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domingo, 28 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25454: Notas de leitura (1686): Timor Leste, que já foi lugar de desterro e encarceramento (Luís Graça)


Timor Leste > Com c. 15 mil km2, e mais de 1,3 milhões de habitantes, ocupa a parte oriental da ilha de Timor, mais o enclave de Oecusse e a ilha de  Ataúro. Independente desde 2002, esteve sob a brutal ocupação da Indonésia durante 24 nos.   




Timor Leste > 2005 > A Ilha de Ataúro, vista de Dili >  Foto de Hu Yui. Fonte: Wikipédia (com a devida vénia...)


Nota de leitura > Marisa Ramos Gonçalves: 

«A ilha-prisão de Ataúro durante a ocupação indonésia de Timor-Leste: histórias de encarceramento, resistência e legados contemporâneos»

e-cadernos CES [Online], 37 | 2022, posto online no dia 02 novembro 2022, consultado o 18 abril 2024. URL: http://journals.openedition.org/eces/7084; DOI: https://doi.org/10.4000/eces.7084

Marisa Ramos Gonçalves é investigadora do CES - Centro de Estudos Sociais | Universidade de Coimbra | marisagoncalves@ces.uc.pt

Fez o seu doutoramento, em 2016, na Universidade de Wollongong, Wollongong, Australia.  (Título: “Intergenerational Perceptions of Human Rights in Timor-Leste: Memory, Kultura and Modernity” (Perceções Intergeracionais de Direitos Humanos em Timor Leste: Memória, Cultura e Modernidade).  Tese de Doutoramento em Filosofia, Faculty of Law, Humanities and the Arts, School of Humanities and Social Inquiry, University of Wollongong, Wollongong, Australia.)

 
I. Da leitura deste artigo, interessa-nos, no âmbito do nosso blogue, destacar as referências, que ainda são muito escassas, a esta antiga colónia portuguesa que foi Timor. E mais ainda,  Timor como lugar de desterro e encarceramento, desde o séc. XVIII (quando há notícias dos primeiros desterrados, se bem que nenhum ainda fosse europeu). 

Muitos portugueses sabem da brutal  invasão, ocupação e anexação  de Timor Leste com a consequente tentativa de genocídio do povo maubere,  em finais de 1975, tornando-se o território na 27ª província da Indonésia.

Mas muitos  desconhecem que "durante o período colonial indonésio" (sic),  "os colonizadores usaram a ilha para confinar as famílias de membros da resistência em campos de concentração abertos, mas com vigilância militar apertada. Estima-se que, entre 1980 e 1987, tenham sido presos cerca de 6000 timorenses, tendo algumas pessoas morrido devido à fome e má-nutrição."

Por outro lado, mesmo habituados, desde os bancos da escola, a repetir "ad nauseam" que vivíamos num Portugal, que ia "do Minho a Timor", nós sabíamos muito pouco (e continuamos a não saber) da história e da geografia de Timor e da presença histórica dos portugueses naquela ilha do sudoeste asiático, de resto escassa até ao séc. XIX, circunscrita a alguns pontos no litoral e sobretudo à ação de missionários e militares.

Este artigo centra-se neste período  da invasão, ocupação e anexação indonésai (1975-1999), sobre o qual vamos passar por alto (o leitor interessado tem acesso ao artigo completo) , bem como sobre a parte teórica ( "estado da arte sobre o tema", a colónia penal como sistema carcerário ou concentracionário e as memórias das suas vítimas ),  a parte metodológoca (utilização dos testemunhos das vítimas do conflito e entrevistas de história oral) bem como a bibliografia. 

Interessa-nos recuar até Ataúro do tempo dos portugueses, e nomeadamente nos anos 20/30 do séc. XX.

Vamos citar algumas excertos,  mais extensos,  e elaborar uma primeira nota de leitura deste artigo,  dispensando as referências bibliográficas,  dada as limitações de espaço num blogue como este, dirigido não a académicos e especialistas mas a antigos combatentes das guerras coloniais.


II. Vejamos o resumo do artigo:

(...) "A ilha de Ataúro, situada a norte da capital de Timor-Leste, funcionou como ilha-prisão durante o período colonial português e, de forma mais intensa, a partir dos anos vinte do século passado. 

"Durante o período colonial indonésio (1975-1999), os colonizadores usaram a ilha para confinar famílias de membros da resistência em campos de concentração abertos, onde centenas de pessoas morreram devido à fome e má-nutrição. 

