segunda-feira, 4 de julho de 2011

Guiné 63/74 - P8503: Os nossos regressos (25): Tempo de partida, há tanto tempo... tanto (Torcato Mendonça)

1. Mensagem de Torcato Mendonça* (ex-Alf Mil da CART 2339 (Mansambo, 1968/69), com data de 1 de Julho de 2011:

Caro Carlos
Há tanto tempo, tanto, que nada escrevo. Não sente o blogue nem os camaradas. O tempo corre veloz. Depois as "fugas" não para o Egipto mas para outras bandas, a idade a dizer - presente - e eu a desleixar. Está aí, no papel ou já teclado, um ou outro escrito. Ainda juntei os dispersos da célebre "Lança Afiada".

Hoje vi este escrito, levou cortes e pensei: Se o Carlos tiver pouco material entre mãos e considerar que pode ser escrito de fim-de-semana mando.
Vai então. Leve, ligeiro, sem aborrecer ou agitar. O calor não aguentaria coisa pesada como um ou dois que vegetam por aqui.

Abraços a todos e um especial para ti.
Torcato Mendonça


OS NOSSOS REGRESSOS (25)

TEMPO DE PARTIDA

Há muito tempo atrás, uma sugestão do José Belo e um comentário do Manuel Joaquim, fizeram o vento abanar ou soprar algumas folhas de minha memória.
Uma longínqua recordação apareceu, meio enrolada, meio esbatida.
Eu vos conto então.

Seria meio-dia. Pouco interessa a hora ou ser a um quatro de Dezembro de sessenta e nove.
Importa, isso sim, ser dia de partida. Dia de partida ainda incerta para mim. Dia especial, o mais, há tanto tempo ou desde sempre, desde o dia de chegada, a ser o dia mais desejado. Parecia ter sido há tanto tempo a chegada.
Tanto suor depois, tanto correr e como estavam tão diferentes, hoje, aquelas gentes, em tempo de partida, dos que outrora estiveram em tempo de chegada. Eram os mesmos. Faltavam alguns, demasiados, que mais cedo se foram da nossa companhia apartando. Ficou a recordação, a triste recordação.

Agora mantinha-me sentado numa viatura GMC ou parecida, mais velha, gasta e farta do que eu. Procurava, ali sentado, a sombra tentando fugir ao calor abrasador, pegajoso, calor já de hábito de assim por ali viver.
O cais logo ao lado, o Geba a correr para se deixar abraçar pelo mar, o Uíge parado esperando gentes, gentes em tempo de partida.

Mantinha-me quieto, atento a tudo, olhar vazio, olhar sem vida, olhar há muito roubado por aquela terra, talvez melhor, pelo que nela vira ou que nela vivera. Dois anos, cerca de dois anos de comissão e agora ali parado. O barco enorme no meio do estuário, a incerteza entre a partida ou de ficar na Comissão Liquidatária. Assinaram a partida e certamente não voltariam atrás. Confiar em tipos daqueles? Vamos esperar.

Será que um dia voltaria? Prometera voltar. Que sabia eu fazer depois daqueles anos todos? A licenciatura fora em Arte de Guerra. Nem para bacharelato dera em tão fraco soldado.

Manhã cedo, mais cedo do que o habitual, ainda assinei papéis e só depois me juntei à Companhia.

Marchamos em desfile dispensável, com passos há muito esquecidos. Desengonçados e irritados lá fomos, num esquerda direita, olha ao lado ou olha à frente, num marchar meio estúpido e desnecessário.

À frente de nós, garbosa, em meneios de braços e ancas, arreios, botas e instrumentos reluzentes, ia a fanfarra. Batiam forte no asfalto escaldante, faziam, para alegria deles, ouvir tambores e instrumentos de sopro numa lenga lenga de marcha militar.

Agora, ali estávamos nós esperando a ordem de embarque. Sempre a ordem. Certo é que as ordens vinham e, aquela máquina oleada, funcionava bem.
Parados, o Uíge logo ali, quase a puder ser tocado e a ordem nada.

- Meu Alferes o almoço e o jantar. Ração para o dia.

Estenderam-me a caixa e recusei.

- Esta é boa. Agora é que aparecem destas.

Aceitei e verifiquei ser melhor. Preferi mais o cigarro.

Finalmente a ordem de embarque. O Uíge a todos, sôfrega e ordenadamente engoliu.
Tudo organizado e as diferenças a notarem-se. Soldados para o enorme porão, mais acima os Sargentos e depois os Oficiais. O normal.

Apresentei-me ao Comandante das Tropas Embarcadas. Veio mais cedo para Portugal o antigo Comandante do BCAÇ 2852, ao qual eu estivera dependente como Companhia Independente. Era o Tenente-coronel Pimentel Bastos.

Agora a nada pertencíamos. Éramos tropa em dia de partida, gente a poucos dias de ser descartável.
Sentia o Uíge deslizando de encontro ao Oceano, a imitar o regresso das caravelas, Bissau cada vez mais longe e eu a acreditar que partia mesmo.

Passaram os dias. O Oceano a ficar, em cada dia que passava, mais revolto, escuro e frio. Aproximava-me rapidamente do “meu desejo do meu objectivo”.

Sempre, tivera, ao longo da comissão “desejos e objectivos” próprios, alguns a parecerem ridículos, como o de comer uma sandes de fiambre com manteiga e beber uma Cola fresca. Questão de sobrevivência ou de fuga à loucura. Talvez alguém entenda. Outros, felizmente para eles, não.
Este ultimo era passar sob a Ponte em Lisboa. Durava há meses este desejo.

Numa manhã gelada, com a luz ainda a querer furar o céu cor de chumbo, finalmente o grito a ser mil vezes repetido:

- Lisboa… Lisboa…

Aí estava a Ponte, a Ponte do ditador e eu a sorrir, a deitar baforadas com vapores de álcool da noite anterior e a olhar para o alto.
Vigas, pilares, tabuleiro com carros a circularem. A Ponte, a Ponte…

O cais a ficar mais perto, a cidade das sete colinas a vir ao nosso encontro, a outra banda à direita. Adeus desejo vai devagarinho e outro virá.

No ar sentia-se a inquietação daqueles quase ex-militares, sentia-se o nervoso. Mais audíveis os sons de quem em terra os esperava. O barco a acostar devagar, tão devagar e os militares a desesperarem.

Finalmente aquietou-se e desinquietaram-se as gentes. Apesar disso o desembarque foi ordeiro, saída de gente habituada a ter calma e estar na ordem, a saber o que fazer e ali quase a desesperar.

Pouco me lembro do desembarque.

Talvez a emoção, muito menor do que a da partida onde ninguém de mim se despedia, talvez, mesmo assim, a emoção tenha apagado esse momento. Talvez mesmo, tantos anos depois, não o queiramos a ser presente.

