segunda-feira, 8 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22696: (De)Caras (181): os dois "ponteiros" de Bambadinca, o velho Brandão (da Ponta Brandão) e o histórico Inácio Semedo, de quem o Amílcar Cabral foi padrinho de casamento - Parte I



Guiné > Região de Bafatá > Bambadinca (Sector L1 > Ponta Brandão, fevereiro de 1970: major Cunha Ribeiro (2.º cmdt do BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70, de alcunha, o "major elétrico") na  ação psicossocial. Havia aqui uma destilaria, de cana de acúcar... Repare-se que a morança tem uma placa, no meio da parede, com "número de polícia": GU 23 (ou 27). A população parece ser balanta.


Guiné > Região de Bafatá > Bambadinca (Sector L1) > Ponta Brandão, uma "ponta" (exploração agrícola, com destilaria de cana de açúcar) que ficava nas imediações de Bambadinca, a caminho de Bafatá, na margem esquerda do Rio Geba Estreito... Na foto, o alf mil cav Jaime Machado (*).

Fotos (e legendas): © Jaime Machado (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Ponta Brandão > 1970 > Dois velhos balantas,  um deles vestido apenas de um rudimentar tapa-sexo. Arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Bafatá > Carta de Bambadinca (1955) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Nhabijões, Mero, Santa Helena, Fá Balanta e Ponta Brandão, núcleos populacionais consideradas, desde o início da guerra, como estando "sob duplo controlo", ou seja, com população (maioritariamente balanta) que tinha parentes no "mato" (zona controlada pelo PAIGC)... Em Finete, Missirá e Fá Mandinga havia destacamentos nossos: milícias e/ou Pel Caç Nat (52, 63)... Entre Bambadinca e Fá Mandinga ficava Ponta Brandão. Havia aqui uma destilaria, de cana de acúcar... O "ponteiro" era o velho Brandão.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2014).


1. A Ponta Brandão veio,  de novo, à baila com a republicação  recente de mais uma das deliciosas  "estórias cabralianas" (**)... Oficial e cavalheiro, o "alfero Cabral", comandante do Pel Caç Nat 63 (Fá Mandinga e Missirá, 1969/71) conta-nos, com a sua inimitável e inefável  brejeirice, as peripécias da 
inesperada visita ao destacamento de Fá Mandinga de "tres alferes de Bambadinca, acompanhados de duas raparigas", uma, a "filha do Senhor Brandão [, da ponta Brandão]" e a outra,  "uma amiga de Bissau, cabo-verdiana".

Não sabemos a razão de ser da visita: por motivos de segurança, só se podia viajar, sem escolta,  à volta de Bambadinca. Fá Mandinga ficava ali à mão, a cerca de 5 km. Ia-se (e vinha-se),;de jipe, nas calmas. Por outro lado, em Fá Mandinga tinha sido uma antiga estação agronómica por onde se dizia ter passado, nos anos 50, o Engº Agrónomo Amílcar Cabral, licenciado pelo ISA- Instituto Superior de Agronomia, de Lisboa... O que parece não corresponder à verdade, mas, provavelmente, as "duas raparigas" eram simpatisantes do PAIGC e queriam ver, com os seus olhos,  o que restava dessas instalações onde o "pai da Pátria" alegadamente trabalhara vinte anos antes ...Ou então os três jovens e galantes alferes de Bambadinca (quem teriam sido eles? ) devem-lhes vendido essa patranha...

Havia uma outra ponta, em Bambadinca (diz a história do BART 2917) (***), mas eu nunca soube onde ficava exatamente . Presumo que essa pertencesse ao outra "ponteiro", Inácio Semedo, de que falaremos num próximo poste. Antes da guerra, teria havido outras mais pontas. 

Os balantas adoravam aguardente de cana. Por outro lado, os comerciamtes também trocavam aguardente de cana por arroz aos balantas, que eram grande orizicultores. Era natural que a guerrilha do PAIGC (ou os seus elementos locais, nomeadamente em Nhabijões, Mero e Santa Helena) viessem aqui, a Ponta Brandão, abastecer-se. A aguardente de cana era o uísque dos pobres. E sem álcool  ou droga ninguém faz guerras.

O Jorge Cabral conhecia, melhor do que eu, a Ponta Brandão (a escassos  quilómetros de Bambadinca, à esquerda da estrada para Bafatá, e a meio caminho de Fá Mandinga; ia-se lá por causa da aguardente de cana, dos leitoes, da fruta tropical e de .... uma certa bajuda, que devia ser filha ou mais provavelmente neta do velho Brandão).
 