"Partindo de uma análise de entrevistas e de material de arquivo sobre as/os antigas/os deportadas/os em Ataúro no período indonésio, este artigo conclui sobre a relevância da preservação das histórias orais sobre as/os prisioneiras/os, bem como da memorialização das histórias desta ilha. 

"O texto reflete, igualmente, sobre memórias e legados coloniais, partindo da observação de que algumas ilhas da região do Pacífico permanecem territórios considerados depósitos e locais de detenção de pessoas que fogem à repressão e violência de regimes ditatoriais e coloniais." (...)

E aqui fica também o índice do artigo (com os respetivos links), para o leitor que tiver mais tempo e vagar:

Introdução
Conclusão

O  texto integral pode ser aqui descarregado, em formato pdf.  PDF 340k. E pode ser utilizado sob licença CC BY 4.0


III. Insularidade e desterro
 
A autora começa por lembrar que a "insularidade", ao longo do tempo e nos mais diversos lugares, tem sido  um "meio de confinamento natural", adoptado por regimes ditatoriais e coloniais,  para deportar e banir inimigos políticos, muitas vezes "sem direito a julgamento ou condenação formal!"...Mas também presos de delito comum.

Os desterrados (muito mais homens do que mulheres) eram, além disso, uma preciosa  fonte de mão-de-obra nas colónias, em todos os impérios coloniais, a começar pelo Britânico.

No nosso caso, "Timor-Leste integrou, desde o século XVIII, o sistema carcerário do império português" (a par das ilhas atlânticas, bem  como Angola e Moçambique):  para lá,  eram enviados militares e civis,  opositores políticos, mas também prisioneiros de delito comum ("deportados sociais)".

A ilha de Ataúro fez parte deste sistema carcerário  durante os vários  períodos coloniais:  português (1702-1975), indonésio (1975-1999), sem esquecer o curto mas não não menos brutal período de ocupação japonesa (1942-1945).  

(...) "A ilha de Ataúro funcionou como ilha-prisão, em particular nos anos vinte e trinta do século XX, quando foi usada como local de deportação de opositores políticos e prisoneiros de delito comum, denominados deportados sociais" (...)  

Ataúro, sendo uma ilha, a norte de Dili, separada por 25 km de mar, não precisava de arame farpado nem muros. Era difícil, ou quase impossível, escapar.

 Na segunda parte do artigo,  a autora apresenta  uma sucinta introdução histórica da colónia penal de Timor , durante o século XX, "em particular os campos de internamento de deportados políticos e sociais provenientes da metrópole e de outros locais do império,  na ilha de Ataúro e no enclave de Oécussi."  

Mas o objetivo principal do artigo é mostrar "a relevância da memorialização das histórias da ilha de Ataúro, através da preservação das narrativas orais" quer dos prisioneiros quer dos seus  habitantes.
 
IV. Ilhas-prisão – Políticas carcerárias dos impérios à atualidade

Algumas ilhas que hoje aparecem nos cartazes das agências turísticas como "paradisíacas", foram no passado espaços carcerários ou concentracionários, criados  pelos sistemas coloniais.  

Os vários  impérios europeus  fizeram dessas ilhas (em geral tropicais ou subtropicais) lugares de desterrro e encarceramento:
  • a França criou as ilhas-prisão da Nova Caledónia, da Cayennne ou Ilha do Diabo na Guiana, das ilhas Reunião e Côn So’n no Vietname;
  • a Grã-Bretanha fez uso da Tasmânia, na Austrália; 
  • a Holanda,  da ilha Nusakambangan nas Índias Orientais Holandesas, atual Indonésia...

 Havia várias tipologias destes lugares:
  • colónias penais, 
  • colonatos,
  • entrepostos, 
  • colónias agrícolas, etc.

No arquipélago dos Bijagós, havia por exemplo a colónia penal e agrícola da Ilha da Galinhas, criada em 1934 (ou pelo menos já existente nessa data), Em Cabo Verde, foi criado o "campo penal" do Tarrafal (1936-1957), reaberto depois como "campo  de trabalho" de Chão Bom (1961-1974) ...


A investigadora  debruça-se depois sobre a ilha-prisão  de Ataúro como local de deportação e degredo no século XX, e nomeadamente nas décadas de 1920 e 1930,   periodo sobre o qual há "mais dados e estudos académicos".

