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sexta-feira, 15 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27121: O segredo de... (51): Virgínio Teixeira, ex-alf mil SAM, CCS/BCAQÇ 1933 (Nova Lamego e Sáo Domingos, 1967/69), economista, consultor, gestorempresário: como perdi dois mil contos, em 1985 (c. de 46,5 mil euros, a preços de hoje), com o projeto




Virgílio Teixeira, ex-alf mil SAM, CCS/BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Dmingos, 1967 /69); economista, empresário, gestor, consultor de projetos; natural do Porto, vive em Vila do Conde; voltou à Guiné-Bissau, em viagem de negócios, em 1984/85 (*). 





Guiné-Bissau > Bissau > Cumeré > 5 de janeiro de 1985 > O Virgílio Teixeira (Vt)  junto a um complexo agroindustrial, inacabado e abandonado: tratava-se de uma fábrica de descasque de arroz... 

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1.  O Virgílio Teixeira já aqui nos contou como foi o seu regresso à Guiné-Bissau, no tempo de 'Nino' Vieira, em 1984 e 1985 (*)

 Guiné 1967/69 - Álbum de Temas:

T999 – O regresso à Guiné em 20out84;
- 10 anos após a independência em 74set24
- 15 anos depois da minha saída em 4ago69;
- 17 anos depois da minha primeira chegada, em 21set67.

Do seu texto de 13 ou 14 páginas ficou por publicar a última parte. Mas o assunto volta agora à baila.

Em 1984/85 o Vt regressou à Guiné-Bissau, em duas viagens de negócios,  como consultor de um projeto de investimento, com financiamento estrangeiro, que acabou mal, devido à conjuntura interna. (Julgamos que o Vt se refere ao chamado "caso 17 de outubro de 1985", que acabou com o fuzilamento, entre outros, do destacado e brilhante dirigente, de origem balanta, Paulo Correia, membro do Governo, que geria a pasta da justica, e era vice-presidente do Conselho de Estado).

Como o Vt  nos disse em 2019: 

(...) "O final do projecto não foi muito feliz, e contém tanta coisa pessoal e que tenho de preservar. Acho que, no final de tudo, quase desgracei a minha vida, e já se passaram 35 longos anos, desde que iniciei esta loucura. 

Em todo o caso, é parte da vida de um camarada da Guiné, e julgo que tem interesse para quem quer perceber o curso que seguiu aquele novo país de língua portuguesa. "  (...) (***)


2. Comentário do Virgílio Teixeira ao poste P27098 (**):

A foto nº 2  onde está um Bar Baiano, colado a um prédio colonial cor tijolo, na porta 12, é o edifício onde tínhamos (a minha equipa de projectos),  em 1984 e 1985, a sede das nossas sociedades.

Era a casa de um homem branco, ou nem tanto, residente que depois também fazia parte do nosso eventual negócio.

Já a partir de 1985, começámos a utilizar as suas instalações, para albergar a malta, era eu, o técnico I...,  depois veio a mulher, o filho e a filha, naturais de Coimbra ou arredores.

Vivemos lá por duas vezes, parte em janeiro de 85 e no fim de tudo em junho 1985.

Nunca mais vi ninguém porque viemos embora (os sócios principais, o V.L.  incluído), todos deram os frosques, pois a resposta ao alegado golpe de Estado foi a matar a torto e a direito a mando de 'Nino' que  também era nosso sócio.

O I..., a mulher, o filho e a filha ficaram lá, pois já tinham avançado com a desmatação na zona de Bafatá, e havia uma sociedade com o meu nome, e outros, que não sei hoje o que se passou.

Como confidência, o I...,  que não tinha já nada aqui em Portugal, com a familia toda lá, ficou...

Nunca nos disse nada, e já éramos muitos, ele terá se aproveitado da sociedade, para levar por diante o seu projecto de vida.

Há aqui uma grande confusão , pois acho que ele teria algumas cartas na manga que nunca soubemos, eu pelo menos e o V. L.  com quem falei durante muitos anos.  A sociedade foi legalmente constituída, eu próprio fiz a minuta e tratei de toda a burocracia - e não era pouca - para para pôr aquilo a andar.

Ainda assinei com os outros um tipo de empréstimo de adiantamento, e cedência de máquinas e pessoal, e às tantas ainda sou devedor de alguma coisa ...

Vim a saber por outros capitalistas mais adiantados, que o sócio I... terá,  depois de nos virmos embora, feito uso  da própria filha 
como moeda de troca,  com alguns comandantes. (Não posso comprovar a veracidade deste facto, no mínimo insólito; o que um homem pode fazer por dinheiro!)

É verdade que todos nós nunca mais contactámos com ele, e a morada era Rua Eduardo Mondlane, nº 12 Bissau, à saída para o aeroporto. 

Não confirmo nada disto, sei é que perdi do meu dinheiro,  2 mil contos, sem nada receber. Era um risco calculado, devido aos diferenciais de ofertas e orçamentos, tratados maioritariamente pelo I..., porque ele é que sabia da matéria de plantação de arroz em sequeiro. (LG: 2 mil contos em 1985 equivalem, a preços de hoje, a 46,5 mil euros)

A parte industrial do projecto era uma empresa alemã de reputação, que iria dar seguimento ao descasque, branqueamento, embalagem e exportação do arroz, tudo com o aval do nosso Banco de Portugal e da Guiné-Bissau.

Mas toda esta história, que era comandada pela Guiné, com o aval dos cooperantes dos paises de Leste, que sempre colocaram reservas e pareceres desfavoráveis, para benefício de outros.

Foi uma grande experiência, onde se via já o poder a funcionar, a corrupção, os interesses, a política e a polícia.

Tive a preciosa ajuda, com pareceres, do Ministro das Finanças da Guiné, convivi na sua casa, ele que foi meu conterrâneo no Curso de Economia na Faculdade de Economia do Porto, e unha com carne com o V.L.  que era o tutor dos filhos no Porto.

Falo nisto com uma certa nostalgia, pois as coisas não correram bem, não por minha culpa (afinal, o cérebro do projecto económico e financeiro, que recebeu um louvor escrito do Banco de Portugal, e outro verbal do Ministro do Desenvolvimento Rural da República do Senegal, onde fomos lá para vender o projecto).

Tudo se projectou no abismo após o alegado atentado ao 'Nino' que, em resposta, mandou fuzilar uma série de malta da alta politica do Estado, onde se incluía um nome importante que era o ajudante de campo do 'Nino'. (***)

Luis, se puderes publica neste poste , com fotos de coisas que já não conheço, e outras que, como é obvio,  ainda reconheço.

