1. Mensagem de Hélder Sousa* (ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72), com data de 29 de Março de 2010:
Caros amigos Editor e Co-Editores e restantes camaradas
Aqui vos envio o 2.º texto com as crónicas da Marta Ceitil, enviadas aquando da sua aventura como formadora em terras da Guiné e para colocarem na série respectiva.
Neste episódio a Marta já começou a dar a primeira série de formações, em Bissau, sendo que a sua aprendizagem vai ser dura mas profunda e duradoura.
Escrevi aprendizagem porque foi exactamente isso que se passou: a Marta foi ensinar e acabou aprendendo também!
Aprendeu a dar novos valores às coisas da vida, aprendeu a dar e a receber, aprendeu a gostar da Guiné.
Um abraço
Hélder Sousa
A GUINÉ AOS OLHOS DAS ACTUAIS GERAÇÕES (II)
HÉLDER SOUSA / MARTA CEITIL
Depois do seu mail de 29 de Julho, em que dava conta das impressões iniciais e onde tudo era novidade, a Marta enviou novo mail em 9 de Agosto, já então com algum tempo de estadia e também de trabalho.
O mail foi o que se segue:
Saudades di mi terra :)
9 Aug 2009 18:49:02 +0000
Olá Família
E Kuma? Kurpo sta diritu? ;)
Pois é, já lá vão duas semanas e parece que já cá estou há um mês. Aqui é tudo tão diferente, a noção de tempo a passar também é diferente.
Já demos a nossa primeira formação, começou na terça-feira e acabou no sábado. Foi incrível. Não estava nada à espera de ter tanto jeito para isto! Nem estava à espera de gostar tanto de dar formação. Substimei o nível de conhecimento dos meus formandos, e levei um ‘estaladão’ na cara invisível: superaram todas e quaisquer expectativas que eu tinha. Foi uma experiência incrível e sinto que estou a aprender e a crescer a cada dia que passa. Sinto também que estou a mudar algumas coisas, ainda é cedo para dizer isto, mas agora, no presente, sinto que cada vez mais dou importância ao que realmente é importante e relativizo aquilo que não vale a pena, nomeadamente coisas minha e fúteis, que como um bom leão que sou, tenho e faz parte do meu ser, ser vaidosa e gastar (se me pudesse dar a esse luxo…) rios de dinheiro em cremes, em roupa, em botas Timberland. Não estou a dizer que quando voltar, vou ser toda ‘Shanti Shanti’ e ser contra o consumismo, mas aqui e agora isso não vale nada. Esta confrontação das duas realidades é brutal e está a fazer-me muito bem. O desafio é saber gerir bem esta confrontação e saber questionar sem me deixar levar pelo extremismo. Mas acho que estou a conseguir.
A semana que passou também foi um bocado tensa, afinal o sítio onde nós estamos não é assim tão protector dos animais como nós achávamos. No outro dia chegámos a casa, e os donos do aparthotel estavam cá fora no jardim a jantar e perguntaram se éramos servidas. Agradecemos e dissemos de imediato que não, o cheiro estranho a carne era insuportável! De seguida vou à cozinha (que é partilhada) para preparar o nosso jantar, quando... na bancada da cozinha está a cabeça da Nucha, a nossa bambi!!! Não aguentei e desatei a chorar!! Que horror! Percebi logo o que é que os outros estavam a jantar!!
Eu sei, estou na Guiné e é normal estas coisas... mas bolas, criámos uma relação com os animais e aos poucos estão todos a ser comidos! O Galo, já era, também já foi morto, (nem sabia que se comiam Galos, pensava que eram só galinhas), qualquer dia é o Manel e a Maria os nossos chimpanzés!!!
Enfim, estas e outras coisas fazem-me crescer e o ter de lidar com elas também!
O que vale é que amanhã vamos já para Mansoa, já estamos um bocado fartas de Bissau. Também é por isso que estou a escrever, vou ficar até ao dia 26 de Agosto em Mansoa, e aí não há mesmo internet, só o telemóvel. Estamos ansiosas para ir, vamos para a Escola Nacional de Voluntariado, funciona como um Campo de Férias com vários jovens que se inscrevem para ter formação em: Associativismo Juvenil, Saúde Sexual Reprodutiva, Planeamento Estratégico, e Metodologia de Projecto. Eu vou ser coordenadora e responsável pela Formação de Saúde Sexual Reprodutiva, e acho que vai correr novamente bem. Já temos os nossos amigos que são impecáveis, ontem à noite começou a doer o ouvido à Telma, eu com uma lanterna espreitei o ouvido... tinha um bichinho lá dentro. Tínhamos de ir a uma farmácia, ligámos ao nosso amigo Cemjoão (não é o 99 é o cem) que tem uma mota, para nos ajudar a encontrar uma farmácia. Impecável, tratou de tudo e conseguiu as tais gotas para o ouvido que mata o bicho!
Hoje ligámos à nossa médica que nos confirmou que fizemos bem. Só aventuras!!! Cada vez que andamos de Táxi é um filme, mas o lado bom é como os taxistas são todos senegaleses, farto-me de falar francês e afinal não estou assim tão mal quanto achava estar.
Estamos a ser muito bem tratadas e bem recebidas por todos. Andamos na rua e parece que estamos na aldeia, toda a gente nos conhece :)
Bem, este mail está a ficar muito grande, só para vos mandar um grande beijinho e dizer que tenho muitas saudades vossas :)
Espero que esteja tudo bem convosco. Na terça-feira ligo à Joana para dar os parabéns ao Francisco!
Beijinhos grandes
Marta Ceitil
O que se pode dizer quanto a isto?
A aprendizagem desta jovem faz-se a um ritmo acelerado. O contraste entre a sua realidade até então vivida e a dura realidade guineense contribui fortemente para um crescimento mental, um crescimento interior, que a vão levar a novos e mais elevados patamares do relacionamento humano.
É verdade que a atitude ajuda muito. Se se parte com o espírito de grupo, de partilha, o ensino e a aprendizagem entrelaçam-se e atingem-se resultados positivos.
De qualquer modo essa aprendizagem tem, como sempre, aspectos duros.
Veja-se a descoberta de que a Casa/Pensão não era propriamente um zoológico ou um habitat/refúgio de animais indefesos…
Veja-se como se aprende que não se pode ir para estes locais com preconceitos, pois rapidamente se pode levar um ‘estaladão’…
Mas também se veja como a Guiné permite, se assim se quiser e estiver disposto a isso, que rapidamente as pessoas procurem superar os seus limites e se questionem sobre os valores da Vida.
Um abraço para toda a Tabanca!
Hélder Sousa
Fur Mil Transmissões TSF
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 26 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6054: Controvérsias (68): Preciso de entender coisas que não alcanço (Hélder Sousa)
Vd. primeiro poste da série de 9 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5961: A Guiné aos olhos das actuais gerações (1): Marta Ceitil, cooperante na área da Formação (Hélder Sousa / Marta Ceitil)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sábado, 3 de abril de 2010
sexta-feira, 2 de abril de 2010
Guiné 63/74 - P6098: Tabanca Grande (210): Fernando da Costa Gomes de Araújo, (ex- Fur Mil OpEsp/RANGER da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512, Jumbembem, 1973/74)
1. O nosso Camarada Fernando Araújo* (ex-Fur Mil da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512, Jumbembem, 1973/74), enviou-nos a sua primeira mensagem, solicitando a adesão à Tabanca Grande, com data de 2 de Abril de 2010:
Camaradas passo a apresentar-me a esta grande tertúlia cibernáutica,
Nome: Fernando da Costa Gomes de Araújo
Nº. Mec.º: 19740272
Especialidade: Operações Especiais/RANGER (4º Curso de 1972)
Posto: Furriel Miliciano
Local na Guiné: Jumbembem
Período: 1973/1974
Unidade: 2º pelotão - 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512
Andei envolvido com o meu pelotão numa coluna a Guidage, cuja acção decorreu imediatamente antes da execução no terreno da famosa e mortífera operação Ametista Real e numa terrível emboscada em Lamel (região situada entre Jumbembem e Farim), acções estas de que vos darei a minha visão pessoal dos factos, em futuras mensagens.
A presente mensagem e a próxima serão dedicadas ao aquartelamento de Jumbembem e alguns aspectos de que disponho fotografias.
A presente mensagem e a próxima serão dedicadas ao aquartelamento de Jumbembem e alguns aspectos de que disponho fotografias.
Foto 1 > Jumbembem > 1974 >2ª CCAÇ do BCAÇ 4512 > Em primeiro plano: o refeitório, caserna do 4º pelotão e espaldão do Obus 10,5 cm. Ao fundo: a escola e a Tabanca da milícia
Foto 2 > Jumbembem > 1974 > 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512
Foto 3 > Jumbembem > 1974 > 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512 > Caserna do meu 2º pelotão
Foto 4 > Jumbembem > 1973 > Parada do quartel
Foto 5 > Jumbembem > 1974 > 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512 > Tarefa diária do Sargento de Dia à Companhia era a cerimónia do arriar da bandeira. Neste dia tocou-me a mim
Foto 6 > Jumbembem > 1973 > A chegada de um helicóptero com o correio
Foto 7 > Jumbembem-1973 > Instantâneo da chegada do helicóptero com a correspondência. Esta foto foi obtida da porta do meu quarto
Foto 8 > Jumbembem > 1973 > Picada de Canjambari
Foto 9 > Jumbembem > 1974 > O pessoal do 2º pelotão
Foto 10 > Jumbembem > 1974 > A caserna do 2º pelotão
Foto 11 > Jumbembem > 1974 > Os dois Comandantes da Companhia: Cap Mil Aires da Silva Gouveia e o Cap Mil OpEsp RANGER Avelar de Sousa (já quase sem cabelo)
Foto 12 > Jumbembem > 1974 > Messe. Sentados, da esquerda para a direita: Eu, Gomes, Alf Mil Moura, Cap Mil Aires Silva Gouveia, Cap Mil OpEsp/RANGER Avelar de Sousa
Foto 13 > Jumbembem > 1973 > Natal na messe
Foto 14 > Jumbembem > 1973 > Eu a tocar viola e, ao meu lado direito, está o nosso Comandante
Foto 15 > Jumbembem > 1974 > 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512 > Aqui estou eu a “votar” discurso na messe
Foto 16 > Jumbembbem > 1974 > Escrevendo à minha futura mulher, Rosa Maria ou Romy (como eu lhe chamo), no meu quarto
Um abraço,
Fernando Araújo
Fur Mil OpEsp/RANGER da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512
2. Comentário de MR:
A partir de agora o nosso Camarada Manuel Marinho (ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512, Nema/Farim e Binta, 1972/74), já tem no blogue mais um elemento do seu batalhão.
Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
Fotos: © Fernando Araújo (2009). Direitos reservados.
_____________
Notas de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
2 DE ABRIL DE 2010 > Guiné 63/74 - P6093: Tabanca Grande (209): Regressei a Portugal depois de 36 de ausência, mas encontrei a mesma burocracia (João Bonifácio)
Fernando Araújo
Fur Mil OpEsp/RANGER da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512
2. Comentário de MR:
A partir de agora o nosso Camarada Manuel Marinho (ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512, Nema/Farim e Binta, 1972/74), já tem no blogue mais um elemento do seu batalhão.
Emblema de colecção: © Carlos Coutinho (2009). Direitos reservados.
Fotos: © Fernando Araújo (2009). Direitos reservados.
