Guiné > Região de Bafatá > Bambadinca (Sector L1 > Ponta Brandão, fevereiro de 1970: major Cunha Ribeiro (2.º cmdt do BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70, de alcunha, o "major elétrico") na ação psicossocial. Havia aqui uma destilaria, de cana de acúcar... Repare-se que a morança tem uma placa, no meio da parede, com "número de polícia": GU 23 (ou 27). A população parece ser balanta.
Guiné > Região de Bafatá > Bambadinca (Sector L1) > Ponta Brandão, uma "ponta" (exploração agrícola, com destilaria de cana de açúcar) que ficava nas imediações de Bambadinca, a caminho de Bafatá, na margem esquerda do Rio Geba Estreito... Na foto, o alf mil cav Jaime Machado (*).
Fotos (e legendas): © Jaime Machado (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Ponta Brandão > 1970 > Dois velhos balantas, um deles vestido apenas de um rudimentar tapa-sexo. Arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).
Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Guiné > Região de Bafatá > Carta de Bambadinca (1955) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Nhabijões, Mero, Santa Helena, Fá Balanta e Ponta Brandão, núcleos populacionais consideradas, desde o início da guerra, como estando "sob duplo controlo", ou seja, com população (maioritariamente balanta) que tinha parentes no "mato" (zona controlada pelo PAIGC)... Em Finete, Missirá e Fá Mandinga havia destacamentos nossos: milícias e/ou Pel Caç Nat (52, 63)... Entre Bambadinca e Fá Mandinga ficava Ponta Brandão. Havia aqui uma destilaria, de cana de acúcar... O "ponteiro" era o velho Brandão.
Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2014).
1. A Ponta Brandão veio, de novo, à baila com a republicação recente de mais uma das deliciosas "estórias cabralianas" (**)... Oficial e cavalheiro, o "alfero Cabral", comandante do Pel Caç Nat 63 (Fá Mandinga e Missirá, 1969/71) conta-nos, com a sua inimitável e inefável brejeirice, as peripécias da inesperada visita ao destacamento de Fá Mandinga de "tres alferes de Bambadinca, acompanhados de duas raparigas", uma, a "filha do Senhor Brandão [, da ponta Brandão]" e a outra, "uma amiga de Bissau, cabo-verdiana".
Havia uma outra ponta, em Bambadinca (diz a história do BART 2917) (***), mas eu nunca soube onde ficava exatamente . Presumo que essa pertencesse ao outra "ponteiro", Inácio Semedo, de que falaremos num próximo poste. Antes da guerra, teria havido outras mais pontas.
Os balantas adoravam aguardente de cana. Por outro lado, os comerciamtes também trocavam aguardente de cana por arroz aos balantas, que eram grande orizicultores. Era natural que a guerrilha do PAIGC (ou os seus elementos locais, nomeadamente em Nhabijões, Mero e Santa Helena) viessem aqui, a Ponta Brandão, abastecer-se. A aguardente de cana era o uísque dos pobres. E sem álcool ou droga ninguém faz guerras.
Os balantas adoravam aguardente de cana. Por outro lado, os comerciamtes também trocavam aguardente de cana por arroz aos balantas, que eram grande orizicultores. Era natural que a guerrilha do PAIGC (ou os seus elementos locais, nomeadamente em Nhabijões, Mero e Santa Helena) viessem aqui, a Ponta Brandão, abastecer-se. A aguardente de cana era o uísque dos pobres. E sem álcool ou droga ninguém faz guerras.
O Jorge Cabral conhecia, melhor do que eu, a Ponta Brandão (a escassos quilómetros de Bambadinca, à esquerda da estrada para Bafatá, e a meio caminho de Fá Mandinga; ia-se lá por causa da aguardente de cana, dos leitoes, da fruta tropical e de .... uma certa bajuda, que devia ser filha ou mais provavelmente neta do velho Brandão).
2. Recorde-se que na Guiné o vocábulo "ponta" quer dizer propriedade agrícola, exploração agrícola, horta, em geral junto a um curso de água, na margem de um rio, e o nome estava muitas vezes associado ao seu proprietário, cabo-verdiano ou "tuga": por exemplo, Ponta do Inglês, Ponta João da Silva, Ponta Luís Dias, Ponta Nova, no Rio Corubal.. Mas havia muito mais pontas pelo interior da Guiné: por exemplo, pela Carta de Farim, verifica-se que havia diversas pontas ao longo do curso do Rio Farim:
Ponta Caeiro
Ponta Fernandes
Ponta Paulo Cumba
Ponta Camilo
Ponta Pinto
Ponta Manuel Rodrigues
Ponta Boa Esperança
Ponta Cabral
Ponta Francisco Monteiro
Ponta Simão, etc.
Com o início da guerra, grande parte destas explorações agrícolas foram abandonadas...
Está, de resto, por fazer a história das pontas na Guiné (****)... Na carta de Cacheu / São Domingos, fui encontrar o topónimo, Ponta Salvador Barreto... Em Bambadinca, havia a Ponta Brandão... Fui lá algumas vezes... No Xime, a Ponta Coli, a Ponta Varela...