Cumprimentei a família, voltamos a marchar, embarcamos em autocarros e, horas depois estávamos no Quartel.

A papelada, as contas, a entrega de fardas e a troca por roupa civil. A noite gelada a vir e aquela barafunda a manter-se, os papéis a serem rapidamente a serem assinados. Tudo à pressa, tudo em fúria para sair. Até as despedidas quase a não serem. Adeuses apressados, despedida rápida.

Finalmente, noite já muito entrada, tudo parou.

- Estão aí os papéis para serem assinados nas repartições. Tudo certo.

A manhã a ser curta, o almoço no Fialho, a vinda para ultimar um ou outro pormenor final e a despedida do Coronel Branco, meu ex-Comandante em Bambadinca no BART 1904.
Despedi-me do Furriel Rei, o ultimo a sair e fui desfardar-me.

Chamaram-me um Táxi para “corrida” de cerca de quinhentos quilómetros e saí civil. Foram vários anos, vários anos a ficarem para trás. Tanto tempo perdido, interrompido ou o quê? Não recordo. Hoje sinto saudades da Guiné, daquela vida, da juventude perdida, como alguém disse ou da idade de então?

Que interessa isso agora. Reflexão breve? Pensemos nisso.

Vieram tempos em fúria de viver, em excessos com medo do tempo se esgotar. Um dia parei.
Interroguei-me. E agora T. ? E agora?

Há tanto tempo… tanto!

Fnd AB/11

Torcato Mendonça (terceiro a partir da direita) aquando da viagem com destino à Guiné em 1968

Torcato Mendonça na actualidade
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 28 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8178: Controvérsias (120): Spínola, Amílcar Cabral, o Tarrafal, o golpe de Estado de 14 de Novembro de 1980, os guineenses e os caboverdianos, nós e o blogue (Torcato Mendonça / Pepito)

Vd. último poste da série de 2 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8033: Os nossos regressos (24): A nostalgia dos tempos em que a amizade, a coragem, a dor, o sofrimento em "fogo lento", o sacrifício, a morte, a solidariedade, a alegria de viver, a camaradagem e tantos outros sentimentos nos tinham unido fortemente e, mesmo, para sempre (Manuel Joaquim)

Guiné 63/74 - P8502: Agenda Cultural (141): Inauguração da Exposição de Fotografia Flores Que Não Existem e lançamento do livro Na Kontra Ka Kontra, dia 7 de Julho pelas 17 horas no Vivacidade - Espaço Criativo - Porto (Fernando Gouveia)

1. Mensagem de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), com data de 3 de Julho de 2011:

Na sequência da divulgação no blogue, pelo Luís Graça, do livro NA KONTRA KA KONTRA, tive a oportunidade de o apresentar no almoço em Monte Real* e também em Lisboa, no almoço da minha Unidade, o Comando de Agrupamento de Bafata. Foram vendidos bastantes exemplares mas torna-se necessário obter mais fundos com vista à sua doação, na totalidade, às crianças da Guiné-Bissau.

Estarei com os livros na próxima quarta-feira (06/Jul) no “Milho Rei” em Matosinhos e no dia a seguir, quinta-feira (07/Jul), pelas 17 horas no “Espaço Vivacidade” na Rua Alves Redol, 364 – B Porto (traseiras do edifício com o nº 376/372) onde ocorrerá uma apresentação.

Chegou a estar prevista a presença de um guineense a tocar korá, mas dado ele andar em digressão pelo Algarve talvez isso não se concretize.

Nesta data será também inaugurada uma exposição de fotografias da minha autoria.

Como não há duas sem três, estarei também no dia 09/Jul no almoço da “Tabanca dos Melros” em Gondomar, com a mesma finalidade.

Mais informo que posso enviar o livro pelo correio com um acréscimo de apenas 60 cêntimos sobre o preço de capa (10 euros).

Com um abraço.
Fernando Gouveia
fg4250@gmail.com


CONVITE



Monte Real, Palace Hotel,  4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca  Grande > Fernando Gouveia autografando o seu livro Na Kontra Ka Kontra (Encontros, desencontros)
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 21 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8307: Agenda Cultural (124): Na Kontra Ka Kontra, a blogonovela de 49 episódios, passada na Guiné, em Portugal, no Brasil, entre 1969 e 2010, agora publicada em livro, a apresentar em Monte Real (4 de Junho) e no Porto, Espaço Vivacidade (7 de Julho) (Fernando Gouveia / Luís Graça)

Vd. último poste da série de 30 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8490: Agenda Cultural (140): Inauguração da exposição: Cartas de Amor e Saudade, de Manuel Botelho, no Centro Cultural de Cascais, dia 1 de Julho de 2011, às 21,30h (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P8501: Os nossos médicos (33): O meu grupo de combate: um forcado, um fanateca... (J. Pardete Ferreira)

1. Mensagem de J. Pardete Ferreira:
Data: 1 de Julho de 2011 16:37
Assunto: Forcado! Circuncisão! Jeep GT





Desculpa-me,  caro camarigo, mas com o entusiasmo já não encontro o texto, que suponho ser do António Paiva.

Com efeito, no que eu chamava o meu Grupo de Combate, composto por três soldados/cabos europeus e dois africanos, eu tinha um que tinha sido forcado e foi talvez, quem lhe enfiou o tal supositório até ao pescoço. Tinha força que nem uma besta, cento e tal quilos de peso e os touros já lhe tinham fracturado nove costelas.

Uma noite, oiço um cagarim infernal... era sua excelência que estava a partir os vidros dos armários que estavam nas escadas e que continham o material para a sala de Pequena Cirurgia:
- Ah! Chefe!!! - Era a maneira como ele me chamava...Bêbado que nem um odre, mas com um sorriso de puto que fez uma burrice.

Bem, arranjamos as coisas como podemos e, em conjunto com o Sargento de Dia e mediante o pagamento dos vidros e a limpeza e arrumação daquela montureira, deixámos a coisa por ali. No Hospital, se tivesse havido participação, pelo menos uma ida para o Mato estava assegurada e para um local de "férias" asseguradas (porrada todos os dias!).

Já que falei em grupo de combate e em soldados africanos, disseram-me que um dos meus meninos era o "fanador" [, fanateca, em crioulo, ] lá do sítio.

Com a minha maluqueira, um dia, indo fazer uma circuncisão, intervenção que era feita, usualmente, na sala de pequena cirurgia, indiquei-o para me ajudar: ensinei-o a desinfectar-se, a pegar nos instrumentos, transmiti-lhe a proibição de fazer qualquer gesto antes de eu mandar e lá fomos.