 
Grande Abraço, Virgilio Teixeira


2. Comentário do editor LG:

(i) Em mail de segunda feira, 11/08/2025, 21:27, disse ao Vt:

Virgílio, a publicar, como me pedes, vou fazê-lo na série "O Segredo de..." (...)

Como envolve nomes de terceiros, e ainda vivos, temos de ser cautelosos... Tenho também que te proteger: tens o coração demasiado ao pé da boca... Já falaste em tempos desta história que pode parecer algo "mafiosa" para os leitores do blogue... mas que ficou incompleta. 

Talvez possas ser mais claro, conciso e preciso...Não tens que mencionar nomes, a não ser o teu e o do 'Nino' e pouco mais (dos outros que estão vivos, não tens a devida e competente autorização; como sabes, há a figura, jurídica, do "direito ao esquecimento", que é reconhecido na UE e na Internet)...

Quanto ao golpe de Estado do 'Nino' não estás a referir-te ao de 14 de novembro de 1980... (E depois houve a guerra civil de 1998/99;  pelas minhas contas, deve tratar-se do chamado caso "17 de outubro de 1985"; Paulo Correia acabou por ser a vítima inocente... )

Revê essa história e depois manda-me uma segunda versão... Pode vir a ser partilhada como um "segredo teu" (*), ligado à Guiné-Bissau...



(ii)  O Vt achou por bem não rever nada...Com a sua autorização, omitimos os nomes dos intervenientes. Aparecem aqui apenas em iniciais. Disse-nos ele:
  • sobre o V. L., direi apenas que era um amigo do meu pai; tinha faro para os negócios e ótimas relações com o poder em Bissau;
  • o resto do grupo incluía empresários e técnicos agrícolas de cultivo de arroz, fugitivos em 1975 de Angola, onde tinham grande peso;
  • o nosso projeto deu voltas por Portugal, Espanha, Alemanha, Guiné-Bissau e Senegal;
  • o resto vem no meu livro de memórias de 6 mil páginas, que nunca hei de publicar...
  • longa história, esta, a culminar com a minha assistência no Raly Dakar, quando lá estava em 15 e 16 de janeiro de 1985.

(Revisão / fixação de texto: LG)



(***) Vd. postes de;




(...) O nosso projecto transitou pelos serviços governamentais, sob a designação inventada por mim, de “AGRINÉ – Agricultura da Guiné, Lda.,“ e ocupava uma zona previsional de 7000 hectares de terreno [mais do que 7 mil campos de futebol...], já inscritos a nosso favor, e com mapa registado, na zona de Cabuca, nas margens do Rio Corubal, que eu tão bem já conhecia.

Bem, como um elevado montante de investimento nacional e internacional, eram 20 milhões de USD que ao câmbio daquela época, já tinha baixado de 200 para 180, dava em dinheiro português cerca de 3,5 milhões de contos.

Aquele valor a preços atuais com a inflação de mais de 30 anos, e com as mudanças de Escudos para Euros, significava algo como 70 milhões de euros!... [Em rigor, 3,5 milhões de contos, em 1985, dava qualquer coisa como 69,6 milhões de euros, a precos de hoje, usando o conversor de moeda da Pordata. ] E fosse o que fosse era sempre muito dinheiro, e da parte do Estado da Guiné significava pouco mais do que a cedência do terreno.

Andei um ano às voltas com este projecto, e para elaborar o estudo tive de me deslocar 2 vezes àquele país. A burocracia era tanta que quase dava para desistir, formámos a empresa local, arranjámos sócios locais – o próprio 'Nino' Vieira, presidente da república, também entrava através do sogro, e mais um brigadeiro local, ajudante de campo do 'Nino'... E cada viagem custava uma pequena fortuna, era arriscar muito. (...)


Guiné 61/74 - P27120: Felizmente ainda há verão em 2025 (17): relembrando alguns encontros imediatos... de 3º grau com "jibóias", na região dos Dembos, em Angola (Fernando de Sousa Ribeiro, ex-alf mil, CCAÇ 3535 / BCAÇ 3880, Zemba e Ponte do Zádi, 1972/74)



Foto nº 2 > Pitão-africano-da-rocha (Python sebae), fotografado vivo  no quartel de Mucondo 



Foto nº 2 > Pitão-africano-da-rocha (Python sebae), fotografado morto no quartel de Mucondo: tinha acabo de comer um cão


Angola > Província do Uíge > Mucondo > CCAÇ 3537 / BCAÇ 3880, 1972/74. Imagens disponibilizadas por Fernando de Sousa Ribeiro, e que fazem parte do álbum da página do Facebook do BCAÇ 3880 (grupo privado).



1. Comentário ao poste P27116 (*),  assinado pelo nosso grão-tabanqueiro Fernando de Sousa Ribeiro:




Fernando de Sousa Ribeiro, ex-alf mil at inf, CCAÇ 3535 /
BCAÇ 3880 ( Zemba e Ponte do Zádi, Angola, 1972/74);
membro da Tabanca Grande desde 11 de novembro de 2018,
com o nº 780, tem 34 referências no nosso blogue.
Engenheiro, natural do Porto, é o administror
que mantém ativo desde janeiro de 2006 até hoje.
Um caso notável de longevidade.

 

O BCCAÇ 3880 e Companhias tem um grupo privado no Facebook.

Há também um blogue, ativo entre 2010 e 2016, administrado pelo Jorge Madureira



Eu peço desculpa por meter o nariz onde não sou chamado, mas esta discussão a propósito de cobras fez-me recordar as que vi em Angola, e foram algumas. 

Numa ocasião tive mesmo uma cobra venenosa a poucos centímetros de mim. Devia ter meio metro de comprimento e era lindíssima, em que as cores das escamas variavam conforme a incidência da luz do sol. Acabou decapitada por uma catana.


Foto nº 1 > Angola, Zemba,
 c. 1972/74
Em Angola existiam cobras para todos os "gostos", desde as inofensivas cobras de água até às temidas cobras cuspideiras, que esguichavam o veneno pelo ar em direção aos olhos da vítima. 

Vi uma vez uma minúscula cobra verde, do tamanho de uma minhoca, que era tão pequena e tão leve que estava em cima de uma folha de cafezeiro sem que a folha vergasse com o seu peso. Apesar do tamanho e do peso, o veneno desta cobra (seria uma mamba verde?) era mortal.