_____________
Notas de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
2 DE ABRIL DE 2010 > Guiné 63/74 - P6093: Tabanca Grande (209): Regressei a Portugal depois de 36 de ausência, mas encontrei a mesma burocracia (João Bonifácio)
Guiné 63/74 – P6097: Agenda Cultural (69): Homenagem da Câmara Municipal de Lisboa ao Marechal António Spínola (Mário G. R. Pinto)
1. O nosso Camarada Mário Gualter Rodrigues Pinto, ex-Fur Mil At Art da CART 2519 - "Os Morcegos de Mampatá" (Buba, Aldeia Formosa e Mampatá - 1969/71), enviou-nos a seguinte mensagem:
Camaradas,
Creio ser do interesse de todos os ex-Combatentes, que sob das suas ordens combateram na Guiné, quando desempenhou a função de Governador e Comandante-chefe do CTIG:
HOMENAGEM DA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA AO MARECHAL ANTÓNIO SPÍNOLA
Realiza-se no próximo dia 11 de Abril de 2010, por altura do centenário do nascimento do Marechal Spínola, uma justa homenagem ao homem que na Guiné se tornou lendário nas qualidades de Comandante-chefe do Exército Português e Governador do Território.
O "Caco" como era respeitosamente conhecido, era estimado na generalidade e odiado por alguns devido a diversos motivos, vai finalmente ter o seu nome inscrito numa artéria da cidade de Lisboa (prolongamento da Av. Estados Unidos da América com a rotunda Infante D. Henrique).
O "Caco" como era respeitosamente conhecido, era estimado na generalidade e odiado por alguns devido a diversos motivos, vai finalmente ter o seu nome inscrito numa artéria da cidade de Lisboa (prolongamento da Av. Estados Unidos da América com a rotunda Infante D. Henrique).
As cerimónias vão contar com a presença de altas individualidades do nosso país, destacando-se o Sr. Presidente da República Aníbal Cavaco Silva, Fernando Spínola (sobrinho do falecido marechal) e o Embaixador, Dr. João Diogo Nunes Barata, que foi Secretário e Conselheiro de António de Spínola, quando Governador da Guiné e Chefe da sua casa civil, quando Presidente da República, logo a seguir ao 25 de Abril.
Recorda-se que o Marechal António Spínola, nasceu em Estremoz em 11 de Abril de 1910 e faleceu em 13 de Agosto de 1996.
Um abraço,
Mário Pinto
Fur Mil At Art da CART 2519
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
13 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5989: Agenda Cultural (66): Homenagem aos ex-combatentes da Guerra Colonial do Concelho de Moura, dia 10 de Abril (Francisco Godinho)
Guiné 63/74 - P6096: Meu pai, meu velho, meu camarada (20): Nunca te esqueças de escrever à tua mãe (Juvenal Amado)
1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado* (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74), com data de 29 de Março de 2010:
Caros Luis, Vinhal, Magalhães e restantes tabanqueiros
É uma pequena homenagem que faço ao meu pai.
Um abraço
Juvenal Amado
MEU PAI MEU AMIGO
“Nunca te esqueças de escrever à tua mãe”.
Estas foram as suas últimas palavras quando me abraçou, naquela madrugada fria de Dezembro, à porta de armas do RI 2 em Abrantes.
Assim foi, nunca passei uma semana em que não escrevesse para a minha mãe, no fim mandava beijos e abraços para o meu pai e irmãos. Ele estava lá sempre em segundo plano, mas garantindo que tudo se passava como o previsto.
Era um homem afável com um elevado sentido de humor.
Foi Soldado de Artilharia Antiaérea e Defesa de Costa na Trafaria onde prestou serviço à volta de 1946.
Sobre a sua passagem pela vida militar, conheci as estórias dos desenfianços e do pouco apego à instituição militar bem como à disciplina que ela impunha.
Desenhador de profissão, ilustrava estórias de cowboys e índios para nos divertir. Chegou a fazer banda desenhada e inúmeros cartazes para os bombeiros e outras associações que deles necessitavam para campanhas de recolha de fundos.
Também fez parte de grupos musicais que abrilhantavam os bailes das associações. Tocava bateria e compunha assim o orçamento familiar com mais uns “cobres”.
Vagamente lembro-me com quatro ou cinco anos dormir com o seu casaco por cima, atrás do palco quando já não aguentava mais o sono.
Mais tarde ensinou-me os princípios básicos da sua profissão, os seus ideais sobre um país novo e livre, fui aprendendo observando-o ao longo dos anos que privei com ele em casa e no emprego.
A nossa relação foi distante enquanto eu fui garoto, o que era natural, pois a figura do pai era sempre austera e menos acessível que a mãe, mas foi fortíssima na minha idade adulta especialmente após o meu regresso da Guiné.
Identificávamo-nos no essencial no plano social e político, gostávamos em grande parte dos mesmos petiscos, filmes e escritores, deferíamos no gosto musical como era natural, mas acima de tudo o que gostávamos mais, era de estarmos juntos.
Qualquer mesa, qualquer café ou um pouco de pão e queijo era o suficiente para saborearmos um copo e o prazer de estarmos juntos. A minha mãe muitas vezes dizia: "tal pai tal filho".
Não me lembro de ele ter pedido algo que fosse só para si.
No dia do Pai percorri a memória e a saudade que tenho dele.
Nunca lhe disse o quanto o amava, talvez convencido que isso estava à vista desarmada.
Sinto que não gozei o suficiente a sua companhia
A sua morte no dia 13 de Janeiro de 1995 foi o acontecimento mais triste da minha vida e hoje lembrei-me de que nunca lhe escrevi uma carta.
Juvenal Amado
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 17 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6006: O 6º aniversário do nosso Blogue (9): O Blogue, o futuro, os nossos encontros, os dias em que não me sinto fora de prazo... (Juvenal Amado)
Vd. último poste da série de 24 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5154: Meu pai, meu velho, meu camarada (19): Cabo Verde, 1942: Plano de defesa do arquipélago, de Santos Costa (José Martins)
Caros Luis, Vinhal, Magalhães e restantes tabanqueiros
É uma pequena homenagem que faço ao meu pai.
Um abraço
Juvenal Amado
MEU PAI MEU AMIGO
“Nunca te esqueças de escrever à tua mãe”.
Estas foram as suas últimas palavras quando me abraçou, naquela madrugada fria de Dezembro, à porta de armas do RI 2 em Abrantes.
Assim foi, nunca passei uma semana em que não escrevesse para a minha mãe, no fim mandava beijos e abraços para o meu pai e irmãos. Ele estava lá sempre em segundo plano, mas garantindo que tudo se passava como o previsto.
Era um homem afável com um elevado sentido de humor.
Foi Soldado de Artilharia Antiaérea e Defesa de Costa na Trafaria onde prestou serviço à volta de 1946.
Sobre a sua passagem pela vida militar, conheci as estórias dos desenfianços e do pouco apego à instituição militar bem como à disciplina que ela impunha.
Desenhador de profissão, ilustrava estórias de cowboys e índios para nos divertir. Chegou a fazer banda desenhada e inúmeros cartazes para os bombeiros e outras associações que deles necessitavam para campanhas de recolha de fundos.
Também fez parte de grupos musicais que abrilhantavam os bailes das associações. Tocava bateria e compunha assim o orçamento familiar com mais uns “cobres”.
Vagamente lembro-me com quatro ou cinco anos dormir com o seu casaco por cima, atrás do palco quando já não aguentava mais o sono.
Mais tarde ensinou-me os princípios básicos da sua profissão, os seus ideais sobre um país novo e livre, fui aprendendo observando-o ao longo dos anos que privei com ele em casa e no emprego.
A nossa relação foi distante enquanto eu fui garoto, o que era natural, pois a figura do pai era sempre austera e menos acessível que a mãe, mas foi fortíssima na minha idade adulta especialmente após o meu regresso da Guiné.
Identificávamo-nos no essencial no plano social e político, gostávamos em grande parte dos mesmos petiscos, filmes e escritores, deferíamos no gosto musical como era natural, mas acima de tudo o que gostávamos mais, era de estarmos juntos.
Qualquer mesa, qualquer café ou um pouco de pão e queijo era o suficiente para saborearmos um copo e o prazer de estarmos juntos. A minha mãe muitas vezes dizia: "tal pai tal filho".
Não me lembro de ele ter pedido algo que fosse só para si.
No dia do Pai percorri a memória e a saudade que tenho dele.
Nunca lhe disse o quanto o amava, talvez convencido que isso estava à vista desarmada.
Sinto que não gozei o suficiente a sua companhia
A sua morte no dia 13 de Janeiro de 1995 foi o acontecimento mais triste da minha vida e hoje lembrei-me de que nunca lhe escrevi uma carta.
Juvenal Amado
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 17 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6006: O 6º aniversário do nosso Blogue (9): O Blogue, o futuro, os nossos encontros, os dias em que não me sinto fora de prazo... (Juvenal Amado)
Vd. último poste da série de 24 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5154: Meu pai, meu velho, meu camarada (19): Cabo Verde, 1942: Plano de defesa do arquipélago, de Santos Costa (José Martins)
Guiné 63/74 - P6095: Os nossos regressos (22): Os cruzeiros da minha vida (Armandino Alves)
1. O nosso Camarada Armandino Alves (ex-1º Cabo Auxiliar de Enfermagem na CCAÇ 1589 - Beli, Fá Mandinga e Madina do Boé -, 1966/68), enviou-nos uma mensagem, em 1 de Abril, que a seguir publicamos:
Os cruzeiros da minha vida
Camaradas,
Tenho lido muitas descrições sobre o transporte marítimo do pessoal mobilizado para a Guiné.Eu não sei como o mesmo se processava no Uíge e no Niassa, certo é que, em tempos de paz, esses navios estavam destinados exclusivamente à movimentação de cargas e passageiros.Não estavam, com certeza, dimensionados para acolher, como muitas vezes o fizeram, um batalhão e outras unidades.Segundo me apercebi, em algumas viagens chegaram a transportar um batalhão e mais uma ou duas companhias.
Mas eram considerados barcos estáveis em alto mar.Alguns dos navios empenhados nestas tarefas, de leva e trás, eram adaptados, mal e toscamente, de transporte de cargas para passageiros, transformando os porões de armazenamento de cargas em longas e atrofiadas camaratas.Agora, aqueles que não viveram esse pesadelo, imaginem o que são cento e tal homens, enfiados num barco que normalmente transportava meia dúzia de passageiros.A sua vocação era inequívoca, o transporte de cargas.Então os poucos camarotes eram destinados aos oficiais e sargentos e o restante pessoal ia no porão, apinhado em colchões de palha, alinhados pelo pavimento sem qualquer tipo de cobertura, ou outra protecção. Privacidade zero!Para os cabos e praças as instalações sanitárias eram construídas em madeira, sobre uma das amuradas do barco e consistiam, basicamente, num caixote em madeira dividido em três, com uma tábua transversal e um buraco no meio onde o pessoal se sentava.Os resultados das evacuações caiam directos no mar (sem como é óbvio passar por nenhum tratamento residual).Quanto a banhos estamos falados, até para lavar a cara era preciso levantar cedo para ter direito a água potável.A alimentação não era da pior, só que a cozinha não estava dimensionada para servir tanta gente.Eu, à boa moda da tropa de então ”desenrasquei-me”, pois comecei a entabular conversa com o pessoal da cozinha e a ajudá-los no transporte dos congelados da câmara frigorífica, cuja entrada obrigava a vestir um casaco de peles até aos pés, com carapuço e luvas do mesmo, pois o frio era “mais que muito”.Assim, viajei todo o percurso dentro da casa das máquinas, pois era um dos poucos sítios onde se sentia menos o balanço do barco e, por isso, menos enjoativo.Havia na parede um dispositivo com uma escala e um ponteiro no meio, que se deslocava ora para a esquerda ora para a direita, indicando o grau de inclinação do barco.Acompanhei os mecânicos, de uma ponta à outra do barco, ou seja da casa das máquinas até à hélice a inspeccionar o veio principal de transmissão.No regresso à Metrópole não tive tanta sorte, mas como o tempo era de Verão passei-o bem e, como vinha de retorno a casa nem liguei a isso. Quanto mais depressa chegasse melhor.A viagem para a Guiné, foi a bordo do navio Manuel Alfredo e o regresso foi no Ana Mafalda (dois transatlânticos do meu tempo).