A intervenção foi feita sem qualquer incidente e, no final, pedi-lhe um comentário:
- Assim dá muito trabalho, como eu faço é mais rápido!

 Ora toma!!! E a malta cá fora, ria a bom rir.

Camarigo António Paiva, o teu substituto era doido por mecânica. O teu jipe passou a GT, com um cantar conhecido e que, com o pára-brisas sobre o capô, tinha o melhor ar condicionado do mundo. Podes estar tranquilo: o teu jipe ficou em boas mãos.

Alfa Bravo para o interessado.

José Pardete Ferreira

PS - Antes de acabar: o Helder Sousa é de Setúbal e ainda não dei por ele. Seria giro encontrarmo-nos e irmos cravar um copo ao Benjamin [Durães]. Valeu?

___________

Nota do editor:

domingo, 3 de julho de 2011

Guiné 63/74 - P8500: Bibliografia (37): Fotos do lançamento do último livro do nosso camarada e amigo António Estácio, Nha Bijagó: Respeitada personalidade da Sociedade Guineense (1871-1959) , Lisboa, 20 de Junho de 2011






 
Lisboa > Palácio da Independência > 20 de Junho de 2011 > Lançamento do livro Nha Bijagó (*), do nosso camarada e amigo António Estácio... Como se pode ver pelas fotos, a cerimónia contou com a presença de numerosos amigos e admiradores do autor que ele foi fazendo ao longo de uma vida com muitos lugares de passagem (Guiné, Coimbra, Angola, Macau...). Infelizmente, por razões profissionais,  eu não pude estar presente como tencionava, pelo que pedi ao Estácio que me mandasse algumas fotos e um pequeno apontamento sobre a sessão. Uma selecção das fotos (da autoria de João Firmino) aqui ficam, mas sem as legendas (que não vieram a acompanhá-las)... As fotos de Daniel Levy não as aproveitei, devido ao seu formato e baixa resolução.


Parabéns ao Estácio por mais este livro que revela o grande amor que ele tem e mantém pela sua terra, ao evocar a figura de Leopoldina Ferreira Pontes,  justamente conhecida por Nha Bijagó, que foi uma figura de referência da sociedade guineense da primeira metade do séc. XX... Teremos oportunidade de publicar em breve algumas notas de leitura deste novo livro do Estácio...(LG).

Fotos: © João Ramiro Firmino (2011). Todos os direitos reservados.


1.  Mensagem do António Estácio, com data de 28 de Junho último:
(i) Caro Luís Graça: Como prometi aí vão algumas fotos referentes à cerimónia de lançamento do meu último livro (*) [, Lisboa, Palácio da Independência, 20 de Junho p.p.]

Podes usá-las, sendo de autoria de João Ramiro Firmino, um ex-colega meu no Liceu de Bissau,  e que, por sinal, como Furriel cumpriu serviço militar na Guiné.

Com um abraço

António J. Estácio




Capa do livro, edição de autor... Foto de Daniel Levy

(ii) Caro Luís Graçacitassi@yahoo.com.br ]


Sem querer abusar, junto mais fotos [... 137, ]do lançamento do livro sobre a Nha Bijagó, de autoria de Daniel Levy, podes usá-las como melhor entenderes.

Grato pela atenção dispensada, se for necessário algo mais é favor dizer.

Obrigado.

António J. Estácio

P. S. - Esqueci-me de dizer que os livros são comercializados a 10,00 €, sem incluiro registo e os portes de Correios. [Contactar o autor através do seu email:
______________

Nota do editor

(*) Vd. poste de 15 de Junho de 2011 >
Guiné 63/74 - P8420: Agenda Cultural (134): Lançamento do livro Nha Bijagó, de António Júlio Estácio, dia 20 de Junho de 2011, pelas 18 horas no Palácio da Independência (António Estácio)

Guiné 63/74 - P8499: Tabanca Grande (293): Manuel Freitas, ex-1º Cabo Escriturário, HM241, Bissau (1968/70)




Guiné > Bissau > HM241 (1968/70) >




Guiné > Bissau > HM241 (1968/70) > O 1º cabo escriturário Manuel Freitas  (em 1971)


Manuel Freitas, em 2010

Fotos: © Manuel Freitas (2011). Todos os direitos reservados

 1. Mensagem do Manuel Freitas (*): 

 Data: 1 de Julho de 2011 18:21

Assunto - Histórias para publicação no Blogue
Caro colega Luís Graça,


Há muito que tenho apreciado o teu/nosso blogue e, a propósito das intervenções do António Paiva, do meu tempo na Guiné, 1968/1970, decidi participar para figurar neste universo de ex-combatentes.

Fui despachado no Niassa no dia 1 de Maio de 1968 para a Guiné, tinha sido incorporado em 10 de Janeiro de 1967, no GACA 3, em Espinho. Como já tinha o meu irmão em Moçambique, tentei safar-me de ser mobilizado sujeitando-me, durante três meses, a estar internado no Hospital Militar do Porto e esperar que as cunhas funcionassem, só que, embora o meu pai fosse marceneiro, não funcionaram e lá tive que ir bater com o costado no Ultramar de então.

A comissão até nem correu mal, fui colocado no HM 241 e, como era [1º cabo] escriturário, fiquei no Conselho Administrativo mas aquele que até lá desmaiava só por tomar uma injecção, imaginem, como foi, ter de ver colegas todos despedaçados porque passavam por nós todas as baixas que ocorriam no HM 241.

Duas situações me marcaram, para além de outras que futuramente enunciarei:

1ª - Num sábado, estando a almoçar, chamaram-me para ir ver um conterrâneo que estava a chegar de heli e quando lá cheguei deparei com o meu grande amigo Carlos Loureiro sem as duas pernas; estarreci e agarrei-me a ele e nunca mais o deixei até ser evacuado e antes dar a notícia à esposa.

2ª- Aconteceu no dia 10.06.1969 diz assim o meu diário:  «Hoje entrou cá no hospital uma africana de nome Feliza Sana, com uma granada de morteiro 62 alojada na anca esquerda; o médico que comandou, com a ajuda dos homens das minas e armadilhas, toda a operação foi o Dr. Diaz, médico muito experimentado que tinha estagiado nos Estados Unidos da América. Foi necessário transportar para a sala de operações sacos de areia e a operação foi um êxito pois a granada foi retirada sem rebentar. Aconteceu um caso idêntico mas foi no Vietname».
Brevemente virei ao blogue trazer mais noticias.

Ah ! quero lembrar o almoço/convívio [do pessoal do HM241, 1967/71,] que vimos realizando, a 5 de Outubro, há nove anos.