2. Recorde-se que na Guiné o vocábulo "ponta" quer dizer propriedade agrícola, exploração agrícola, horta, em geral junto a um curso de água, na margem de um rio, e o nome estava muitas vezes associado ao seu proprietário, cabo-verdiano ou "tuga": por exemplo, Ponta do Inglês, Ponta João da Silva, Ponta Luís Dias, Ponta Nova, no Rio Corubal.. Mas havia muito mais pontas pelo interior da Guiné: por exemplo, pela Carta de Farim, verifica-se que havia diversas pontas ao longo do curso do Rio Farim:

Ponta Caeiro
Ponta Fernandes
Ponta Paulo Cumba
Ponta Camilo
Ponta Pinto
Ponta Manuel Rodrigues
Ponta Boa Esperança
Ponta Cabral
Ponta Francisco Monteiro
Ponta Simão, etc.

Com o início da guerra, grande parte destas explorações agrícolas foram abandonadas...

Está, de resto, por fazer a história das pontas na Guiné (****)... Na carta de Cacheu / São Domingos, fui encontrar o topónimo, Ponta Salvador Barreto... Em Bambadinca, havia a Ponta Brandão... Fui lá algumas vezes... No Xime, a Ponta Coli, a Ponta Varela...

Há muitas histórias, ligadas às Pontas, que estão por contar... Mas a nossa curiosidade ficará, em muitos casos, por satisfazer: afinal, quem era o Varela ? E o Inglês ? E o Salvador Barreto ?

Mesmo em relação a Ponta Brandão... Q
uem era o velho Brandão?  A sua origem, a sua historia?... Seria também um desterrado? ... Não temos bnenhuma foto dele, só do sítio (e de parte da sua destilaria). Mas na Ponta Brandão haveria mais população, e nomeadamente balanta, gente que no passado trabalhava o arame ele, na ponta e na destilaria...
Enfim, do velho  Brandão, sabemos pouco, embora a malta de Bambadinca, do meu tempo (1969/71), lá fosse com alguma frequência... Afinal, era um vizinho.

Eis aqui alguns testemunhos, já em tempos aqui publicados (*****):

(i) Torcato Mendonça (1943-2021) (, o nosso saudaso amigo e camarada passou por Fá Mandinga, antes da da sua CART 2339, 1968/69, ter sido colocada em Mansambo):

(...)  Não sei se a Ponta Brandão de que falas, se refere a uma quinta, algures entre Fá e Bambadinca, e pertencente a um português há muito radicado na Guiné. Creio que por razões de ordem politica.

Tenho disso uma recordação muito fraca. O vagomestre parece que ia lá comprar vegetais. Passei lá uma ou duas vezes. O Velhote tinha quatro ou cinco filhos, já homens e mulheres, mais velhos que nós. Falei com, pelo menos, um dos filhos. Contou-me que, antes da guerra certamente, caçavam no Geba jacarés e outro tipo de caça naquela zona, etc.

O Velhote tinha uma destilaria. Estando a fazer aguardente de cana,quando por lá passei, agarrou num copo em bambú, encheu e bebeu a aguardente de um trago. Como quem bebe água fresca. Depois, noutro copo, deitou aguardente e deu-me a beber. Foi o liquido mais forte que bebi... deslizava e queimava... e ele olhava... respirei fundo e soprei forte. Fiquei desinfectado. O fulano sorrindo disse ter-me portado bem. 

A minha memória dessa destilaria é fraquissima. Há outro pormenor mas é com a "inteligência" de Bambadinca. O Jorge Cabral e outros militares que passaram por Fá, certamente lembram-se desta família. Será Brandão? Não sei.


(ii) Luís Graça:


(...) Também lá fui uma ou outra vez. Ponta quer dizer quinta. Logo havia lá criação (leitões, por exemplo), horta e fruta (abecaxis, por exemplo). Julgo ter lá ido algumas vezes quando algum de nós estava de sargento de dia à messe (ou sargento de mês, mais exactamente)... 

O Jaime  (Soares Santos), o nosso vaguemestre (da CCAÇ 12), batia região à cata de matéria-prima para satisfazer o apetite voraz da messe de Bambadinca (as meses de sargentos e de oficiais eram separadas, mas a cozinha era a mesma)...

