terça-feira, 28 de setembro de 2021

Guiné 61/74 - P22576: Ser solidário (240): Jardim-Escola Capitão Luís Filipe Rei Vilar e Residência dos Professores de Susana "Os Sopitos", duas magníficas obras da Associação Anghilau (Manuel Rei Vilar / José d'Encarnação)




Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Susana > 13 de julho de 2021 > Depois da escola cap ri, foi construida a residência de professores do Agrupamento Escolar de  Susana, com início em novembro de 2020. Tem 7 quartos e 2 salas comuns.


Fotos (e legendas): ©  Manuel Rei Vilar (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Manuel Rei Vilar

1. Duas mensagem do nosso amigo Manuel Rei Vilar, membro da nossa Tabanca Grande (nº 812), líder do projeto Kasumai, irmão do saudoso cap cav Luís Rei Vilar (Cascais, 1941 - Suzana, 1970) (*)

Data - 19 jul 2021 20h37
Assunto - Nova Residência de Professores da Escola de Suzana

Caríssimo Amigo Luís Graça

A construção de uma Residência de Professores foi o grande objetivo da Associação Anghilau para 2021. 

De facto, a necessidade de fixar os Professores da Escola de Suzana numa Residência com condições dignas de habitabilidade foi um pedido a Direção do Agrupamento Escolar de Suzana nos solicitou para assegurar a continuidade do ensino e a presença dos Professores nesta localidade.

As obras da Residência terminaram agora e esta foi já entregue aos professores do Agrupamento Escolar de Suzana, esperando pela Inauguração oficial será efetuada posteriormente logo que as condições sanitárias o permitirem pelos membros da nossa Associação.

Falta agora unicamente completar com o mobiliário, os equipamentos da cozinha e da casa de banho assim como a canalização da agua corrente, o que será realizado nas próximas semanas.

Temos de agradecer aqui a preciosa ajuda de do incansável Padre Vítor, Prior de Susana e do nosso amigo Olálio Neves Trindade, responsável da ONG VIDA assim como da comunidade de Susana que respondeu com o seu trabalho à edificação desta linda Residência.

Kassumai (Felicidade, Paz e Liberdade)

Manuel Rei Vilar



Data- 26 ago 2021 15h03
Assunto - A história de uma inesperad surpresa

Caríssimo Luís Graça

Há uns dias enviei-lhe um texto intitulado "A HISTÓRIA DE UMA INESPERADA
SURPRESA" e publicado num blogue

https://duaslinhas.pt/2021/08/a-historia-de-uma-inesperada-surpresa

Não sei se o recebeu... Trata-se de um pequeno resumo da nossa história e do nosso trabalho em Suzana na Guiné-Bissau. Foi escrito por um amigo meu que gostou da história. O José d'Encarnação é de Cascais e andou connosco na Escola Salesiana do Estoril. Foi ai que ele conheceu o meu irmão. Atualmente, ele é Professor Catedrático reformado da Universidade de Coimbra e exerce muitas vezes o jornalismo. Penso que seria interessante publicá-lo no blogue dos Combatentes e pedia-lhe que se
estivesse de acordo, os meus irmão e eu também gostaríamos que o fizesse.

Um grande abraço e muita Saúde

Manuel Rei Vilar (**)


2. A HISTÓRIA DE UMA INESPERADA SURPRESA – O JARDIM-ESCOLA CAPITÃO LUÍS FILIPE REI VILAR!

por José d'Encarnação

  
Nesse dia do ano 2000, a cabeleireira do lar não estava disponível e D. Maria do Carmo precisava mesmo de lavar a cabeça e pentear-se. Decidiu, pois, sair e ir até à cabeleireira do bairro. Conversa puxa conversa (a gente sabe como é…) e a surpresa apareceu assim de repente, completamente inesperada, mais inesperada do que todas as surpresas. 

A mãe do capitão

Não era a primeira vez que D. Maria do Carmo ia ali. Contudo, desta feita, vendo que a cabeleireira era uma senhora africana, teve curiosidade em saber donde viera. 
– Da Guiné – respondeu. 
– E donde exactamente. 
– De uma aldeia chamada Susana. Fica situada a 5 km da fronteira com o Senegal, no noroeste da Guiné-Bissau. 
– Susana? Mas foi em Susana que o meu filho esteve e aí comandou a sua Companhia… 
– Mas a Senhora é da família do senhor capitão que morreu na guerra, o capitão Luís Filipe Rei Vilar? 