Há muitas histórias, ligadas às Pontas, que estão por contar... Mas a nossa curiosidade ficará, em muitos casos, por satisfazer: afinal, quem era o Varela ? E o Inglês ? E o Salvador Barreto ?
Mesmo em relação a Ponta Brandão... Quem era o velho Brandão? A sua origem, a sua historia?... Seria também um desterrado? ... Não temos nenhuma foto dele, só do sítio (e de parte da sua destilaria). Mas na Ponta Brandão haveria mais população, e nomeadamente balanta, gente que no passado trabalhava a mando dele, na ponta e na destilaria...
Ponta Caeiro
Ponta Fernandes
Ponta Paulo Cumba
Ponta Camilo
Ponta Pinto
Ponta Manuel Rodrigues
Ponta Boa Esperança
Ponta Cabral
Ponta Francisco Monteiro
Ponta Simão, etc.
Com o início da guerra, grande parte destas explorações agrícolas foram abandonadas...
Está, de resto, por fazer a história das pontas na Guiné (****)... Na carta de Cacheu / São Domingos, fui encontrar o topónimo, Ponta Salvador Barreto... Em Bambadinca, havia a Ponta Brandão... Fui lá algumas vezes... No Xime, a Ponta Coli, a Ponta Varela...
Há muitas histórias, ligadas às Pontas, que estão por contar... Mas a nossa curiosidade ficará, em muitos casos, por satisfazer: afinal, quem era o Varela ? E o Inglês ? E o Salvador Barreto ?
Mesmo em relação a Ponta Brandão... Quem era o velho Brandão? A sua origem, a sua historia?... Seria também um desterrado? ... Não temos nenhuma foto dele, só do sítio (e de parte da sua destilaria). Mas na Ponta Brandão haveria mais população, e nomeadamente balanta, gente que no passado trabalhava a mando dele, na ponta e na destilaria...
Enfim, do velho Brandão, sabemos pouco, embora a malta de Bambadinca, do meu tempo (1969/71), lá fosse com alguma frequência... Afinal, era um vizinho.
Eis aqui alguns testemunhos, já em tempos aqui publicados (*****):
(i) Torcato Mendonça (1943-2021) (o nosso saudaso amigo e camarada passou por Fá Mandinga, antes da da sua CART 2339, 1968/69, ter sido colocada em Mansambo):
(...) Não sei se a Ponta Brandão de que falas, se refere a uma quinta, algures entre Fá e Bambadinca, e pertencente a um português há muito radicado na Guiné. Creio que por razões de ordem politica.
Tenho disso uma recordação muito fraca. O vagomestre parece que ia lá comprar vegetais. Passei lá uma ou duas vezes. O velhote tinha quatro ou cinco filhos, já homens e mulheres, mais velhos que nós. Falei com, pelo menos, um dos filhos. Contou-me que, antes da guerra certamente, caçavam no Geba jacarés e outro tipo de caça naquela zona, etc.
O velhote tinha uma destilaria. Estando a fazer aguardente de cana,quando por lá passei, agarrou num copo em bambú, encheu e bebeu a aguardente de um trago. Como quem bebe água fresca. Depois, noutro copo, deitou aguardente e deu-me a beber. Foi o liquido mais forte que bebi... deslizava e queimava... e ele olhava... respirei fundo e soprei forte. Fiquei desinfectado. O fulano sorrindo disse ter-me portado bem.
(...) Não sei se a Ponta Brandão de que falas, se refere a uma quinta, algures entre Fá e Bambadinca, e pertencente a um português há muito radicado na Guiné. Creio que por razões de ordem politica.
Tenho disso uma recordação muito fraca. O vagomestre parece que ia lá comprar vegetais. Passei lá uma ou duas vezes. O velhote tinha quatro ou cinco filhos, já homens e mulheres, mais velhos que nós. Falei com, pelo menos, um dos filhos. Contou-me que, antes da guerra certamente, caçavam no Geba jacarés e outro tipo de caça naquela zona, etc.
O velhote tinha uma destilaria. Estando a fazer aguardente de cana,quando por lá passei, agarrou num copo em bambú, encheu e bebeu a aguardente de um trago. Como quem bebe água fresca. Depois, noutro copo, deitou aguardente e deu-me a beber. Foi o liquido mais forte que bebi... deslizava e queimava... e ele olhava... respirei fundo e soprei forte. Fiquei desinfectado. O fulano sorrindo disse ter-me portado bem.
A minha memória dessa destilaria é fraquissima. Há outro pormenor mas é com a "inteligência" de Bambadinca. O Jorge Cabral e outros militares que passaram por Fá, certamente lembram-se desta família. Será Brandão? Não sei.
(ii) Luís Graça:
(...) Também lá fui uma ou outra vez. Ponta quer dizer quinta. Logo havia lá criação (leitões, por exemplo), horta e fruta (abecaxis, por exemplo). Julgo ter lá ido algumas vezes quando algum de nós estava de sargento de dia à messe (ou sargento de mês, mais exactamente)...