Um Abraço,
Armandino Alves
1º Cabo Aux Enf CCAÇ 1589 (1966/68)
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Nota de M.R.:
Vd. último poste da série em:
1 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6089: Os nossos regressos (21): No dia 1 de Abril de 1970, a CCAÇ 2381 finalmente despede-se em Parada Militar (Arménio Estorninho)
Guiné 63/74 - P6094: Notas soltas da CART 643 (Rogério Cardoso) (15): As famosas costeletas do Asdrúbal, e não só (Rogério Cardoso)
1. Nota solta do nosso camarada Rogério Cardoso (ex-Fur Mil, CART 643/BART 645, Bissorã, 1964/66), enviada em mensagem do dia 29 de Março de 2010.
NOTAS SOLTAS DA CART 643 (15)
As costeletas do Asdrúbal
No pouco tempo que a Cart 643 esteve em Bissau, deu para que todos os locais onde houvesse petisco, fossem visitados. Eram consumidos uns caranguejos do rio, camarão, ostras, etc.
Todos se lembram de um restaurante perto do Forte da Amura, que era conhecido pelo Asdrúbal, ou também pela alcunha do Porco Sujo.
A freguesia abundava, mesmo sabendo que a limpeza não era predicado que se aplicasse, mesmo assim era capaz de ser melhor do que se passava nos aquartelamentos e messes.
Então o que fazia aquela malta acorrer com tal abundância?
Eram dois os motivos, o primeiro é que as refeições eram servidas por uma filha do Asdrúbal, rapariga nova, forte, buçal, com um abundante manto cabeludo distribuido pelo corpo visual. Aplicando-se o velho ditado que "na terra de cego quem tem olho é rei", era o melhor que se conseguia ver por aquelas bandas.
O segundo motivo eram as gostosas costeletas, que deliciavam a freguesia, incluindo eu e alguns camaradas, só que mais tarde, mas dentro do espaço da nossa permanência em Bissau, foi descoberto que elas provinham do desgraçado do chamado Macaco Cão, descoberta feita por acaso, quando um nativo dos arredores, vindo com um às costas e interrogado, afirmou que era costume fornecer o Asdrúbal com tal produto.
Mais tarde, ouvimos dizer que houve grande cena de pancadaria, com destruição de parte do Restaurante, não sei se por causa do macaco se pela cabeluda filha, que era um deslumbre para o Zé Tropa.
R.C.
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 30 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6072: Notas soltas da CART 643 (Rogério Cardoso) (14): Recordando o Fur Mil Américo Leong Monteiro, Maitá
NOTAS SOLTAS DA CART 643 (15)
As costeletas do Asdrúbal
No pouco tempo que a Cart 643 esteve em Bissau, deu para que todos os locais onde houvesse petisco, fossem visitados. Eram consumidos uns caranguejos do rio, camarão, ostras, etc.
Todos se lembram de um restaurante perto do Forte da Amura, que era conhecido pelo Asdrúbal, ou também pela alcunha do Porco Sujo.
A freguesia abundava, mesmo sabendo que a limpeza não era predicado que se aplicasse, mesmo assim era capaz de ser melhor do que se passava nos aquartelamentos e messes.
Então o que fazia aquela malta acorrer com tal abundância?
Eram dois os motivos, o primeiro é que as refeições eram servidas por uma filha do Asdrúbal, rapariga nova, forte, buçal, com um abundante manto cabeludo distribuido pelo corpo visual. Aplicando-se o velho ditado que "na terra de cego quem tem olho é rei", era o melhor que se conseguia ver por aquelas bandas.
O segundo motivo eram as gostosas costeletas, que deliciavam a freguesia, incluindo eu e alguns camaradas, só que mais tarde, mas dentro do espaço da nossa permanência em Bissau, foi descoberto que elas provinham do desgraçado do chamado Macaco Cão, descoberta feita por acaso, quando um nativo dos arredores, vindo com um às costas e interrogado, afirmou que era costume fornecer o Asdrúbal com tal produto.
Mais tarde, ouvimos dizer que houve grande cena de pancadaria, com destruição de parte do Restaurante, não sei se por causa do macaco se pela cabeluda filha, que era um deslumbre para o Zé Tropa.
R.C.
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 30 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6072: Notas soltas da CART 643 (Rogério Cardoso) (14): Recordando o Fur Mil Américo Leong Monteiro, Maitá
Guiné 63/74 - P6093: Tabanca Grande (209): Regressei a Portugal depois de 36 de ausência, mas encontrei a mesma burocracia (João Bonifácio)
1. Mensagem do nosso camarada João Bonifácio* (ex-Fur Mil SAM, CCAÇ 2402, Có, Mansabá e Olossato, 1968/70), com data de 27 de Março de 2010:
Olá Caros Amigos e Camaradas;
Os melhores cumprimentos ao Carlos, Graça e restantes responsáveis por este local de encontro.
Como em tempos informei, eu tomei uma decisão radical e que foi mudar de temperaturas. Assim, e depois de 36 anos num país frio e com uns verões muito curtos, resolvi regressar a Portugal. Não, eu não retornei... eu regressei apenas ao meu country de origem.
Tem sido muito complicado. Primeiro porque deixei neve e frio no dia 9 de Janeiro, e logo para me habituar melhor, Portugal premiou-me com chuva, vento e frio. Eu nada fiz para merecer este castigo, mas como não chegasse, e vindo do Canadá, pensei que duas semanas depois poderia fazer a escritura de um andar que o verão passado comprei na Quinta do Bom Retiro, Vale Figueira, na freguesia da Sobreda.
Eu tinha tantas informações, confirmações e contactos que até pensei: eh pá... Portugal está muito mudado, e daí asneira. Acreditei. Calculem que até vendi a minha casa no Canadá em 48 horas... e hoje dia 27 de Março ainda não estou no andar.
Papéis, inspecções, burocracia, fins de semana longos, férias para tudo e mais, Carnaval e com a Páscoa tão perto, já vi filmes mais bonitos.
Estou a tentar manter a calma, mas até me tem parecido o mesmo da nossa idade para a Guiné. Tudo feito à balda e em cima do joelho, e nós os "combatentes" nem água tínhamos naquele campo quente e de barracas que eu nem me lembro já onde era.
É evidente que a chegada chuvosa a Portugal foi melhor. Tive direito a uma recepção, mas sem a red carpet, mas uma viagem sem "minas" pela segunda circular, eixo norte-sul e depois sobre a sempre espectacular ponte sobre o Tejo, que nem digo o nome, em caso que algum ministro sem pasta... ou quase, se lembre de acordar um dia e deixar de ser 25 de Abril.
Finalmente, parece que a primavera está já à porta em termos reais, pois das datas estou eu cansado. Nós fazemos barulho porque temos 15 graus e no meu segundo país, refilam porque está vento e baixa a temperatura para menos 14 como foi nos últimos dois dias.
Ainda não estou preparado para o combate, mas estou a tentar por-me em forma.
Para já este mail a dizer que cá estou, e a partir de agora, tentar rapidamente adaptar-me a tudo, incluindo aos serviços de saúde.
Por intermédio do Carlos, renovo os meus cumprimentos a todos e obrigado pela atenção dispensada.
João Gomes Bonifácio
CCAÇ 2402
Guiné/1968-70
2. Comentário de CV:
Caro Bonifácio
Pois é... mudar mentalidades é muito complicado, e este país é um caso sério.
Serviço público que se preze atira para as mãos do utente uma molhada de papéis para preencher. Tratam-nos por senhor José, senhor Carlos, quando não, por você.
Não te esqueças da gorjeta que sempre lubrifica o sistema e retira umas pedras da engrenagem.
Bem-vindo ao nosso Portugal imutável e corrupto, e vê se não compras algum andar já vendido a outrem ou ainda hipotecado pelo construtor.
O perigo espreita onde menos esperares.
Em nome da tertúlia desejo-te as maiores felicidades neste teu velho país.
Se puderes envia as tuas fotos da praxe, uma antiga e outra actual para os nossos registos.
Recebe um abraço dos editores e da restante tertúlia.
Vinhal
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 11 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5256: Tabanca Grande (186): João Bonifácio regressa em Janeiro de 2010 ao solo pátrio (Os Editores)
Vd. último poste da série de 12 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5981: Tabanca Grande (208): Daniel Matos, ex-Fur Mil da CCAÇ 3518 (Gadamael, 1972/74)
Olá Caros Amigos e Camaradas;
Os melhores cumprimentos ao Carlos, Graça e restantes responsáveis por este local de encontro.
Como em tempos informei, eu tomei uma decisão radical e que foi mudar de temperaturas. Assim, e depois de 36 anos num país frio e com uns verões muito curtos, resolvi regressar a Portugal. Não, eu não retornei... eu regressei apenas ao meu country de origem.
Tem sido muito complicado. Primeiro porque deixei neve e frio no dia 9 de Janeiro, e logo para me habituar melhor, Portugal premiou-me com chuva, vento e frio. Eu nada fiz para merecer este castigo, mas como não chegasse, e vindo do Canadá, pensei que duas semanas depois poderia fazer a escritura de um andar que o verão passado comprei na Quinta do Bom Retiro, Vale Figueira, na freguesia da Sobreda.
Eu tinha tantas informações, confirmações e contactos que até pensei: eh pá... Portugal está muito mudado, e daí asneira. Acreditei. Calculem que até vendi a minha casa no Canadá em 48 horas... e hoje dia 27 de Março ainda não estou no andar.
Papéis, inspecções, burocracia, fins de semana longos, férias para tudo e mais, Carnaval e com a Páscoa tão perto, já vi filmes mais bonitos.
Estou a tentar manter a calma, mas até me tem parecido o mesmo da nossa idade para a Guiné. Tudo feito à balda e em cima do joelho, e nós os "combatentes" nem água tínhamos naquele campo quente e de barracas que eu nem me lembro já onde era.
É evidente que a chegada chuvosa a Portugal foi melhor. Tive direito a uma recepção, mas sem a red carpet, mas uma viagem sem "minas" pela segunda circular, eixo norte-sul e depois sobre a sempre espectacular ponte sobre o Tejo, que nem digo o nome, em caso que algum ministro sem pasta... ou quase, se lembre de acordar um dia e deixar de ser 25 de Abril.
Finalmente, parece que a primavera está já à porta em termos reais, pois das datas estou eu cansado. Nós fazemos barulho porque temos 15 graus e no meu segundo país, refilam porque está vento e baixa a temperatura para menos 14 como foi nos últimos dois dias.
Ainda não estou preparado para o combate, mas estou a tentar por-me em forma.
Para já este mail a dizer que cá estou, e a partir de agora, tentar rapidamente adaptar-me a tudo, incluindo aos serviços de saúde.