O Jorge Cabral também conhecia a Ponta Brandão, que de resto ficava perto de Fá... Mas tudo aquilo, a começar pela casa, tinha um ar decadente...

Já não posso jurar se a família era de origem metropolitana, ou cabo-verdiana... Sei que a família Brandão de Bambadinca era aparentada com os Brandão de Catió... Uns e outros tinham fama de ter gente no PAIGC. Já os Semedos tinham fortes ligações ao PAIGC (...)

(iii) António Rosinha:

Quando se fala nestas figuras de comerciantes ou agricultores, neste caso com o nome de Brandão, que na Guiné é um dos nomes de colonos históricos, noutras ex-colónias há outros nomes também com história, estamos a falar dos verdadeiros colonizadores "à lá portuguesa".  

Estes homens, sem disso terem consciência, chegaram e abriram caminho e serviram de intérpretes, a missionários católicos e outros, a chefes de posto e administradores e militares.

Estes comerciantes raramente foram alvo de um estudo, que analizasse as suas grandezas e misérias. Mas todos os governantes, desde o Diogo Cão até ao Gen Spínola, secundarizaram estas pessoas, quando devia ter sido o contrário.

Os africanos (indígenas) davam mais importância a um comerciante do que a um governador geral ou a um missionário ou chefe de posto.

Em relação à guerra, tiveram um papel tão importante, para o bem ou para o mal, que podemos dizer que os milhares de Brandões na África portuguesa, foram os pais e os avós da maioria dos teóricos fundadores, do MPLA, PAIGC e FRELIMO, movimentos que secaram outros em volta, e com isso, talvez ainda sobre alguma coisa no fim de isto tudo.

Estes comerciantes, a maioria analfabetos, ou quase, chegavam a falar um dialeto ou mais que um, continuarão a ser olhados de soslaio por qualquer militar que, ao fim de 24 meses, não chegava a comprender aquela africanização, para não dizer outros nomes.

Estes portugueses de Áfricas e Brasis foram a história mais importante da diáspora portuguesa. Em geral viajaram com passagem paga por eles. Muitos netos dessa gente veio para o meio de nós em pontes aéreas. (*****)

(iv) Jorge Cabral:

Confirmo. Fui visita assídua do Senhor Brandão, principalmente durante as férias da filha que trabalhava em Bissau. Era natural de Viana do Castelo ou da Póvoa de Varzim, já não me recordo bem. Teria na altura quase 80 anos, mais de 40 de Guiné e muitos filhos. (******)

A aguardente de cana era fogo... mas matava qualquer bicho, mesmo os imaginários...

(Continua)
___________



(***) Vd. poste de 16 de junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6601: Elementos para a caracterização sociodemográfica e político-militar do Sector L1 (6): Povoações sob controlo IN; Recursos; Clima e meteorologia; Dispositivo e actuação da guerrilha (Benjamim Durães / J. Armando F. Almeida / Luís Graça)

16 comentários:

Valdemar Silva disse...

Tenho uma ideia, o Abílio Duarte poderá lembrar-se, ter passado por um local que não sei precisar mas julgo ter sido para os lados de Bambadinca, e ver umas edificações "barracões", que os soldados diziam ser do tempo do Eng. Amílcar Cabral com muitos cajueiros alinhados em redor. Os "barracões" faziam lembrar pequenos hangares de telhado curvo do tempo da 2ª. guerra.
Não me recordo perfeitamente do local.

Abraço e saúde
Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

Bom Dia Henriques. O Brandão era Natural de Arouca, esteve na 1º Guerra Mundial, veio gaseado. Os Filhos eram proprietários da Carrinha e do Autocarro que fazia a carreira Bambadinca - Bafatá e Bafatá -Nova Lamego. Um dos Filhos foi chefe de posto em Bambadinca em 1970.O outro era quem conduzia a Carinha e o Autocarro e tomava conta da Ponta. Um abraço. Fernando Almeida

José Botelho Colaço disse...

Colonos que penso com alguma predominãncia na Guiné em Bafatá o tio Bento que também tinha um autocarro de passageiros que em 1965 estava abandonado num terreno ao lado do Café do tio Bento. O tio Bento em 1969 regressou a Portugal estava numa reidencial na zona da Estrela em Lisboa, o outro colono de Bafatá que não me recordo o nome era o dono da padaria em Bafatá era esta padaria que fornecia o pão para os militares em Bafatá em 1965.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Obrigado, meu querido amigo e camarada Almeida... Há quanto tempo não "aparecias" por aqui!... Tens memória de elefante|... De resto, conheceste melhor Bambadinca do que eu. Agradeço-te a informação sobre a família Brandão.

