segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Guiné 61/74 - P22575: Notas de leitura (1385): Francisco Serra Frazão e o crioulo guineense (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 10 de Outubro de 2018:

Queridos amigos,
Não é nenhuma lança em África, trata-se de um maço de fichas, alfabeticamente organizadas, um curioso em filologia do mundo africano português, quadro colonial em Angola, escritor premiado, ter-se-á interessado pela filologia comparada e foi juntando elementos sobre línguas étnicas da Guiné, que não desenvolveu. O que aqui se mostra é a transcrição das suas fichas e conta-se com a benevolência e a disponibilidade dos camaradas na Guiné para corrigir o que Francisco Serra Frazão terá mal interpretado, junto dos seus interlocutores. Só nas décadas recentes é que apareceram dicionários, Benjamin Pinto Bull doutorou-se com o crioulo guineense e há missionários italianos que devotam ao crioulo um estudo notável.

Um abraço do
Mário



Francisco Serra Frazão e o crioulo guineense

Beja Santos

Nos Reservados da Biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa consta um volume que aberto revela um conjunto impressionante de fichas de trabalho que pertenceram a este administrador de circunscrição, sempre em Angola, em 1914 já era administrador no Golungo Alto, no prefácio a um dos seus trabalhos, Norton de Matos tece-lhe os elogios mais rasgados pela exemplaridade como funcionário e como investigador. O livro aqui mencionado, sobre as associações secretas entre os indígenas de Angola, recebeu o 1.º prémio de etnografia no XX Concurso de Literatura Colonial. O curioso dos seus trabalhos era a filologia comparada, não faltam referências a Angola, Cabo Verde, São Tomé e Guiné. Foi admitido como sócio efetivo da Sociedade de Geografia de Lisboa em 21 de novembro de 1944, era o sócio 15003, faleceu em março de 1948.

Verificados todos os maços de fichas, encontra-se um levantamento de vocábulos do crioulo guineense. Convém recordar que a primeira tentativa de dicionário é da autoria de Padre Marcelino Marques de Barros, nas últimas décadas, graças ao labor de missionários investigadores do crioulo surgiram dicionários. Não se sabe o que levou Francisco Serra Frazão a interessar-se por estas expressões, há mesmo uma tentativa, que só desenvolveu de forma incipiente, de comparar vocábulos portugueses em cinco ou seis línguas étnicas, não passou de um esboço. Mas quanto ao crioulo, veja-se o que consta destas fichas:
Abrandar – barandá; acabar – cabá; aceitar – setá; acender – sendê, cendê; achar – ódja; aconselhar – consedjá; afogar – fogá; água – iágo; agudo – gúdu; ainda – inda; ajuntar – djuntá; alguém – àguém; ali, aqui – li; amor – querê; aquecer – quentá; aquele, aquilo – quel; arrozal – bolanha; assim – sima, sim, ês; atirar – djogá, ramangá; avermelhar – burmedjá; bater – batê, bati; Bolama – Blama; balaio – balé; balcão, varanda – balcon; bandeira – bandera; barafustar – barafustá; bem – bem; bolo – bolo; bote – bote; cacho – cacho; caiar – caiá; camisa – camisa; candeeiro – candia; canoa – canua; carneiro – carnél, amonton; casa – can, cassa; cascos (de animal) – sapata; chão – tchon; chicote – chicote; chover – djobê; cobrir – cubri; colher – cudjer; concordar – setá; conta – conta; contar – contá, cuntá; convir – sentá; copo – copo; coroa – crua; dar – dá; deitar – botá, bota; deixar – dessá; demanda – demanda; Deus – Deus, Dês; doce – dôc; dossel, sanefa – mêc; doido – dôdo; dois – dôs; é (verbo) – i; eles – es; embarcar – bác; enganar – anganhá; então – antã, antam; escolher – escodjê; esconder – sucundi; escondido – condidjo, sucundido; esmola – sumóla; espera – pera; eu – mim; falcão – falcon; faltar – mangá; fazenda – fassenda; fazer – fassê, fossê, facêl; feira – fera; fiar, confiar – fiá; ficar – fica; filho – fidjo; fogo – fugo; figueira – fuguera; galinha – galinha; garfo – garfo; grande – garandi; grão – garâ; história – stória; imbecil – amonton; irado – brabu; irmão, irmãos – ermon, ermons; janeiro – djanero; janela – djanela; jarra – djarra; junto de – longo; jurar – djurmentá; lenço – lenç; levar – rebatá; lobo – lobo; loja – lossa; lua – lua; luz – candia; macho – matcho; mãe – mamãe; mais – más; malhar – madjá; mancarra – mancara; mandar – mandá; manobra – manobra; mar – mar, mádje; marrada – modjadera; marrar – modjá; matança – matança; matar – matá; meio – mi; mulher – mindjer; menino – minino; meu, minha – nha; miséria – fede; molhar – modjá; moradia – morança; mostrar – mostrá; mudança – cambança; mundo – mundo; neto – neto; nós – na; nosso – nô, nos; novo – nobo; nunca – nem; oiro – ôro; oliveira – olbera; ovo – obo; paciência – passença; pai – papai; parida – padida; pássaro – pástro, pástros (plural); pau – pó (árvore); pedir – pidi; pessoa – aquém; pilão – pilon; poder – pudê; poilão – polon; pois – pô; pomba – pomba; pôr – pô; porque – parque; porta – porta; pouco – pouco; prata – prata; prato – prato; pressa – de pressa; providência – purbidência; rabo – rabo; rato – rato; queixar – queçá; rabiar – rabidá; recuar – racuá; reino – reno; rende – renda; requebro – requendel; respeito – respêto; responder – respondê; retalhar – ratadjá; revirar – rabidá; rua – rua; sair – saí; satã – seitáno; seco – sêcu; sem – sim; senhor – nho; servir – sirbí; seu, sua – sê; silva – sirbi; só, somente – djusto; sobre, em cima – riba; sol – sol; tardar – tardá; teimoso – amonton (carneiro); ter – tenê, tem; tina – tina; tio – ti; todo – tudo; tolo – amonton; tomar – tomá, toma; tornar – torna; torcido – torcido; trancar – trancá, tarancá; tratar – taratá; três – tres; tudo – tudo; tufo – bucho (diz-se das velas pandas); vaca – baca; vai – bá; vela – vela, bela (de navio); vem – ben; vender – bendê; verdade – bardade; vermelho – burmedjo; virar – bidá; voar – buá; vós – bós.

Ver site da aprendizagem do crioulo guineense:
MONTE DE PALAVRAS

____________

Nota do editor

Último poste da série de 26 DE SETEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22572: Notas de leitura (1384): "Tempo das coisas", tempo de viver, tempo de morrer... A pungente despedida de Renato Monteiro (1946-2021): 31 poemas escritos de rajada na noite de 3 para 4 de julho de 2021 (Luís Graça)

1 comentário:

alma disse...

Até que em fim, Poesia e da boa!