Por intermédio do Carlos, renovo os meus cumprimentos a todos e obrigado pela atenção dispensada.
João Gomes Bonifácio
CCAÇ 2402
Guiné/1968-70
2. Comentário de CV:
Caro Bonifácio
Pois é... mudar mentalidades é muito complicado, e este país é um caso sério.
Serviço público que se preze atira para as mãos do utente uma molhada de papéis para preencher. Tratam-nos por senhor José, senhor Carlos, quando não, por você.
Não te esqueças da gorjeta que sempre lubrifica o sistema e retira umas pedras da engrenagem.
Bem-vindo ao nosso Portugal imutável e corrupto, e vê se não compras algum andar já vendido a outrem ou ainda hipotecado pelo construtor.
O perigo espreita onde menos esperares.
Em nome da tertúlia desejo-te as maiores felicidades neste teu velho país.
Se puderes envia as tuas fotos da praxe, uma antiga e outra actual para os nossos registos.
Recebe um abraço dos editores e da restante tertúlia.
Vinhal
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 11 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5256: Tabanca Grande (186): João Bonifácio regressa em Janeiro de 2010 ao solo pátrio (Os Editores)
Vd. último poste da série de 12 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5981: Tabanca Grande (208): Daniel Matos, ex-Fur Mil da CCAÇ 3518 (Gadamael, 1972/74)
Guiné 63/74 - P6092: Notas de leitura (87): Antologia O Corpo da Pátria, de Pinharanda Gomes (Beja Santos)
1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Março de 2010:
Queridos amigos,
Não conheço mais obras sobre literatura de nacionalistas que combateram na Guiné ou à Guiné aludam.
Peço a amabilidade a quem possua livros de exaltação nacionalista, proveniente de antigos combatentes na Guiné, que me facultem para se proceder a inventário.
Recordo que já aqui se fez referência a uma Antologia do Conto Ultramarino organizada por Amândio César.
Um abraço do
Mário
O corpo da Pátria:
Dar voz aos nacionalistas que combateram na Guiné
Beja Santos
Alguns dos poemas publicados por Rodrigo Emílio em “Vestiram-se os Poetas de Soldados” tinham aparecido na antologia “O Corpo da Pátria” (Editora Pax, Braga, 1971) organizada por Pinharanda Gomes, um intelectual e filósofo que nunca escondeu o seu ideal nacionalista. Aos poetas nacionalistas que não combateram ou combatiam em África chamou-lhes poetas da retaguarda (caso de Fernanda de Castro, Natércia Freire, Fernando Guedes e Pedro Homem de Mello); aos poetas combatentes chamou-lhes poetas da frente, incluindo, entre outros, Rodrigo Emílio, José Valle de Figueiredo, Jorge Silveira Machado, Almeida Matos, Armor Pires Mota e João de Mattos e Silva. Como se compreenderá, iremos referenciar os poetas que combateram na Guiné e que pelo seu canto se assumiam pela integridade territorial, usando as expressões possíveis que a lírica, o epigrama, a épica e a apologética consentem, revelando sentimentos exaltados, de apelo ao heroísmo, por vezes de consciência abismada e patética. Diz Pinharanda no prefácio: “O leitor encontrará um mundo vário de motivações: o amor, a morte, a saudade, a promessa, o ódio, o medo (o medo!), a indecisão, o regresso, a viagem sem retorno – o testemunho vivo, directo, de quem reagiu ao empurrão. Ainda que a validade intrínseca de alguns poemas possa ser posta em causa, todos os poemas antologiados são vivo testemunho de um lance histórico da vida portuguesa”.
Como se passa a exemplificar. De Jorge Silveira Machado, natural de São Jorge, Açores, oficial condecorado, o poema “Quem é o inimigo”:
Só conhecemos o inimigo
quando começa o tiroteio
a força a violência o ódio os berros
e a morte pelo meio
quem é o inimigo
quando há silêncio na floresta
no rio no tarrafo no capim
esperar é o que nos resta
só conhecemos o inimigo
quando o fogo cresce à nossa volta
e tudo acaba como principia
quando se volta
..............................................
só conhecemos o inimigo
quando começa o tiroteio
a dúvida o perigo
e a morte pelo meio
De Almeida Mattos o poema “Guiné/67”
Solenes, voltaremos.
E sobre o mar as cicatrizes ficam
livres da dor, do ódio desta guerra
Inútil e eterna essa lembrança
breve e inútil como nossas vidas.
Amanhecerá no teu corpo um pleno verão,
feito de frutos desta longa ausência
dos corpos que ficaram nas bolanhas
que em nossos próprios corpos viverão.
De Armor Pires Mota e do seu poema “Cântico”
Vou partir para a metralha, Senhor!
Carrego de morte os bolsos e os olhos
doidos de manhãs de claras, rasgadas no infinito.
Afivelo a alma bem dentro da alma
e, de medo, trauteio a marcha do rio Kwai.
Não sujo as mãos de qualquer remorso,
não seja cobarde: tenho o meu povo, a minha bandeira! –
e, se tombar no sangue, na lama,
seja para Ti, Senhor,
a força do meu cântico.
A minha maior surpresa foi encontrar nesta colectânea “Poema de uma Guerra Longe”, de Ruy Cinatti, datado de 1970. Conhecia-o, recebi-o na Guiné, era a resposta a uma descrição que eu fizera de um encontro com guerrilheiros. Carta e poema foram oferecidos à Sociedade de Geografia de Lisboa:
Sete horas húmidas, algures.
Progressão, fardas ensopadas.
Silêncio na terra de combate.
Silêncio nos corpos.
Estacas calcinadas.
O piar da aves, o olhar súplice.
Dois tiros quase num só eco.
O desabar das folhas, ramos rápidos.
Um grito que se apaga.
Missão cumprida, a meta adivinhada.
Febre sem alma ou acordo.
O peso súbito de um morto
Caindo nos ombros estreitos,
Doloridos,
da minha miséria.
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 1 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6087: Notas de leitura (86): A Lebre, de Álvaro Guerra - a intervenção da tolerâcia numa escrita que escapou à censura (Beja Santos)
Queridos amigos,
Não conheço mais obras sobre literatura de nacionalistas que combateram na Guiné ou à Guiné aludam.
Peço a amabilidade a quem possua livros de exaltação nacionalista, proveniente de antigos combatentes na Guiné, que me facultem para se proceder a inventário.
Recordo que já aqui se fez referência a uma Antologia do Conto Ultramarino organizada por Amândio César.
Um abraço do
Mário
O corpo da Pátria:
Dar voz aos nacionalistas que combateram na Guiné
Beja Santos
Alguns dos poemas publicados por Rodrigo Emílio em “Vestiram-se os Poetas de Soldados” tinham aparecido na antologia “O Corpo da Pátria” (Editora Pax, Braga, 1971) organizada por Pinharanda Gomes, um intelectual e filósofo que nunca escondeu o seu ideal nacionalista. Aos poetas nacionalistas que não combateram ou combatiam em África chamou-lhes poetas da retaguarda (caso de Fernanda de Castro, Natércia Freire, Fernando Guedes e Pedro Homem de Mello); aos poetas combatentes chamou-lhes poetas da frente, incluindo, entre outros, Rodrigo Emílio, José Valle de Figueiredo, Jorge Silveira Machado, Almeida Matos, Armor Pires Mota e João de Mattos e Silva. Como se compreenderá, iremos referenciar os poetas que combateram na Guiné e que pelo seu canto se assumiam pela integridade territorial, usando as expressões possíveis que a lírica, o epigrama, a épica e a apologética consentem, revelando sentimentos exaltados, de apelo ao heroísmo, por vezes de consciência abismada e patética. Diz Pinharanda no prefácio: “O leitor encontrará um mundo vário de motivações: o amor, a morte, a saudade, a promessa, o ódio, o medo (o medo!), a indecisão, o regresso, a viagem sem retorno – o testemunho vivo, directo, de quem reagiu ao empurrão. Ainda que a validade intrínseca de alguns poemas possa ser posta em causa, todos os poemas antologiados são vivo testemunho de um lance histórico da vida portuguesa”.
Como se passa a exemplificar. De Jorge Silveira Machado, natural de São Jorge, Açores, oficial condecorado, o poema “Quem é o inimigo”:
Só conhecemos o inimigo
quando começa o tiroteio
a força a violência o ódio os berros
e a morte pelo meio
quem é o inimigo
quando há silêncio na floresta
no rio no tarrafo no capim
esperar é o que nos resta
só conhecemos o inimigo
quando o fogo cresce à nossa volta
e tudo acaba como principia
quando se volta
..............................................
só conhecemos o inimigo
quando começa o tiroteio
a dúvida o perigo
e a morte pelo meio
De Almeida Mattos o poema “Guiné/67”
Solenes, voltaremos.
E sobre o mar as cicatrizes ficam
livres da dor, do ódio desta guerra
Inútil e eterna essa lembrança
breve e inútil como nossas vidas.
Amanhecerá no teu corpo um pleno verão,
feito de frutos desta longa ausência
dos corpos que ficaram nas bolanhas
que em nossos próprios corpos viverão.
De Armor Pires Mota e do seu poema “Cântico”
Vou partir para a metralha, Senhor!
Carrego de morte os bolsos e os olhos
doidos de manhãs de claras, rasgadas no infinito.
Afivelo a alma bem dentro da alma
e, de medo, trauteio a marcha do rio Kwai.
Não sujo as mãos de qualquer remorso,
não seja cobarde: tenho o meu povo, a minha bandeira! –
e, se tombar no sangue, na lama,
seja para Ti, Senhor,
a força do meu cântico.
A minha maior surpresa foi encontrar nesta colectânea “Poema de uma Guerra Longe”, de Ruy Cinatti, datado de 1970. Conhecia-o, recebi-o na Guiné, era a resposta a uma descrição que eu fizera de um encontro com guerrilheiros. Carta e poema foram oferecidos à Sociedade de Geografia de Lisboa:
Sete horas húmidas, algures.
Progressão, fardas ensopadas.
Silêncio na terra de combate.
Silêncio nos corpos.
Estacas calcinadas.
O piar da aves, o olhar súplice.
Dois tiros quase num só eco.
O desabar das folhas, ramos rápidos.
Um grito que se apaga.
Missão cumprida, a meta adivinhada.
Febre sem alma ou acordo.
O peso súbito de um morto
Caindo nos ombros estreitos,
Doloridos,
da minha miséria.
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 1 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6087: Notas de leitura (86): A Lebre, de Álvaro Guerra - a intervenção da tolerâcia numa escrita que escapou à censura (Beja Santos)
Guiné 63/74 - P6091: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (27): Teixeira Pinto - o dia-a-dia
1. Mensagem de Luís Faria (ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto, 1970/72), com data de 26 de Março de 2010:
Amigo Vinhal
Mais uns apontamentos de “Viagem …” que se calhar te vai dar um pouquito de trabalho, ajudando-te na saúde, que espero esteja bem.
Um abraço extensivo a todos
Luís Faria
Viagem à volta das minhas memórias (27)
Teixeira Pinto – o dia a dia
A actividade operacional da “FORÇA” em Teixeira Pinto foi tão intensa ou mais do que em Bula, mas tivemos na verdade outras condições dadas pelo comando do CAOP 1
Ao que me disseram, parece que fomos destacados para lá por a nossa operacionalidade no sector de Bula ter sido considerada eficiente. É verdade que tínhamos sido a Companhia do Batalhão que mais combates travou nas matas de Bula e ao que sei, mais estragos causou ao IN, que nos teria “um certo respeito”.