Não admira por isso que, em todas as bolsas levadas pelos auxiliares de enfermeiro para as operações militares, havia obrigatoriamente um frasco de soro antiofídico. Era um item que não podia faltar, a par do soro fisiológico, do garrote ou dos comprimidos e/ou injeções contra a malária. Felizmente, o soro antiofídico nunca foi necessário no meu batalhão. 

Apesar da relativa abundância de cobras, nenhum militar do BCaç 3880 foi alguma vez mordido por um destes répteis.

Na região dos Dembos, no norte de Angola, onde eu estive em 1972-73, as cobras mais vulgares eram as jibóias. Vi várias, umas vivas e outras mortas. Onde quer que o terreno fosse pedregoso, podíamos ter a certeza que por ali havia pelo menos um ninho de jibóias.

Houve casos de jibóias que foram apanhadas e foram mortas dentro dos quartéis ou das sanzalas. Na página do meu batalhão no Facebook, camaradas meus publicaram fotografias de jibóias apanhadas dentro do arame farpado. Permito-me o atrevimento de partilhar três dessas fotografias.

A primeira fotografia mostra uma jibóia encontrada dentro do quartel de Zemba e que estava tão magrinha, tão magrinha, que devia estar cheia de fome e se preparava para atacar o galinheiro. (Fotografia que se reproduz, acima à direita, com a devida vénia) (Foto nº 1).

A segunda fotografia foi tirada dentro do quartel do Mucondo (onde estava a CCaç 3537, do meu batalhão) e mostra uma jibóia que tinha acabado de comer um cão! (Foto nº 2, publicada no topo)

A terceira e última fotografia mostra uma jibóia ainda viva, também encontrada dentro do quartel do Mucondo, toda enrolada sobre si mesma e com o aspeto de quem se sente senhora incontestada de todos aqueles domínios... É um magnífico exemplar de jibóia, mas também acabou por ser morta (Foto nº 3, reproduzida no topo)


Fernando Ribeiro

(Texto e fotos do Fernando de Sousa Ribeiro)

(Revisão / fixação de texto, reedição de imagem: LG)


2. Comentário do editor LG:

2.1. Já há tempos comentei no poste P4477 (**):

Há uma diferença (até no comprimento) entre a jibóia (nome científico, Boa constrictor) e o pitão (o nome é masculino...), jibóia africana ou irã cego (na Guiné-Bissau) (nome científico, Python sebae)... 

Esta última, sim, é a maior cobra da África subsahariana. Quando adulta, pode atingir os 6 metros e ultrapassar os 100 quilos de peso... 

Habita a floresta-galeria, as matas e só ocasionalmente a savana. A sua dieta é constituída por aves, pequenos roedores e ainda mamíferos de média dimensão. Pode viver trinta anos e não está em risco de desaparecer.

Já a jibóia p.d. (que está no nosso imaginário, pela pomada jibóia e não só...) é centro e sul-americana. Boa constrictor deve o seu nome à forma como mata as suas vítimas, por constrição, sufocando a presa, técnica usada pelas cobras não venenosas. 

Contrariamente a muitos mitos populares, é pacífica e fugidia, evita sempre o contacto com animais de grande porte, incluindo o homem... Em média anda nos três metros...É sobretudo caçadora nocturna, alimentando-se de roedores e aves...

Em resumo, a jibóia “verdadeira” (nome científico, Boa constrictor) é do Novo Mundo (centro e sul das Américas e algumas ilha do Caribe). Há "boas" africanas, mas não são jibóias... E as anacondas também não exietem em África...

Anacondas e pitões não são jibóias, mas também são constritoras. E não sáo venenosas!... Em África há várias espécies de pitões. (As anacondas pertencem à família Boidae , a mesma família das jibóias, e vivem apenas nas Américas, sobretudo na América do Sul).

2. 2. O "Sabe-Tudo", o assistente de IA (neste caso.  o Gemini e ChatGPT) confirma que esta "jibóia", da região dos Dembos, no norte de Angola, é o pitão-africano-da-rocha (nome científico, Python sebae). 

Resposta do assistente de IA:

(i) O pitão-africano-das rochas: a "jibóia" presente na Região dos Dembos, Angola

A principal serpente de grande porte, frequentemente designada como "jibóia",  em Angola, e que habita a região dos Dembos, na província do Bengo, é o Pitão-africano-da-rocha (Python sebae)

Embora pertençam a famílias distintas (os pítões são da família Pythonidae e as verdadeiras jibóias são da família Boidae), popularmente, o termo "jibóia" é muitas vezes usado para descrever qualquer serpente constritora de grande porte.

Evidências científicas confirmam a presença da Python sebae na província do Bengo. Um estudo de 2019 sobre o comércio de carne de caça documentou a venda desta espécie ao longo das estradas na província, o que atesta a sua existência na região que abrange o município dos Dembos.

O Pitão-africano-da-rocha é a maior serpente de África, podendo atingir e, em casos excepcionais, superar os 6 metros de comprimento. O seu padrão de cores, com manchas irregulares em tons de castanho, azeitona e amarelo, proporciona uma excelente camuflagem nas savanas, florestas abertas e áreas rochosas que habita. É um predador poderoso,  uma não-venenosa, que mata as suas presas por constrição.

(ii) Outras "jibóias" em Angola: uma questão de geografia

É importante notar que Angola é lar de outras espécies de pitões e de uma verdadeira jibóia, mas a sua distribuição torna improvável ou impossível a sua presença na região dos Dembos:

  • Pitão-angolano (Python anchietae):  esta é uma espécie endémica de Angola e da Namíbia, mas a sua distribuição está confinada às regiões mais áridas e rochosas do sul e sudoeste do país; é consideravelmente menor que o pitão-africano-da-rocha.
  • Pitão-real ou Pitão-bola (Python regius): embora a sua vasta área de distribuição na África Ocidental e Central se aproxime do norte de Angola, a sua presença no país não é consistentemente documentada e é menos provável na zona específica dos Dembos quando comparada com a Python sebae.
  • Jibóia-da-areia-da-calabária (Calabaria reinhardtii): esta é a única representante da família das jibóias (Boidae) formalmente registada em território angolano; no entanto, a sua presença está limitada ao enclave de Cabinda, uma floresta tropical húmida, um habitat distinto e geograficamente separado da região dos Dembos.

Portanto, para a região dos Dembos, a resposta conclusiva é que a grande serpente constritora que pode ser encontrada e identificada como "jibóia" é o imponente Pitão-africano-da-rocha.