Ficamos a saber que Timor só obteve o estatuto de distrito autónomo em 1896: dependia originalmente do Estado da Índia (Goa) e, posteriormente, de Macau.

Situado na periferia do império, no sudoeste asiático, era visto "como um espaço insular e longínquo da metrópole e de outros centros administrativos do império, como Goa e Macau".

Ser desterrado para Timor  era, pois,  uma condenação pesadíssima, tanto para civis como para militares.

Em 1897 já existia uma cadeia civil, na comarca de Díli, para presos não- indígenas. Dezasseis anos depois, em 1913, foi criado o Depósito dos Degredados de Timor, que recebia maioritariamente macaenses, que vão representar uma importante força de mão-de-obra.  

 Em 1927, existiam três estabelecimentos prisionais:  o depósito de degredadas de Aileu, a colónial penal de Taibesse e a Cadeia da Comarca, em Díli,  para além de três presídios militares (Aipelo, Batugadé e Baucau) e os “campos de concentração” de Ataúro e Oécussi.

No período de 1927-1931, os deportados portugueses  distribuíam-se por várias colónias do império:
  • S. Tomé e Príncipe (29),
  • Guiné-Bissau (46).
  • Angola (456),
  • Cabo Verde (334),
  • Timor (500)
 
(...) Na ilha de Ataúro e no enclave de Oécussi, os denominados 'campos de concentração', foram considerados 'locais malditos', onde os prisioneiros estavam expostos às chuvas e temperaturas elevadas, com dietas pobres, muitos morrendo de malária e desnutrição" (...)
 
Entre 1927 e 1933, e na sequências das revoltas contra a Ditadura Militar e o Estado Novo, chegaram ao território timorense  algumas centenas de jovens,  socialistas, comunistas e anarcossindicalistas, acusados de serem os principais instigadores e participantes no atentado ao comandante da polícia de Lisboa, João Maria Ferreira do Amaral (1876-1931), alguns por alegadamente pertencerem  à rede bombista "Legião Vermelha", e outros na sequência do movimento revolucionário de 26 de agosto de 1931.

Sabe-se, oor outras fontes, que no ano de 1927, a população europeia de Timor era de 11 ocidentais estrangeiros e 378 portugueses, grande parte funcionários estatais, ou elementos das missões católicas,  além de 155 naturais originários de outras colónias.

Ora entre 1927 e 1933, terão passado por Timor  cerca de 600 deportados, quase o dobro da população civil europeia  ali residente.
 

Houve, entretanto,  uma  amnistia política geral, em 1932, para os vários deportados políticos nas diferentes colónis. A maioria  dos  prisoneiros em Timor regressou à metrópole, mas outros puderam ficar em liberdade no território.  


De fora ficou uma lista dos 50 prisioneiros considerados  “mais perigosos”, bem como os "deportados sociais" (presos de delito comum).

(...) "110 homens deportados originalmente em 1927 ficaram dispersos pelo território, constituindo famílias das quais descendem várias figuras da elite política atual de Timor-Leste.(...)

A ilha de Ataúro continuou a servir de prisão depois da ocupação japonesa de Timor, no pós-guerra. Os presos passaram a ser os timorenses que colaboraram com os ocupantes.

 A talhe de foice refira-se, por fim,  que durante a 
  ocupação indonésia de Timor-Leste " estima-se que entre 100 000-200 000 timorenses tenham perdido a sua vida em resultado do conflito e das políticas repressivas da administração militar indonésia, marcada por massacres, assassinatos de membros da resistência militar e civil, práticas planeadas de deslocação forçada e fome das populações, prisões arbitrárias e tortura." (...) 

Como é dos manuais da guerra contra-subversiva,  o governo de Suharto , através do seu exército invasor e ocupante, procurou retirar o apoio que a população dava às FALINTIL  – Forças Armadas de Libertação Nacional de Timor-Leste, a resistir nas zonas montanhosas, para isso criando "campos de trânsito e internamento para essa população".  E, entre outras medidas repressivas, proibiu o uso da língua portuguesa. (**)

O maior destes campos era o da ilha de Ataúro. (A ilha tem 25 km de extensão por 9 km de largura, cerca 117 km² de superfície, e uma população atualmwnte  à volta de 10 mil habitantes.)