Talvez por essas razões, ficamos à ordem não do BCAÇ 2905 mas do comando do CAOP 1, que nos utilizou em “rotação” com os Fuzos, Páras e Comandos lá estacionados, como se fôssemos também Tropa Especial. Só não fizemos saídas de heli!
Assim sendo, a breve trecho e após provas dadas(?!) recebemos certas contrapartidas de maneira a minimamente satisfazer o “para trabalho igual, salário igual “ do pós 25 Abril, digo eu (!!!), sendo que neste caso o salário era a alimentação e o armamento. O trabalho era o que todos sabemos!
Talvez para que mantivéssemos a dinâmica e a boa operacionalidade no ”trabalho”, passamos a ter rancho melhorado, suplemento e ração de combate especial, ao que recordo idêntica à dos Fuzileiros. Quanto ao armamento, para além da nossa dotação normal, acumulamos mais duas MG, um (dois ?) morteiro 60 e creio que mais um lança-granadas, ao que recordo por GCOMB. Estas armas eram-nos também dispensadas pelos Fuzileiros que, sem desprimor para as outras tropas Especiais, era um Pessoal diferente, impecável, de fácil convivência sempre prontos a nos apoiar e ajudar no que pudessem.
Claro que estas “benesses” nos ajudavam à auto-confiança e moralizavam o Pessoal nas constantes acções a desenvolver naquelas matas belicosas. Dava-me gozo e confiança olhar para a Rapaziada do bi-grupo (por norma reduzido) formada na parada antes das saídas e vê-los com aquela disciplina, aquele “porte” e aquele armamento!
Na verdade sinto orgulho e emoção por ter ajudado a comandar e ter feito parte integrante daquele grupo de Rapaziada que, como tantos e tantos milhares de outros, a troco de nada se sacrificaram e deram o seu melhor incluindo sangue e vida, na defesa da que sentiam sua Pátria e do seu símbolo maior a Bandeira, também naquelas latitudes flamejante e que nos tempos actuais são tão pouco ou nada reconhecidos, esquecidos e maltratados em nome(?) de uma vergonha (?!) absurda, que nos querem fazer sentir, mas que eu não sinto nem aceito! Como tantos milhares, cumpri o meu dever o melhor que soube e pude e volto a afirmar que me sinto orgulhoso por o ter conseguido, com a ajuda de Deus e dos meus Camaradas de armas.
Foto 1 > O meu 2.º GCOMB completo
Foto 2 > Elementos 4.º GCOMB
Recebidas todas estas “cerejas”, faltava o “bolo” propriamente dito que não tardou a ser servido ! Foi um grande e pesado bolo com doses de veneno que foi sendo cortado em fatias que pareciam não acabar, sobrando sempre mais uma !!!! Íamos comê-las lá para o Balanguerês e Burné, por norma a todas as trinta e seis horas durante cinco meses até primeiros de Dezembro, com interregno de Agosto em que fomos para o AGREBIS. O pior é que algumas dessas fatias nos “caíam” pior por ficarem estragadas, afectando-nos o corpo e a Alma!
Para de certo modo “desenjoar” deste bolo e para fugir um tanto ao ambiente e disciplina castrenses, alguma da Furrielada (creio que só?) alugamos uma vivenda situada numa perpendicular à Av. Principal e próxima do quartel, que usávamos parcialmente nas nossas trinta e seis horas de descanso.
Aberta a todos os que quisessem confraternizar de mente aberta e sem hierarquias, por lá passou quem quis e continuou a lá ir quem se sentia bem naquele ambiente de sinceridade e espontaneidade. Eram momentos de recuperação psicológica em que nos permitíamos quase tudo, inclusive… sonhar!
Era uma vivenda simpática, com o seu belo alpendre onde não faltavam a cadeira de baloiço que nos embalava numa leve modorra e os sempre presentes (julgo que em toda a Guiné) “bancos –caixote” a par de umas cadeiras. Já se dizia “o seguro morreu... de velho” e assim também não faltava nunca pelo menos uma ou mais G3 à mão, já que na segurança “mais valia prevenir que remediar” e elas podiam vir a fazer a diferença, mesmo considerando Teixeira Pinto um “oásis de paz”!
Por lá passávamos bons momentos em amenas cavaqueiras por norma “des-intelectuais” e pseudo-filosóficas que não nos levavam a lado algum a não ser a umas gargalhadas e a uns “arriões” vocabulares susceptíveis de fazer corar um “militar de carreira” e o meu amigo Portuense “Teixeira Malcriado”!!!…
As escritas mais ou menos comentadas, as “confidências – disseminadas” de amores e desamores temporários, os comentários e as criticas jocosas normalmente com base no feminino… iam-nos escorrendo as horas. O importante era não ter tempo para pensar muito nas incertezas do amanhã!
A entremear, também lá aconteciam as “cerimónias” de fazer inveja a qualquer batucada, em que o whisky, as Casal Garcia e as “bazucas” fresquinhas, acompanhadas ou não por petisco eram quem comandava, nos punham a desopilar com cantorias infernais ao desafio, sincopadas ou não por viola e “batuque” na meia cabaça ou na mesa e nos podiam levar a fazer as ditas e consideradas “figuras tristes”!!! Eram espectaculares estas cerimónias e aconteciam quase sempre que chegávamos da mata.
Foto 3 > "Cerimónia” – Urbano de pé eu à viola
Foto 4 > "Cerimónia" com a G3 à mão
Claro que muito do tempo também se passava no “lar doce lar” do quartel, por onde cirandavam a “Belinha” e a "Sheilinha”, duas canídeos rafeiras que me adoptaram e de quem gostava muito. Por onde andasse no quartel, elas seguiam-me e já crescidotas, quando saíamos nos “Unimog” elas seguiam-no até à saída da povoação, até que um dia um “inteligente” lhes mandou um tiro. Nunca mais as vi!
Foto 5 > A Bélinha e a Sheilinha
O nosso BAR (Furriéis) era o dos Comandos. Por lá se bebiam uns valentes copos e se passavam tempos agradáveis em conversas talvez meio “sérias da treta”, já não recordo e em que algumas vezes no final, o caminho mais curto entre dois pontos deixava de ser a linha recta para ser a sinusoidal!!!
Havia também por lá a “mota da Companhia”, isto é, a motorizada do Alferes Barros (guineense) em que dávamos umas voltitas e fazíamos umas “habilidadezitas”. Esta motorizada era o transporte que o Barros usava para se “desenfiar” com o pretexto de visitar a família (dizia), deixando-me e ao Castro “órfãos” do comando do 2.º GCOMB e até bi- grupo em algumas das saídas para o mato.
- Oh Alferes… outra vez? Foda–se… a família é grande com'ó caralho…!!! - Dizíamos-lhe (bocas no género) rindo!
- Sabes onde está o Barros? Sei lá…, deve-se ter “posto nas putas”… e a gente que se “foda”…!!! - Dizíamos bem dispostos.
Ele era (é) um “gajo porreiro”, valente e que confiava em nós. Por isso é que de quando em vez “abusava” sem dizer népia! Na verdade formávamos uma boa equipa.
Foto 6 > “Mota da Companhia”- a minha “habilidade” com o descanso no chão !!!
Foto 7 > “Clientes da mota da Companhia”, montada pelo dono. Da esquerda: Alf Mil Freitas Pereira; Fur Mil Fontinha; eu; Alf Mil Barros e Alf Mil Gaspar
O rio, onde se davam umas braçadas e uns mergulhos para refrescar e desanuviar, mesmo com o risco de “ganhar elefantíase”, pródiga naquelas paragens como tive ocasião de constatar, era também um local que de quando em vez visitava e apreciava, que me transmitia uma certa paz de espírito e me ajudava a “reformatar” para a próxima saída.
Enfim, todos os pretextos eram bons e úteis para gastar o tempo, evitando questionar-me sobre o futuro! Vivia o dia a dia e… era só!
Foto 8 > Bolanha - rio
Foto 9 > Banho retemperador com faca no cinto por causa dos “elefantes”!!!
Foto 10 > À procura do Mundo - bolanha ao fundo
Fotos: © Luís Faria (2010). Direitos reservados
Luís Faria
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 13 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5984: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (26): Teixeira Pinto, Julho de 1971, no pico da época das chuvas
Amigo Vinhal
Mais uns apontamentos de “Viagem …” que se calhar te vai dar um pouquito de trabalho, ajudando-te na saúde, que espero esteja bem.
Um abraço extensivo a todos
Luís Faria
Viagem à volta das minhas memórias (27)
Teixeira Pinto – o dia a dia
A actividade operacional da “FORÇA” em Teixeira Pinto foi tão intensa ou mais do que em Bula, mas tivemos na verdade outras condições dadas pelo comando do CAOP 1
Ao que me disseram, parece que fomos destacados para lá por a nossa operacionalidade no sector de Bula ter sido considerada eficiente. É verdade que tínhamos sido a Companhia do Batalhão que mais combates travou nas matas de Bula e ao que sei, mais estragos causou ao IN, que nos teria “um certo respeito”.
Talvez por essas razões, ficamos à ordem não do BCAÇ 2905 mas do comando do CAOP 1, que nos utilizou em “rotação” com os Fuzos, Páras e Comandos lá estacionados, como se fôssemos também Tropa Especial. Só não fizemos saídas de heli!
Assim sendo, a breve trecho e após provas dadas(?!) recebemos certas contrapartidas de maneira a minimamente satisfazer o “para trabalho igual, salário igual “ do pós 25 Abril, digo eu (!!!), sendo que neste caso o salário era a alimentação e o armamento. O trabalho era o que todos sabemos!
Talvez para que mantivéssemos a dinâmica e a boa operacionalidade no ”trabalho”, passamos a ter rancho melhorado, suplemento e ração de combate especial, ao que recordo idêntica à dos Fuzileiros. Quanto ao armamento, para além da nossa dotação normal, acumulamos mais duas MG, um (dois ?) morteiro 60 e creio que mais um lança-granadas, ao que recordo por GCOMB. Estas armas eram-nos também dispensadas pelos Fuzileiros que, sem desprimor para as outras tropas Especiais, era um Pessoal diferente, impecável, de fácil convivência sempre prontos a nos apoiar e ajudar no que pudessem.
Claro que estas “benesses” nos ajudavam à auto-confiança e moralizavam o Pessoal nas constantes acções a desenvolver naquelas matas belicosas. Dava-me gozo e confiança olhar para a Rapaziada do bi-grupo (por norma reduzido) formada na parada antes das saídas e vê-los com aquela disciplina, aquele “porte” e aquele armamento!
Na verdade sinto orgulho e emoção por ter ajudado a comandar e ter feito parte integrante daquele grupo de Rapaziada que, como tantos e tantos milhares de outros, a troco de nada se sacrificaram e deram o seu melhor incluindo sangue e vida, na defesa da que sentiam sua Pátria e do seu símbolo maior a Bandeira, também naquelas latitudes flamejante e que nos tempos actuais são tão pouco ou nada reconhecidos, esquecidos e maltratados em nome(?) de uma vergonha (?!) absurda, que nos querem fazer sentir, mas que eu não sinto nem aceito! Como tantos milhares, cumpri o meu dever o melhor que soube e pude e volto a afirmar que me sinto orgulhoso por o ter conseguido, com a ajuda de Deus e dos meus Camaradas de armas.
