1. Mensagem de Rui Silva* (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 16 de Setembro de 2010:
Caros amigos Luís Graça, Vinhal, M. Ribeiro e Briote:
Recebam desde já um grande abraço e o maior desejo de que estejam bem de saúde e boa disposição.
Junto, envio um trabalho que se virem de algum interesse publiquem no Blogue.
Qualquer vossa decisão será sempre bem aceite.
Há mais histórias para contar do meu “Páginas Negras com salpicos cor-de-rosa” (no presente não é o caso) e também dos salpicos alguma coisa.
Mais um abraço.
Até sempre
Rui Silva
2. Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.
DOENÇAS E OUTROS PROBLEMAS DE SAÚDE (ou de integridade física) QUE A CCAÇ 816 TEVE DE ENFRENTAR DURANTE A SUA CAMPANHA NA GUINÉ PORTUGUESA (Bissorã, Olossato, Mansoa - 1965-67)
(I) Paludismo
(II) Matacanha
(III) Formiga “baga-baga”
(IV) Abelhas
(V) Lepra
(VI) Doença do sono
- Não é minha intenção ao “falar” aqui de doenças e outros problemas de saúde que afligiam os militares da 816 na ex-Guiné Portuguesa imiscuir-me em áreas para as quais não estou habilitado (áreas de Medicina Geral, Medicina Tropical, Biologia, etc.) mas, tão só, contar aquilo, como eu, e enquanto leigo em tais matérias, vi, ajuizei e senti.
Assim:
As 4 primeiras, a Companhia sentiu-as bem na pele (ou no corpo); as 2 últimas (Lepra e Doença do Sono), embora as constatássemos - houve mesmo contactos directos de elementos da Companhia com leprosos (foram leprosos transportados às costas, do mato para Olossato nas tais operações de recolha de população acoitada no mato para as povoações com protecção de tropa) –, não houve qualquer caso com o pessoal da Companhia, ou porque estas doenças estavam em fase de erradicação (?), ou porque a higiene e a profilaxia praticadas pela Companhia eram o suficiente para as obstar.
PALUDISMO - I
Esta doença não demorou a entrar na 816 ou não começássemos logo a ser atacados pelo agente causador (o Anopheles) mal pusemos os pés na Guiné.
Pele branquinha e sangue fresco, bom pasto para aqueles sanguessugas.
Os 13 primeiros dias em Brá (trampolim para o mato) foram dormidos sem mosquiteiros. Foi um tal atacar! O pessoal passava a vida a “tocar harpa”, como dizia o meu amigo Furriel Baião (já falecido) ao apontar um camarada a coçar-se desesperadamente com as unhas das mãos, logo ao limiar do dia. Afinal aprendemos todos a tocar harpa (uns mais desesperados que outros). A picada do mosquito, em alguns quase não se via sinais da dita, noutros era cada verdugo(!). Curiosa a reacção tão diversa da epiderme no pessoal. Mas todo o mundo se coçava. Já o nosso Primeiro (1.º Sargento Rodrigues, também já falecido) era alérgico, ou parecia ser, às picadas dos mosquitos, pois era vê-lo à noite (altura do ataque em massa) vestido de pijama de algodão fininho e de chinelos de tira, com o peito desnudado e de calças arregaçadas qual turista usufruindo da frescura da noite. Mosquitos não eram com ele. Seria de ele ser da terra dos presuntos (Lamego) e aqui estaria o antídoto? Fazia-nos cá um asco, pois a maioria à noite vestia-se do pescoço às pontas dos pés para não deixar um milímetro da pele à mostra.
Era um suplício querer desfrutar da frescura da noite e estar vestido quase “à inverno”.
Concluímos que a cor preta nas camisas ou nas meias ainda os atraíam mais.
Vínhamos então a saber que era através da picadela do mosquito que podíamos apanhar o Paludismo.
O meu amigo açoriano Furriel Vieira dormia todo vestido, isto ainda em Brá e, como se disse, sem mosquiteiros. As meias verdes militares, compridas, apanhavam as calças do pijama bem até cima e uma outra meia fazia de gorro. Só ficavam as narinas e a boca ao ar livre… para respirar. O medo não era do Paludismo mas sim o da irritação
Que quadro! Aquele calor e um homem todo tapado. Mas dormia, dormia até mais do que os outros.
Havia mosquitos por todo o lado, todos de longa palhinha para nos sugar. Apareciam mais à noite, muitos mais perto das Bolanhas e de outras águas estagnadas. E Uaque, mais lá para diante na comissão, com água por todo o lado. O rio ali tão perto e bolanhas alagadiças por todo o lado.
Ali em Uaque os mosquitos eram às carradas e até o “Lion Brand” dava a impressão que os alimentava.
Quando deixamos Brá para Bissorã aqui já passamos a ter mosquiteiros.