Se o velho Brandão era natural de Arouca, isso quer dizer que era da família Brandão, ou Pinho Brandão, de Catió, cuja origem também era Arouca. O que bate certo com a informação que o Inácio Semedo Júnior, ex-guerrilheiro e quadro do PAIGC, ex-embaixador aposentado, filho do velho Inácio Semedo, o outro ponteiro e dono de uma outra destilaria de aguardente de cana em Bambadinca. Falei com ele ao telefone, em 2008, vivia em Lisboa, e estava então com 65 anos. Voltarei a falar dessa conversa em próximo poste...

Pergunto-te, Almeida, se tens alguma ideia deste agricultor, Inácio Semedo Sénior, afilhado de casamento do Amílcar Cabral ? Onde seria a ponta e a destilaria ? O filho disse-me nasceu em Bambadinca, e que a família tinha propriedades na região; nomeadamente o pai tinha uma destilaria de aguardente de cana, tendo costume comprar arroz aos Brandão, de Catió, para alimentar os seus trabalhadores balantas de Bambadinca (que seria possivelmente de Nhabijões, Mero, Santa Helena...)... Coisa que eu não sabia trocava-se, naquele tempo, aguardente por arroz, sendo o arroz do sul, do celeiro da Guiné, o melhor...

No Enxalé também havia uma destilaria, do Pereira, o pai da nossa amiga Maria Helena Carvalho...Há fotos, aí no blogue,das instalações e máquinas. A tropa ocupou a casa e o terreno. Fui lá várias vezes em operações...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Obrigado, meu querido amigo e camarada Almeida... Há quanto tempo não "aparecias" por aqui!... Tens memória de elefante|... De resto, conheceste melhor Bambadinca do que eu. Agradeço-te a informação sobre a família Brandão.

Se o velho Brandão era natural de Arouca, isso quer dizer que era da família Brandão, ou Pinho Brandão, de Catió, cuja origem também era Arouca. O que bate certo com a informação que o Inácio Semedo Júnior, ex-guerrilheiro e quadro do PAIGC, ex-embaixador aposentado, filho do velho Inácio Semedo, o outro ponteiro e dono de uma outra destilaria de aguardente de cana em Bambadinca. Falei com ele ao telefone, em 2008, vivia em Lisboa, e estava então com 65 anos. Voltarei a falar dessa conversa em próximo poste...

Pergunto-te, Almeida, se tens alguma ideia deste agricultor, Inácio Semedo Sénior, afilhado de casamento do Amílcar Cabral ? Onde seria a ponta e a destilaria ? O filho disse-me nasceu em Bambadinca, e que a família tinha propriedades na região; nomeadamente o pai tinha uma destilaria de aguardente de cana, tendo costume comprar arroz aos Brandão, de Catió, para alimentar os seus trabalhadores balantas de Bambadinca (que seria possivelmente de Nhabijões, Mero, Santa Helena...)... Coisa que eu não sabia trocava-se, naquele tempo, aguardente por arroz, sendo o arroz do sul, do celeiro da Guiné, o melhor...

No Enxalé também havia uma destilaria, do Pereira, o pai da nossa amiga Maria Helena Carvalho...Há fotos, aí no blogue,das instalações e máquinas. A tropa ocupou a casa e o terreno. Fui lá várias vezes em operações...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Sobre a família Pinho Brandão, de Catió,com raízes em Arouca, temos no blogue 17 referências.

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/search/label/fam%C3%ADlia%20Pinho%20Brand%C3%A3o

Por outro lado, temos a satisfação de ter, à sombra do poilão da Tabanca Grande, uma representante da família:

A Gilda Pinho Brandão, nascida em Catió, de mãe fula e pai português, veio para Portugal, aos 7 anos, em 1969, para uma família de acolhimento, trazida por um camarada nosso, o Fur Mil João Pina, a quem ela chama mano. Em 2007 pediu ajuda ao nosso blogue, para encontrar a família do pai, que é de Arouca. Afonso Pinho Brandão, comerciante, foi assassinado em 1962, em Catió.