Foto 1 > O meu 2.º GCOMB completo
Foto 2 > Elementos 4.º GCOMB
Recebidas todas estas “cerejas”, faltava o “bolo” propriamente dito que não tardou a ser servido ! Foi um grande e pesado bolo com doses de veneno que foi sendo cortado em fatias que pareciam não acabar, sobrando sempre mais uma !!!! Íamos comê-las lá para o Balanguerês e Burné, por norma a todas as trinta e seis horas durante cinco meses até primeiros de Dezembro, com interregno de Agosto em que fomos para o AGREBIS. O pior é que algumas dessas fatias nos “caíam” pior por ficarem estragadas, afectando-nos o corpo e a Alma!
Para de certo modo “desenjoar” deste bolo e para fugir um tanto ao ambiente e disciplina castrenses, alguma da Furrielada (creio que só?) alugamos uma vivenda situada numa perpendicular à Av. Principal e próxima do quartel, que usávamos parcialmente nas nossas trinta e seis horas de descanso.
Aberta a todos os que quisessem confraternizar de mente aberta e sem hierarquias, por lá passou quem quis e continuou a lá ir quem se sentia bem naquele ambiente de sinceridade e espontaneidade. Eram momentos de recuperação psicológica em que nos permitíamos quase tudo, inclusive… sonhar!
Era uma vivenda simpática, com o seu belo alpendre onde não faltavam a cadeira de baloiço que nos embalava numa leve modorra e os sempre presentes (julgo que em toda a Guiné) “bancos –caixote” a par de umas cadeiras. Já se dizia “o seguro morreu... de velho” e assim também não faltava nunca pelo menos uma ou mais G3 à mão, já que na segurança “mais valia prevenir que remediar” e elas podiam vir a fazer a diferença, mesmo considerando Teixeira Pinto um “oásis de paz”!
Por lá passávamos bons momentos em amenas cavaqueiras por norma “des-intelectuais” e pseudo-filosóficas que não nos levavam a lado algum a não ser a umas gargalhadas e a uns “arriões” vocabulares susceptíveis de fazer corar um “militar de carreira” e o meu amigo Portuense “Teixeira Malcriado”!!!…
As escritas mais ou menos comentadas, as “confidências – disseminadas” de amores e desamores temporários, os comentários e as criticas jocosas normalmente com base no feminino… iam-nos escorrendo as horas. O importante era não ter tempo para pensar muito nas incertezas do amanhã!
A entremear, também lá aconteciam as “cerimónias” de fazer inveja a qualquer batucada, em que o whisky, as Casal Garcia e as “bazucas” fresquinhas, acompanhadas ou não por petisco eram quem comandava, nos punham a desopilar com cantorias infernais ao desafio, sincopadas ou não por viola e “batuque” na meia cabaça ou na mesa e nos podiam levar a fazer as ditas e consideradas “figuras tristes”!!! Eram espectaculares estas cerimónias e aconteciam quase sempre que chegávamos da mata.
Foto 3 > "Cerimónia” – Urbano de pé eu à viola
Foto 4 > "Cerimónia" com a G3 à mão
Claro que muito do tempo também se passava no “lar doce lar” do quartel, por onde cirandavam a “Belinha” e a "Sheilinha”, duas canídeos rafeiras que me adoptaram e de quem gostava muito. Por onde andasse no quartel, elas seguiam-me e já crescidotas, quando saíamos nos “Unimog” elas seguiam-no até à saída da povoação, até que um dia um “inteligente” lhes mandou um tiro. Nunca mais as vi!
Foto 5 > A Bélinha e a Sheilinha
O nosso BAR (Furriéis) era o dos Comandos. Por lá se bebiam uns valentes copos e se passavam tempos agradáveis em conversas talvez meio “sérias da treta”, já não recordo e em que algumas vezes no final, o caminho mais curto entre dois pontos deixava de ser a linha recta para ser a sinusoidal!!!
Havia também por lá a “mota da Companhia”, isto é, a motorizada do Alferes Barros (guineense) em que dávamos umas voltitas e fazíamos umas “habilidadezitas”. Esta motorizada era o transporte que o Barros usava para se “desenfiar” com o pretexto de visitar a família (dizia), deixando-me e ao Castro “órfãos” do comando do 2.º GCOMB e até bi- grupo em algumas das saídas para o mato.
- Oh Alferes… outra vez? Foda–se… a família é grande com'ó caralho…!!! - Dizíamos-lhe (bocas no género) rindo!
- Sabes onde está o Barros? Sei lá…, deve-se ter “posto nas putas”… e a gente que se “foda”…!!! - Dizíamos bem dispostos.
Ele era (é) um “gajo porreiro”, valente e que confiava em nós. Por isso é que de quando em vez “abusava” sem dizer népia! Na verdade formávamos uma boa equipa.
Foto 6 > “Mota da Companhia”- a minha “habilidade” com o descanso no chão !!!
Foto 7 > “Clientes da mota da Companhia”, montada pelo dono. Da esquerda: Alf Mil Freitas Pereira; Fur Mil Fontinha; eu; Alf Mil Barros e Alf Mil Gaspar
O rio, onde se davam umas braçadas e uns mergulhos para refrescar e desanuviar, mesmo com o risco de “ganhar elefantíase”, pródiga naquelas paragens como tive ocasião de constatar, era também um local que de quando em vez visitava e apreciava, que me transmitia uma certa paz de espírito e me ajudava a “reformatar” para a próxima saída.
Enfim, todos os pretextos eram bons e úteis para gastar o tempo, evitando questionar-me sobre o futuro! Vivia o dia a dia e… era só!
Foto 8 > Bolanha - rio
Foto 9 > Banho retemperador com faca no cinto por causa dos “elefantes”!!!
Foto 10 > À procura do Mundo - bolanha ao fundo
Fotos: © Luís Faria (2010). Direitos reservados
Luís Faria
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 13 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P5984: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (26): Teixeira Pinto, Julho de 1971, no pico da época das chuvas
Guiné 63/74 - P6090: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (6): Os dias da batalha de Guidaje, 20 e 21 de Maio de 1973
1. Parte VI dos dias da batalha de Guidaje, de autoria do nosso camarada Daniel Matos (ex-Fur Mil da CCaç 3518, Gadamael, 1972/74), enviado ao nosso Blogue em 6 de Março de 2010:
Os Marados de Gadamael
e os dias da Batalha de Guidaje
Parte VI
Daniel de Matos
Os Dias da Batalha
20 de Maio
As flagelações sucedem-se dia após dia e praticamente todos os edifícios já sofreram danos. O nosso abrigo, qual cabeça de cogumelo pousada no chão, e muito poucos outros telhados são o que resta de construções por esburacar. Sem conseguir dormir, fumo mais um Português Suave e caminho ao longo das valas repletas de homens deitados no fundo. O dia rompe, preguiçoso. Avisto Marcelino da Mata, palma da mão direita para cima, quatro dedos a dobrarem-se e esticarem-se com intermitência, “toca a levantar”, assim acorda os homens que pernoitaram na mesma vala ziguezagueante que nós, só que lá no extremo oposto.
Ele e este seu Grupo já tinham estado connosco em Gadamael, (na altura, um grupo reduzido de dezasseis ou dezoito elementos), de lá saíram para uma Operação de que não tivemos informações. Só sei que lhes abri as armadilhas à saída da pista de aviação e, mais adiante, em Viana, para poderem passar. Seguiram acompanhados do guia Queba Mané, (que regressou sozinho quarenta minutos depois) em direcção a Gadamael Fronteira (daí em diante era chão da Guiné-Conacry). Não os vi carregados de mochilas e mantas, nem de bornais e rações de combate, acartavam apenas dois cantis de água cada um e cinturões pejados de armamento. Só voltaram à base passados três dias, onde um batelão os aguardava para os transportar, julgo que para Cacine. Era um grupo mítico de que se contavam estórias, inclusive as mais idiotas e macabras, tais como a de coleccionarem orelhas de inimigos abatidos ou apanhados, serem antropófagos, levarem apitos e desatarem a correr atrás do IN disparando e apitando ao mesmo tempo, etc.. Mas estas estórias (verdadeiras ou não, tão condenáveis como os actos, porém, que ficaram na História!) apenas se contavam para ilustrar a destreza destes homens, alguns deles evidenciando bastante juventude ainda, durante as operações mais secretas e bicudas para onde eram mandados.
Ouviram-se rebentamentos breves vindos de leste, alvitram-se bombas lançadas pela aviação nos arredores de Fajonquito. Quanto a nós, a partir de hoje veremos que consequências teve a Operação levada a cabo pelos Comandos Africanos e a destruição da base de Koumbamory, fosse ela total ou parcial. Será que vão reduzir-se os ataques?
Antes da investida dos Comandos e do bombardeamento da Força Aérea, o PAIGC dispunha no local das seguintes unidades: Corpo de Exército 199/B/70, com quatro Bigrupos de Infantaria e uma Bateria de Artilharia; Corpo de Exército 199/C/70, com cinco Bigrupos de Infantaria e uma Bateria de Artilharia; Grupo de Foguetes da Frente Norte, com quatro rampas; três Bigrupos de Infantaria, um Grupo de Reconhecimento e uma Bateria de Artilharia do CE/A/70, deslocadas de Sare Lali (zona leste); e um Pelotão de Morteiros de 120 milímetros.
O pessoal do Batalhão de Comandos arranca em direcção ao sul. Desloca-se a pé (em bicha de pirilau e sem viaturas), não podendo assim transportar nem os dez mortos resultantes dos confrontos de Koumbamory nem os vinte e dois feridos graves resultantes da Operação Ametista Real. Há outros homens que, com mazelas e ferimentos mais ligeiros não estão em condições de aguentar a marcha, ou de a consumar com segurança e ficam também em Guidaje.
Os dez corpos, cuja identificação mencionarei mais adiante, virão mais tarde a ser aqui sepultados. Não há notícia dos três desaparecidos em combate, cujos corpos ficaram tombados em território senegalês. Em toda a acção, os Comandos Africanos dispararam 26.700 munições de G3 e 4.600 de Kalashnikov (todas de 7,62mm), 292 granadas de lança-granadas foguete (6 e 8,9 cm), 71 granadas de RPG-2 e RPG-7, 195 munições de morteiro e 268 granadas de mão (ofensivas e defensivas).
Num terreno descampado do lado de lá da fronteira, três crianças de varapaus controlam de longe a numerosa manada que levam a pastar, o que há muito tempo não é habitual ver-se por ali, até porque existem áreas com mais e melhor verdura para o efeito.
Alguém sugeriu mais tarde que o PAIGC desconfiara que o Exército Português havia minado aquele corredor fronteiriço, para vedar a passagem. Dificilmente as NT conseguiriam colocar minas nesse terreno sem despertar a atenção dos vigias, que controlariam permanentemente os nossos movimentos. Na impossibilidade de enviar picadores para se certificar (ficariam ao alcance das nossas armas ligeiras), as vacas a calcorrear o terreno seriam a forma de o testar. Porém, nenhum animal foi pelos ares…
Não consigo recordar-me de quantas vezes terei ido à messe sentar-me e comer uma refeição. Primeiro, porque as horas do tacho são trocadas constantemente e tenho pouca sorte na escolha dos momentos de investida; segundo, porque enquanto duram alguns restos de rações de combate que o pessoal “anfitrião” sacou do armazém, aproveito-me da sua generosidade; terceiro, porque já começo a enjoar-me das salsichas de lata, só o cheiro me dá náuseas. Neste dia começa a faltar o pão, parece que já estão a racionar a farinha, vem uma pequena fatia na borda do prato de cada um e é o que há! E uma bernarda certeira no cocuruto do depósito de géneros arrasou as já de si insignificantes esperanças de um dia nos brindarem com rancho melhorado…
Bem, mas de sentir fome lembro-me perfeitamente (ou talvez não seja fome e apenas pensar que devo mastigar alguma coisa), e dirijo-me à messe, que desta vez está a servir refeições e cheia que nem um ovo. Olho para o fundo e calculo que deve ser naquele balcão que nos devemos servir, tipo self-service, do tal esparguete salsicheiro, prato do dia, não ao almoço e ao jantar, mas à hora de abertura que parece tirada às sortes.