Um abraço

Manuel Freitas

endereço: manuel.freitas@equicontas.com
tlm. 964498832

2. Comentário do editor:

Meu caro Manuel Freitas, como prometido, aqui está o teu mail de apresentação. Passas a ser membro da nossa Tabanca Grande, com o número de entrada 506. Já conheces as nossas regras de convívio (afixadas na coluna do lado esquerdo da página de rosto do blogue).  Acomoda-te, ajeita-te, e partilha connosco mais histórias do teu tempo de Guiné e do HM241. Traz mais malta dos serviços de saúde militar. Um Alfa Bravo. Luís Graça
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 3 de Julho de 2011 > Guiné 63/74 - P8498: O Mundo é Pequeno e o nosso Blogue...é Grande (43): Manuel Freitas, que organiza há 9 anos os encontros do pessoal do HM241 (1967/71), acaba de descobrir o nosso blogue, graças ao António Paiva

(**) Último poste da série > 27 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8474: Tabanca Grande (292): José Pardete Ferreira, ex-Alf Mil Médico (Teixeira Pinto e Bissau, 1969/71)
  A equipa de futebol do hospital, de que o Manuel Freitas era treinador, jogador, e capitão (é o terceiro, da segunda fila, de pé, a contar da direita para a esquerda; enverga a braçadeira de capitão).

Guiné 63/74 - P8498: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca...é Grande (43): Manuel Freitas, que organiza há 9 anos os encontros do pessoal do HM241 (1967/71), acaba de descobrir o nosso blogue, graças ao António Paiva

1. Comentário de Manuel Freitas ao poste P3817:


Data: 30 de Junho de 2011 12:06
Assunto:   Poste de 20 de Fevereiro de 2009 >  Guiné 63/74 - P3917: Histórias de um condutor do HM 241 (António Paiva) (4): Não cobiçar a mulher do próximo




Olá, Paiva,


Não compreendo porque andei tanto tempo sem consultar este blogue do Luis Graça. Lá estava desatualizado porque, organizando há já 9 anos convivios com os ex-militares do HM241, onde já estiveram, o Dr. Felino de Almeida (diretor do hospital do nosso tempo), o Dr. Diamantino, Dr.Rui Meireles, Dr. Ventura e outros,  não consegui trazer-te para este evento que por certo vais gostar pois junta a malta de 1967 a 1971.


Das hitórias que contas,  lembro-me do resultado desta cobiça.


Lembras-te daquela africana que veio evacuada, trazendo alojada numa anca uma granada, e foi um espetáculo a preparação no bloco para retirar sem rebentar ?


Vou inscrever-me no blogue e depois conto algumas histórias que tenho registadas no meu album.


Sou o Manuel Freitas e estive no HM 241, de 1968 a 1970,  era o treinador e jogador da nossa equipa de futebol.


um abraço


Manuel Freitas


2. Comentário de L.G.:


Meu caro Manuel Freitas: nunca é tarde para descobrir o nosso blogue... Como costumamos dizer, na brincadeira, o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Estamos na Net há 7 anos e tal... E tu já organizas encontros do pessoal do HM241 ainda há mais tempo: 9 anos, sem também a gente saber. 


É obra!... Tens direito a que a gente te bata a pala. Da nossa parte, também andamos, há anos, à procura dos nossos médicos, dos nossos enfermeiros, das nossas enfermeiras pára-quedistas, dos nossos condutores de ambulância, dos nossos camaradas do HM241, como tu... e por aí fora. Andamos à procura uns dos outros. De modo a podermos reconstituir o puzzle das nossas memórias fragmentadas. 


Não é tarefa acabada, nem muito menos é tarefa fácil. Os nossos camaradas, que estiveram connosco no TO da Guiné, de 1961 a 1974, andam por aí, espalhados pelo mundo, dos EUA à Austrália, de Portugal ao Brasil... Tu tens feito a tua parte, juntando a família do HM241... Anualmente. A gente também se encontra anualmente, agora em Monte Real... E todos os dias, à sombra do nosso poilão, gigantesco, centenário, mágico, fraterna, frondoso... O poilão da nossa Tabanca, virtual, que só existe na blogosfera... Mas à qual queremos que passes a pertencer, como de resto é teu desejo.


Já sabes as regras: só tens que pagar a "jóia de ingresso": 2 fotos + 1 história (leia-se: uma simples apresentação da tua pessoa, dizeres quem és, por onde andaste, o que fizeste e, facultativamente, o que fazes hoje, onde vives e por aí fora)... Conto contigo... na volta do  correio. Para te poder apresentar, com as devidas honras, ao meio milhar de camaradas e amigos da Guiné que estão registados na nossa Tabanca Grande.


Um Alfa Bravo. Luís Graça


PS - Manuel Freitas: Como estou fora de Lisboa, neste fim de semana, só agora vi o teu último mail, de 1 do corrente. Será oportunamente publicado, se possível ainda hoje, por mim ou pelo Carlos  Vinhal, conforme a nossa disponibilidade.  É, afinal, a tua esperada apresentação aos camaradas que nos honram, com a sua presença, nesta Tabanca Grande (ou tertúlia)... Para já, ficamos a saber que foste escriturário do Conselho Administrativo do HM241 e que és contemporâneo do António Paiva.  Serás, em princípio, o "tabanqueiro" nº 506...
___________________

Nota do editor:

Último poste desat série > 13 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8264: O Mundo é Pequeno e a Nossa Tabanca... é Grande (42): Foram localizados os dois jovens carregadores que aparecem na foto junto Cap Mil Vasco da Gama (Pepito / Vasco da Gama)

Guiné 63/74 - P8497: Parabéns a você (283): António Nobre, ex-Fur Mil da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861 (Tertúlia / Editores)

PARABÉNS A VOCÊ

DIA 03 DE JULHO DE 2011

ANTÓNIO NOBRE

NESTE DIA DE ANIVERSÁRIO DO NOSSO CAMARADA ANTÓNIO NOBRE, A TERTÚLIA E OS EDITORES VÊM POR ESTE MEIO DESEJAR-LHE AS MAIORES FELICIDADES E UMA LONGA VIDA COM SAÚDE, JUNTO DE SEUS FAMILIARES E AMIGOS.