(**) Vd. poste de 7 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4477: FAP (29): Encontros imprevistos (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)

Vd. também poste de 9 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4484: Fauna & flora (20): Histórias de grandes serpentes: da jibóia de 7 metros (Paulo Raposo) ao irã-cego (Clara Amante)

quinta-feira, 14 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27119: A nossa guerra em números (33): colonos, administradores coloniais e colonos de ocasião


Moçambique > Colonato do Limpopo > c. 1950 > Fotograma do documentário da RTP, História de África > Episódio 6 > Colonato do Limpopo (com a devida vénia...)


(...) A estratégia para o povoamento das províncias africanas por parte do Estado português é alterada nos anos 50. Pretendia-se um modelo eminentemente rural, maciço, branco, e totalmente dirigido pela administração estatal. Na base desta opção estava a ameaça de descolonização que se fazia sentir por toda a África. Para fazer face à hipótese de subversão dos nativos, impunha-se nacionalizar, com gente, os territórios ocupados.

Em Moçambique constrói-se o maior colonato, a partir das margens do Rio Limpopo, no sul do país. 13 aldeias para onde são atraídas famílias rurais portuguesas, a quem é entregue casa, gado, terreno para cultivo, sementes e alfaias.

Em troca, os colonos amortizavam a dívida para com o Estado com gado, parte da produção agrícola e impostos, além de trabalharem em regime de exclusividade. Em Angola, um projeto semelhante é construído na Cela, na província do Cuanza Sul.(...)



A. Como definir, sociologicamente, a figura do "colono" (por exemplo, em Angola e Moçambique, até 1974/75) ? (*)

Do ponto de vista sociológico, o termo "colono", aplicado ao contexto português em Angola e Moçambique até 1974/75, designa um indivíduo oriundo, em geral, da metrópole (Portugal continental ou ilhas atlânticas, incluindo Cabo Verde) que se estabelecia de forma permanente ou prolongada num território colonial, com o objetivo de nele viver, explorar recursos e, muitas vezes, exercer atividades económicas, políticas ou administrativas.

(i) Origem e estatuto:
  • o colono era normalmente cidadão da metrópole que migrava para o ultramar ao abrigo do regime colonial português ...
  • mas também das ilhas da Madeira e dos Açores,  do arquipélago de Cabo Verde (para a Guiné e São Tomé), do Líbano (para a Guiné), de Goa, Damão e Diu (para Moçambique);
  • beneficiava de um estatuto jurídico e social privilegiado em relação à população local, fruto da hierarquia racial e cultural implícita no sistema colonial.
(ii) Função e motivação:

  • procurava melhores oportunidades económicas e sociais (agricultura, comércio, serviços, pesca, indústria extrativa);
  • ou ocupava postos administrativos;
  • muitas vezes, tinha acesso a terras e recursos por via de políticas de expropriação ou reordenamento que marginalizavam comunidades indígenas (por ex., o colonato de  Cela, em Angola, em território ovimbundo).

(iii) Integração e relações sociais:

  • a vivência do colono estava frequentemente marcada por algum tipo de segregação socioespacial (bairros, escolas e serviços diferenciados para europeus e para africanos);

  • embora não houvesse um regime de "apartheid" institucionalizado,  como na África do Sul (em vigor de 1948 a 1994);

  • a sua presença fazia parte de uma estratégia, embora tardia, de povoamento e “portugalização” do território, legitimada pelo discurso oficial do “Império” e da “missão civilizadora” de Portugal;

  • a política de povoamento do Estado Novo sob a forma de colonatos (como de Cela, em Angola, e do Limpopo, em Moçambique), acabam por ser um fracasso, em termos políticos, sociais, econõmicos e demográficos (vd. aqui documentário da RTP sobre o colonato do Limpopo, 2017, 30' 52''),

(...) "Os planos de povoamendo dirigidos terminam em Angola ainda na década de 60, embora em Moçambique se tenham mantido até 1973. Os colonatos acabariam por não ser mais do que uma manobra de propaganda do Estado Novo, já que não serviram para aumentar a população branca em África – que, em 1970, era menos de cinco por cento do total em Angola e menos de 2 por centro em Moçambique -, nem para desenvolvimento económico dos territórios"- (...)


(iv) Dimensão simbólica e ideológica

  • o colono representava, para o Estado Novo, a presença física e cultural de Portugal no ultramar, funcionando como um instrumento de consolidação do domínio político e económico;
  • ao mesmo tempo, para muitos africanos, simbolizava a desigualdade estrutural e a perda de soberania e de idemtidade;
  • após as independências (1974/75), o termo “colono” passou também a ter uma conotação  política  e uma carga emocional forte, muitas vezes associado à memória do domínio e exploração colonial.

B. Diferenças entre “colono”, “administrador colonial” e “colono de ocasião”, que ajudam a perceber a diversidade de perfis destes migrantes.

Aqui vai a distinção sociológica e histórica entre os três perfis acima citados:


(i) Colono (no sentido mais restrito e clássico)
  • origem: migrante europeu (no caso português, vindo da metrópole e illhas atlânticas) que se fixa de forma permanente na colónia (sobretudo Angola e Moçambique);

  • objetivo principal: criar raízes, explorar terras, desenvolver negócios ou trabalhar em setores chave (agricultura, minas, comércio, indústria, serviços).

  • posição social: beneficia de estatuto legal e social privilegiado em relação à população africana, com acesso facilitado a recursos e direitos;

  • exemplo: agricultor estabelecido no planalto de Angola; empresário com loja em Lourenço Marques (Maputo).

(ii) Administrador colonial
  • origem: funcionário do Estado nomeado para exercer funções políticas, jurídicas ou militares no território;
  • objetivo principal: manter a ordem colonial, aplicar leis e decretos, representar a autoridade do governo português;
  • posição social: pertence à elite administrativa, com forte ligação ao aparelho de Estado e, normalmente, sem intenção de permanência vitalícia (regressava após o fim da comissão de serviço);
  • exemplo: Govrenador-geral (Angola e Moçambique); Governador de distrito em Moçambique ou chefe de posto administrativo no interior da Guiné.