É sabido que os graduados não usam divisas nem galões nos ombros quando partem em Operação, em virtude da ideia de que o inimigo pretende sempre aniquilar quem comanda, em primeiro lugar. Portanto, todos nós, quando saímos do COMBIS de manhãzinha deixámos nos cacifos essas identificações hierárquicas. Entro na messe e oiço um berro estridente, vindo de uma das mesas. Pelos cabelos brancos só pode ser de pessoal do quadro. Deduzo tratar-se do Comandante, e é de facto o Tenente-Coronel Correia de Campos que vejo apontar na minha direcção, de indicador em riste:
– “Adonde” é que você pensa que vai? Ponha-se lá fora imediatamente! Apresente-se primeiro e peça autorização para entrar!
Por decoro, não vou agora descrever o que balbuciei na altura, enquanto rangia os dentes, nem o que me apeteceu e estive mesmo para fazer… Recuei até à entrada da messe, ou refeitório, ou espelunca o lá o que era aquilo. Como não trazia quico não podia fazer continência, pus-me em sentido:
– Apresenta-se o furriel miliciano n.º 19711671, Daniel Rosa de Matos. V. Exa, meu Comandante, dá-me licença que entre?
– Entre! – respondeu sem me olhar, a boca cheia a mastigar o esparguete.
De pronto, virei as costas e saí. Confesso que o que queria mesmo era arremessar-lhe qualquer coisa às ventas, não sei bem o quê, o que apanhasse à mão de semear para lhe dar o troco do enxovalho. Só não o fiz porque alguém me puxou pelo braço e me disse “tem juízo pá, caga mas é no gajo, que é um xico de merda, e vem comer” e acabei por atacar mas foi a dose reduzida de salsicha, apesar do fastio. Sentei-me numa mesa corrida, – não muito distante da do Tenente-Coronel, – onde já estavam de prato vazio milicianos de outras unidades. O que me sussurrou os insultos ao Comandante e me arrastou para ir buscar o prato ao balcão, contou então certas histórias de atitudes que o homem teria tomado em Pirada, – e que não têm cabimento aqui, – e garantiu-me que se não havia whisky na messe era porque ele tinha açambarcado para o seu quarto as cerca de quarenta garrafas que há poucos dias constavam no inventário do depósito de géneros. É claro, os outros camaradas que estavam à mesa confirmaram tudo, puseram até os adjectivos no superlativo, mas nunca me convenci que não fosse mais um daqueles boatos que circulam sem se saber como nasceram. Nunca estivera cara a cara com Correia de Campos, aliás, ficara com boa impressão do homem desde que vi, ao longe, no meio da parada e durante uma flagelação, indiferente às granadas que caiam por perto, de pingalim (à Spínola) numa mão e de AVP-1 na outra, a dar ordens à Artilharia e às Armas Pesadas de como responder ao fogo. Agora, a atitude mentecapta que teve para comigo obrigou-me a mudar de opinião. Num quartel que, sob o seu comando, mais parecia já uma “Casa de Orates”, era assim que queria impor “respeito”? “Autoridade”? “Disciplina”? O que pode levar um indivíduo corajoso a revelar atitudes como estas, a coberto dos galões – de que outra coisa poderia ser?
No 25 de Abril de 1974, imagino que devido ao relacionamento que mantinha com Spínola, o Tenente-Coronel apareceu em Lisboa, à porta do Quartel do Carmo. Adelino Gomes (jornalista que estava a fazer a reportagem dos acontecimentos que viria a ser gravada em vinil e em cd), pergunta-lhe como estão as coisas e Correia de Campos retorquiu-lhe mais ou menos isto: se uma mulher grávida estiver a parir você pergunta-lhe se está com dores? A delicadeza da resposta caracteriza a sua personalidade. Passados estes anos, o episódio da messe pouco (me) importa, todos temos momentos de menor inspiração. Sem lhe querer mal algum, relatar agora o que se passou é já uma vingançazinha, como que a reivindicar para mim igual costela cabotina…
21 de Maio
Parece haver um abrandamento no ritmo dos ataques de artilharia de que somos alvos. Será provavelmente a primeira consequência da operação dos Comandos em Koumbamory, base que ainda há poucos meses recebeu seis dezenas de combatentes recém-formados na Argélia e em Cuba e é (era?) o principal ponto de abastecimento aonde os guerrilheiros se vão municiar. Mas já se fala em reposição de stocks! Diz-se que têm chegado ali camiões carregados com material vindo de Zinguinchor.
Num passado mais longínquo, Zinguinchor foi também relacionada com os colonos portugueses pelas piores razões, ao ser palco de tráfico de escravos com a cumplicidade “tuga”. Em 1836, o decreto de 10 de Dezembro aboliu as exportações de escravos em todos os territórios portugueses, mas isso não afectou os dois maiores traficantes dessa época: o antigo governador da Guiné e Coronel de Milícias, Joaquim António de Matos, e o Governador de Bissau, Caetano José Nozolini, comerciante mestiço, cabo-verdiano, marido e sócio de Nhara Aurélia Correia. Segundo a escritora Joana Ruas, que foi cooperante na Guiné-Bissau depois da independência e jornalista cultural do jornal Nô Pintcha (Avante, em português), creio que ao mesmo tempo que o jornalista português Daniel Reis (de A Bola) que também esteve no jornal, “Ziguinchor estava povoada por mestiços luso-africanos, grumetes e escravos, o chefe da feitoria vem de uma família mestiça, os Carvalho Alvarenga, ramo donde virá Honório Pereira Barreto, filho de um cabo-verdiano e de Rosa de Carvalho Alvarenga, a poderosa Rosa de Cacheu. Honório Pereira Barreto, sendo Governador da Guiné de 1835 a 1839, o número de escravos libertados nos 55 navios provenientes dali e apresados pelos cruzadores, fixou-se em cerca de 3.929”. Pois Honório Pereira Barreto (nascido no Cacheu a 24/4/1813, morre em Bissau a 26/4/1859), é o único negro (falso negro, por sinal) a figurar nas parangonas do sistema colonial: a sua pretensa fotografia aparece nas notas antigas do escudo guineense, nos selos emitidos pelos CTT, e tem inclusive um monumento majestoso, construído em sua memória. O regime aponta-o como o supremo exemplo do “portuguesismo” que pode haver num assimilado. Acontece é que o seu lado verdadeiramente negro, – digamos que, obscuro, – é o de, numa época em que o comércio de escravos está em extinção, consolidar no Cacheu um lucrativo comércio esclavagista! Que credibilidade pode ter entre os guineenses o poder exercido em Bissau ao longo do século e nos dias da guerra, cujo único monumento a um negro é erigido em memória do tal Honório?
Outra vez do lado senegalense da fronteira, um pouco mais distante do enfiamento do abrigo do Obus, nota-se uma invulgar movimentação de viaturas amareladas, bem ao alcance dos nossos olhos. Sabíamos da sua circulação, protegidas por blindados, numa estrada paralela à fronteira mas a cerca de dois quilómetros de distância. Mas assim tão perto… Pertenceriam às tropas do país vizinho ou à guerrilha? Tamanha concentração fez crescer o nervoso miudinho e, com maior ou menor fundamento, o receio de vir a concretizar-se o temido ataque ao arame. O nosso Cabo artilheiro, pelo sim, pelo não, apontou o Obus o mais paralelamente ao solo possível, a ponta do cano quase apoiada sobre a circunferência de bidões, “just in case”, gastaria o resto das munições fazendo tiro directo!
Corre o informe de que no enfiamento do quartel de Nema (Farim), estaria instalada uma porção descomunal de “turras”, provavelmente para reforçar a instalação de minas no itinerário para Guidaje. Mais lenha para queimar a nossa débil moral…
(Continua)
__________
Nota de CV:
Vd. Os cinco primeiros postes da série de:
16 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6000: Os Maradados de Gadamael (Daniel Matos) (1): Por onde andaram e com quem estiveram?
18 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6014: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (2): Levar a lenha e sair queimado
20 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6027: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (3): Os dias da batalha de Guidaje - Antecedentes à nossa chegada
24 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6041: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (4): Os dias da batalha de Guidaje, 15 a 18 de Maio de 1973
30 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6069: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (5): Os dias da batalha de Guidaje, 19 de Maio de 1973
Os Marados de Gadamael
e os dias da Batalha de Guidaje
Parte VI
Daniel de Matos
Os Dias da Batalha
20 de Maio
As flagelações sucedem-se dia após dia e praticamente todos os edifícios já sofreram danos. O nosso abrigo, qual cabeça de cogumelo pousada no chão, e muito poucos outros telhados são o que resta de construções por esburacar. Sem conseguir dormir, fumo mais um Português Suave e caminho ao longo das valas repletas de homens deitados no fundo. O dia rompe, preguiçoso. Avisto Marcelino da Mata, palma da mão direita para cima, quatro dedos a dobrarem-se e esticarem-se com intermitência, “toca a levantar”, assim acorda os homens que pernoitaram na mesma vala ziguezagueante que nós, só que lá no extremo oposto.
Ele e este seu Grupo já tinham estado connosco em Gadamael, (na altura, um grupo reduzido de dezasseis ou dezoito elementos), de lá saíram para uma Operação de que não tivemos informações. Só sei que lhes abri as armadilhas à saída da pista de aviação e, mais adiante, em Viana, para poderem passar. Seguiram acompanhados do guia Queba Mané, (que regressou sozinho quarenta minutos depois) em direcção a Gadamael Fronteira (daí em diante era chão da Guiné-Conacry). Não os vi carregados de mochilas e mantas, nem de bornais e rações de combate, acartavam apenas dois cantis de água cada um e cinturões pejados de armamento. Só voltaram à base passados três dias, onde um batelão os aguardava para os transportar, julgo que para Cacine. Era um grupo mítico de que se contavam estórias, inclusive as mais idiotas e macabras, tais como a de coleccionarem orelhas de inimigos abatidos ou apanhados, serem antropófagos, levarem apitos e desatarem a correr atrás do IN disparando e apitando ao mesmo tempo, etc.. Mas estas estórias (verdadeiras ou não, tão condenáveis como os actos, porém, que ficaram na História!) apenas se contavam para ilustrar a destreza destes homens, alguns deles evidenciando bastante juventude ainda, durante as operações mais secretas e bicudas para onde eram mandados.
Ouviram-se rebentamentos breves vindos de leste, alvitram-se bombas lançadas pela aviação nos arredores de Fajonquito. Quanto a nós, a partir de hoje veremos que consequências teve a Operação levada a cabo pelos Comandos Africanos e a destruição da base de Koumbamory, fosse ela total ou parcial. Será que vão reduzir-se os ataques?
