sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Guiné 63/74 - P3292: Controvérsias (3): O acidente de helicóptero que vitimou Pinto Leite (J. Martins / J. Félix / C. Vinhal / C. Dias)

Um Helicóptero Allouette III > Na foto, uma enfermeira pára-quedista (cuja identidade se desconhece) >

Fonte: Especialistas da BA 12, Guiné 1965/74 > Victor Barata > 16 de Julho de 2007 > "AS NOSSAS GLORIOSAS ENFERMEIRAS PÁRA-QUEDISTAS" (com a devida vénia...)


1. Em relacção à questão posta no poste P3291, de 10 de Outubro de 2008 (Guiné 63/74 - P3291: (Ex)citações (4): Pinto Leite, em Bambadinca, dois dias antes de morrer em desastre de helicóptero: Não há solução militar ), trocámos, na nossa Tabanca Grande, os seguintes mails:


(i) José Martins:

(...) Nas consultas que tenho efectuado para organizar os meus elementos para a Nova Crónica dos Feitos da Guiné, para o que tenho consultado vários elementos e de diversa proveniência, o que tenho registado é o que reproduzo abaixo:

25 de Julho de 1970 - Queda de um helicóptero na Guiné, de que resultou a morte dos deputados José Pedro Pinto Leite, Leonardo Coimbra, Vicente de Abreu e Pinto Bull.

(ii) Luís Graça:

Zé: E o pessoal do heli ? Pelo menos, dois (piloto e Melec)... Sei que ao todo morreram 6, incluindo os 4 deputados... O heli seria um Allouette III ? Os militares, da FAP, não constam na Lista dos Mortos do Ultramar...(Só vi lista da Liga dos Combatentes).

Julgo que o heli desapareceu nas águas lodosas do Rio Mansoa. Não terá havido sobreviventes. Seria muito pouco provável. A FAP deve ter feito um inquérito...

O PAIGC chegou a reivindicar, segundo o Leopoldo Amado, o abate do aparelho. Mas sabe-se hoje que isso era mera propaganda... Subsiste a tese do acidente provocada pelo tornado... A sabotagem era improvavel... Só o Leite Pinto, creio eu, era da "ala liberal" da Assembleia Nacional, e ainda por cima amigo pessoal do Marcelo Caetano (ou, pelo menos, seu antigo aluno brilhante). Mas o irmão, Vasco, do malogrado deputado, no livro de 2003 (que eu não li), acho que explora outras hipóteses... A FAP nunca terá esclarecido, publicamente, as circunstâncias do acidente... Se sim, porquê ? Pressões do poder político de então ?

Talvez o Jorge ou o Victor possam acrescentar algo mais...

Um Alfa Bravo. Luís

(iii) Jorge Félix:


Caro Luis Graça:

Contador de Histórias e narrador de feitos gloriosos, tivemos um. O seu nome serviu para, num trocadilho bem ao jeito da época, definir o autor e os feitos.
- Fernão, Mentes ?
- Minto !!!

Antes de contar o que sei, sobre o assunto que me é pedido informar, gostaria de vissem nisto a minha Recordação do acontecimento.

Ter estado na FAP não dá o direito, meu ou de outro qualquer, de Latinisar sobre o que aconteceu na Força Aérea.

Sobre este assunto, acidente de Helicóptero no rio Mansoa, de onde resultou a morte do piloto e mecânico, mais quatro ocupantes, (era assim que nós viamos os acidentes), tenho duas coisas a acrescentar para o nosso Blogue.

(a) Mediante os parcos conhecimentos de metereologia que tínhamos na altura, o que acontecia na Guiné , chuvas intensas, trovoadas, ventos fortes, era, na época das Chuvas, considerado por nós como "mau tempo". Nunca se lhe deu o nome de Tornado. Voavamos dentro do mau tempo, e a fugir do mau tempo. Havia situações, se bem se lembram, em que o dia se transformava em noite. As descargas eléctricas transformavam o mais profundo breu numa África luminosa. A água jorrava de tal maneira que o céu confundia-se com o mar. Cuidados acrescidos tinham que ser tomados nestas alturas, quando era difícil saber onde acabava o céu e começava o mar. Naquele dia, foi isto que aconteceu. O acidente deu-se porque a chuva era intensa, o rio transbordou para o Céu.

(b) Um dia, em Julho de 1970, quando dava instrução em Tancos a futuros Pilotos de Helicópetros, disseram-me o seguinte:
- O teu substituto morreu num acidente no Mansoa!