Houve vários casos de Paludismo na Companhia, mas, que eu soubesse, ninguém precisou de ser hospitalizado. Da Icterícia já não se podia dizer o mesmo e no Hospital via-se por ali muita gente amarelinha, alguns em trânsito para a metrópole para uma cura mais cuidada. De comprimidos a injecções, o Paludismo desaparecia logo, o que era preciso era ser bem diagnosticado, o que não parecia difícil, e a terapêutica, logo aplicada, era eficaz.
Era corrente dizer-se que até 38º de temperatura uma dose de comprimidos chegava. Para além daquele valor só de injecção.
Apenas conheci (foi-me contado) um caso de morte por Paludismo e no Hospital Militar de Bissau, que foi de um Fuzileiro que morreu do Paludismo.
Dizia-se que só se morria por desleixo ou incúria, por pavor a injecções e outras fobias, isto é, se se deixasse andar…
A febre, sintoma típico desta doença, era alta, e por vezes, em casos não valorizados, subia até o mercúrio encostar no valor mais alto do termómetro e então aqui a malta dizia que fulano tinha “rebentado” o termómetro.
O Paludismo era por vezes confundido com Dengue mas julgo que esta doença (viral) de sintomas semelhantes aos do Paludismo (parasitária) era mais uma doença sazonal (após chuvas) enquanto o Paludismo era uma presença constante ou não houvesse mosquitos todo o tempo e a toda a hora.
Às quintas-feiras lá tomávamos a nossa pastilha de Quinino como medida preventiva. O Furriel enfermeiro Molhinho (Ludgero) lá se encarregava disso. Mas havia quem não o tomasse. Fiquei ali a saber que havia quem tivesse aversão à tomada de pastilhas, uma espécie de fobia. Não as conseguiam engolir…
A conclusão que se tirou é que era uma doença perigosa e mortal, mas de cura relativamente fácil, daí…
O que se segue foi retirado da Internet cuja reprodução, com a devida vénia, se pede a autorização devida ao autor
O paludismo (malária) é uma infecção dos glóbulos vermelhos causada pelo mPlasmadiu, um organismo unicelular.
O paludismo transmite-se através da picada do mosquito
Anopheles fêmea infectado, por uma transfusão de sangue contaminado ou então por uma injecção dada com uma agulha previamente utilizada numa pessoa infectada.
Existem 4 espécies de parasitas (
Plasmodium vivax, Plasmodium ovale, Plasmodium falciparum e Plasmodium malariae) que podem infectar os humanos e causar paludismo.
Os medicamentos e os insecticidas têm feito com que o paludismo seja muito raro nos países mais desenvolvidos, mas a infecção continua a ser muito frequente nos países tropicais. As pessoas originárias dos trópicos em visita a outros países ou os turistas que regressam dessas áreas estão por vezes afectados e causarão, possivelmente, uma pequena epidemia.
O ciclo de vida do parasita começa quando um mosquito fêmea pica um indivíduo infectado. O mosquito aspira sangue que contém parasitas do paludismo, os quais chegam às suas glândulas salivares.
Quando o mosquito pica outra pessoa, injecta parasitas com a sua saliva.
Uma vez dentro da pessoa, os parasitas depositam-se no fígado, onde se multiplicam. Amadurecem no decurso de 2 a 4 semanas e depois abandonam o fígado e invadem os glóbulos vermelhos.
Os parasitas multiplicam-se dentro dos glóbulos vermelhos, o que finalmente faz com que eles rebentem.
Plasmodium vivax e
Plasmodium ovale podem permanecer nas células do fígado enquanto vão, periodicamente , libertando parasitas maduros para a corrente sanguínea, provocando ataques com os sintomas do paludismo.
Plasmodium falciparum e
Plasmodium malariae não permanecem no fígado. Contudo, se a infecção não for tratada ou receber uma terapêutica inadequada, a forma madura do
Plasmodium falciparum pode persistir na corrente sanguínea durante meses e a forma madura do
Plasmodium malariae durante anos, provocando ataques repetidos com os sintomas do paludismo.
Sintomas e complicações
Os sintomas costumam começar entre 10 e 35 dias depois de um mosquito ter injectado o parasita na pessoa.
Em geral, os primeiros sintomas são febre ligeira e intermitente, dor de cabeça e dor muscular, calafrios juntamente com uma sensação de doença (mal-estar geral).
Às vezes os sintomas começam com arrepios e tremores seguidos de febre, os quais duram entre 2 e 3 dias; confundem-se frequentemente com a sintomatologia da gripe. Os sintomas subsequentes e os padrões que a doença segue variam para cada tipo de paludismo.
Dados para recordar acerca da malária
- Os medicamentos preventivos não são 100% eficazes.
- Os sintomas podem começar um mês ou mais depois o indivíduo ter sido infectado por uma picada do mosquito.
- Os primeiros sintomas são inespecíficos e costumam confundir-se com os da gripe.