A Gilda faz parte do nosso blogue desde 25 de julho de 2007. Foi graças a nós, e com o incentivo do nosso saudoso Vítor Condeço, e as preciosas informações dos nossos também muito saudosos amigos Leopoldo Amado e Pepito, be, como do engº agr. Carlos Pinho Brandão, em Bissau, que ela conseguiu encontrar os seus irmãos e outros familiares do pai.

O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca é Grande... (Infelizmente não temos notícia dela desde 2015).

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O nosso saudoso amigo e camarada Torcato Mendonça, ex-alf mil da CART 2339, esteve em Fá, antes de ser colocada em Mansambo, cujo aquartelamento iria construir de raíz, a pá e pica.

Tirando as patrulhas ao mato Cão, para montar segurança aos barcos civis que atravessavam o Geba Estreito (Xime-Bambadinca-Bafata), Fá Mandinga era uma "verdadeira colónia de férias", beneficiando de "instalações ótimas"...

Durante uns tempos, escreveu-se, erradamente, np blogue, que Fá tinha sido uma "antiga estação agronómica por onde passara, nos anos 50, o engº Agrónomo Amílcar Cabral, licenciado pelo ISA - Instituto Superior de Agronomia, de Lisboa"...

Tudo indica ser falsa esta informação, propalada pela tropa, já no meu tempo. O engº agrónomo Amílcar Cabral trabalhou e viveu, isso, sim, em Pessubé, perto de Bissau, com a sua esposa e colega portuguesa, Maria Helena Rodrigues.

Segundo o Torcato Mendonça, as "instalações civis" estavam, na altura, à guarda de um civil, mandinga, o Marinho, que deveria ser pago pela administração [circunscrição de Bafatá ?].

Tambémo Jorge Cabral também aqui escreveu:

Fá estava dividido, em duas partes, a de cima e a de baixo.

Como te disse ao telefone, existia um guarda civil, o Marinho do qual tanto eu como o Torcato Mendonça [ex-alf mil, CART 2239, Fá e Mansambo, 1968/69], já falámos. Terá sido contratado, por via do fim da serração do Fausto Teixeira?

Penso que a tropa só lá se instalou, em Fá, a partir de 1965. Foi sede de Batalhão e de muitas Companhias. Em Julho de 1969 e pela primeira vez, foi entregue a um Pelotão, o meu.

Era na parte de cima que se encontravam as melhores instalações. Uma casa óptima com vários quartos e duas vivendas, além de mais dois edifícios. Teria tido água canalizada e com certeza um potente gerador, que ocuparia uma casa própria, que o meu soldado Dairo aproveitou para a sua residência.

Entre Julho de 1969 e Fevereiro de 1970, data da chegada da 1.ª Companhia de Comandos Africanos, as mulheres e os filhos dos meus soldados viveram no Quartel. Não ocupámos nem a parte de baixo, nem a "casa grande" e as duas vivendas.

Quem pagaria o ordenado do Marinho, que até fazia rondas nocturnas, munido apenas de uma lanterna e que uma vez foi alvejado pelo meu soldado Mamadú que, estando de sentinela, ao ver uma luz, disparou ?...

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2017/06/guine-6174-p17482-de-caras-84-fausto.html

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Fá Mandinga foi sede do Sector L1, até 1965. Depois passou a ser Bambadinca. Muita gente de certeza que conheceu a Ponta Brandão e a família Brandão,muito antes do Jorge Cabral.

10 DE JUNHO DE 2014
Guiné 63/74 - P13265: Consultório militar, de José Martins (4): Unidades que passaram por Fá Mandinga, no leste (1964 / 1974)

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2014/06/guine-6374-p13265-consultorio-militar.html

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Almeida,como a nossa memória é seletiva!... Já não tinha ideia nenhuma dos filhos do velho Brandão (que para ter estado na 1º Guerra Mundial, e vir gaseado, ter nascido nos finais do séc. XIX, logo teria, em 1969, setenta anos ou mais, mas não os 80 que lhe dava o Jorge Cabral; e para ter 40 anos ou mais de Guiné, terá vino nos anos 20.)

Dizes tu, meu caro José Fernando Almeida, ex.fur mil trmsda CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71), que "os Filhos (do Brandão) eram proprietários da Carrinha e do Autocarro que fazia a carreira Bambadinca - Bafatá e Bafatá -Nova Lamego", e que um deles foi "chefe de posto em Bambadinca em 1970", enquanto o outro era quem "conduzia a Carrinha e o Autocarro e tomava conta da Ponta".