Para saber mais ler: A ilha-prisão de Ataúro no período da ocupação Indonésia
 
 ____________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 26 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25448: Notas de leitura (1685): O Santuário Perdido: A Força Aérea na Guerra da Guiné, 1961-1974 - Volume II: Perto do abismo até ao impasse (1966-1972), por Matthew M. Hurley e José Augusto Matos, 2023 (22) (Mário Beja Santos)
 
(**) "Os 24 anos da ocupação indonésia tornaram o bahasa a língua do ensino e da administração. O português foi banido, e a forma de resistir à total aculturação foi desenvolver a mais disseminada das línguas locais, o tétum. Fê-lo, principalmente, a Igreja Católica, que assumiu o protagonismo da resistência cultural e simbólica.'

"Chegada a independência, há uma geração (todas as pessoas com menos de 30 anos, o que constitui a esmagadora maioria da população) que não fala português. Aprendeu bahasa Indonésia e inglês como segunda língua e fala tétum em casa, além de alguma outra língua timorense, como o fataluco ou o baiqueno. É a chamada geração 'Tim-Tim, do nome Timor-Timur, que os indonésios davam à sua 27.ª província." (...)

in Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/artigos/rubricas/idioma/portugues-tetum-ou-tetugues/1178 [consultado em 27-04-2024]

sábado, 27 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25450: 20.º aniversário do nosso blogue (12): Alguns dos melhores postes de sempre (VII): Guileje, "colónia penal militar", com pelo menos meio século de história? (Nuno Rubim, 1938-2023)


Guiné > Região de Tombali > Guileje > Outubro de 1968 > "Guileje, Colónia Penal, Terra Ingrata, de Mau Signo, Terra de Bandidos, Terra da Fome"... Nesta altura, a unidade de quadrícula de Guileje era a CCAÇ 2316 (Mai 1968/Jun 1969).

Foto (e legenda) : © Gabriel Chasse / Nuno Rubim (2008). Todo os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Mapa do Sul da Guiné no Final do Séc XIX, segundo Pélissier (vd. René Pélissier - História da Guiné: Portugueses e Africanos na Senegâmbia, 1841-1936. 2ª ed. Lisboa: Editorial Estampa. 2001. 2 volumes).  Cortesia de Nuno Rubim (2008)
  

Pormenor do mapa (ou carta) de Guileje (escala 1:50000): no quadro das Convenções, pode ler-se que há um símbolo que representa as aldeias abandonadas, como é o caso de Sare Morsô... Só um estudioso como o Nuno Rubim era  capaz de ter olho clínico para estes detalhes que escapam à vista desarmada do leigo...

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2024)


1. Excertos de três mensagens do nosso saudoso Nuno Rubim (1938-2023), coronel de artilharia na reforma, historiador militar, esteve em Guileje, à frente de duas unidades, a CCAÇ 726, Out 1964/Jul 1966, e a CCAÇ 1424, Jan 1966/Dez 1966; foi ainda cmdt da CCmds CTIG, em 1965; e voltou ao CTIG nos anos 70.

No 20.º aniversário do nosso blogue, apraz-nos recordar aqui o que ele escreveu sobre "Guileje, colónial penal" (sic)...


Guileje, "colónia penal militar",  com pelo menos meio século de história? 

(1) Durante anos, após a minha permanência em Guileje, ouvi referências sobre o facto de serem enviados para lá militares punidos ou indesejados de outras unidades do CTIG [Comando Territorial Independente da Guiné].

Apesar de ter tido uma experiência pessoal que parece ter confirmado este facto, só agora descobri, no AHM [Arquivo Histórico Militar], um documento oficial que esclarece totalmente a questão !

Mensagem Com-Chefe, Guiné, Dezembro 1969.

Retransmitido pelo Batalhão de Artilharia 2865, reponsável pelo Sector S3 (nessa altura em Catió), que englobava o subsector de Guileje. (AHM )

Por determinação superior “… Considerada a situação de Guileje, cancelamento de mais transferências por motivos disciplinares para aquela guarnição” !!!



(ii) Trago à liça mais uns elementos que consubstanciam essa tese.

Porque vem de longe ... Pélissier, no 2º volume da sua obra sobre as guerras na Guiné, escreve, na página 191:

"Em 1916, um dos tenentes de Abdul Injai, Alfa Modi Saidou, foi convidado a instalar-se em Guileje com 300 a 400 indígenas franceses provenientes dos bandos de Abdul Injai. As mulheres seriam exclusivamente prisioneiras feitas durante a campanha de 1915." 