António Nobre, em Binar, enquanto Fur Mil da CCAÇ 2464

António Nobre na actualidade
____________

Notas de CV:

António Nobre foi Fur Mil na CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, Buba, Nhala e Binar, nos anos de 1969 e 1970

Vd. último poste da série de 1 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8493: Parabéns a você (282): Silvério Ribeiro Lobo, Mec Auto da CCS/BCAÇ 3852 (Tertúlia / Editores)

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Guiné 63/74 - P8496: Notas de leitura (252): Picadas e Caminhos da Vida na Guiné, de Fernando de Sousa Henriques (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Junho de 2011:

Malta,
Quem quer voltar à Guiné, faça como este grupo a que se juntou o Fernando de Sousa Henriques. É assim que se produzem relatos singelos, com solidariedade, encontros imprevistos, se descobrem vestígios de quartéis entre picadas por onde se deambula com o coração pequenino, não de medo mas de emoção. Os caminhos da vida na Guiné estão à mercê de quem deles guarda saudade.
Um abraço do
Mário


Retorno à Guiné pelo chamamento da saudade,
percorrendo as picadas dos tempos sofridos


Beja Santos

“Picadas e caminhos da vida na Guiné” (por Fernando de Sousa Henriques, edição de autor, 2011), é um relato de uma viagem de um conjunto de ex-combatentes que, décadas depois se afoita a revisitar os locais onde cada um deles cumprira o seu dever. É um documento singelo na reconstituição das situações, desempoeirado até no recurso que faz, com sucesso, ao uso da linguagem de caserna, que a todos irmanava. Conheci as peripécias desta viagem através da visita que fiz ao Jaime Machado, na Senhora da Hora, em Matosinhos, vi os filmes e as fotos de muitos desses momentos tocantes, por isso não fui apanhado pelo factor surpresa das minúcias recolhidas pelo Fernando de Sousa Henriques que soube usar tão equilibradamente os apontamentos da viagem integrando-lhes as imagens apropriadas.

É um relato de emoções, todos eles irão ser confrontados com imprevistos, de Bissalanca a João Landim (local de pernoita), a viagem de reconhecimento a Bissau, o contraste da cidade, nos principais pontos de referência. Ninguém que ali tenha combatido pode esconder a amargura de ver uma cidade em ruinas ou em derrocada. Depois rumam para Bafatá, a decepção pelo estado da antiga segunda cidade da Guiné-Bissau não foi menor. O grupo vai largando lembranças. No hospital de Bafatá deixaram um aparelho para medir a tensão arterial, equipamento para o despiste da diabetes, medicamentos. Seguem para Bambadinca, um dos viajantes, médico, não sabe esconder a emoção no reencontro som a sua lavadeira, Cumba. Registam a destruição do porto de Bambadinca, há ali duas imagens que constam da operação Tangomau: o cabeço de amarração, único sinal da vida pujante que teve o cais de Bambadinca e as canoas junto ao rio, adormecidas sobre o tarrafe.

Segue-se a pernoita no Capé ao pé de Bafatá e parte-se para Cadique, com passagem por Guileje, foi um longo dia de emoções através do Saltinho, Quebo, Cadique, próximo do rio Cumbijã. O que resta de Cadique é fotografado enquanto quem ali combateu anda agitado e eufórico; segue-se a viagem ao Museu de Guileje. Como não há viagem sem desencontros, chegados a Jemberem, uma das viaturas virou à direita outra à esquerda, lá chegaram ao Capé, com o coração aos saltos, sem saber uns dos outros.

No dia seguinte partem à conquista de Piche, Buruntuma e Canquelifá, os viajantes captaram imagens eloquentes com uma placa a referir as distâncias para Bafatá, Piche, Cam-Quelefá, Buruntuma, Cabuca, Madina (Boé), Sonáco, Paunca, Bajocunda e Pirada. Que belas fotografias! Os memoriais existentes na ponte Caium, em Buruntuma, os edifícios de Canquelifá, as crianças a cantarem o hino nacional da Guiné-Bissau, os últimos vestígios da presença dos militares como os memoriais; depois Piche, com as ruinas da capela e a espantosa fotografia da antiga piscina agora circundada de campos lavrados. O imprevisto são também as gentes, aqueles que combateram e que exibem documentos, perguntam por nomes destes ou daqueles, pois são estimas que perduram. Dia muito quente, também para os corações.

Do Capé partiram depois para Bambadinca, Xitole, Quebo e Buba. Inevitavelmente, visitas a escolas e ao cemitério de Bambadinca, não lhes deixaram tirar fotografias no Xitole (o Tangomau teve sorte, andou por ali à solta com os seus antigos soldados, o blogue guarda imagens dos principais vestígios do quartel e de edifícios que assinalam uns tempos de prosperidade comedida quando no Xitole havia uma encruzilhada comercial). A comitiva passa junto à ponte Carmona, destruída durante a guerra. Visitaram o Quebo e prosseguiram em direcção a Buba. Graças a um jerricã, houve um encontro inesperado e a alegria de uma confraternização, toda a viagem vai conhecer estes tempos, viaturas empanadas, crianças ruidosas à procura de uma lembrança.

A viagem prossegue pelo Norte, agora vai-se para Nova Lamego ou Gabu, e depois Pirada. São captadas belas imagens de Pirada, apetece perguntar como guineenses e portugueses pretendem lidar com este património, é impossível responder com indiferença. Como é sabido, os guineenses tomaram a atitude resoluta de pôr Teixeira Pinto, Honório Pereira Barreto, Nuno Tristão e Diogo Gomes nas respectivas peanhas, a história não se apaga. Apetece dizer: estes quartéis também não.

Agora o grupo aproxima-se de Bissau, percorre Bula, Canchungo (Teixeira Pinto), Cacheu e S. Domingos. Encontros, entrega de livros, abraços de antigos combatentes. Regresso a Bissau, compra lembranças e o regresso. Cada um foi ao seu ermo, ali relembrou os tempos sofridos, levaram ajuda e também pediram ajuda para as suas memórias. Quem escreve este relato sente-se recompensado. No blogue, também nos devemos sentir recompensados por estas magníficas lembranças. Há muita gente que não quer dizer (ou infelizmente não tem meios) que com um empurrão também se aventuraria por estas picadas, dói que se farta ver tanta gente acolhedora magoada pela indiferença e pelas más governações, foram estas gentes que confiaram em nós, combatemos no meio deles, e por vezes só com eles. Todos estes relatos são o nosso dever de memória. Obrigado, Fernando de Sousa Henriques.
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 28 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8478: Notas de leitura (251): Mansas, Escravos, Grumetes e Gentio – Cacheu na encruzilhada de civilizações (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P8495: Os nossos médicos (32): Fotos do Serviço de Saúde do BCAÇ 2845 (Albino Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Albino Silva* (ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845, Teixeira Pinto, 1968/70), com data de 15 de Junho de 2011:

Camarigo Carlos Vinhal.
Como na semana se tem falado de médicos, daqueles nossos médicos da Guiné, manifesto aqui grande alegria por termos agora na nossa Tabanca o Dr. Pardete Ferreira, grande médico que conheci na Guiné, mais exatamente em Teixeira Pinto.