(iii) Colono de ocasião (ou migrante temporário no ultramar)

  • origem: portugueses que iam para o ultramar por períodos curtos ou médios (alguns anos), muitas vezes para aproveitar incentivos económicos;
  • objetivo principal: ganhar dinheiro, obter experiência profissional ou aproveitar um momento de oportunidade (obras públicas, comércio sazonal, serviços técnicos);
  • posição social: embora também beneficiem de privilégios coloniais, não criam raízes profundas e regressam à metrópole quando a oportunidade ou contrato termina;
  • exemplo: engenheiro civil que vai supervisionar obras de estrada em Angola ou comerciante que abre um armazém durante um boom económico; professora, que acompanhou o marido militar, do QP ou miliciano, durante a guerra de 1961/74 (em Angoloa, Guiné, Moçambique); 
(iv) Resumo: podemos ver estes perfis como três camadas:

  • colono → raízes permanentes + exploração económica e social;
  • administrador colonial → poder político e jurídico, ligado ao Estado;
  • colono de ocasião → presença temporária, motivada por oportunidade económica.


Quadro comparativo: Colono × Administrador Colonial × Colono de Ocasião


Categoria/
Critério
ColonoAdministrador ColonialColono de Ocasião
OrigemMigrante da metrópole
ou ilhas atlânticas (Madeira, Açores, Cabo Verde)
Funcionário público da metrópole ou ilhas atlànticasMigrante temporário da metrópole oulhas atlânticas
Objetivo
principal
Fixar-se e explorar recursos / localAdministrar e manter a ordem colonialGanhar dinheiro ou experiência a curto/médio prazo
PermanênciaLongo prazo / vitalíciaTemporária (missão de serviço)Temporária (contrato ou oportunidade)
Vínculo&
Ligação
ao Estado

Indireta (apenas enquanto cidadão)Direta e oficialIndireta (pode trabalhar para empresas privadas ou contratos públicos)
Estatuto
social
Privilegiado face à população localElite colonial, poder formalPrivilegiado, mas com menos influência política
Tipo
de atividade
Agricultura, ,minas, comércio, indústria, serviçosAdministração, legislação, segurançaComércio, obras, serviços técnicos 
Relação com a população localSegregada, mas com contactos económicosDistante e autoritáriaGeralmente limitada e pragmática
Exemplo típicoAgricultor no planalto angolanoGovernador de distrito em MoçambiqueEngenheiro civil contratado para obra

_________________________

Fonte: IA | ChatGPT | LG

Nota sociológica:

Apesar de partilharem o privilégio de serem europeus (ou predominantemente europeus) num sistema colonial, estes grupos tinham funções, relações com o território e horizontes de vida bastante diferentes. Esta diversidade ajudava a sustentar o sistema colonial em várias frentes, económica, política e simbólica.

No quadro a seguir, pode perceber-se a linha temporal mostrando como o peso relativo destes três grupos mudou entre 1900 e 1974/1975, o que é muito útil para se entender o fim do colonialismo português.

Linha temporal (1900–1975) > Evolução do papel de colonos, administradores coloniais e colonos de ocasião em Angola e Moçambique

    Categorias / PeríodoContexto históricoColonoAdministrador ColonialColono de Ocasião
1900 / 26
(Final da Monarquia/ 1.ª Repú-
blica)
Fraca presença
europeia; colonização limitada; predomínio  de missões religiosas 
 e militares; "campanhas de pacificação"
Poucos, concentrados em zonas agrícolas 
 de fácil acesso;  continuação do recurso a degredados/ desterrados
Forte presença: a administração assegura controlo básico.Quase inexistentes (custos e riscos elevados).
1926 / 45
(Ditadura
Militar,
início do Es- do Novo e crise mundial)
Consolidação autoritária, políticas
de povoamento limitadas; economia centrada em
matérias-primas.
Crescimento lento; colonos mais estáveis começam a instalar-se.Administração estruturada e centralizada.Ainda raros; apenas em setores estratégicos como obras públicas.

1945 /61 

(Pós-guerra/ início da industriali-
zação colonial)
Expansão económica
no ultramar; incentivos
à migração; obras
públicas e agricultura mecanizada.
Cresce o número  de amílias fixas, sobretudo
em áreas agrícolas (como os colonatos de Cela e Limpopo)
Administração reforça poder e controlo social.Surge com mais força: técnicos, comerciantes e empresários de curto prazo.
1961 / 74
(Guerra
colonial)
Conflito armado, aumento do investimento estatal e privado; tentativas de “portugalização” acelerada.Maior entrada de colonos, mas também maior insegurança; comunidades europeias atingem
 o seu pico numérico.
Administração militarizada; funções civis misturam-se com funções militares.Expansão temporária devido a contratos ligados ao esforço de guerra e obras  infraestruturais.
1974/75
(Revolu-
ção, desco-
loniza-
e indepen- dência)
Colapso
do sistema colonial português.
Emigração massiva; maioria abandona o território.Quase todos regressam à metrópole.Saída rápida após término dos contratos; raros permanecem.
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Leitura sociológica da linha temporal: 


Até 1945, a administração era o pilar principal do domínio português, com os colonos ainda em número reduzido.
  • Entre 1945 e 1961, o colono fixo tornou-se central na economia local, ao mesmo tempo que cresciam os colonos de ocasião ligados a obras públicas, comércio e serviços.

  • Após 1961, o sistema dependeu simultaneamente de três pilares: administração militarizada, colonos fixos e influxo de trabalhadores temporários especializados.

A queda foi abrupta em 1974-75, com a descolonização rápida e a saída em massa de todos os 
grupos (c. 600 mil "retornados").(**)

Fonte: IA/ChatGPT /LG (Revisão / fixação de texto: LG)

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Notas do editor LG:

(*) Último poste da série > 14 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27118: A nossa guerra em números (32): A Administração Colonial (que, no caso da Guiné, foi completamente ultrapassada, para não dizer "cilindrada",  pelas Forças Armadas)

Guiné 61/74 - P27118: A nossa guerra em números (32): A Administração Colonial (que, no caso da Guiné, foi completamente ultrapassada, para não dizer "cilindrada", pelas Forças Armadas)


Governador Manuel Sarmento Rodrigues (1945-1949) [ foto: cortesia da Revista Militar].


Também era carinhosamente conhecido com o "Mamadu" Rodrigues e havia uma tabanca chamada Sinchã Sarmento.  Capitão de fragata e depois almirante, Sarmento Rodrigues (Freixo de Espada à Cinta, 1899 - Lisboa, 1979) foi, a par do gen António Spínola, um dos melhores governadores que passou pela Guiné. Foi governador entre  abril de 1945 e janeiro de 1949, quis fazer daquele território atrasado uma "colónia-modelo" (então colónia portuguesa, parte do Império Colonial Português, e sem complexos, de natureza semântica e conceptual, e muito menos político-ideológica!),  Foi ele quem, por exemplo, em 1948, fez um primeiro esforço sério para grafar os topónimos (nomes geográficos) guineenses, através da Portaria nº 71, de 7 de julho de 1948. Apostou na construção de infra-estruturas, mas também no desporto, educação e cultura. Reforçou a aliança com os muçulmanos. Foi também reformador da administração  ultramarina enquanto ministro do Governo de Salazar (1950/55).