Ora isto sucede numa altura em que já tinham terminado as negociações entre Portugal e França que tinham definido as fronteiras na região (1906). (Vd. Mapa, acima).

Cabe aqui abrir um parêntese. Toda a região a Leste de uma diagonal traçada no eixo do rio Cacine, para NE até perto do Rio Balana, pertencia à Guinée, colónia francesa [hoje Guiné-Conacri]. Por isso aparecem no mapa supra as designações de Poste Français [posto francês] em Caconda e Cacine. 

Aquando da delimitação de fronteiras, essa região passou para o domínio português, por troca com a zona do Casamansa no Senegal.

Pormenor do mapa (ou carta) de Guileje (escala 1:50000): no quadro das Convenções, pode ler-se que há um símbolo que representa as aldeias abandonadas, como é o caso de Sare Morsô... Só um estudioso como o Nuno Rubim é capaz de ter olho clínico para estes detalhes que escapam à vista desarmada do leigo... (LG).

Mas a anterior linha fronteiriça era praticamente inexistente, não se sabendo realmente as áreas que pertenciam a cada país. Ora constatei, com surpresa, que, segundo Pélissier / vol. II, pp 60- 69, os portugueses instalaram em Sare Morsô, em 1897, um posto militar, a que deram o nome de Posto de D. Maria Pia (como era uso na altura, em quase todas as colónias portuguesas, nomes de rainhas ou princesas ) e que só foi desguarnecido cerca de 1901.

Surge essa designação, como tabanca abandonada, na carta 1:50000 da Guiné. Quando agora passei pelo chamado cruzamento do corredor [da morte ou de Guileje] ainda tive esperanças de lá poder dar uma saltada (cerca de 2,5 km do cruzamento ), mas infelizmente não tive tempo.

Segundo algumas informações,  o PAIGC teria ali instalado uma base durante a guerra.


(iii) Continuando com a saga de Guileje, Colónia Penal:

Pois parece-me que nos tempos modernos fui eu quem deu continuidade a essa triste fama..

De facto, no final de 1965, enquanto Cmdt da Companhia de Comandos da Guiné e em virtude de um contencioso que se abriu com o Cmdt do CTIG ( relacionado, a meu ver, com a indevida utilização que estava a ser dada aos Grupos de Comandos da Companhia ), tive um dia uma acesa discussão com o referido senhor.

O resultado não se fez esperar ! Mandou-me sair imediatamente do seu gabinete e disse-me que no dia seguinte receberia guia de marcha para seguir imediatamente para Guileje !

Lá fui, pois ... substituir o Cmdt da CCAÇ 726, companhia que na altura já tinha cerca de 16 meses de comissão, em finais de Janeiro de 1966.

Mas isto não ficou por aqui ! Ainda durante a permanência desta companhia em Guileje, chegou a CCAÇ 1424, que a ia render. Pois retiraram-na do comando do seu Capitão, que a tinha formado em Portugal e que o pessoal muito estimava e puseram-na sob as minhas ordens ! Incrível, mas assim aconteceu !

Depois há um vácuo temporal ... ou possívelmente não, mas não me foi dado saber se até 1973 houve mais casos de corrécios despachados para lá ... O que é certo é que me deparei, no AHM [ Arquivo Histórico Militar] com mais dois casos, já em 1973.

Segundo notas da 1ª Rep / CTIG, a 22 de janeiro é transferido do GA 7 para o COP 5, o alf mil art José A. C. Branco da Costa, por motivo disciplinar. E logo a seguir, a 9 de fevereiro, o fur mil op esp Delfim J. Marques dos Santos, é transferido da CCAÇ 3373 para a CCAV 8350, pelo mesmo motivo !

Realmente a inscrição que amavelmente o nosso camarada Gabriel Chasse, que esteve em Guileje, me enviou (ver foto acima ), sintetiza melhor do que quaisquer palavras o que foi o inferno naquele local.

(Seleção, revisão / fixação de texto, negritos: LG)
___________

Notas do editor:

(*) Vd. postes de:


Vd. tamnbém poste de 23 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25432: 20.º aniversário do nosso blogue (9): Alguns dos nossos melhores postes de sempre (VI): Na sua já famosa carta aberta a Salazar e Caetano, de 2010, o 'sínico' António Graça de Abreu recomendava-lhes vivamente a leitura do nosso blogue, lá no além...