E a "filha do Brandão" que trabalharia em Bissau, segundo o Jorge Cabral ?

A mãe devia ser cabo-verdiana ou guineense, não ?

Mantenhas, Henriques, aliás Luís Graça.

José Botelho Colaço disse...

Manuel Pinho Brandão : antes de haver a guerra era ele que controlava todo o comércio na Ilha do Como e só não foi linchado na Ilha porque uns nativos amigos o avisaram para ele não ir mais na Ilha, e se o tentasse teria "sentença de morte", quando na tomada do Cachil em Janeiro de 1964 ao lado do Cais do Cachil ainda existia umas paredes de um armanzém com o esqueleto de uma balança décimal que devia ser penso eu para pesar e comercializar os produtos agricolas produzidos na Ilha. Em Cufar creio que também havia um Brandão da família mas sobre este Brandão quem poderá dar algumas dicas deve ser o Mário Fitas ou Norberto Gomes da Costa ambos ex-furrieis milicianos da C. caç. 555.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Zé Colaço, o Manuel Pinho Brandão, o "rei da ilha do Como", deve-se ter refugiado em Ganjolá... O seu irmão Afonso, pai da Gilda, é assassinado ainda antes do "começo oficial" da guerra, em 1962...

Diz o Mário, um dos "bravos do Como":

16 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXV: Op Tridente (Ilha do Como, 1964): II Parte (Mário Dias)

(...) "A tabanca de Cauane, bem como as restantes, estava praticamente destruída assim como a casa do comerciante Brandão, ali bem próxima. Meses antes, já a aviação havia actuado na ilha bombardeando e destruindo todas as instalações que pudessem ser proveitosas ao IN. Recordo-me ainda de assistir no QG em Santa Luzia, onde ocasionalmente me encontrava, aos protestos do referido Brandão por lhe terem escavacado tudo quanto possuía no Como" (...).

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Sobre o Brandão, de Ganjolá (seria o Manuel ?) o J.L. Mendes Gomes (, o poeta das baladas de Berlim) escreveu esta belíssima crónica:

22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjolá, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2007/01/guin-6374-p1455-crnica-de-um-palmeirim.html

(...) "Sete e Meio era o nome dado à casa que albergava os alferes da companhia de intervenção e mais alguns dos felizardos, residentes com o comando do batalhão (...).

"Era a casa do enfermeiro de antes da guerra. Como aconteceu a tantos outros, foi obrigado a cedê-la, de aquartelamento, aos militares.

"Uma pequena moradia, em cimento armado e tijolo, como as que se encontravam em qualquer parte da metrópole, ali, era um palacete de luxo, aos olhos dos indígenas das rudes tabancas de palha. Uma sala comum, quatro quartos e uma casa de banho, dava a sensação de estadia romanesca, para um aventureiro que viesse fazer uma caçada nas cerradas matas tropicais, ali ao pé.

"Era-nos fácil imaginar, com sadia cobiça, a deliciosa época da vida colonial, de antes da guerra, para os felizardos, a quem a sorte, em boa hora, escorraçara, com a pena de desterro, por feitos heterodoxos à moral reinante das gentes da metrópole.

"Era o caso do Sr. Brandão, de Ganjola, a quinze km de Catió, um injustiçado lavrador das terras de Arouca. Ali vivia há dezenas de anos, por assassínio, cometido numa das romarias da Senhora da Mó. No meio dos folguedos e romarias, por vezes, acertavam-se contas atrasadas, duma qualquer hora de desavença, mesmo no fim da missa domingueira.

"O Sr. Brandão, agora, era um velhote, rodeado de filhos e netos que foi gerando, ao sabor das madrugadas de batuque e da liberdade de escolha, sem custos, entre as mais viçosas bajudas da tabanca…

"Uma negra, velha, mas de rosto e olhar, ainda iluminados por olhos meigos, como a sua voz, doce, era a predilecta, de sempre. Seu nome, Sexta-Feira. Soava bem aos ouvidos dos falares balantas, fulas ou mandingas. Era ela quem lhe tratava das tarefas caseiras. Dedicada. Sem nada cobrar, para além do breve e malicioso sorriso do velho Brandão, quando lhe despontava o desejo do seu corpo, negro, sem idade. Podia despontar a qualquer hora. Sexta-Feira ali estava, sempre dócil e submissa.