Através das mensagens dele aqui na Tabanca, fiquei igualmente satisfeito em falar no nome do Prof. Dr. Maymone Martins, pois era o meu Chefe na Enfermaria, e ao serviço do BCaç 2845.

Assim, e para que alguém possa recordar esse médico, envio estas fotos, pois são bem do nosso tempo.

Havia ainda o Dr. Máximino Vaz Cunha, actualmente a exercer funções no Hospital de Chaves.
Numa das fotos estão os dois médicos na Enfermaria em Teixeira Pinto, juntamente com o pessoal do S.S. e alguns civis, foto esta tirada no dia de apresentação e tomada de posse da Enfermaria.

Noutra foto está o Dr. Maymone Martins com o pessoal do S. Saúde que iria manter-se até final da comissão.
Outra foto onde está o Comandante na altura,Ten Cor Aristides Américo de Araújo Pinheiro, e claro, eu.
Por fim o Dr. Maymone Martins, que sempre que pode lá vem aos nossos Convívios da CCS.

Aproveito para desejar a todos os tertulianos, um excelente fim de semana inclusivamente para os Chefes de Tabanca e Régulos, e de forma particular a ti, que só te dou trabalho.

Albino Silva





____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 17 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8435: Convívios (347): Almoço/Convívio dos ex-combatentes de Fão, no dia 10 de Junho de 2011 (Albino Silva)

Vd. último poste da série de 30 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8491: Os nossos médicos (31): HM241: Pessoal médico do meu tempo por especialidades (J. Pardete Ferreira)

Guiné 63/74 - P8494: As mulheres que, afinal, foram à guerra (18): As madrinhas de guerra e a Cecília Supico Pinto, precursora do Facebook (António Matos)

1. Comentário do António Matos, ex-Alf Mil Minas e Armadilhas da CCAÇ 2790 (Bula, 1970/72), a um poste do meu blogue pessoal, Luís Graça > Blogpoesia (*):

[O António, ex-IMB, grande amante do karting, camarada que eu muito estimo,  é membro da nossa Tabanca Grande, e além disso amigo inscrito na nossa página no Facebook; o seu pai ainda foi meu colega de trabalho, na Direcção Geral dos Impostos; e ele, António Matos, tal como o meu velho, em Cabo Verde, 1941/43, também foi confidente e escriturário de camaradas analfabetos, neste  no TO da Guiné, 1970/72]:


Caramba, Luís, tocaste num ponto que me foi sempre enigmaticamente madastro,  sabendo-se da sua relação umbilical com o Movimento Nacional Feminino e que, numa linguagem moderna e com todos os perigos inerentes a tal extrapolação, me soava a acompanhantes (não necessariamente de luxo), ainda que desses relacionamentos tivessem surgido, inclusivamente, muitos, felizes e duradouros casamentos !


Acho que as ilusões que eram criadas na generalidade dos nossos soldados funcionavam muito mais como a namorada ausente que muitas vezes também,  elas próprias,  se envolviam num relacionamento nem sempre ingénuo.

Tal como muitos de nós, também eu acompanhei "aquele" soldado analfabeto que me elegeu como confidente das suas frustrações, dos seus anseios, das suas necessidades morais e fisiológicas,  lendo e escrevendo os seus desabafos para mães, pais, namoradas, madrinhas de guerra e sei lá para quem mais ....


Sei do que falo, portanto !

Aqui entra o elemento que consubstanciava estes diálogos com compasso de espera entre pergunta e resposta - o aerograma - que teve em Cecília Supico Pinto uma das precursoras do actual Facebook ...


As analogias funcionais serão imperceptíveis mas uma coisa era evidente:  a possibilidade de se dizer tudo aquilo que o pudor não permitia dizer cara-a-cara !!!

O tema que levantas é aliciante e concordo com quem diz que maravilhosa estória seria descoberta se se dessem a conhecer esses 300 milhões de aerogramas escritos naqueles anos ....

Obrigado,  Luís !


Beijos às madrinhas que ainda hoje existam !!

Abraços a todos e hoje em especial aos afilhados de guerra !!! (**)


António

30 Junho, 2011
___________________


Notas do editor:

(*) Setembro 10, 2008 > Blogantologia(s) II - (71): Hoje tenho pena de nunca ter escrito um aerograma a uma madrinha de guerra


Criada uma ligação ao mural da nossa página do Facebook, e que mereceu, além do comentário do António Matos,  mais dois (com data de ontem), quer em relação ao meu poema quer em relação ao meu próprio comentário: Ter-se-ão escrito mais de 300 milhões de aerogramas durante a guerra colonial...



João Pereira da Costa

Luis Graça,  é diabólico esse número. Que livro ou livros dariam as passagens dos seus conteúdos. Sei lá. Todos os tipos de sentimentos e segredos. Fiquemos por aqui.


Por casualidade entabulei amizade com um oficial do exército brasileiro q...ue dá aulas numa unidade, em que fez um trabalho (estudo) para saber as razões porque raparigas brasileiras se correspondiam como madrinhas de guerra com militares portugueses na guerra colonial.


Estou à espera que me envie um livro sobre a unidade, contudo não sei se falará sobre o assunto que coloquei.


Só de pensar o que acontecera a alguns deles quando recebidos atendendo ao seu conteúdo... Que temática maravilhosa. Seria um desafio. Haverá voluntários? (...)

José Manuel Corceiro > Parabéns e obrigado Luís Graça, pelo lindo poema que escreveste… É um hino de louvor e agradecimento às nossas queridas Mães, pelos dias de dor vividos sem dormir, em sofrimento angustiante, causado pela ansiedade e a incerteza que dominava impiedosamente o seu pensamento amargurado. Continuamente a mesma dúvida, se voltariam um dia a ter a oportunidade de ver e abraçar os seus meninos? (...)

 
(**) Último poste da série > 22 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8460: As mulheres que, afinal, foram à guerra (17): Público, Cinecartaz: Críticas dos leitores

Guiné 63/74 - P8493: Parabéns a você (282): Silvério Ribeiro Lobo, Mec Auto da CCS/BCAÇ 3852 (Tertúlia / Editores)

PARABÉNS A VOCÊ

DIA 01 DE JULHO DE 2011

SILVÉRIO LOBO

NESTE DIA DE ANIVERSÁRIO DO NOSSO CAMARADA SILVÉRIO LOBO, A TERTÚLIA E OS EDITORES VÊM POR ESTE MEIO DESEJAR-LHE AS MAIORES FELICIDADES E UMA LONGA VIDA COM SAÚDE, JUNTO DE SEUS FAMILIARES E AMIGOS.

A imagem de Nossa Senhora do Amparo, transportada com todo o carinho e devoção pelo Moita desde Felgar, encontrou um altar em Bula. Testemunharam o acto o Silvério Lobo, o Álvaro Basto e o Zé Teixeira.