Guiné-Bissau > Bissau > Maio de 2025 > O antigo edifício da administração civil


Fotos: © João Melo (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.]



 Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > CCS/BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > Janeiro de 1969 > Cerimónias da mudança do administrador da circunscrição de São Domingos > Em primeiro plano, o cmdt do BCAÇ 1933 e o administrador cessante, cabo-verdiano.

Foto (e legenda): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. A administração colonial portuguesa no Estado Novo: como funcionava  ? quais eram  as principais categorias de funcionários ?


Durante o Estado Novo (1933-1974), a administração colonial / ultramarina portuguesa seguia uma lógica fortemente centralizada e hierárquica, refletindo a ideologia autoritária do regime de Salazar. 

A gestão das colónias (chamadas oficialmente “Províncias Ultramarinas” a partir de 1951, ao tempo do Ministro do Ultramar, o reformador Sarmento Rodrigues) era orientada, a mhares de quilómetros de distância, a partir de Lisboa, pelo Ministério das Colónias ( e depois do Ultramar) e executada localmente por um aparelho administrativo que espelhava a estrutura do Estado em Portugal. 

 O próprio Gabinete de Urbanização Colonial (1944-1951) (depois GUU - Gabinete de Urbanização Ultramarina)  funcionava, imagine-se!, em Lisboa, dependente do Ministério das Colónias (e depois do Ultramar): centralizava o planeamento e a execução de projetos de arquitetura e urbanismo nas então colónias portuguesas, com um foco particular nos territórios africanos.

(i) Três características fundamentais da administração colonial de então:
  • centralização em Lisboa: todas as grandes decisões políticas, económicas, financeiras e militares eram controladas pelo governo central;

  • governadores e chefes superiores: cada colónia tinha um Governador-Geral (nas maiores, como Angola e Moçambique) ou Governador (nas menores, como era o caso da Guiné), nomeado diretamente pelo Presidente da República sob proposta do Ministro do Ultramar;

  • aparelho administrativo rígido: a organização visava manter a ordem, cobrar impostos (incluindo o famigerado "imposto de palhota"),  gerir recursos,  garantir a presença cultural e linguística portuguesa, etc.


(ii) Principais categorias de funcionários:

(a) Governador-Geral  (Angola, Moçambique) / Governador (Guiné)
  • máxima autoridade na colónia;
  • competências políticas, militares e administrativas;
  • nomeação política, geralmente militares de carreira ou altos quadros civis.
(b) Secretário-Geral
  • no. 2  do governo colonial / eminência parda do governador
  • coordenava as direções e serviços administrativos.
(c) Administradores de Circunscrição / Concelho:
  • responsáveis por áreas administrativas menores (circunscrições: semelhantes a municípios: por exemplo na Guiné: Bissau, Bolama, Bafatá,  Teixeira Pinto,  Cacheu, Farim, Catió, etc.).
  • ligavam a população local ao governo colonial;
  • Manuel da Trindade Guerra Ribeiro, natural de Chaves, é a figura mais conhecida nos anos 60/70:   atuou como administrador colonial (administrador da circunscrição/concelho de Bafatá, nos anos 60) e, mais tarde, foi intendente,  exercendo funções durante o período do general Spínola, já no início dos anos 70.
(d) Chefes de Posto Administrativo:
  • autoridade em zonas rurais e remotas;
  • funções de polícia, cobrança de impostos,  mediação de conflitos, etc.:
  • por exemplo, a circunscrição (mais tarde, concelho de Bafatá, um vasto território da zona leste) em 1969 tinha os seguintes postos administrativos: Bambadinca, Contuboel, Xitole, Galomaro, Gã-Mamudo.
(e) Magistrados e funcionários judiciais:
  • juízes, escrivães, procuradores do Ministério Público.
  • aplicavam as leis portuguesas (adaptadas ao “indigenato” até 1961, e procurando  respeitar os usos e costumes jurídicos de cada etnia).
(f) Funcionários técnicos:
  • engenheiros, médicos, enfermeiros. professores, agrónomos, geógrafos, topógrafos, etc.
  • muitas vezes com estatuto especial de “funcionários ultramarinos”.

(g) Polícia e militares:


  • tropas coloniais, Polícia de Segurança Público (PSP), PIDE/DGS, no plano político;
  • polícia administrativa ("cipaios"):
  • garantiam a ordem e reprimiam revoltas .

Observ1 - É difícil (se não impossível)  fornecer um número exato e definitivo de funcionários da administração colonial portuguesa em Angola, Guiné e Moçambique em 1979.  As estatísticas da época muitas vezes agrupavam diferentes categorias de pessoas e trabalhadores, e os números variam entre as fontes.

Observ2 - Até 1961, vigorava o Estatuto do Indigenato, que criava uma divisão legal entre “indígenas” e “cidadãos portugueses”, com direitos, deveres e tratamento administrativo diferentes. A partir de 1961, houve uma crescente "militarização" da administração civil (muita acentuada, por exemplo, com o  gen Spínola na Guiné, entre 1968 e 1973).

A Administração Civil sofria de graves carências, em termos quantitativos e qualitativos, no que dizia respeito a recurso humanos e a meios técnicos e financeiros, sendo completamente ultrapassada (para não dizer "cilindrada") durante o consulado de Spínola.(**)

Segue-se um quadro esquemático e um gráfico com a hierarquia da administração colonial portuguesa no Estado Novo, permitindo visualizar melhor a sua estrutura.