D. Maria do Carmo estremeceu ao ouvir soletrar o nome completo do filho. 
– Sim, sou a mãe. Ele morreu, sim, em combate na Guiné. A 18 de fevereiro de 1970… Mas a senhora, que é tão nova, como sabe o nome do meu filho? 
– É que, em Susana, nós veneramos muito a memória dele! 

D. Maria do Carmo estremeceu ainda mais. 
– Sim? Porquê? 

E a cabeleireira começou a desfiar, com entusiasmo, o rosário de benefícios que o capitão conseguira trazer para a aldeia, quando ali estivera em serviço com a sua companhia. Lutara, sim, ele e os seus homens, para defenderem a população, garantiu a cabeleireira; mas o mais importante ainda foi toda a obra social aí levada a cabo, nomeadamente no domínio da instrução, mediante a construção de uma escola, uma escolinha de 25 x 10 metros. 

«Lutando, construindo e ensinando» era a sua divisa! Em Susana chamavam-lhe o Capitão dos Pretos! As crianças eram recolhidas num raio de 5 km para irem à escola e, antes de serem levadas para casa, partilhavam o rancho dos soldados, da sopa deles… Por isso, esses meninos eram apelidados de “sopitos”. E ainda hoje o são! 

A surpresa da família 

A novidade caiu inesperada. 

Sobre a comissão de Luís Filipe Rei Vilar, nascido em Cascais a 12 de Novembro de 1941, e, sobretudo, acerca das circunstâncias da sua trágica morte,  chegaram a divulgar-se informações contraditórias e a família, contristada, preferiu continuar a ficar com a recordação do excelente percurso académico e militar que o filho tivera. 

Fora brilhante aluno na Escola Técnica e Liceal Salesiana de Santo António, no Estoril; praticara hóquei em patins no Grupo Dramático de Cascais; notabilizara-se na Academia Militar e, nomeadamente, na equitação, tendo participado em vários concursos no Hipódromo de Cascais, que tem hoje o nome de Manuel Possolo, mestre de equitação do Luís. 

Essa informação trouxe, pois, de novo à memória os momentos bons e também os maus. 

D. Maria do Carmo viria a falecer em 6 de Janeiro de 2004. Os filhos Duarte, Manuel e Miguel é que não ficaram sossegados enquanto não tiraram a limpo o que acontecera e qual a razão dessa veneração dos Felupes pelo seu irmão mais velho. 

Fora-lhe atribuída, a título póstumo, a Medalha de Serviços Distintos Prata com Palma («Diário do Governo» de 11-5-1970), tendo sido destacado, na circunstância, que «no campo da acção psicológica actuou como um verdadeiro apóstolo, conquistando o respeito e admiração das populações, que nele confiavam cegamente; no campo operacional salientou-se pela firme determinação em bater o inimigo nas zonas de refúgio e pelo exemplo da sua presença nos locais de maior risco». 

Soube-se depois que, também em Susana, após a sua morte, fora colocada uma placa em sua memória, hoje desaparecida. 

O Município de Cascais, por deliberação unânime de 5 de Junho de 1970, dera o nome ‘Capitão Rei Vilar’ a um arruamento do Bairro Navegador, no mesmo dia em que foi decidido homenagear, no mesmo bairro, a memória de outro cascalense, o Furriel João Vieira, que, aos 23 anos, fora morto em combate, em Angola, a 6 de Agosto de 1965. Aluno da Escola Salesiana do Estoril também ele. 

A obra em marcha 

Em primeiro lugar, a notícia dada pela cabeleireira causou na família muito espanto e alguma dúvida. 

Sucedeu, porém, que, em Abril de 2016, o irmão Miguel recebeu a mensagem de um desconhecido, um certo Luís Costa, antropólogo, recém-chegado da Guiné, aonde fora em preparação da sua tese de doutoramento e que vivera quatro meses em Susana. O teor era o seguinte:

 «Quero-lhe dar conta que a Memória do seu irmão, Cap Cav Luís Filipe Rei Vilar, comandante da CCAV 2538 […] continua bem viva e respeitada. Os habitantes de Susana falam com entusiasmo e saudade do seu irmão e contam o interesse e respeito que ele tinha pelas gentes da Guiné, em especial pelos Felupes». 