Monte Real > Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca Grande > Da esquerda para a direita, o Eduardo Campos (Maia),o Hélder Sousa (Setúbal) e o Silvério Lobo de Matosinhos

____________

Notas de CV:

Silvério Lobo foi Mec Auto na CCS/BCAÇ 3852, Aldeia Formosa e Buba, 1971/73

Vd. último poste da série de 30 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8489: Parabéns a você (281): Agradecimento/reflexão de Santos Oliveira (2.º Sarg Mil Armas Pesadas Inf, Pel Mort 912, Como, Cufar e Tite, 1964/66)

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Guiné 63/74 - P8492: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (6): A Doença do Sono (Rui Silva)

1. Mensagem de Rui Silva (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 16 de Abril de 2011:

Caros Luís e Vinhal
Envio em anexo o meu último capítulo da série “Doenças e outros problemas de saúde…”, desta feita tratando-se da Doença do sono.


Recebam um grande abraço extensivo ao nosso querido amigo Magalhães Ribeiro e a outros co-editores e colaboradores do Blogue.

Para toda a Tertúlia também.
Rui Silva

2. Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

DOENÇAS E OUTROS PROBLEMAS DE SAÚDE (ou de integridade física) QUE A CCAÇ 816 TEVE DE ENFRENTAR DURANTE A SUA CAMPANHA NA GUINÉ PORTUGUESA (Bissorã – Olossato – Mansoa 1965/67)

(I) Paludismo (P7012)
(II) Matacanha (P7138)
(III) Formiga “baga-baga” (P7342)
(IV) Abelhas (P7674)
(V) Lepra (P8133)
(VI) Doença do sono

Não é minha intenção ao “falar” aqui de doenças e outros problemas de saúde que afligiam os militares da 816 na ex-Guiné Portuguesa imiscuir-me em áreas para as quais não estou habilitado (áreas de Medicina Geral, Medicina Tropical, Biologia, etc.) mas, tão só, contar aquilo, como eu, e enquanto leigo em tais matérias, vi, ajuizei e senti.

Assim:

As 4 primeiras, a Companhia sentiu-as bem na pele (ou no corpo). As 2 últimas (Lepra e Doença do sono), embora as constatássemos - houve mesmo contactos directos de elementos da Companhia com leprosos (foram leprosos transportados às costas, do mato para Olossato nas tais operações de recolha de população acoitada no mato para as povoações com protecção de tropa) –, não houve qualquer caso com o pessoal da Companhia, ou porque estas doenças estavam em fase de erradicação (?), ou porque a higiene e a profilaxia praticadas pela Companhia eram o suficiente para as obstar.


DOENÇA DO SONO - VI

Era uma das doenças mais faladas, sempre que vinham à conversa as doenças na Guiné, quer ainda em Santa Margarida aonde estivemos algumas semanas antes de embarcar, quer durante a viagem no Niassa. Sabíamos também que era a mosca Tsé-Tsé (mosca já ouvida e falada nos bancos da escola) o portador do parasita que provocava a doença.

Pessoalmente não conheci caso algum na Companhia, mas, já na população indígena deparávamo-nos com situações que nos diziam serem portadores daquela doença. Em Olossato apercebemo-nos de um ou outro caso de nativos, alguns já com alguma idade, sentados às portas das suas moranças, muito magros e de cor amarelecenta e quais múmias, e que, pelo menos, e por si só, indiciavam logo doença grave. Dizia-se então por ali que tinham a Doença do Sono. O aspecto…

Sabíamos também que era a mosca Tsé-Tsé que a provocava e, ao princípio, quando víamos uma mosca poisada na nossa pele, principalmente uma que fosse diferente das conhecidas, ficávamos a temer por tal. A fase de “Periquitos” era de receio em tudo quanto mexesse…

Com o tempo só um crocodilo, e tinha que ser grande, é que nos assustava.

Lembro-me em Bissorã e estávamos ali à meia dúzia de dias (JUN65), uma vez sentir uma picada forte no braço e ao olhar ver uma mosca estranha, comprida, a picar-me. Como era uma mosca de fisionomia diferente das comuns fiquei apreensivo (pensei logo ser a Tsé-Tsé), mas ao ver a malta passar com a bola esqueci logo. Que a mosca deixou uma boa marca lembro-me bem!

A Mosca Tsé-Tsé (Glossina palpalis) causadora da Doença do sono

Mas depressa habituaríamo-nos a ver moscas e outros insectos voadores das mais variadas espécies.

Insectos voadores, terrestres, rastejantes, anfíbeos, passando por aquela formiga grande e avermelhada que numa fase da sua metamorfose ganhava e perdia as asas (eram às milhares à volta de tudo que fizesse luz na escuridão da noite e quando ainda tinham asas), cobras e lagartos e passarada, Santo Deus havia ali de tudo e parecia que tudo estava ali na Guiné.

Quando nos deitávamos no mato e em qualquer sítio e na mais completa escuridão a fazer tempo para o assalto a uma casa-de-mato, que era ao alvorecer, nem nos lembrávamos do que poderia estar por baixo.

A cada passo surgia um novo e estranho ser vivo, para curiosidade da malta, que se juntava logo ao alerta deste ou daquele. Consoante o porte e as características do animal aproximávamo-nos mais ou menos para ver aquele pequeno monstro. Mexia-se virava-se e… logo também aparecia alguém de máquina fotográfica na mão.

Os nativos sabiam como ninguém se o bicho era de brincar ou se era de pormo-nos à “distância regulamentar de nove metros e quinze, como dizia muitas vezes o Sargento Correia, camarada da 816, o do “Mar Eterno” (passava o tempo a cantar isto), já falecido. Paz à sua alma!

Mas o que mais nos atacava, e logo cedo, eram as alergias, bem denunciadas na pele.

Alergias também para todos os gostos: borbulhas, manchas, rosetas maiores ou menores, com ou sem cor e outras erupções cutâneas; era no peito, nos braços, na cara, ou em todo o corpo.

Lá funcionava a maior parte das vezes o Cálcio-Luvistina em forma de pomada e, julgo, para actuação mais rápida, em injectável também, nas veias. Sei que em situações mais agressivas (naquelas que parecíamos um Cristo era-nos dado um injectável nas veias pareceu-me com o mesmo nome daquele medicamento.

Quando vim da primeira vez de férias com os meus amigos, também Furrieis Milicianos da 816, Coutinho, Piedade e Baião, passamos grande parte da véspera do embarque a esfregar as virilhas de uma irritação assanhada que nos fazia andar de pernas abertas. Diziam que aquela vermelhidão, que a muitos poucos poupava, era da água das bolanhas - não raras vezes andávamos nela e com ela bem acima das virilhas. Molha, seca; molha, seca…, havia quem lhe desse o nome de "flor do congo", e via-se por ali muito militar do mato de perna aberta.