Luis Graça, o Piloto, por artes mágicas, na altura esqueci o nome, tinha dois meses de experiência de voo na Guiné. Se foram feitos inquéritos ao acidente, este pequeno pormenor deve ter sido indicado. Pouco mais há a dizer sobre isto, a não ser que Fernão Mendes Pinto esteja a perder estatuto.

Um destes dias vamos Guiné ver os Jagudis a deambular naqueles Tornados.

Jorge Félix

(iv) Carlos Vinhal:

Caros companheiros

Na HU [História da Unidade] da CART 2732 consta:

24JUL - Desenrolou-se a Op Fechadura destinada a fornecer a necessária segurança à deslocação de um grupo de deputados à Assembleia Nacional, entre Nhacra e Mansabá. A CART foi empenhada a 4 Gr Commb.

Digo eu: Lembro-me perfeitamente de acompanhar (eu não era operacional à época, logo estava no aquartelamento) estas personalidades que estiveram alguns momentos em Mansabá. Lembro-me de, porventura no dia seguinte, se ouvir notícias do acidente.

Consultei um livro, editado em fascículos pelo DN, e na pág. 490 refere que o acidente se deu no dia 26 de Julho de 1970. Seguiam 3 helicópteros que foram apanhados por chuva intensa. Dois conseguiram poisar nas margens do rio Mansoa e um terceiro caiu. São mostradas 3 fotos, uma delas mostra a recuperação do heli sinistrado.

É o que sei.
Um abraço para os meus amigos.

(v) César Dias:

Sobre o post 3291, recordava-me de ter visto uma referência ao acidente dos Deputados na História da Unidade. É um facto que lhes foi preparado o terreno para se deslocarem por ali com alguma segurança.

Mas quanto à data exacta, ficamos na mesma, pois a Operação Fechadura, levada a cabo para proteger os Deputados, foi efectuada no dia 24 de Julho de 1970, pelo que seria muito possível que o acidente tivesse sido a 25.

"Em 24JUL70, desenrolou-se a Operação Fechadura, destinada a fornecer a necessária segurança à deslocação de Deputados à Assembleia Nacional, entre NHACRA e MANSABÁ. Foram empenhados 3 Gr Comb da CCAÇ 2588, 2 Gr Comb da CCAÇ 2589, 4 Gr Comb da CCAÇ 15, 4 Gr Comb da CART 2732, 3 Pel Mil e ainda um Pelotão de Autometralhadoras PANHARD atribuído como reforço ao BCAÇ 2885."

Lembrei-me de vos enviar esta informação, pois este episódio teve lugar na zona do BCAÇ 2885.


(vi) Jorge Félix

(...) Está aqui tudo. Acidente, chuva intensa, (quanta não havia) e a data. Não te falei no meu mail anterior que por vezes "encostávamos" numa bolanha até o mau tempo passar, porque podias achar "pretenciosismo". Os pilotos mais experientes mandavam-se para o chão, até o "tornado" passar.

Agora, vamos ficar por aqui. Ponto final.

Jorge Félix

(...)

8 comentários:

Anónimo disse...

Luís,
ao fazer umas pesquisas sobre a Guiné-Bissau, deparei-me com o vosso blog e como não podia deixar de ser procurei info sobre o acidente de 25 de Julho de 1970, o qual vitimou o meu Avô James (Pinto Bull) que, infelizmente, eu nunca viria a conhecer.
E não posso deixar de esclarecer e garantir-lhe (e aos demais participantes/intervenientes do blog) que o acidente ocorreu exactamente na data que mencionei - 25 DE JULHO DE 1970. O meu Pai, inclusivamente, prestava serviço militar na altura na Guiné-Bissau, tendo ele próprio participado nas buscas do aparelho e dos corpos (também o do seu própria Pai).
Documentos disponibilizados pela COLOREDO (Comissão Eventual para Localozação e Recolha de Dcumentação da Marinha sobre a sua Acção nas Operações Militares em África e Timor - 1967/75) com base em documentos nela existentes e no Arquivo Geral da Marinha e em depoimentos prestados por alguns dos intervenientes na operação também o confirmam.
Transcrevo um excerto do livro «O Sonho Desfeito - Quanto Vale a Vida de um Homem?», de Vasco Pinto Leite, irmão do Dr. Pinto Leite falecido também no acidente:
"(...) Dia 25 de Julho de 1970