E, assim, em Janeiro de 2017, no seguimento desta mensagem, os três irmãos Manuel, Duarte e Miguel partiram para a Guiné. Escreve o Manuel, a 30 desse mês: 

«Quando chegámos a Susana, a surpresa! À chegada, tínhamos uma recepção de cerca de 200 crianças a cantarem e a bailarem, todas lindamente penteadas, limpas e bem vestidas. Não estava a acreditar! Toda a população nos esperava! Permanecemos em Susana 4 dias, alojados na missão católica. Foram 4 dias a conviver com a população, com os Felupes, a etnia local. Fomos ao sítio onde tudo se passara. Ainda há alguns guias felupes vivos que incorporaram a Companhia nessa altura e os seus pormenorizados relatos, nomeadamente das circunstâncias da morte do Luís, foram para nós testemunhos muito importantes». 

Entre outros, o do Padre Zé (José Fumagalli), já com 80 anos, que dirigia a Missão Católica nesse tempo e que conheceu e conviveu com o Capitão, também confirmou essas informações. 

As autoridades locais (o Conselho dos Homens Grandes) acolheram-nos, pois, de braços abertos; e a Missão Católica (liderada então pelo Padre Abraão e, posteriormente, pelo Padre Vítor) proporcionou-lhes um básico alojamento, porque, na verdade, Susana é aldeia pobre, minguada de meios.

 O resultado dessa primeira viagem a Susana foi a promessa dos irmãos Rei Vilar de continuarem a obra, no que respeitava à educação das crianças, em tão boa hora iniciada pelo irmão Luís Filipe, em circunstâncias assaz adversas. Foi assim que surgiu, espontaneamente e com esse objectivo, o Projecto Kassumai, que deu origem, em 2020, à constituição da Associação Anghilau («criança», em língua felupe). 

Foram assim apadrinhadas 35 crianças: a Adelaide da Silva, o André Djejo, a Bequita Ampabagai, o Davide N’Manga, a Necas Sambu, o Olívio Bussa, por exemplo, que aparecem, felizes e tímidas, no vídeo Kassumai, que Casper Steketee e Manuel Rei Vilar realizaram, não apenas para dar conta da vida do irmão Luís, mas, de modo especial, para fazerem jus ao bom acolhimento havido por parte da população e, sobretudo, para motivarem os amigos e familiares a aderirem a este projecto educacional. 

Kassumai, o nome do projecto, é a saudação felupe, que significa simultaneamente «felicidade, paz e liberdade». E quando alguém saúda outrem – «Kassumai»! – o outro deve responder «Kassumai Kep», que quer dizer «para sempre!». Um toque de humanidade a reter dos nossos irmãos africanos! 

Daí até à sugestão de reabilitar a escola e de fazer um edifício a condizer com as necessidades foi um passo. O Jardim-escola, que se encontrava decrépito, foi completamente reabilitado: renovação do telhado, pavimentação das salas, pinturas das paredes, aquisição de nova mobília adequada ao ensino pré-escolar, arranjos das portas totalmente danificadas, novas instalações sanitárias com duas fossas sépticas, criação duma pérgula para as crianças tomarem as refeições e brincarem nos dias de chuva e elaboração duma cerca para maior protecção da miudagem. 

Em 2017, os irmãos Rei Vilar tinham encontrado em Susana um homem branco, da ONG VIDA – Voluntariado Internacional para o Desenvolvimento Africano, organização criada em 1992, com sede em Lisboa, na Rua Nova do Almada (http://vida.org.pt), que focou muito da sua actividade na Guiné, em prol de contribuir para acudir às prementes necessidades de nutrição, mormente das crianças, através duma implementação correcta do Programa Nacional de Nutrição da Guiné-Bissau que contribua para a sua sustentabilidade. Como é lógico, gerou-se, de imediato, uma útil parceria com a futura ‘associação’ das boas vontades que a família conseguira congregar em torno de si. 

A partir desse encontro, a figura de um felupe, o Sr. Olálio Neves Trindade, hoje responsável da ONG VIDA na Guiné-Bissau, veio a ser o homem de campo do Projecto, em colaboração com o Prior de Susana Padre Vítor Pereira. Os media foram indispensáveis para manter uma ligação quase quotidiana com Susana e para difundir as actividades do Projecto. 