Flor do Congo
Certamente que há em Angola muitas e variadas flores, tudo floresce naquela terra tão fértil. Esta foto com três lindos malmequeres foi tomada em 1972 no Luvo, no jardim da Casa do Administrador de Posto.

Mas hoje quero falar de outra flor, a denominada “flor do congo”, uma flor que dura muito, que porventura só os militares conhecem, porque muitos ainda hoje a possuem passados tantos anos desde que a “colheram”.

Aquilo a que os militares chamam “flor do congo” é uma doença de pele (micose) que ataca as virilhas e partes genitais, fruto do suor acumulado por longas caminhadas e dormidas no mato sem possibilidade de tomar banho.

É mais uma das muitas sequelas que muitos carregam para o resto da vida, e então depois comer umas azeitonas ou beber um digestivo é certo e sabido que  a dita clama por  “carícias”.
Mário Mendes
In http://cc3413.wordpress.com/2009/12/07/flor-do-congo/

Aplicávamos então o Astérol em líquido (o 1214 pouco servia) e aquilo ardia que nos fazia saltar, mas a vontade de chegar à metrópole sem aquele incómodo era grande. Daí, cada um saltava para o seu lado.
Foi assim no princípio e pela noite dentro no Hotel Internacional em Bissau onde estávamos alojados.

Voltando à Doença do Sono esta tinha alguma assistência nas chamadas “Missões de Sono”.














Foto da esquerda - Crianças vítimas da doença do sono. Foto extraída de Jornal de Angola, com a devida vénia.
Foto da direita - O gado (principal hospedeiro do parasita) também era vítima da doença. Foto extraída da página BBC Brasil.com.

Soube mais tarde que havia uma Missão em Bissorã que também dava assistência a leprosos e houve militares que recorreram àquela instituição para resolver algum problema sanitário, não soube se por falta episódica do clínico militar na altura, se o problema que o militar enfrentava era do foro daquele estabelecimento.

Selo de S. Tomé e Príncipe emitido em 1966 por altura também que o Clube Militar Naval comemorava 100 anos da sua existência, referindo a erradicação da Doença do Sono naquela também província ultramarina. Na Guiné não terá sido assim…


Doença do sono
(transcrito, com a devida vénia, do site www.medipedia.pt)

CAUSAS
A doença do sono é provocada pelo Trypanosoma brucei gambiense e pelo Trypanosoma brucei rhodesiense, protozoários presentes no organismo de diversos animais mamíferos e de seres humanos parasitados. Estes protozoários desenvolvem parte do seu ciclo biológico no aparelho digestivo das moscas do género Glossina, conhecidas como moscas tsé-tsé, que vivem em habitats húmidos e nos bosques da África tropical, onde a doença do sono é endémica. O contágio ao ser humano efectua-se através das picadas das moscas tsé-tsé, que actuam como vectores dos agentes causadores.

MANIFESTAÇÕES E EVOLUÇÃO
Uma ou duas semanas após o contágio, começa a evidenciar-se uma lesão característica na zona da pele por onde os tripanossomas se inocularam: uma elevação ou pequeno tumor vermelho, muito doloroso, que desaparece espontaneamente ao fim de alguns dias ou semanas. Todavia, na maioria dos casos, esta lesão inicial cutânea acaba por não se manifestar ou até passar despercebida. De qualquer forma, algumas semanas após a produção do contágio, começa a manifestar-se febre, com uma notória subida da temperatura do corpo acompanhada por intensos arrepios e suores que, embora de início se repitam várias vezes ao longo de cada dia, posteriormente adoptam um padrão mais irregular. Uma outra manifestação muito habitual desta fase inicial do problema é a inflamação dos gânglios linfáticos, particularmente evidente nos que se situam na nuca e na região supraclavicular.

Numa segunda fase, normalmente ao fim de alguns meses, evidenciam-se as típicas manifestações neurológicas que designam a doença: alterações no comportamento e personalidade, indiferença face ao que o rodeia, debilidade, tremores, dificuldade em realizar os movimentos mais comuns, como a locomoção, dificuldades na linguagem, alterações de humor, intensa sonolência e letargia. Caso não se proceda ao devido tratamento, os casos mais graves evoluem para um estado de coma, que muitas vezes provoca a morte do paciente por paralisia respiratória.

TRATAMENTO
O tratamento baseia-se na administração de medicamentos activos contra os protozoários responsáveis pela doença e, caso se proceda ao mesmo na fase inicial, consegue-se obter a eliminação dos protozoários em poucos dias, enquanto que nas fases avançadas é necessário uma terapêutica mais prolongada. Para além disso, deve-se igualmente administrar outros medicamentos que aliviem os eventuais sinais e sintomas e, caso seja necessário, deve-se proceder à hospitalização do paciente para prevenir ou tratar as complicações das fases mais avançadas.

PREVENÇÃO
Dado ainda não existir uma vacina eficaz contra a doença do sono, a prevenção consiste na eliminação da mosca tsé-tsé através da fumigação e em evitar as suas picadas através da utilização de mosquiteiras e repelentes ambientais ou de aplicação local. Por outro lado, as pessoas que habitam nas zonas endémicas e as que planeiam viajar para as mesmas devem proceder à administração de medicamentos antiparasitários específicos. Como é óbvio, a prescrição deve ser efectuada por um médico e rigorosamente cumprida, pois caso não o seja, essas pessoas correm o risco de não estarem devidamente protegidas contra um eventual contágio.
Interessante o ciclo Tsé-Tsé-homem, homem Tsé-Tsé, com o parasita pelo meio, e há semelhança do que acontece com o mosquito Anopheles causador do Paludismo, observado na figura seguinte:

Com a devida vénia, figura transcrita do site www.dpd.cdc.gov/dpdx


Depois de tudo isto e como já aconteceu com o Anopheles (o tal que provoca o Paludismo) constata-se que o insecto infecta o homem mas também pode ser o homem a infectar (?) o insecto. Afinal quem infecta quem? Ressalvando, no entanto, alguma ingenuidade no assunto, isto faz-me lembrar a história do ovo e da galinha.

Rui Silva
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 1 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 – P8354: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (12): Baile de Fim de Ano na Associação Comercial, mesmo ao lado do Palácio do Governador

Vd. postes da série de:

20 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7012: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (1): Paludismo (Rui Silva)

17 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7138: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (2): Matacanha (Rui Silva)

26 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7342: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (3): Formiga baga-baga (Rui Silva)

26 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7674: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (4): As abelhas (Rui Silva)

19 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8133: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (5): A lepra (Rui Silva)