(ii) Luís Graça:
(...) Também lá fui uma ou outra vez. Ponta quer dizer quinta. Logo havia lá criação (leitões, por exemplo), horta e fruta (abecaxis, por exemplo). Julgo ter lá ido algumas vezes quando algum de nós estava de sargento de dia à messe (ou sargento de mês, mais exactamente)...
O Jaime (Soares Santos), o nosso vaguemestre (da CCAÇ 12), batia região à cata de matéria-prima para satisfazer o apetite voraz da messe de Bambadinca (as meses de sargentos e de oficiais eram separadas, mas a cozinha era a mesma)...
O Jorge Cabral também conhecia a Ponta Brandão, que de resto ficava perto de Fá... Mas tudo aquilo, a começar pela casa, tinha um ar decadente...
Já não posso jurar se a família era de origem metropolitana, ou cabo-verdiana... Sei que a família Brandão de Bambadinca era aparentada com os Brandão de Catió... Uns e outros tinham fama de ter gente no PAIGC. Já os Semedos tinham fortes ligações ao PAIGC (...)
(iii) António Rosinha:
O Jorge Cabral também conhecia a Ponta Brandão, que de resto ficava perto de Fá... Mas tudo aquilo, a começar pela casa, tinha um ar decadente...
Já não posso jurar se a família era de origem metropolitana, ou cabo-verdiana... Sei que a família Brandão de Bambadinca era aparentada com os Brandão de Catió... Uns e outros tinham fama de ter gente no PAIGC. Já os Semedos tinham fortes ligações ao PAIGC (...)
(iii) António Rosinha:
Estes homens, sem disso terem consciência, chegaram e abriram caminho e serviram de intérpretes, a missionários católicos e outros, a chefes de posto e administradores e militares.
Estes comerciantes raramente foram alvo de um estudo, que analizasse as suas grandezas e misérias. Mas todos os governantes, desde o Diogo Cão até ao Gen Spínola, secundarizaram estas pessoas, quando devia ter sido o contrário.
Os africanos (indígenas) davam mais importância a um comerciante do que a um governador geral ou a um missionário ou chefe de posto.
Em relação à guerra, tiveram um papel tão importante, para o bem ou para o mal, que podemos dizer que os milhares de Brandões na África portuguesa, foram os pais e os avós da maioria dos teóricos fundadores, do MPLA, PAIGC e FRELIMO, movimentos que secaram outros em volta, e com isso, talvez ainda sobre alguma coisa no fim de isto tudo.
Estes comerciantes, a maioria analfabetos, ou quase, chegavam a falar um dialeto ou mais que um, continuarão a ser olhados de soslaio por qualquer militar que, ao fim de 24 meses, não chegava a comprender aquela africanização, para não dizer outros nomes.
Estes portugueses de Áfricas e Brasis foram a história mais importante da diáspora portuguesa. Em geral viajaram com passagem paga por eles. Muitos netos dessa gente veio para o meio de nós em pontes aéreas. (*****)
(iv) Jorge Cabral:
Confirmo. Fui visita assídua do senhor Brandão, principalmente durante as férias da filha que trabalhava em Bissau. Era natural de Viana do Castelo ou da Póvoa de Varzim, já não me recordo bem. Teria na altura quase 80 anos, mais de 40 de Guiné e muitos filhos. (******)
A aguardente de cana era fogo... mas matava qualquer bicho, mesmo os imaginários...
Confirmo. Fui visita assídua do senhor Brandão, principalmente durante as férias da filha que trabalhava em Bissau. Era natural de Viana do Castelo ou da Póvoa de Varzim, já não me recordo bem. Teria na altura quase 80 anos, mais de 40 de Guiné e muitos filhos. (******)
A aguardente de cana era fogo... mas matava qualquer bicho, mesmo os imaginários...
(Continua)
___________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 22 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14914: Álbum fotográfico de Jaime Machado (ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2046, Bambadinca, 1968/70) - Parte VIII: População: da Ponta Brandão a Cansamba
(*) Vd. poste de 22 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14914: Álbum fotográfico de Jaime Machado (ex-alf mil cav, cmdt do Pel Rec Daimler 2046, Bambadinca, 1968/70) - Parte VIII: População: da Ponta Brandão a Cansamba
(**) Vd. poste de 6 de novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22693: Antologia (79): "Alfero Cabral", oficial e cavalheiro... ou o último dos românticos do império (Jorge Cabral, autor de "Estórias cabralianas", 1º volume, 2020)
(****) Vd. poste de 7 de abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6126: (Ex)citações (65): Os nossos Brandões desconhecidos que foram os antepassados dos pais fundadores do PAIGC, MPLA e FRELIMO (António Rosinha)
(******) Útimo poste da série > 24 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22657: (De) Caras (145): 55 anos depois, o reencontro ao vivo, em São da João da Madeira, com o ex-alf mil médico Francisco Pinho da Costa (BCAÇ 1888, Fá Mandinga e Bambadinca, 1966/68) (João Crisóstomo, Nova Iorque, de visita a Portugal)