Antes da investida dos Comandos e do bombardeamento da Força Aérea, o PAIGC dispunha no local das seguintes unidades: Corpo de Exército 199/B/70, com quatro Bigrupos de Infantaria e uma Bateria de Artilharia; Corpo de Exército 199/C/70, com cinco Bigrupos de Infantaria e uma Bateria de Artilharia; Grupo de Foguetes da Frente Norte, com quatro rampas; três Bigrupos de Infantaria, um Grupo de Reconhecimento e uma Bateria de Artilharia do CE/A/70, deslocadas de Sare Lali (zona leste); e um Pelotão de Morteiros de 120 milímetros.
O pessoal do Batalhão de Comandos arranca em direcção ao sul. Desloca-se a pé (em bicha de pirilau e sem viaturas), não podendo assim transportar nem os dez mortos resultantes dos confrontos de Koumbamory nem os vinte e dois feridos graves resultantes da Operação Ametista Real. Há outros homens que, com mazelas e ferimentos mais ligeiros não estão em condições de aguentar a marcha, ou de a consumar com segurança e ficam também em Guidaje.
Os dez corpos, cuja identificação mencionarei mais adiante, virão mais tarde a ser aqui sepultados. Não há notícia dos três desaparecidos em combate, cujos corpos ficaram tombados em território senegalês. Em toda a acção, os Comandos Africanos dispararam 26.700 munições de G3 e 4.600 de Kalashnikov (todas de 7,62mm), 292 granadas de lança-granadas foguete (6 e 8,9 cm), 71 granadas de RPG-2 e RPG-7, 195 munições de morteiro e 268 granadas de mão (ofensivas e defensivas).
Num terreno descampado do lado de lá da fronteira, três crianças de varapaus controlam de longe a numerosa manada que levam a pastar, o que há muito tempo não é habitual ver-se por ali, até porque existem áreas com mais e melhor verdura para o efeito.
Alguém sugeriu mais tarde que o PAIGC desconfiara que o Exército Português havia minado aquele corredor fronteiriço, para vedar a passagem. Dificilmente as NT conseguiriam colocar minas nesse terreno sem despertar a atenção dos vigias, que controlariam permanentemente os nossos movimentos. Na impossibilidade de enviar picadores para se certificar (ficariam ao alcance das nossas armas ligeiras), as vacas a calcorrear o terreno seriam a forma de o testar. Porém, nenhum animal foi pelos ares…
Não consigo recordar-me de quantas vezes terei ido à messe sentar-me e comer uma refeição. Primeiro, porque as horas do tacho são trocadas constantemente e tenho pouca sorte na escolha dos momentos de investida; segundo, porque enquanto duram alguns restos de rações de combate que o pessoal “anfitrião” sacou do armazém, aproveito-me da sua generosidade; terceiro, porque já começo a enjoar-me das salsichas de lata, só o cheiro me dá náuseas. Neste dia começa a faltar o pão, parece que já estão a racionar a farinha, vem uma pequena fatia na borda do prato de cada um e é o que há! E uma bernarda certeira no cocuruto do depósito de géneros arrasou as já de si insignificantes esperanças de um dia nos brindarem com rancho melhorado…
Bem, mas de sentir fome lembro-me perfeitamente (ou talvez não seja fome e apenas pensar que devo mastigar alguma coisa), e dirijo-me à messe, que desta vez está a servir refeições e cheia que nem um ovo. Olho para o fundo e calculo que deve ser naquele balcão que nos devemos servir, tipo self-service, do tal esparguete salsicheiro, prato do dia, não ao almoço e ao jantar, mas à hora de abertura que parece tirada às sortes.
É sabido que os graduados não usam divisas nem galões nos ombros quando partem em Operação, em virtude da ideia de que o inimigo pretende sempre aniquilar quem comanda, em primeiro lugar. Portanto, todos nós, quando saímos do COMBIS de manhãzinha deixámos nos cacifos essas identificações hierárquicas. Entro na messe e oiço um berro estridente, vindo de uma das mesas. Pelos cabelos brancos só pode ser de pessoal do quadro. Deduzo tratar-se do Comandante, e é de facto o Tenente-Coronel Correia de Campos que vejo apontar na minha direcção, de indicador em riste:
– “Adonde” é que você pensa que vai? Ponha-se lá fora imediatamente! Apresente-se primeiro e peça autorização para entrar!
Por decoro, não vou agora descrever o que balbuciei na altura, enquanto rangia os dentes, nem o que me apeteceu e estive mesmo para fazer… Recuei até à entrada da messe, ou refeitório, ou espelunca o lá o que era aquilo. Como não trazia quico não podia fazer continência, pus-me em sentido:
– Apresenta-se o furriel miliciano n.º 19711671, Daniel Rosa de Matos. V. Exa, meu Comandante, dá-me licença que entre?
– Entre! – respondeu sem me olhar, a boca cheia a mastigar o esparguete.
De pronto, virei as costas e saí. Confesso que o que queria mesmo era arremessar-lhe qualquer coisa às ventas, não sei bem o quê, o que apanhasse à mão de semear para lhe dar o troco do enxovalho. Só não o fiz porque alguém me puxou pelo braço e me disse “tem juízo pá, caga mas é no gajo, que é um xico de merda, e vem comer” e acabei por atacar mas foi a dose reduzida de salsicha, apesar do fastio. Sentei-me numa mesa corrida, – não muito distante da do Tenente-Coronel, – onde já estavam de prato vazio milicianos de outras unidades. O que me sussurrou os insultos ao Comandante e me arrastou para ir buscar o prato ao balcão, contou então certas histórias de atitudes que o homem teria tomado em Pirada, – e que não têm cabimento aqui, – e garantiu-me que se não havia whisky na messe era porque ele tinha açambarcado para o seu quarto as cerca de quarenta garrafas que há poucos dias constavam no inventário do depósito de géneros. É claro, os outros camaradas que estavam à mesa confirmaram tudo, puseram até os adjectivos no superlativo, mas nunca me convenci que não fosse mais um daqueles boatos que circulam sem se saber como nasceram. Nunca estivera cara a cara com Correia de Campos, aliás, ficara com boa impressão do homem desde que vi, ao longe, no meio da parada e durante uma flagelação, indiferente às granadas que caiam por perto, de pingalim (à Spínola) numa mão e de AVP-1 na outra, a dar ordens à Artilharia e às Armas Pesadas de como responder ao fogo. Agora, a atitude mentecapta que teve para comigo obrigou-me a mudar de opinião. Num quartel que, sob o seu comando, mais parecia já uma “Casa de Orates”, era assim que queria impor “respeito”? “Autoridade”? “Disciplina”? O que pode levar um indivíduo corajoso a revelar atitudes como estas, a coberto dos galões – de que outra coisa poderia ser?
No 25 de Abril de 1974, imagino que devido ao relacionamento que mantinha com Spínola, o Tenente-Coronel apareceu em Lisboa, à porta do Quartel do Carmo. Adelino Gomes (jornalista que estava a fazer a reportagem dos acontecimentos que viria a ser gravada em vinil e em cd), pergunta-lhe como estão as coisas e Correia de Campos retorquiu-lhe mais ou menos isto: se uma mulher grávida estiver a parir você pergunta-lhe se está com dores? A delicadeza da resposta caracteriza a sua personalidade. Passados estes anos, o episódio da messe pouco (me) importa, todos temos momentos de menor inspiração. Sem lhe querer mal algum, relatar agora o que se passou é já uma vingançazinha, como que a reivindicar para mim igual costela cabotina…
21 de Maio
Parece haver um abrandamento no ritmo dos ataques de artilharia de que somos alvos. Será provavelmente a primeira consequência da operação dos Comandos em Koumbamory, base que ainda há poucos meses recebeu seis dezenas de combatentes recém-formados na Argélia e em Cuba e é (era?) o principal ponto de abastecimento aonde os guerrilheiros se vão municiar. Mas já se fala em reposição de stocks! Diz-se que têm chegado ali camiões carregados com material vindo de Zinguinchor.
Num passado mais longínquo, Zinguinchor foi também relacionada com os colonos portugueses pelas piores razões, ao ser palco de tráfico de escravos com a cumplicidade “tuga”. Em 1836, o decreto de 10 de Dezembro aboliu as exportações de escravos em todos os territórios portugueses, mas isso não afectou os dois maiores traficantes dessa época: o antigo governador da Guiné e Coronel de Milícias, Joaquim António de Matos, e o Governador de Bissau, Caetano José Nozolini, comerciante mestiço, cabo-verdiano, marido e sócio de Nhara Aurélia Correia. Segundo a escritora Joana Ruas, que foi cooperante na Guiné-Bissau depois da independência e jornalista cultural do jornal Nô Pintcha (Avante, em português), creio que ao mesmo tempo que o jornalista português Daniel Reis (de A Bola) que também esteve no jornal, “Ziguinchor estava povoada por mestiços luso-africanos, grumetes e escravos, o chefe da feitoria vem de uma família mestiça, os Carvalho Alvarenga, ramo donde virá Honório Pereira Barreto, filho de um cabo-verdiano e de Rosa de Carvalho Alvarenga, a poderosa Rosa de Cacheu. Honório Pereira Barreto, sendo Governador da Guiné de 1835 a 1839, o número de escravos libertados nos 55 navios provenientes dali e apresados pelos cruzadores, fixou-se em cerca de 3.929”. Pois Honório Pereira Barreto (nascido no Cacheu a 24/4/1813, morre em Bissau a 26/4/1859), é o único negro (falso negro, por sinal) a figurar nas parangonas do sistema colonial: a sua pretensa fotografia aparece nas notas antigas do escudo guineense, nos selos emitidos pelos CTT, e tem inclusive um monumento majestoso, construído em sua memória. O regime aponta-o como o supremo exemplo do “portuguesismo” que pode haver num assimilado. Acontece é que o seu lado verdadeiramente negro, – digamos que, obscuro, – é o de, numa época em que o comércio de escravos está em extinção, consolidar no Cacheu um lucrativo comércio esclavagista! Que credibilidade pode ter entre os guineenses o poder exercido em Bissau ao longo do século e nos dias da guerra, cujo único monumento a um negro é erigido em memória do tal Honório?
Outra vez do lado senegalense da fronteira, um pouco mais distante do enfiamento do abrigo do Obus, nota-se uma invulgar movimentação de viaturas amareladas, bem ao alcance dos nossos olhos. Sabíamos da sua circulação, protegidas por blindados, numa estrada paralela à fronteira mas a cerca de dois quilómetros de distância. Mas assim tão perto… Pertenceriam às tropas do país vizinho ou à guerrilha? Tamanha concentração fez crescer o nervoso miudinho e, com maior ou menor fundamento, o receio de vir a concretizar-se o temido ataque ao arame. O nosso Cabo artilheiro, pelo sim, pelo não, apontou o Obus o mais paralelamente ao solo possível, a ponta do cano quase apoiada sobre a circunferência de bidões, “just in case”, gastaria o resto das munições fazendo tiro directo!
Corre o informe de que no enfiamento do quartel de Nema (Farim), estaria instalada uma porção descomunal de “turras”, provavelmente para reforçar a instalação de minas no itinerário para Guidaje. Mais lenha para queimar a nossa débil moral…
(Continua)
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Nota de CV:
Vd. Os cinco primeiros postes da série de:
16 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6000: Os Maradados de Gadamael (Daniel Matos) (1): Por onde andaram e com quem estiveram?
18 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6014: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (2): Levar a lenha e sair queimado
20 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6027: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (3): Os dias da batalha de Guidaje - Antecedentes à nossa chegada
24 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6041: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (4): Os dias da batalha de Guidaje, 15 a 18 de Maio de 1973
30 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6069: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (5): Os dias da batalha de Guidaje, 19 de Maio de 1973
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