Cerca das 15.00 horas ocorreu a queda de l helicóptero da FAP quando voava de Teixeira Pinto psra Bissau e foi atingido por um forte tornado. (...) pilotado pelo alferes miliciano Pil. Av. da FAP Francisco Lopes Manso e fazia parte duma formação de 3 helicópteros comandada pelo Cap. Pil. Av. Cubas, que pilotava um dos helicópteros, sendo o terceiro pilotado pelo alferes miliciano Pil. Av. Coelho.
O helicóptero sinistrado transportava como passageiros:
- 4 deputados à então Assembleia Nacional (Dr. James Pinto Bull, Dr. José Pedro Pinto Leite, Dr. Leonardo Coimbra e José Vicente de Abreu).
- Capitão de cavalaria Carvalho de Andrade, oficial de ligação do Comando Chefe das fOrças Armandas da Província da Guiné.
Posteriormente viria a verificar-se que o helicóptero tinha caído nas águas do Rio Mansoa, em 20mt de fundo, a Este da Ilha de Lisboa, ou seja, entre esta e a Ilha de Bissau."
Buscas ocorreram nos dias seguintes (segundo cópias de documentos constantes no livro), terão sido resgatados das águas lodosas dois corpos identificados como sendo do Dr. Leonardo Coimbra e do Cap. Carvalho de Andrade, e os detroços do aparelho, estes últimos entregues à FAP a 30 de Julho. Uma das lanchas envolvidas nas buscas, "a LPG "Cassiopeia" manteve-se na área até ao dia 2 de Agosto, fazendo buscas sistemáticas das águas do Mansoa entre as ilhas de Lisboa e de Bissai mas nada mais viria a encontrar. (...) botes voltaram por vezes às zonas das buscas, em observação, mas nada mais encontraram."
Mas, de facto, e com muita pena minha e concerteza de todos os familiares das vítimas deste desastre, nunca houve nenhum INQUÉRITO. No livro, Vasco Pinto Leite afirma ainda "(...) Três dias depois da tragédia, em 28 de Julho de 1970, morre Salazar, e as atenções da Comunicação Social passam para 2º plano o impacto com o desastre da Guiné. Daí para a frente, os brandos costumes portugueses fizeram o resto", inclusivamente "o inquérito que não foi feito" sublinha o autor!

Espero ter elucidado e respondido a algumas dúvidas.

Na imaginação desenho ainda hoje o meu retrato do meu Avô que quis o destino (ou não) que eu nunca tivesse conhecido, e na memória ficam, para além da enorme tragédia, histórias e relatos maravilhosos da minha Avó principalmente, mas também de outras pessoas que tiveram a felicidade de se cruzarem na vida com o meu Avô e com quem também eu me tenho vindo a cruzar!


Sofia Pinto Bull

Carlos Coelho - FRITZ disse...

Por hoje só quero esclarecer um pequeno detalhe, o terceiro helicóptero era pilotado pelo Furriel Mil.Pil.Av. Coelho - Carlos Coelho - mais conhecido por Fritz.
Dentro em breve voltarei à vossa presença para tentar dar algumas respostas às perguntas que pairam sobre o que se passou naquela tarde.
Carlos coelho - FRITZ

mls disse...

Por princípio pessoal de que não abdico, evito integrar debates públicos que envolvam mortos em combate ou por acidente, militares ou não, no respeito pela sensibilidade e privacidade a que, cada um ou famíliares, têm direito próprio pelos traumas e perdas sofridas.

No meu caso, limitarei sempre o relato a factos documentados oficialmente mas que podem, mais tarde, vir a ser complementados ou até corrigidos, por pesquisa e investigação, com recolha de novos dados.

Com as palavras acima, não pretendo defender a exclusão de possíveis colaborações, de quem quer que seja, no esclarecimento de factos mas sempre a pedido dos interessados, neste caso diga-se familiares.

Desde o primeiro post publicado sobre este tema que nunca opinei sobre o assunto, por não o entender conveniente.

De qualquer das formas, documentadamente, o acidente teve lugar no dia 25 de Julho de 1970 e nas operações de busca e salvamento que se prolongaram até dia 30, participaram diversas unidades navais.

Manuel Lema Santos

Jorge Narciso disse...

Ola Coelho (Fritz)

Eu sou o Jorge Narciso era mecanico nos helis e coabitamos neles na Guiné.
Não sei se te lembras de mim, mas folgo reencontrar-te.
Também eu emiti um comentário (ao post da Sofia Bull) acerca do acidente que ficará a léguas do que poderás dizer enquanto interveniente directo no que aconteceu. Fico à espera.
Recebe um abraço

Fernando Vouga disse...