  

Quadro esquemático da administração colonial portuguesa no Estado Novo:


Ministério do Ultramar (Lisboa) │ └── Governador-Geral (Angola / Moçambique) Governador (colónias menores) │ ├── Secretário-Geral │ ├── Direções de Serviços Centrais │ ├─ Finanças │ ├─ Obras Públicas │ ├─ Educação │ ├─ Saúde │ └─ Agricultura │ ├── Administradores de Circunscrição / Concelho │ ├─ Chefes de Posto (zonas rurais) │ │ └─ Autoridades tradicionais “reconhecidas” (sob controlo)
(régulos na Guiné e em Moçambique; sobas em Angola;
liurais em Timor) │ ├── Magistratura e Serviços Judiciais │ └── Forças de Segurança ├─ Polícia Colonial / PSP ├─ PIDE/DGS └─ Tropas coloniais (Exército e milícias locais)



Leitura rápida do esquema:
  • Topo → Lisboa decidia quase tudo.
  • Meio → Governadores geriam a colónia com um núcleo de secretários e diretores.
  • Base → Administradores, chefes de posto, polícia administrativa e forças policiais/militares garantiam o controlo direto sobre a população.
As autoridades locais  (sob o sistema do Indigenato até 1961) tinham funções subalternas, limitadas, subordinadas, em grande parte simbólicas: régulos (na Guiné e em Moçambique), sobas (erm Angola), liurais (em Timor).

A polícia administrativa, a par da PIDE, era particularmente odiosa.
 
Gráfico: a hierarquia da administração colonial




(Pesquisa: IA / ChatGPT / Gemini  + LG | Revisão / fixação de texto: LG)

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Notas do editor LG:


(*) Último poste da série > 12 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27113: A nossa guerra em números (31): Angola e Moçambique: População europeia total: ~535 mil / 600 mil | Total geral de "retornados" (incluindo os restantes territórios): c. 500 mil / 520 mil pessoas

(**) Vd. postes de:

20 de novembro de 2018 > Guiiné 61/74 - P19213: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (59): os reordenamentos no desenvolvimento sócio-económico das populações, brochura da Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológioco [ACAP], do QG / CCFAG - Parte I


21 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19214: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (60): os reordenamentos no desenvolvimento sócio-económico das populações, brochura da Repartição de Assuntos Civis e Acção Psicológica [ACAP], do QG / CCFAG - Parte II

(...) 1. Estando a Guiné sob a pressão de um estado de subversão que visa a conquista das populações por vários meios, entre os quais a luta armada; existindo um Quadro Administrativo [QA] com graves deficiências quantitativas e qualitativas e possuidor da falta de meios para realizar a manobra de contra-subversão em tempo útil e, ainda, por razões de controle e segurança, não é possível à Administração Civil encarar sozinha, de momento, o esforço que se pretende realizar.

Assim, porque possuidoras de vários meios, humanos, técnicos e de defesa, as Forças Armadas estão aptas a colaborar, com carácter temporário, com as estruturas administrativas na solução dos problemas sócio-económicos. Porque, também, os problemas de desenvolvimento social e económico constituem a manobra da contra-subversão que é preciso fazer rapidamente e pertence à missão das Forças Armadas [FA].

As FA são, pois, chamadas a participar temporariamente em funções que seriam da competência civil, se os quadros administrativos estivessem em condições de as desempenhar, e que lhes serão totalmente confiadas quando as condições o permitam. São funções de colaboração e reforço da orgânica...[ilegível].

2. (...) Os civis do Quadro Administrativo (QA) pensam e actuam de maneira diferente. E a diferença reside em dois pontos distintos: a estagnação e carências várias do próprio QA e no diferente carácter de obrigatoriedade de uns e outros.

As Forças Armadas são uma organização profundamente hierarquizada, com escalões de comando definidos, com leis e regulamentos mais rígidos e pormenorizados, prevalecendo um forte espírito de disciplina. Arreigados a conceitos burocráticos ultrapassados e morosos por natureza , regulados por leis mais vastas, com um carácter de disciplina menos acentuado e relativo momento a leis de carácter mais geral, os civis do QA têm um diferente comportamento face a situações que exigem a resolução adequada em tempo próprio. A base de toda a actuação entre militares e civis terá de basear-se na compreensão e na colaboração, já que ambos servem o objectivo comum. (...)

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27117: Historiografia da presença portuguesa em África (493): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial da Colónia da Guiné Portuguesa, 1937 (48) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 13 de Março de 2025:

Queridos amigos,
Vamos finalmente saber alguma coisa sobre as operações de Canhabaque, que decorreram no ano anterior, o governador concede múltiplos louvores e vale a pena observar um punhado de régulos premiados, um bom número deles irá aparecer no apoio às autoridades portuguesas, durante a luta de libertação. A colónia vè crescer a sua administração, estruturam-se mais e mais serviços, o governador vê-se que tem mão dura com os atos de corrupção. Pela leitura atenta das reuniões de Conselho de Governo vê-se que há um apreciável anseio em expandir as infraestruturas, em melhorar a urbanização de Bissau, nesta altura é inevitável a transferência da capital de Bolama para aqui, aliás os diferentes serviços básicos vão sendo transferidos, desde a saúde às comunicações. Há expetativas que ficarão por concretizar, irão materializar-se quando o comandante Sarmento Rodrigues aqui chegar com alguns alforjes de dinheiro e um dinamismo insuperável.

Um abraço do
Mário


A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Oficial da Colónia da Guiné, 1937 (48)


Mário Beja Santos

O grande destaque para os acontecimentos deste ano é o do crescimento da Administração, espalha-se de modo capilar por todo o território, veremos, enfim, referência aos acontecimentos de Canhabaque, há mão dura para os atos de corrupção. Regressou o major Carvalho Viegas à Guiné, depois de uma apreciável ausência, em que este substituído pelo Encarregado de Governo, capitão Salvação Barreto. A A.E.G. Lusitana, representante da Telefunken, fica responsável pelo fornecimento e instalação na Guiné de postos radiotelefónicos e radiotelegráficos. Já no segundo semestre será criada a secção de estatística da colónia (suplemento ao Boletim Oficial n.º 35, de 2 de setembro); processa-se formalmente uma orientação da lavoura com a criação de um organismo dito estreme (puro, que não tem mistura) destinado a estudar todos os problemas que se relacionam com a produção agrícola, o organismo chama-se Conselho Técnico da Agricultura, tem a principal finalidade de promover que sejam modificados os métodos e sistemas de agricultura empregados pelos indígenas (BO n.º 39, de 27 de setembro, com a legislação respetiva publicada no BO n.º 40).

Falou-se atrás que o Boletim Oficial vai dando conta de várias demissões por roubos administrativos, como se passa a referir. No Boletim Oficial n.º 3, de 18 de janeiro, ficamos a saber que Jorge António Medina, secretário do Quadro Administrativo e chefe de posto, que estava na inatividade por dois anos, era arguido de ter desviado em seu proveito próprio, do cofre da Administração da Circunscrição Civil de Farim, uma quantia superior a 28 contos, e tinha pretendido atribuir o desvio ao aspirante Eduardo Melo, na data gravemente doente no hospital de Bissau, onde faleceu.