"Uma loja farta de tudo o que chegava na carreira regular das barcaças de Bissau. Os lindos panos de cor garrida e os gordos cordões reluzentes, de fantasia, com que as negras tanto gostavam de se enfeitar. (...)

(Continua)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Continuação...

22 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1455: Crónica de um Palmeirim de Catió (Mendes Gomes, CCAÇ 728) (7): O Sr. Brandão, de Ganjolá, aliás, de Arouca, e a Sra. Sexta-Feira

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2007/01/guin-6374-p1455-crnica-de-um-palmeirim.html

(...) "O vinho tinto da metrópole era o regalo dos ociosos negros, de rostos engelhados e curtidos pelo álcool, pela tarde fora, a par da cachaça de coco.O saboroso bacalhau, curado nas míticas secas da Figueira da Foz e Aveiro, tão apreciado e toda a sorte de ferragens eram tudo o que aguçava o desejo daquelas gentes, para a troca do arroz, milho, mandioca, galinhas e demais produtos que, em cortejo lento e constante, pelas picadas entre as frondosas matas, traziam em açafates, à cabeça.O preço era feito, à medida da vontade gulosa do velho, matreiro e bem afortunado, Brandão.

"Dizia-se que tinha metade das terras de Arouca… não fosse o diabo tecê-las. Ali, vivia, pacatamente, como se não houvesse guerra, numa típica mansão colonial, de um piso sobreelevado, com um varandim a toda a volta, com as dependências necessárias à farta panóplia de utensílios, alfaias e mercadoria.

"Ficava mesmo ao pé [do rio], rico de peixe, onde, infalivelmente, chegavam, em cada dia, as marés vivas capazes de lhe movimentar, de graça, os prodigiosos moinhos com que moía os cereais abundantes.

"Conhecia toda a gente, naquelas paragens, incluindo os turras, a quem pagava, com simpatia, os devidos tributos de guerra… quando não era o fornecimento das informações sobre os últimos planos de operações que, por artes obscuras, ali chegavam aos ouvidos bem afilados.

"Aquele sítio era estratégico e crucial. Por isso, um pelotão reforçado com uma metralhadora pesada, destacado de Catió, disputava-lhe os largos aposentos, como guarda avançada e tampão às possíveis arremetidas que os turras poderiam desfechar sobre Catió" (...).

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Que relação teriam este clã Pinho Brandão com o família Brandão de Bambadinca ? Seriam, muito provavelmente, parentes...

José Botelho Colaço disse...

Luís as famílias Brandão de Catió e Bambadinca quase de certeza que eram descendentes, se pesquisar nas migrações em Portugal do interior para Lisboa encontramos nos Bairros periféricos de Lisboa comunidades de famílias oriundas de uma zona conforme a 1ª família a migrar, assim temos daquilo que conheci exemplo: Póvoa de Santo Adrião comunidades de Almodôvar, Almada e laranjeiro Castro Verde zona de Sacavém: Sousel e Casa Branca e há muitos mais exemplos. Por isso era normal os migrantes aconselharem os famíliares e a seguir os amigos a fugirem da miséria do interior, e creio que a família Brandão na Guiné não deve ter fugido á regra pois até se dizia que iam para as colónias deportados e regressavam deputados. Um abraço.
Uma "Rábula" quando um migrante que na terra era praticamente o que se diz hoje um sem abrigo se pôs a falar sobre os seus exitos dele e da família que até eram veradeiros. E teve como comentário "satírico": mas a Arruda é alguma terra de parvos?!

Valdemar Silva disse...

Colaço, há Brandões e Brandões.
Do Raúl Brandão sabemos que foi um escritor.
Mas Brandões houve conhecidos como pertencentes ao "bando dos Brandões".
Entre estes Brandões do bando, fazia parte o célebre bandoleiro/guerrilheiro João Brandão conhecido como o "terror das Beiras", mais o seu pai e dois irmãos fizeram parte duma quadrilha de bandoleiros políticos no anos 60 do séc. XIX. Foram todos presos e condenados, sendo deportados para a colónias.
Não sei se algum destes Brandões foi deportado para a Guiné, o João Brandão foi deportado para Angola e lá morreu, não sei o que aconteceu aos outros Brandões da família
O João Brandão foi deportado e não regressou deputado, mas é uma figura muito popular na sua terra natal de Midões-Tábua.

Abraço e saúde
Valdemar Queiroz