Eu estive na Guiné nessa altura, em Bafatá e, como comandante do ERec2640, escoltei os deputados e respectiva comitiva de Nova Lamego até Bambadinca no dia 21 de Julho de 1970. Dias depois, deu-se o acidente. Tenho a acrescentar que além do pessoas fa FAP, morreu o capitão Andrade de Cavalaria.

DOMINGOS GRILO disse...

Nha parente: Domingos Grilo ex, Esp/M.Rádio na BA12 conheci e voei com Furriel/Piloto Fritz (Coelho) e lembro o Alf./Piloto Xavier. Do acidente recordo a morte do Alf./Piloto Manso casado de fresco e que teria pouco mais de 1 mês na base. Foi o único elemento da FA falecido. O héli pilotado pelo Cap./Piloto Ricardo Carvalho Cubas acompanhado pelo Esp/MElec Caciano escapou devido à experiência, e à sorte, pois outro héli passou a rasar por eles. Frente de mau tempo, muita chuva, e a voar sobre o rio deve ter confundido o malogrado Alf.Manso, um tipo pacato e bacano. Da obcessão em cumprir a missão, (militarista como era) o Cap/Cubas (agora Major/General se ainda vivo) poderá ter contribuído para o fim trágico que sabemos. O que aqui deixo não foi dito, pelo Cap/Cubas nem pelos desaparecidos.
Ao dispor. Cumprimentos

DOMINGOS GRILO disse...

Peço desculpa pela troca do nome. É Alf./Piloto Felix e não Xavier.

Fernando Rosa disse...

No dia 25 de Julho de 1970, pelas 11horas da manhã, andávamos nós (6) na LDM 308 (Lancha de Desembarque Média) num "cruzeiro" de 30/40 dias, como era habitual, patrulhando o rio Mansoa, quando fomos sobrevoados por três Helicópteros no sentido Bissau-Teixeira Pinto.
Pelas 17horas, como Radiotelegrafista da Lancha, recebo uma mensagem a informar-nos que tinha desaparecido um Helli, para procedermos as buscas no rio e nas margens para encontrarmos alguns vestígios de possíveis sobreviventes (ainda não se sabia se tinha caído).
Passados dois dias, localizámos um corpo a flutuar e enviei de imediato mensagem para Bissau. Recolhemos o corpo e pela documentação na carteira que trazia no bolso das calças verificámos que se tratava do Dr. Leonardo Coimbra. Informei Bissau e transportámos o corpo para o cais de João Landim onde se encontrava uma ambulância que o levou para Bissau.
Continuámos as buscas para encontrar mais corpos durante 15 dias e só uma vez quando vínhamos a descer o rio e em maré baixa, mas já de noite, sentimos um cheiro de algo morto, mas não podíamos fazer luz e voltámos na manhã seguinte, àquela zona, por várias vezes, e já não conseguimos ver nada (possivelmente estaria ali um corpo!).
Passados oito dias da queda do Helli, uma avioneta ao passar, visualizou uma mancha de óleo junto à ilha de Lisboa (no rio Mansoa). Foram enviados mergulhadores para o local e de facto era o Helli que estava a cerca de 10 metros de profundidade. Mandou-se vir uma LDG (Lancha de Desembarque Grande) com uma grua e retirou-se o Helli. Não havia ocupantes dentro do Helli. Também não havia indícios de incêndio ou de alguma explosão (Assisti à sua recuperação e tirei fotos).
Viemos a saber que a tripulação do Helli era composto pelos: piloto Alf.Mel. Francisco Lopes Manso, Cap. Carvalho de Andrade, os quatro deputados da Assembleia Nacional (da Ala Liberal ?) Dr. José Pinto Leite, Dr.James Pinto Bull, Dr. Leonardo Coimbra e José Vicente de Abreu.
Soubemos que além do corpo que resgatámos de Leonardo Coimbra, também apareceu o do cap.Carvalho de Andrade e falou-se que teria sido encontrado também o do piloto(?) perto de Teixeira pinto num qualquer afluente.
De facto pelas 15 horas (hora da queda) fazia-se sentir um tornado naquela zona o que tudo indica que teria sido a causa da tragédia. Tragédia que não foi muito divulgada na Metropole até porque três dias depois morre Salazar, passando a ser a notícia mais importante!
Existe um livro publicado pelo Irmão do Dr. José Pinto Leite, Vasco Pinto Leite que aconselho a ler aqueles que se interessam por este assunto. " O Sonho desfeito-Quanto vale a vida de um homem"

Fernando Rosa - 41/68 Mar. C.
Guiné 1969/71