Nos autos provou-se a má-fé com que procedera, ludibriando o seu superior hierárquico, que na sua honestidade confiara; havia contra ele as agravantes de já ter sido punido com a pena de regresso à categoria inferior em consequência de um desvio de 6 contos e também pelo desaparecimento de conhecimentos de cobrança do imposto de palhota, numa quantia superior também a 6 contos.

O conselho disciplinar, de forma retórica procede a despacho, elabora portaria a demiti-lo; na mesma data, o conselho disciplinar demite o professor auxiliar do ensino primário Zeferino José Simão Monteiro de Macedo por atos praticados contra a moral e prestígio da função pública, tinha levado alunos de ambos os sexos da escola oficial a seu cargo a banharem-se no rio, em completo estado de nudez e numa promiscuidade imoral; levou os alunos a uma dança regional, caracterizadas por gestos e atitudes obscenos, dançando conjuntamente com eles… Houve depois relações sexuais com uma aluna, com a mulher de um aluno.

Foi-me dado ver pela primeira vez que havia apartheid puro e duro, consagrado na legislação. No Decreto n.º 27:491, do Ministério das Colónias, publicado no Boletim Oficial n.º 9, em 1 de março, pode ler-se, tendo em consideração que os caminhos-de-ferro de algumas colónias não dispõem de carruagens de 3.ª classe próprias para nelas puderem viajar os cabos e os soldados europeus, era necessário providenciar que se evitasse que aquelas praças viajassem em promiscuidade com os indígenas durante largos períodos de muitas horas; o governador-geral do Estado da Índia tinha procurado providenciar sobre a matéria, a fim de ser mantida a dignidade da farda. Assim sendo, era decretado que quando os cabos e soldados europeus viajassem, por motivo de serviço, em caminho de ferro onde as respetivas carruagens de 3.ª classe não possuíssem compartimentos especiais para europeus, sendo apenas destinado a indígenas, tinham o direito ao transporte em 2.ª classe.

Temos finalmente uma referência a Canhabaque, consta da Portaria n.º 37, Boletim Oficial n.º 13, de 20 de março. Ficamos a saber que tinha cessado as medidas de exceção do arquipélago dos Bijagós:
“Sendo certo que o prolongado estado de insubmissão do indígena – obrigando o Governo à adopção de um regime de força – o empobreceu pela perda do seu armentio (rebanhos) e outros valores, o que aconselha que se anotem medidas de proteção que restabeleçam, naquela ilha, o primitivo índice de riqueza indígena, determina-se que entre imediatamente em vigor:
1.º Que seja restabelecido, na ilha de Canhabaque, o regime de administração civil, constituindo a área da ilha um posto administrativo com sede em Inorei integrado na circunscrição civil dos Bijagós;
2.º Que seja criado, na mesma ilha, um centro comercial fixado na sede do posto, sendo expressamente vedado o exercício do comércio fora dele;
3.º Que a concessão de licenças do comércio fique rigorosamente limitada a firmas individuais ou coletivas que se encontrem matriculadas no Tribunal do Comércio.”
E os indígenas de Canhabaque passavam a ter completa liberdade de se movimentarem.

No suplemento ao n.º 14 do Boletim Oficial n.º 9, de 8 de abril, publicam-se várias portarias emanadas do gabinete do governador, louvores. “Terminadas as operações militares na ilha de Canhabaque, com o bom êxito das quais ficou a Colónia inteiramente pacificada, e sendo de justiça publicamente patentear o esforço dos que expuseram a vida em serviço da Pátria e da civilização, não se poupando a sacrifícios, mostrando patriotismo, desinteresse pessoal e destemor, operando numa região de climas deveras inóspito, e através de uma serrada vegetação em que todas as emboscadas são fáceis”, louvam-se tenentes de infantaria e um tenente-médico, dois sargentos, vários primeiros-cabos, é promovido a capitão de 2.ª linha o então tenente de 2.ª linha, régulo de Badora, Boncó Sanhá, pela maneira decidida como mandou os auxiliares do seu regulado durante as operações na ilha de Canhabaque; também promovido a capitão de 2.º linha o régulo de Sancorlá, Bram Jam, pela coragem, brio e valentia que deu provas num combate, apesar de ver cair morto, a seu lado, o seu filho primogénito, a tenente de 2.ª linha, o alferes de 2.ª linha, régulo do Ganadú, Demba Danelho, pela dedicação, coragem e valentia que dera provas; e também promovidos a alferes de 2ª linha os régulos de Quinará, Buli Jassi, Braima Baldé e do Cossé, Infali Baldé, pela coragem e valentia que deram provas.

E termina-se com mais medidas disciplinares, constantes do Boletim Oficial da Guiné n.º 46. Desta feita estava envolvido o capitão do extinto quadro de administração de saúde das colónias, António das Neves Jacob:
“a) Sendo Fiscal do Hospital de Bolama, apesar de fazer expedir de uma maneira irregular circulares para o fornecimento de géneros para dietas, continuava a proceder incorretamente, não respeitando as propostas mais vantajosas, prejudicou os interesses do Estado;
b) Pretendeu mancomunar-se com o seu subordinado e inferior hierárquico, combinando com este as repostas a dar ao encarregado do inquérito;
c) Falta de lealdade para com o diretor do hospital, dando-lhe a assinar um recibo e não lhe levando à assinatura o talão respetivo, diversamente escriturado;
d) Praticou graves irregularidades de escrituração das contas e recibos dos doentes;
e) Serviu-se de dinheiros do Estado para pagamento das suas contas circulares, sem lhes ter dado entrada na fazenda, como cumpria.” Com todas as atenuantes somadas, não acusando o seu registo disciplinar castigo algum, o governador aplicou-lhe o mínimo de pena de inatividade por 181 dias, ficou com direito às regalias concedidas aos militares das Forças Armadas e tem vencimento militar, perde as gratificações de comissão e de serviço.


Bombas contra Franco
Luta da Mantampa, Papéis, Guiné Portuguesa
Imagem de evento Bijagó, 1946
'Beleza Bijagó, Guiné', fotografia de Domingos Alvão, postal fotográfico da 1.ª Exposição Colonial Portuguesa, 1934
Indígena Bijagó, Guiné, 1940

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 6 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27097: Historiografia da presença portuguesa em África (493): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial da Colónia da Guiné Portuguesa, (o segundo semestre de 1936) (47) (Mário Beja Santos)