- É importante estabelecer um diagnóstico rapidamente e começar o tratamento, particularmente para a malária por
P. falciparum, que é mortal, chegando a 20% das pessoas infectadas.
No Paludismo por
Plasmodium falciparum pode verificar-se uma alteração da função cerebral, complicação denominada malária cerebral. Os sintomas consistem em febre de pelo menos 40º C, dor de cabeça intensa, vertigens, delírio e confusão. O paludismo cerebral pode ser mortal. Em geral afecta as crianças, as mulheres grávidas e os turistas que se dirigem para zonas de alto risco.
No paludismo por
Plasmodium vivax pode haver delírio quando a febre estiver alta mas, se não for esse o caso os sintomas cerebrais não são frequentes.
Em todas as variedades de paludismo, o número total de glóbulos brancos costuma ser normal, mas o número de linfócitos e de monócitos, dois tipos específicos de glóbulos brancos, aumenta.
Em geral, se o paludismo não for tratado, aparece icterícia ligeira e o fígado e o baço aumentam de volume. É frequente que a concentração de açúcar no sangue (glicose) diminua ainda mais nas pessoas que têm uma grande quantidade de parasitas. Os valores de açúcar no sangue podem descer posteriormente naqueles que são tratados com quinina.
Às vezes o paludismo persiste apesar de no sangue aparecerem apenas números baixos de parasitas. Os sintomas incluem apatia, dores de cabeça periódicas, sensação de mal-estar, falta de apetite, fadiga e ataques de calafrios e febre. Os sintomas são consideravelmente mais ligeiros e os ataques não duram tanto como o primeiro.
Se um indivíduo não receber tratamento, os sintomas do paludismo por
Plasmodium vivax, por
Plasmodium ovale ou por
Plasmodium malariae regridem espontaneamente em 10 a 30 dias mas podem recorrer com intervalos variáveis. O paludismo por
Plasmodium falciparum é mortal, chegando a 20% dos afectados.
A febre hemoglobinúrica é uma complicação rara do paludismo causada pela ruptura de uma grande quantidade de glóbulos vermelhos. Em seguida liberta-se um pigmento vermelho (hemoglobina) na corrente sanguínea. A hemoglobina, que é logo excretada com a urina, faz com que esta apresente uma cor escura. Esta febre ocorre quase exclusivamente nos doentes com malária crónica por
Plasmodium falciparum, especialmente nos que foram tratados com quinina.
Diagnóstico
O médico suspeita que um indivíduo apresenta malária quando este tem ataques periódicos de calafrios e febre sem causa aparente. A suspeita é maior se, durante o ano anterior, a pessoa visitou alguma zona na qual o paludismo é frequente e se, além disso, o seu baço aumentou de volume. O facto de se identificar o parasita numa amostra de sangue confirma o diagnóstico.
É possível que sejam necessárias mais do que uma amostra par estabelecer o diagnóstico, porque a taxa de parasitas no sangue varia com o passar do tempo. O resultado do laboratório deve identificar a espécie de
Plasmodium encontrado no sangue, porque o tratamento, as complicações e o prognóstico variam conforme a espécie.
Prevenção e tratamento
As pessoas que vivem em zonas endémicas ou então que viajam para lá devem tomar as suas precauções. Podem utilizar insecticidas com efeitos de longa duração quer dentro das suas casas quer nas zonas anexas, colocar redes nas portas e janelas, usar mosquiteiro sobre as suas camas e aplicar repelente contra mosquitos na pele. Também devem usar roupa suficiente, em particular depois do pôr-do-sol, protegendo a pele o mais possível contra as picadas dos mosquitos.
É possível iniciar algum tipo de medicação para prevenir o paludismo durante a viagem a uma zona endémica. O medicamento começa a ser tomado uma semana antes, continua-se durante toda a estada e prolonga-se durante mais um mês depois de ter abandonado a zona. O fármaco mais frequentemente utilizado é a cloroquina. Contudo, muitas zonas do mundo têm espécies de
Plasmadium falciparum que são resistentes a este fármaco. Outras medicações compreendem a mefloquina e a doxiciclina. No entanto, a doxiciclina não pode ser tomada por crianças menores de 8 anos ou mulheres grávidas.
Nenhuma terapêutica é completamente eficaz no momento de evitar a infecção. Os turistas que tenham febre enquanto se encontram numa zona infestada de malária deverão ser examinados de imediato por um médico. O indivíduo pode começar a tomar, por conta própria, uma combinação de fármacos como a pirimetamina-sulfadoxina, até conseguir ajuda médica.
O tratamento depende do tipo de malária e de, na zona geográfica em concreto, existirem espécies de parasitas resistentes à cloroquina. Para um ataque agudo de malária por
P. falciparum numa zona que se sabe possuir espécies resistentes à cloroquina, a pessoa pode tomar quinina ou receber quinidina endovenosa. Noutros tipos, a resistência à cloroquina é menos frequente e, por consequência, a pessoa afectada toma-a, habitualmente, seguida de primaquina.
Segue: MATACANHA (II)
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Nota de CV:
(*) Vd. poste de 12 de Junho de 2010 >
Guiné 63/74 – P6579: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (10): Golpe-de mão à “casa-de-mato” de Cussondome