E, a 18 de Fevereiro de 2020, 50 anos depois da morte do Capitão, dia após dia, as novas instalações pré-escolares foram solenemente reinauguradas, com o nome Jardim-Escola Capitão Luís Filipe Rei Vilar, nome escolhido pela Direcção do Agrupamento Escolar de Susana, na presença de doze padrinhos e madrinhas, que se deslocaram a Susana para esse fim, das autoridades locais (administrativas, religiosas e escolares) e do Comité das Mães. Actualmente, o Jardim-Escola tem uma capacidade para mais de 70 crianças e o Agrupamento Escolar de Susana, que resultou da pequena escola criada pelo Capitão Rei Vilar, é frequentado por mais de 700 alunos. 

A construção de uma Residência dos Professores de Susana foi o segundo objectivo do projecto, crucial para fixar os docentes em alojamentos condignos. A nova residência encontra-se terminada e apta a acolher os professores a partir do próximo ano lectivo: foi entregue nas últimas semanas às entidades escolares. 

A reabilitação do Jardim-Escola assim como a construção da nova Residência para professores foram totalmente pagas com os donativos do apadrinhamento das crianças. 

O que falta? 

Compreende-se, porém, que projectos deste teor nunca podem considerar-se terminados e, após uma solução encontrada, outro problema por resolver se depara com premência. Neste sentido e neste momento, um terceiro projecto tem como objectivo reabilitar os restantes edifícios escolares, incluindo o acabamento do Liceu, que foi inteiramente construído pela comunidade de Susana. 

Em Março de 2020, a Associação Anghilau, recentemente constituída, decidiu dar conhecimento do trabalho realizado em Susana à Câmara Municipal de Cascais, tendo sido pedida, para esse efeito, uma reunião com a Divisão das Relações Internacionais. Nessa reunião, a Câmara dispôs-se a analisar este terceiro projecto, baptizado de Projecto Cascais-Susana, que se encontra ainda em apreciação. 

A aprovação desse projecto seria, de facto, o reconhecimento de todo o trabalho realizado até aqui e também, de certa forma, uma maneira de o Município poder honrar, tal como os Felupes o fizeram, a memória do Capitão Luís Filipe Rei Vilar, um filho de Cascais, sempre presente nesta vila e no coração dos habitantes de Susana. 

José d’Encarnação

___________


(**) Último poste da série > 7 de setembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22521: Ser solidário (239): Para as crianças deslocadas em Moçambique, a Escola é uma primeira casa - Uma iniciativa da Helpo - Organização Não Governamental para o Desenvolvimento (Manuel Gonçalves, ex-Alf Mil)

2 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...


Meu caro Manuel: Só hoje consegui publicar o prometido poste. TIve que ir a Lisboa. Vivo na Lourinhã.

Vê se está tudo OK . Os meus parabéns à família Vilar pelo carinho e determinação com que têm levado a acbvo este projeto solidário. No Olimpo dos combatentes, o nosso camarada Luís Reri Vilar vê-vos com orgulho.

Transmite também o nosso apreço aos demais associados da Anghilau. Continua a dispor do blogue e a alimentá-lo, como grã-tabanqueiro que és.

Um alfabravo (ABraço) fraterno. Kasumai. Luís

PS - Infelizmente não tenho nenhum antigo combatente, representado na Tabanca Grande, que tenha pertencido à companhia do teu mano, a CCAV 2538. Tenho gente do batalhão, o BCAv 2876, que integrava a CCav 2538 (Susana), a CCav 2539 (S. Domingos), a CCav 2540 (Ingoré, Antotinha e Sedengal) e a CCS (Ingoré)..

Tenho apenas 12 referências (, ou seja, postes com referência) à CCAC 2538. Posso-te mandar a lista completa.

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/search/label/CCAV%202538

Anónimo disse...


Manuel Rei Vilar (by email=
28 set 2021 19:34

Boa tarde amigo Luís

Permite-me que te trate por tu!

Muito obrigado pelas tuas palavras cordiais e amigas. Nós agradecemos-te muito em especial a ti e à Tabanca Grande a publicação deste pequeno texto e todo o carinho e amizade que dispensaram à nossa historia e ao nosso irmão.

Eu darei conhecimento aos meus irmão Duarte e Miguel da tua mensagem e da publicação. Aproveito para te transmitir o email do meu irmão Miguel.

Quanto às referências sobre o CCav 2538, claro que gostaria de ter essa lista.

Nós continuamos a ajudar os nossos irmãos africanos, e neste caso os mais pequeninos. Vamos continuando a missão que o nosso irmão Luís nos deixou através da Educação dessas crianças.

Um grande abraço e uma longa vida a este blog

Kassumai

Manuel Rei Vilar