oficial do Exército a sua passagem por Binta e pela “675” preencherá (talvez) apenas duas ou três linhas no seu currículo.
Julgamos, no entanto, não ser exagero afirmar que a nossa “Companhia” o marcou de maneira especial.
E a confirmá-lo está, ao longo dos anos, a sua presença assídua nos convívios anuais das “675”.
Numa viagem de autocarro de Lisboa para Évora fomos companheiros de “banco”. Foram quase duas horas de amena cavaqueira que deram para “troca de memórias” que, apesar do tempo decorrido – os tais quarenta e tal anos depois – nunca mais acabam.
Uma “estória” de que foi protagonista único o então”Alferes Foitinho” tocou-nos particularmente. Tem a ver com uma demorada caminhada de... apenas umas dúzias de metros!
O nosso Alferes, depois de cerca de um mês a comandar interinamente a C.Caç. 675, prepara as suas “coisas” para voltar ao Batalhão pois o nosso Capitão Tomé Pinto, regressado do HM 241, de Bissau, tinha voltado a Binta.
A terminar o seu relatório(verbal) o Alferes Foitinho refere finalmente que tinha colocado uma «armadilha» – granada defensiva com arame de tropeçar – num trilho do lado do Cacheu, frente a Binta. No Oio.– Fizeste bem mas antes de ires para Farim vais lá desarmá-la. Só tu é que sabes exactamente o local – disse com sua voz tranquila de comando o nosso Capitão.
O Alferes Foitinho olhou para os seus pertences e... não tinha que enganar.
Teriam que esperar mais algum tempo pelo dono!
Um militar levou-o de piroga e atravessou o rio (Rio Cacheu).
- Aguardas aqui uns minutos que eu não me demoro.
- Às ordens, meu Alferes, mas vou para a sombra que está um brasa que até queima!
O Alferes Foitinho orientou-se e encontrou o trilho sem dificuldade. Estava à vista mas... onde é que era o local certo!? Como apenas num mês tinha crescido tanto o capim!
Onde é que estaria exactamente a armadilha e o seu arame “mortífero”!?
O nosso Alferes coçou a cabeça, ajoelhou-se e... deitou-se no chão. Teria que rastejar, cautelosamente, centímetro a centímetro até encontrar (e tocar) no arame sem nele... tropeçar. Começou a rastejar e a suar... copiosamente.
O calor da tarde estava por todo o lado. Com uma mão à frente da cabeça ia afastando, lenta e cuidadosamente, as ervas do trilho.
Na floresta a passarada foi-se habituando à sua presença silenciosa e recomeçou a fazer... o que tinha interrompido.
O problema era mesmo do Alferes Foitinho!
Uma macaca e os seus filhotes passaram por perto, pararam momentaneamente e... afastaram-se. O que faria por ali, com tanto calor, aquele jovem branco!?
O Alferes Foitinho suava e ia rastejando. Onde estará o arame!? Passaram mais alguns minutos que lhe pareceram horas.
Sentou-se para respirar melhor e descansar um pouco.
A roupa colava-se-lhe ao corpo e o suor, que lhe corria copiosamente da testa ,quase não o deixava ver...Calma... tens que ter calma. O arame há-de estar por aí.
Tenho que o ver antes... de lhe tocar.
Armadilha do cara... do caraças!
E pensar eu que a malta da Companhia está do outro lado a dormir a sesta! Que calor, porra!
Bem vamos a isto...
Rastejar com calma e... passo certo. Já passei por coisas piores.
Macacos me mordam se... não é o arame!
Porra... já não era sem tempo.
Afinal ali estava ele. O sacana do arame!
Agora... é com calma. Levantar-me devagarinho e afastar as ervas.
Ok. Está à vista.
E... está feito.
Armadilha do cara... do caraças.
- Até que enfim, meu Alferes. Está tudo bem?
- Ok, pá. Atravessa lá o rio e…vai pela sombra.
Voltei ao aquartelamento. O Capitão Tomé Pinto preparava uma operação para o dia seguinte.
– Demoraste, pá. Já pensava que te tinhas ido embora sem te despedires.
Mais uma vez obrigado por tudo o que fizeste.
Cumprimentos ao nosso Ten. Coronel Cavaleiro e... vai dizendo coisas.
Depois de uma chuveirada, fardei-me pela segunda vez e ala para Farim, onde me esperava o meu Pelotão de Morteiros 980.
Olhei mais uma vez para lá do Cacheu.
Ia jurar que tinha emagrecido 5 quilos nas últimas duas horas...
3 Armadilha do cara... do caraças!
Nota 1: Fotografias.
1) Coronel Foitinho na actualidade (2009)
2) Rio Cacheu frente a Binta. O Oio ficava do outro lado, frente ao cais, mas não se vê na foto.
3) O Alferes Foitinho em 1965
Nota 2:
Em recente conversa telefónica com o meu Coronel Foitinho tive oportunidade de recordar alguns momentos importantes da sua carreira.
Começou em Mafra como Instrutor do C.O.M e partiu para a Guiné em Maio de 1964 como Alferes, comandando o Pelotão de Morteiros 980, que se fixou em Farim (BCav. 490).
Foi durante cerca de um mês – Agosto de 1964 – Comandante Interino da C.Caç. 675. Passados alguns meses foi promovido a Tenente e foi comandar a C.Caç. 656, que estava instalada em Enxalé.
Como Tenente foi condecorado a Cruz de Guerra de 4ª. Classe.
Regressou a Lisboa em finais do ano de 1965, já como o posto de Capitão.
Chegou portanto à Guiné como Alferes e regressou à Metrópole como Capitão!
Foi colocado no Reg. Infantaria nº. 3 de Beja, onde comandou uma Companhia de Instrução.
Promovido a Major prestou serviço no Quartel-general da Região Militar de Lisboa. Frequentou mais tarde o Curso de Estado-Maior e, como Ten. Coronel, foi Professor na Área de Logística durante cerca de 8 anos.
Quando foi promovido a Coronel rumou a Tomar, para comandar o Reg. Infantaria nº. 15.
Seguiu-se a Repartição de Logística do E.M.E., em Lisboa.
Passou à situação de reserva nos Serviços Sociais das Forças Armadas, tendo ainda chegado a desempenhar funções na Cruz Vermelha Portuguesa).
Um abraço,
JERO
Fur Mil Enf da CCAÇ 675
Fotos: José Eduardo Oliveira (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em: