sexta-feira, 21 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6446: Convívios (242): 21º Encontro do BCAV 8323, 6 de Junho de 2010, em Coimbra (Amílcar Ventura)


1. O nosso Camarada Amílcar Ventura, ex-Fur Mil da 1.ª CCAV/BCAV 8323, enviou-nos uma mensagem solicitando a divulgação da festa do seu batalhão:

Batalhão de Cavalaria 8323
21º Almoço/Convívio


Camaradas,

No próximo dia 6 de Junho, em Coimbra, vai levar-se a efeito o 21º Almoço/Convívio do BCAV 8323.

O evento será realizado a partir das 11h00, no restaurante “Varandas do Ceira” (antigo “Pego Negro”), que se situa na estrada da Beira (EN17).

Chega-se lá, passando por cima do rio Mondego e seguindo em direcção à Guarda, ao km 12.

Um abraço do tamanho da Guiné para todos,
Amílcar Ventura
Fur Mil da 1.ª CCAV/BCAV 8323
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Nota de M.R.:
Vd. último poste da série em:

19 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6426: Convívios (156): o 3º Convívio da Companhia de Caçadores 1589, 15 de Maio de 2010 (Armandino Alves)

Guiné 63/74 - P6445: Histórias de um condutor do HM 241 (António Paiva) (12): Um PM devidamente fardado apesar das circunstâncias (António Paiva)

1. Mais uma história do nosso camarada António Paiva, (ex-Soldado Condutor Auto no HM 241 de Bissau, 1968/70):

Histórias de um Condutor do HM 241 - 12

Um PM devidamente fardado apesar das circunstâncias


Como todos sabem, a PM (Polícia Militar), primava pela sua apresentação e pelo rigor, no cumprimento do seu dever.
Verdade seja dita, pelo que me tocou, nunca me fizeram qualquer mal, correu sempre tudo às mil maravilhas, na Guiné, talvez por se tratar da Unidade que era, Hospital, do qual poderiam necessitar durante o tempo que lá estavam, tinham-nos sempre em atenção.

Alguns camaradas da PM quando ia haver uma operação de controle de excesso de velocidade, de uma forma ou de outra, nos informavam do dia, local e hora, chegavam mesmo a avisar-nos de que o Oficial que estava na operação não era “gajo” para perdoar. Por vezes até boleia nos davam quando, à noite, perdíamos o ultimo transporte.
Posso mesmo dizer, quase com a certeza, que durante a minha comissão só duas vezes de chatearam.

A primeira foi aquela a que faço referencia no P3615, a segunda no dia 31 de Dezembro de 1969, que pouco me chateou, pois não era eu que ia a conduzir, era o Whisky, era fim de ano, mas quem levou com 10 dias de detenção fui eu.

Mas vamos ao que me leva a esta história:

Como devem saber, dentro do Hospital, a boina não fazia parte do nosso complemento militar, a qual não devia mesmo ser usada no seu interior e mais, sem que fosse uma postura de desmazelo, podíamos andar de chinelos e camisa fora dos calções, consoante as circunstâncias, para melhor liberdade de movimentos, o nosso serviço era assim, não tínhamos tendência para aprumos militaristas.

O 2.º Comandante ainda tentou que no Hospital, os militares andassem devidamente fardados, talvez para lhe baterem a pala quando lá entrava, mas não conseguiu.
O General Spínola, sempre aceitou a forma como estávamos e como éramos.

Dou esta pequena explicação, pelo seguinte:

Certo dia, com sinais emergência, chega ao Hospital um jeep da PM, não era para menos, no banco do pendura vinha um Senhor Oficial devidamente fardado e de boina bem posta, fazendo honras à sua farda e à Unidade que representava, mesmo que o sangue lhe escorresse pela face.

Saiu do jeep e entrou pelo Hospital adentro sem tirar a boina. Logo à entrada do corredor foi chamado à atenção, por um médico, que naquela Unidade não se entrava com boina na cabeça.

Resposta pronta, mais ou menos nestes termos:

- Sou militar, sou oficial (Alferes) e estou devidamente fardado.

No corredor se ouve uma voz, vinda da boca do Alf Mil Med Diamantino Lopes:

- Eu trato dele.

Podem crer que o tratou bem, não descompondo o rigor militar de S. Exª.
Nem entrou no Posto Socorros, foi directo para Pequena Cirurgia.

O Alferes, depois de sentado, ia para tirar a boina, o que foi impedido pelo médico.

- Deixe-a estar, aqui quem manda sou eu.

Recurso necessário:

Uma tesoura, para cortar a boina e pôr metade para cada lado.

Depois do espaço aberto, foi executado na perfeição o tratamento adequado.

Só não sei se foi a quente ou a frio, se levou agrafes ou ponto cruz, a verdade é que saiu de lá tratado e a boina unida com fita adesiva.

Já me esquecia, O Sr. Alferes tinha partido a cabeça ao bater com ela na porta de um armário que se encontrava aberta.

Um abraço
António Paiva
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Notas de CV:

Vd. último poste da série de 30 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6075: Histórias de um condutor do HM 241 (António Paiva) (11): Quando a missão não deixa ver

Guiné 63/74 - P6444: Notas de leitura (110): A Guerra Colonial e o Romance Português, de Rui de Azevedo Teixeira (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso Camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil At Inf, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Maio de 2010:

Queridos amigos,
O trabalho do Rui de Azevedo Teixeira é incontornável para qualquer estudo que se venha a fazer alusivo à literatura colonial da guerra da Guiné.

Apelo a quem tem em seu poder os “Contos de Guerra” de Alpoim Calvão (Intertermal, 1994) e “Memórias das Guerras Coloniais” de João Paulo Guerra (Edições Afrontamento, 1994) tenha a bondade de mos emprestar.

Um abraço do
Mário


A guerra colonial e o romance português

por Beja Santos

“A Guerra Colonial e o Romance Português”, de Rui de Azevedo Teixeira (Editorial Notícias, 1998) é uma adaptação de uma tese de doutoramento arguida na Alemanha na Universidade Técnica da Renânia Vestefália, apresentada na Universidade Aachen. É portanto um documento científico sobre a literatura de guerra colonial, obedece a uma selecção de um conjunto de obras reputadas como muito importantes pelo autor: A Costa dos Murmúrios, de Lídia Jorge; O Capitão Nemo e Eu, de Álvaro Guerra; Lugar de Massacre, de José Martins Garcia; Os Cus de Judas, de António Lobo Antunes; Jornada de África, de Manuel Alegre; Nó Cego, de Carlos Vale Ferraz; Percursos, de Wanda Ramos e Os Navios Negreiros Não Sobem O Cuando, de Domingos Lobo. Antes de ir ao cerne destes romances, Rui de Azevedo Teixeira procede a uma contextualização histórica do Império Colonial Português, enquadra as Forças Armadas na guerra de África, apresenta as três frentes de guerra, procedendo a um rescaldo que talvez seja útil aqui sintetizar:

“Para a maioria dos combatentes a experiência africana significou, basicamente, o seguinte: a primeira viagem de avião ou de barco; o primeiro contacto com compatriotas de outras regiões – o minhoto com o açoriano, o alentejano com o transmontano, etc; o primeiro espaço exterior a Portugal a ser conhecido; a concretização do espírito aventureiro dos vinte anos, a realização de sonhos adolescentes como conhecer África ou entrar numa floresta, ter arma de guerra ou assaltar um acampamento, seguir pistas ou preparar uma emboscada ou uma contra-emboscada; o despertar para o amor pátrio na instituição patriótica por excelência – as Forças Armadas, o gosto ou a repulsa pela sociedade armada; o primeiro, e quase sempre único, contacto com a morte violenta; o hábito do duche; a certeza das três refeições diárias; o forte sentido de pertença a um grupo – o grupo de combate; o conhecimento e a aceitação do negro; a avassaladora experiência da imensidão do espaço e da imobilidade do tempo; a inolvidável posse do poder último, do poder de matar ou poupar vidas (nomeadamente nas tropas especiais); o primeiro acto sexual completo”. Este rescaldo deverá incluir os traumas físicos e psíquicos, o autor não deixa de chamar a atenção para o que ficaram psicologicamente afectados e cita os estudos dos psiquiatras Afonso de Albuquerque e Fani Lopes, que têm vindo a ser bastante contestados nos últimos anos.

Segue-se a apresentação da estetização verbal da guerra, e aqui Rui Azevedo Teixeira anda bastante próximo das considerações expendidas por João de Melo em “Os Anos da Guerra”. Primeiro, distinguindo o fio condutor da literatura centrada sobre o conflito armado nas ex-colónias daquela que a precedeu em termos de temática puramente colonial. Segundo, recordando-nos que existiram escritores que defenderam a ideologia colonial. Terceiro, pondo igualmente em cima da mesa a contestação (mais ou menos velada) da literatura portuguesa contemporânea à própria guerra, como é o caso de Álvaro Guerra, Assis Pacheco e João Bação Leal. Quarto, a escrita em democracia, onde as vozes preponderantes tematizam a guerra com valores anti-colonialistas mas onde há também uma correntes ultra minoritária daqueles que mantiveram um sonho nostálgico do império. Ainda tendo em conta a argumentação de Rui de Azevedo Teixeira, é fundamentalmente uma literatura de alferes milicianos, das suas mulheres, de alguns oficiais do quadro, que se estriaram literariamente. Não esquecendo que a tese de doutoramento do autor foi apresentada no final dos anos 90, todo o seu vasto repertório sobre a literatura da guerra colonial refere as marcas essenciais da culpa e da geração, nos seus mais diversos matizes, o que é aliás o campo central da análise do doutorando.

Estamos perante um movimento literário que, como todos nós sabemos, permanece activo, os escritores do século XXI, com excepções honrosas (caso de Armor Pires Mota ou Cristóvão de Aguiar) aproveitaram a distanciação, disponibilidade ou a carga nostálgica para uma retoma da escrita já a caminho da idade sénior, pegando na literatura memorialista e até mesmo na pura ficção. Aliás, nas conclusões da sua tese, o autor lembra-nos que estudou um conjunto de romances canónicos em que os movimentos de fundo tinham exactamente a ver com a geração combatente ainda carregada de emoções e pronta a vazá-las na escrita (caso do Lobo Antunes ou Álvaro Guerra) seguiu-se uma corrente já com a catarse mais domada, um regresso a África com alguma patine (caso de Wanda Ramos e Lídia Jorge), culminando num conjunto de obras de grande pendor nostálgico (caso de Domingos Lobo e Manuel Alegre). Importa insistir que as obras analisadas se referiam ao universo literário que teve o seu termo no século XX, isto para sublinhar que o caudal de obras entretanto surgidas necessita de um outro tipo de ponderação. Ou seja, temos mais teses de doutoramento sobre a temática em perspectiva...
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 20 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6434: Notas de leitura (109): Carlota Lima Leite Pires, 'Nha Carlota' (1889-1970), de António Estácio (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P6443: A Guiné aos olhos das actuais gerações (4): Primeiras impressões de Catió e viagem até Bubaque (Hélder Sousa / Marta Ceitil)

1. Mensagem de Hélder Sousa (ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72), com data de 29 de Março de 2010:

Caros camaradas Editor e Co-Editores
Em anexo vos envio o 4.º relato das experiências de 'formação' de Marta Ceitil, para integrarem, caso entendam, na série respectiva.

Este IV documento relata a ida para Catió, depois das aventuras em Mansoa.
Há um fim-de-semana com viagem até Bubaque, descoberta dos encantos das ilhas e depois a chegada a Catió, com o alojamento na Missão Católica.

Estas são as primeiras impressões... depois virá o trabalho... e as dificuldades e as perplexidades, com as consequentes interrogações e o abalar de 'certezas' adquiridas... mas isso fica para o próximo relato!

Um abraço
Hélder Sousa


Fotos de Catió


A GUINÉ AOS OLHOS DAS ACTUAIS GERAÇÕES (IV)

Primeiras impressões de Catió e viagem até Bubaque


por Hélder Sousa / Marta Ceitil

No seu anterior mail, do final de Agosto, a Marta tinha-nos dado conta como correu a sua experiência em Mansoa. Os avanços sua aprendizagem, os preconceitos quanto à questão de trabalho com jovens ‘militares’, a comovente e inesquecível festa de aniversário que os formandos e amigos lhe proporcionaram. Tudo isto, tendo sempre como base uma atitude que só pode ser classificada como correcta e a única que verdadeiramente funciona: está lá para ensinar mas também muito para aprender.

É essa a chave do sucesso. E é curioso como se pode perceber, pela leitura do “Relatório de Actividades da AD”, na pág. 30, a propósito das actividades das “ong”, como os guineenses entendem certo tipo de ‘colaborações’ e a sua esterilidade, exactamente no sentido do que atrás se disse. Reparem:

“Outro dos aspectos notáveis destes tempos modernos, é o da tentativa de descredibilização da competência dos quadros nacionais, como forma de justificar o envio de rapaziada nova, recém-cursada, sem experiência alguma de terreno, sem dominarem minimamente os conceitos teóricos e práticos do desenvolvimento e que apenas são ouvidos porque ao chegarem ao país, metem a mão no bolso, puxam pela carteira, metem-na em cima da mesa e, do alto da sua sobranceria e deslumbramento, clamam: chegou o Pai Natal!

Vamos distribuir fundos!

É uma rapaziada do tipo “inter-rail”, passeiam pelo mundo inteiro sob o chapéu do subdesenvolvimento, estão sempre de passagem, não chegam a conhecer nada e nada aprendem, convencem-se que o mundo começou com eles, que eles são o big-bang e permitem-se dar aulas técnicas a quem passou a vida a queimar pestanas e que têm a modéstia de reconhecer que o muito que ainda têm de aprender será…com aqueles que sabem.
Afinal, cada tempo tem o seu colonialismo… e o seu combate.”


Não acham que está bem caracterizado? Pessoalmente gostei bastante da classificação da “rapaziada tipo ‘inter-rail’…. que passeia pelo mundo sob o chapéu do subdesenvolvimento, sempre de passagem …. não chegam a conhecer nada e nada aprendem …. e convencidos que o mundo começou com eles”. Um mimo!

Agora, depois da experiência de Mansoa, a Marta vai para Catió. Iremos tomar conhecimento de como o trabalho, a formação, irá decorrer, com as suas vicissitudes e a superação expedita das dificuldades, dos seus ganhos emocionais, mas entretanto ficamos por uma visita a Bubaque e a viagem e chagada a Catió, com as primeiras impressões.

Espero que os camaradas que andaram por Catió possam reconhecer e corroborar as impressões que a Marta nos vai trazer.

Esse mail, datado de 3 de Setembro, foi o que se segue:


Subject: Catio: novas aventuras do sul da Guiné
Date: Thu, 3 Sep 2009 11:45:54 +0000

Olá :)

Kuma di kurpo? Kuma di Galinha? Kuma di trabajo?

Já estamos em Catió e aqui a saudação é ligeiramente diferente. Mais uma vez peço desculpa pelos erros ortográficos, mas estes computadores continuam a ser um mistério para mim, este é italiano, ainda é pior.

No fim-de-semana fomos para as Ilhas, Bubaque. A viagem de 4 horas foi no mínimo surreal: uma “tempestade gigante com ondas do tamanho do mundo”, passei quase todo o tempo enjoada, não sei se pelas ondas, se pelo o cheiro da aguardente de cana que todos os que iam no barco estavam a beber. Tirando esta viagem tudo o resto em Bubaque foi brutal. Comemos muito bem, fizemos praia, fomos sair à noite onde tivemos oportunidade de assistir a um concerto de um músico famoso (não me lembro do nome) mas quem em vez de cantar, faz playback e dança muito…

Já estamos a ficar especialistas na Batida (Kizomba) no Decalé, Gumbé e no Kuduro :)

Segunda-feira viemos para Catió. A viagem foi tranquila, tinham-nos dito que ia ser horrível que as estradas estavam más... nada disso foi mesmo “Shanti Shanti”. Catió fica no Sul da Guiné e é lindo, lindo. Aqui sim, sinto e vejo a Guiné que idealizei: paisagem verde, que contraste com o castanho das tabankas. Aqui as pessoas são bem mais calmas, parecem alentejanos.

Estamos muito bem instaladas, na Missão Católica. O Padre Maurício (italiano) é uma personagem, muito bem disposto, tem 60 anos, e tirando o meu pai, é dos homens mais charmosos que alguma vez vi na vida :) Para além do seu aspecto físico faz umas massas óptimas. Está na Guine desde 1973 e é um espectáculo ouvir as suas histórias. A missa também é qualquer coisa…, primeiro é dada em crioulo e depois a música é tocada com djambés. Segunda-feira começamos a dar a formação aos professores. Este vai ser o nosso maior desafio, mas acredito que vamos dar conta do recado.

Connosco na Missão Católica está um rapaz italiano o Giovanni que é a maior personagem que alguma vez conheci. Tem 26 anos, e está na Guiné há 3 anos. Ficou por Catió e agora ajuda o Padre Maurício na horta. O Giovanni é baixinho, gordinho e parece o Pai Natal. No outro dia fomos com ele de carro ver a Horta, e no rádio começou a dar Madona - Material Girl, o que é que foi aquilo? Parecia louco, a cantar e a dançar como se não houvesse amanhã. Surreal, nem consigo descrever. Na Horta, quisemos ajudar, pegámos nas enxadas e começámos a cavar, não sei bem para quê. Esta minha experiência durou 15 minutos, além de ter ficado exausta tive o meu primeiro encontro imediato com uma cobra. Desta vez não fiquei calma, desatei aos berros e fugi para o carro e só saí lá de dentro quando chegámos a casa.

Enfim... tenho tantas histórias ainda para contar, mas fica para depois. Continuo encantada, e cada vez a gostar mais disto. Sinto-me mais tranquila e de bem comigo própria. Nunca tinha estado assim...em paz. Também estou a gostar de sentir que estou a aproveitar cada momento desta experiência e a tirar o máximo partido dela.

Bem, por agora é tudo, na próxima semana envio mais notícias.
Beijinhos grandes com muitas saudades :)
Marta Ceitil



Que se pode dizer quanto a isto?

Podemos perceber como a Marta emprega sempre um entusiasmo, uma alegria, uma atitude de “gostar do que faz”, em tudo quanto observa e relata. E a franqueza e aparente ingenuidade dos relatos de algumas passagens só dão mais autenticidade às mesmas.

Apenas para que possam compreender como toda esta experiência ‘de Verão’ foi importante, revelo que a Marta depois de ter regressado a Portugal no início de Outubro passado, já se encontra de novo na Guiné, agora desenvolvendo trabalho no âmbito dos “Médicos del Mundo” que não deixaram de aproveitar todo o seu entusiasmo e gosto por aquela terra e aquelas gentes.

Um abraço para toda a Tabanca!
Hélder Sousa
Fur Mil TRMS TSF
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 27 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6260: A Guiné aos olhos das actuais gerações (3): Estou feliz e estou grata por esta oportunidade (Hélder Sousa / Marta Ceitil)

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Guiné 63/74 - P6442: História da CCAÇ 2679 (36): O jogo do gato e do rato (José Manuel M. Dinis)

1. Em mensagem de José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 17 de Maio de 2010 recebemos mais este pedaço da História da sua Companhia:

HISTÓRIA DA CCAÇ 2679 (36)
O jogo do gato e do rato
Com um pedaço de pão limpei o óleo, quase côr de sangue, que cobria o fundo da lata de chouriço. O petisco salgado soubera-me muito bem, e esta gordura prolongava o prazer do paladar. O local era fresco, se assim se pode dizer de uma temperatura ambiente idêntica às dos meses de Verão em Portugal, mas a sombra proporcionada pelas muitas árvores, conferia uma frescura que nós valorizávamos.

Um ou outro chamamento das aves que esvoaçavam entre as copas, contribuía para o ambiente bucólico da savana algo densa nesta região fronteiriça com o Senegal.

Apeteceu-me saborear o sol. Assim, a modos que um qualquer turista em região de excursões, deixei escorregar o corpo num local onde incidiam os raios do astro, apoiei a cabeça sobre as cartucheiras, abri a camisa e senti o efeito da luz rarefeita pela folhagem, mas que me aquecia o peito como se estivesse em estância balnear.
Em redor, o pessoal também adoptava atitudes pachorrentas.

Era muito improvável que, àquela hora e naquele lugar (fora de trilhos e linhas de passagem na fronteira), tivéssemos um inesperado encontro com o IN, por isso dava oportunidade à descontração.

Passaram-se alguns momentos naquele estado de ausência, em que a mente voava para outras paragens familiares e saudosas.
Até que do ar, lá longe, da direcção de Pirada, chegou o ruído grave e mecânico de um helicóptero. Abri os olhos, apurei os sentidos, e parecia que o aparelho pairava suspenso no ar, como quem me procurava. Mau, pensei para comigo. De facto, o Foxtrot estava muito longe do percurso desenhado para uma daquelas patrulhas de combate, pomposa designação que nos dá a ideia de termos saído à caça do IN, como os caçadores saem de casa, caçadeira ao ombro, e embrenham-se no campo, de onde regressam com meia-dúzia de rolas, enquanto os canitos alegres fazem correrias espevitados por cheiros de animais que passaram pelos caminhos. Pois era destas sugestões que viviam os nossos gestores de Operações, que faziam traços coloridos sobre as cartas, para a tropa devassar numa lógica de que se ali passassemos, a guerra estava controlada.

Entretanto, aquelas ondas sonoras provenientes do movimento das pás e dos motores, pareciam garantir-me que, lá do alto, alguém queria observar os nossos movimentos em terra. Talvez por isso, ou porque eu sabia perfeitamente que me estava a baldar para o percurso, que devia estender-se precisamente naquela direcção, dei um salto e dirigi-me para o Transmissões:

- Nuno, dá cá a pilha do rádio!

O Nuno quase não reagiu, com um olhar surpreso, calado, sem esboçar qualquer movimento, como se lhe tirassem a vida, tirando-lhe a pilha do rádio.

- Dá cá a pilha, não ouves? insisti.

Ouviu, e incrédulo retirou a pilha do rádio para ma entregar. Guardei-a, e perante os olhares atónitos justifiquei-me:

- Malta, nós devíamos estar naquela área que o héli sobrevoa, mas decidi ficarmos por aqui a descansar. Esta minha decisão pode custar uma porrada para mim, por isso não quero qualquer comunicação. Se vocês se dispuserem a fazer uma corrida de quatro ou cinco quilómetros, pode ser que a coisa passe, sobretudo se o héli voltar àquele lugar.

O Pelotão, estimulado por dois ou três, decidiu imediatamente, que sim, que num instante nos poríamos lá.

Começámos a correria, toc-toc, com as mochilas a bater nas nádegas e nos cantis, tropeçando em raízes e lianas, em gincana por entre os obstáculos da vegetação.

Até que chegámos ao rio Mael Jaubé.

O rio apresentava-se quase seco, limitado a três ou quatro drenos onde a água, praticamente estagnada, esperava os efeitos da vaporização até à seca derradeira. Não era um obstáculo, mas as botas submergiram à sua passagem, encharcando os pés e dificultando a marcha. Não desistimos, que o Foxtrot era um grupo determinado e teimoso. Prolongámos a corrida por mais um pouco. Do héli já não havia sinal, ainda progredimos um bocado, até que a pedido de alguns fizémos uma paragem. Houve quem tirasse as botas e meias húmidas. Deixámo-nos estar ao sol, como bacalhaus a secar.

Quando decidi regressar ao aquartelamento, havia pessoal que não conseguia calçar as botas por terem os pés inchados. Surpresa ingrata aquela, que não permitia o regresso normal da patrulha. No entanto, aqueles poucos reagiram que andariam descalços, não haveria problema.

Do héli não tivemos mais notícias, nem sei se alguém tentou contactar-nos durante o percurso. A chegada verificou-se com os pés descalços fazendo chalaças sobre a situação.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 4 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6309: Controvérsias (72): Uma Página Negra (José Manuel Matos Dinis)

Vd. último poste da série24 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6236: História da CCAÇ 2679 (35): De estórias se faz a história de uma Companhia (José Manuel M. Dinis)

Guiné 63/74 - P6441: (Ex)citações (74): Comentários e respostas (Arménio Estorninho)

1. Mensagem de Arménio Estorninho* (ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, CCAÇ 2381, Ingoré, Aldeia Formosa, Buba e Empada, 1968/70), com data de 15 de Abril de 2010:

Amigo e Camarada Carlos Vinhal,
Saudações e extensivas a todos os Tabanqueiros.
Como tudo deve feito a seu tempo e houve um pouco de disposição, para responder a alguns comentários feitos a “estórias minhas” contidas nos Postes: P5293 e P5304.

Provavelmente os camaradas a quem irei responder, não tivessem feito uma leitura mais atenta e/ou eu como algarvio “escrevi muito rápido” e não tendo esclarecido devidamente a mensagem, mas tenho elementos que elucidam as datas e observações. No entanto tratam-se de outros acontecimentos com situações relevantes que no meu ponto de vista não se ajustam aos contidos.


Ponto 1 – Guiné 63/74 P5324: FAP (37) TEVS a Aldeia Formosa e Buba – Jorge Félix ex - Alferes Mil. Pil. B12 – Bissalanca.

Amigo e Camarada Jorge Félix, documentando e esclarecendo os factos subjacentes, das intervenções em TEVS e da interpretação que deu ao conteúdo da minha crónica:

- Excerto da História da Unidade CCaç 2381, da qual consta que em 04/Jan/69.

A Unidade deslocou-se em coluna de Aldeia Formosa para Buba, tendo-lhe sido atribuída a missão de dar segurança aos trabalhos de abertura da nova estrada entre Buba e Aldeia Formosa, colaborar nas escoltas às colunas realizadas entre estas duas localidades, operações e emboscadas de contra penetração.

Coluna Aldeia Formosa – Buba, sem incidentes.

- Estando mencionado no Poste P5304 – Aldeia Formosa, em data posterior a 04/Jan/69, quando regressei a este Aquartelamento, o Comando e Serviços da minha Unidade CCaç 2381, já se tinha deslocado para Buba. É porque não podendo precisar, pois nesta data ainda me encontrava em Bissau (foto 1) a frequentar um curso sobre geradores eléctricos.

Foto 1 – Guiné> Cidade de Bissau> Praça do Império> 1969> Museu e Biblioteca, imagem com belos realços e hoje como será.

- Por conseguinte tratou-se de TEVS, efectuadas na data na zona mencionada e em apoio de outras Unidades.

- Excerto da História da Unidade CCaç 2381, da qual consta que em 21/Jan /69, durante a coluna auto Aldeia Formosa – Buba, grupo In emboscou as NT durante dez minutos, utilizando armas ligeiras, RPG-2, granadas de mão e morteiros ligeiros, causando 07 feridos às nossas tropas e 02 civis.

Quando a coluna retomava a marcha, foi accionada por um viatura uma mina a/c reforçada, causando danos materiais e destruição parcial de uma viatura. As NT reagiram pelo fogo e manobra efectuando uma batida à zona.

- A data que registou coincide com a antes mencionada e por conseguinte foram efectuados os TEVS, relativos aos feridos sofridos pela acção In e no decorrer da coluna. (foto 2)

Foto 2 - Guiné> Região de Quinara> Algures do Sector de Buba> 1969> Operação de TEVS, estando eu assentado, de pé o ex-1.º Cabo “O Lisboa” e um sinistrado.

- No entanto eu consegui evitar seguir incorporado nessa coluna, porque tive a sorte de antecipadamente fazer a viagem de Dakota e todavia é a única menção que fiz na crónica.

- Assim sendo, como eu referi trata-se de assunto diferente com data de 22/Jan./69, que ao anoitecer em Aldeia Formosa (Quebo) deu-se um acidente, o qual ocasionou dois mortos e dez feridos às NT. Estando eu no Quartel de Buba, pela noite dentro ouvia as inusitadas passagens de meios aéreos, o que era anormal e por isso interrogávamo-nos sobre o que sucedera para os lados de Aldeia Formosa.

Penso que assim ficaram devidamente esclarecidas as dúvidas em causa e ficarei receptivo para quaisquer esclarecimentos.

Amigo Jorge Félix, daqui vai um forte abraço.


Ponto 2 – Guiné 63/74 P5293 Buba – Aldeia Formosa – Comentário de Carlos Cordeiro.

- Caro amigo e Camarada Carlos Cordeiro, tenho muito gosto em lhe responder ao seu comentário um pouco sarcástico, mas, e embora tapando o Sol com uma peneira com (estou a brincar naturalmente), a primeira reacção pessoal que tive foi impulsiva de lhe apontar a esferográfica, mas para saber em que águas podia navegar tive o cuidado de aproveitar o Blogue para antecipadamente fazer uma pequena leitura sobre os seus dados, em que consta ex–Furriel Miliciano de Infantaria e actualmente professor de História Contemporânea na Universidade dos Açores, em Ponta Delgada, bonita cidade que já visitei três vezes, quando militava nas lides da Arbitragem de Futebol. Assim, a coisa fiou mais fino e claro está tratou-se de uma brincadeira para espicaçar as hostes. Tudo bem quando é salutar.

- Contudo para satisfação ao v/pedido de eu comentar como funcionavam as viaturas, porque lhe fazia confusão e os mecânicos quando punham uma viatura avariada a andar, (o português é muito traiçoeiro) deitavam os peitos para fora e olhavam de soslaio com ar de superioridade.

- Aqui vai mais ou menos como as coisas se passavam:

- A Secção Auto da Unidade só deveria receber as viaturas que circulassem e sem qualquer avaria detectável (foto 3)

- Era sempre conveniente que houvesse várias viaturas da mesma marca e tipo, para quando uma se avariasse ou se acidentasse e mesmo antes de ser abatida servia para peças sobressalentes ou era feita permuta de peças com outras viaturas;

Foto 3 – Guiné> Região de Quinara> Empada> 1969> Oficina Auto e Garagem, um luxo no meio do mato.

Foto 4 – Guiné> Sector de Buba> Algures Aldeia Formosa – Buba> 1968/9> Desmantelamento de uma viatura sinistrada, pela direita um mecânico africano, eu ao centro e o Soldado Mec. Auto, José António Coelho, de Maiorca - Figueira da Foz.

- Como não havia ferramentas para grandes reparações, as funções dos mecânicos eram mais à base de desempanar e/ou substituindo peças (foto 4). Eram poucas as Secções de oficinas existentes no mato que tinham a possibilidade de reparar um motor e/ou caixa de velocidades, em caso fosse necessário deveriam ser enviados os conjuntos para Bissau e eram comuns as instruções dadas, todavia em Aldeia Formosa, a CCaç 1792 teve o consentimento para reparar motores e caixas de velocidades.

Por conseguinte neste Aquartelamento, agrupou-se um bom grupo de mecânicos auto tendo como o seu principal promotor um 1.º Cabo (foto 5).

Foto 5 – Guiné> Região de Tombali> Aldeia Formosa (Quebo)> 1968> Eu, à direita, e o ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas da CCaç 1792, que era um senhor na arte prática da mecânica auto.

- Se os mecânicos quando punham uma viatura a andar, olhavam de soslaio e com ar de superioridade,” era devido às deficientes condições de trabalho, com um reduzido tipo de ferramentas, com martelo e escopro até faziam milagres, depois era para alguém dar-lhes uma palmada nas costas e acordarem de um lindo sonho de ser útil (foto 6).

- Ao frequentar a EPSM em Sacavém, (textos eram comigo) dadas as minhas habilitações teóricas granjeei amizades com aqueles que tinham a prática oficinal e juntávamos a teoria à prática. Portanto eu possuidor do Curso Secundário da Escola Industrial de Silves e o Curso de Mecânico Auto, da EPSM em Sacavém, e os meus camaradas tinham a prática profissional e o Curso de Mecânico Auto, das EPSM.

Foto 6 – Guiné> Região de Quinara> Empada> 1969> Parque de viaturas, depósito de combustíveis e a Tabanca Manjaco, sendo a primeira palhota a da Eugénia, irmã do recente falecido Mamadu o conhecido ex-Alferes da Milícia de Empada.

- Das muitas dificuldades deparadas, posso-lhe dizer que aquando uma coluna ter chegado a Buba, efectuara um trabalho que aparentemente era simples, tornando-se complicado somente colocar um motor de arranque numa viatura Berliet, demorando cerca de cinco horas para executar, devido ao reduzido espaço de movimento e da forma como era encaminhado (guiado) para apanhar posição. Que belo petisco, fazendo-o sem ajudas, estando deitado debaixo da viatura, com o motor em suspensão e colocando-o a pulso. A urgência e a ânsia de efectuar o serviço conjugavam-se, não podia dar mostras de incapacidade e por fim disse “eureka.” Mas esta viatura só depois de reparada é que foi posta em marcha (também estou a brincar naturalmente).

- Em que cada um me dizia que era inventar o que já estava inventado, que também sabiam das dificuldades e eu fiquei sem apetite de repetir a façanha.

- Nos trabalhos efectuados e a coadjuvar dei o meu melhor, dando como forma de remate de conversa que no desempenho das minhas funções, tive a honra do Comandante do BCaç 2892 me ter concedido um Louvor.

Pelo o meu ponto de vista dou por terminadas as respostas a comentários, que me foram colocados e dando o devido esclarecimento.

Com cordiais saudações a todos os Tabanqueiros,
Arménio Estorninho
Ex-1.º Cabo Auto Rodas
CCaç 2381 Os Maiorais
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 18 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6421: Do meu álbum fotográfico (Arménio Estorninho) (2): Bissau - Um olhar de turista

Vd. último poste da série de 8 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6129: (Ex)citações (58): Repondo a verdade sobre o ensino na Guiné Portuguesa (Mário Dias)

Guiné 63/74 - P6440: Da Suécia com saudade (25): O estatuto dos Oficiais do Exército há 60 anos, que não podiam casar com mulheres brancas, nascidas nas colónias, mesmo que filhas de casais brancos (José Belo)

1. Mensagem do José Belo, o luso-sueco (e quiçá, no futuro, americano)  fundador, editor, animador da Tabanca da Lapónia (*):



Data: 19 de Maio de 2010 13:50

Assunto: O Cúpido: Racismos e Burocracias.

Caros Camaradas e Amigos:

Hoje é esquecido, e custa mesmo a acreditar, mas facto é que, tão próximo como na década de 50, os oficiais do Exército não podiam casar com mulheres BRANCAS,  nascidas nas províncias ultramarinas, mesmo que filhas de casais brancos.

Isto aplicava-se à África, Índia, Macau ou Timor. Uma perfeita anomalia, segundo a qual haveria" brancas de primeira", as nascidas na metrópole, e" brancas de segunda", as nascidas no ultramar. 

Creio que as gerações novas, perante este tipo de determinações dos nosssos "maiores" de então, terão mais facilidades de compreensão de todo um .....contexto colonial que tantos procuram, hoje,"sublimar". 

Para salvaguardar perdas de prestígio profissional, resultantes de situações económicas menos dignas devido a Soldos de miséria, os Tenentes e Alferes não podiam casar sem que os pais das noiva, ou alguém responsável, se comprometesse a dar-lhes uma pensão mensal. As situações burocráticas complicavam-se com mobilizações.

O Ministério do Ultramar de então aceitava os casamentos desses oficiais sem dote ou pensão.Assim, ao irem para as colónias pela primeira vez, os casais tinham viagens pagas pelo Estado, mas posteriormente, por terem deixado de estar sob a alçada do Ministério do Ultramar, e agora passarem a depender do Ministério do Exército, esses oficiais já não tinham direito a viajar com as famílias. 

Para "circundar" alguns destes problemas...insolúveis, alguns oficiais realizavam, por procuração, o casamento em Espanha, e o registo Católico desses casamentos era posteriormente feito, com o auxílio de alguns Capelões Militares, nas dioceses coloniais, e comunicado então às repartições respectivas. 

Quanto ao casamento com noiva não Católica ,mesmo que Cristã, mas Protestante (para não referir as não Cristãs),as coisas eram ainda mais complicadas de...."circundar". 

O Cúpido, mesmo em época tão próxima no nosso querido Portugal, não tinha o trabalho facilitado pelo Estado Novo. 

Estocolmo
19 Maio 2010
J.Belo.

[Revisão / fixação de texto / título: L.G.]

2. Comentário de L.G.:

Não conheço o estatuto dos oficiais do Exército dessa época... Gostava de ter acesso à respectiva legislação. Num país em que tudo se legisla(va) e regulamenta(va), deve haver seguramente um diploma legal sobre esse problema... Deves conhecer este "dossiê", já que o teu pai era médico militar...

Possivelmente da mesma época é o Decreto Lei nº 32612, de 31 de Dezembro de 1942 que veio reformar o ensino e da prática de enfermagem, começando por impor a infamante proibição do casamento às enfermeiras (o D.L. 31913, de 12 de Março de 1942, reservava o exercício da enfermagem às mulheres solteiras ou viúvas, sem filhos), uma medida claramente sexista e misógina, inspirada na legislação de Mussolini, e que só será revogada mais de vinte anos depois (D.L. nº 44 923, de 18 de Março de 1963), por notória dificuldade no recrutamento de pessoal de enfermagem hospitalar mas também por que a economia e a sociedade estavam a sofrer profundas mudanças...

Igualmente discriminatório era a legislação de 1936 que impunha que o casamento das professoras não poderia realizar-se sem autorização do Ministro da Educação Nacional, exigindo-se ao pretendente  prova de ter "bom compartimento moral e cívico"  e de auferir vencimentos ou rendimentos   em harmonia com os da professora...
Havia legislação igualmente discriminatória para outras ocupações femininas como as telefonistas, etc.   

Sobre este período do Estado Novo, que vai até ao fim da II Guerra Mundial, veja-se o filme de João Canijo,"Fantasia Lusitana",  agora no circuito comercial... Ver aqui o "trailer", de 29 segundos:


(Amigos e camaradas: Nas imagens do filme do João Canijo, que se baseou em reportagens da época, fui lá encontrar o nosso velho "Carvalho Araújo" transportando, a partir do Cais da Rocha Conde de Óbidos, expedicionários para os Açores... Quem diria, vinte e tal anos depois, que o mesmo "Carvalho Araújo" levaria os filhos desses expedicionários agora para o TO da Guiné!...).

3. Adenda do José Belo, com data de 21 do corrente:


Se tiveres acesso ao livro de Maria Manuela Cruzeiro sobre Costa Gomes, o último Marechal, ele a páginas 39/40 referindo-se aos seus tempos em Macau,  descreve toda esta problemática dos casamentos com brancas de.....segunda e outras complicações burocráticas. 

Mas o problema, no fundo, não estava ligado a "brancas" e "brancas", mas sim há possibilidade de haver sangue africano misturado gerações atrás nos progenitores das referidas meninas brancas, o que poderia vir a provocar inesperados nascimentos mais bronzeados do que os costumes de então aceitariam numa família de oficial. 

Este "pequeno detalhe"  foi-me contado pelo meu Avô paterno que era também médico militar,e fora colocado no norte de Moçambique durante a primeira guerra Mundial. Primeiro julguei que o problema só fosse referido a Moçambique por ter maiores influências da África do Sul, mas depois de ler o livro do Marechal compreendi que era generalisado a todas as colónias. Um abraço.

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Guiné 63/74 - P6439: Ser solidário (70): Novas formas de colonialismo (José Teixeira)

1. Mensagem do nosso camarada José Teixeira* (ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada , 1968/7), com data de 19 de Maio de 2010:

Caríssimos editores e amigos.

O texto que junto, resulta de uma leitura atenta do Relatório da AD.
Não sei se "tem pernas para andar" dentro do nosso blogue. Se não tiver paciência.
Por mim creio que o que está escrito no Relatório é um tremendo grito de repulsa, a algumas formas de caridadezinha que se tem vindo a incrementar e que segundo o Pepito, com quem tive oportunidade de conversar sobre este assunto, antes de ler o texto.
O que ele e a AD* pretendem é fazer crescer o povo da Guiné, através da formação, da utilização de meios para por as gentes a agir e não ficarem "penduradas" nos contentores que todos os anos lá aparecem com consumíveis de toda a espécie.

Abraço fraterno
José Teixeira


Novas formas de colonialismo

Por amabilidade do Carlos Vinhal, tive acesso ao Relatório da actividade desenvolvida pela AD – Acção para o Desenvolvimento, ONG, durante o ano de 2009 na Guiné-Bissau.

Li-o apaixonadamente, porque desde há alguns anos, desde que tomei conhecimento da sua existência, graças a este blogue, me apercebi que não se trata de uma ONG qualquer, mas de uma organização, com objectivos muito concretos, uma equipa de técnicos e colaboradores de alto gabarito, a começar pelo querido amigo Carlos Schwars (Pepito), com obra realizada e projectos que devem merecer a nossa atenção e melhor colaboração.

Por mim, estou procurando através da Tabanca Pequena – Grupo de Amigos da Guiné- Bissau**, dar uma pequena ajuda, fomentando a abertura de 10 fontenários em tabancas do interior da Guiné, num projecto já acordado com a AD.

O primeiro vai ser construído por administração directa da AD na tabanca de AMINDARÁ- junto a Guiledje, para o qual, com a colaboração de alguns camaradas, já há a verba (quase) para o equipamento.

Chamou-me à atenção no Relatório da AD um pequeno trecho, que transcrevo abaixo:

Nos últimos tempos, assistimos à chegada em força de projectos de tipo caritativo, sobretudo nas áreas da agricultura e da saúde, que descarregam sem nenhum critério de durabilidade, material, sementes, máquinas e postos de saúde nas zonas que supostamente (?) necessitam de apoio. Esta nova modalidade envolve não só as ong estrangeiras como organismos internacionais especializados que, com uma perna às costas, escolhem com transparência (como havia de ser, pois então!) organizações locais dispostas a serem meninos de mandado e que se prestam a distribuir, por preços de ocasião, toda essa parafernália de material, ao primeiro que apareça e sem a mínima preocupação de apoiar o surgimento de uma dinâmica de desenvolvimento, ou de consolidar uma que já exista, ou assegurar a durabilidade dessa intervenção avulsa.

Como consequência cria-se uma cultura de mendicidade em que as comunidades ficarão todos os anos à espera que os outros lhes venham resolver os problemas. É que há uma diferença abissal entre dar sementes agrícolas todos os anos aos mesmos e criar uma rede de agricultores – multiplicadores que assegurem a existência de sementes em todas as regiões do país. No passado, o DEPA provou que era possível existir na Guiné-Bissau uma política consequente neste domínio.

Mais grave ainda é quando uma organização estrangeira especializada dá gato por lebre, isto é, distribui sementes não certificadas, compradas a bana-banas de material agrícola em que a faculdade germinativa (isto para não falar da pureza específica e varietal e do seu poder germinativo) estão abaixo de 50%. Ou é incompetência, ou irresponsabilidade ou estamos perante o que se chama de “corrupção discreta” que grassa neste país.

Outro dos aspectos notáveis destes tempos modernos, é o da tentativa de descredibilização da competência dos quadros nacionais, como forma de justificar o envio de rapaziada nova, recém-cursada, sem experiência alguma de terreno, sem dominarem minimamente os conceitos teóricos e práticos do desenvolvimento e que apenas são ouvidos porque ao chegarem ao país, metem a mão no bolso, puxam pela carteira, metem-na em cima da mesa e, do alto da sua sobranceria e deslumbramento, clamam: chegou o Pai Natal!

Vamos distribuir fundos.

É uma rapaziada do tipo “inter-rail”, passeiam pelo mundo inteiro sob o chapéu do subdesenvolvimento, estão sempre de passagem, não chegam a conhecer nada e nada aprendem, convencem-se que o mundo começou com eles, que eles são o big-bang e permitem-se dar aulas técnicas a quem passou a vida a queimar pestanas e que têm a modéstia de reconhecer que o muito que ainda têm de aprender será… com aqueles que sabem.

Afinal, cada tempo tem o seu colonialismo… e o seu combate.


(Com a devida vénia. Sublinhados da minha responsabilidade)

Esta parte do relatório, pôs-me a pensar e creio que o remate final diz tudo.

Tenho sido testemunha de situações deste tipo. Não é minha intenção censurar quem as tem praticado, até porque compreendo muito bem as razões que nos levam a nós - guineenses de coração, avançarmos para esta forma de agir, como uma maneira fácil de “ajudar” quem tanto precisa.

Permito-me levantar algumas questões.

- Porque não procuramos saber através de ONGs como a AD, quais as necessidades efectivas do povo da Guiné para organizarmos campanhas direccionadas para colmatar essas necessidades?

- Porque não entregamos a ONGs como a AD os produtos que conseguimos arranjar para que estas façam a gestão dos mesmos?

- Não será que se deva informar as ONGs das dificuldades e problemas que detectamos localmente, (normalmente nos locais por onde passamos outrora) e com as ONGs procurarmos soluções de continuidade que promova o crescimento da pessoa e se combata a “caridadezinha” que tanto criticamos cá em Portugal?

José Teixeira
__________

Notas de CV:

(*) Para consultar postes relativos à ONG AD, clicar no marcador AD - Acção para o Desenvolvimento

(**) Vd. poste de 8 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6342: Ser solidário (69): Sementes e água potável para o Cantanhez - Faltam-nos 500€ para o primeiro poço, em Amindará (José Teixeira)

Guiné 63/74 - P6438: Álbum fotográfico de Daniel Matos - III parte

Terceira parte do Álbum fotográfico de Daniel Matos, ex-Fur Mil da CCaç 3518, Gadamael, 1971/74



Foto 67 > Festarola em Bafatá, creio que em Outubro de 1973, no dia em que acabaríamos a comissão; depois, "gostaram de nós", e acabámos por ficar até Abril de 1974!...
À esquerda, o Morais, dono do restaurante do mesmo nome e da escola de condução. Há uns anos apareceu num convívio da Companhia na Costa de Caparica, mas estupidamente não ficámos com o contacto e nunca mais tivemos o privilégio da sua companhia. Suponho que mora na Margem Sul, se alguém souber a forma de o contactarmos, por favor, avise.

Ainda na foto, os Fur Mils Calvão, Ângelo Silva e Lopes Silva e, entre eles, um agente da PIDE/DGS que quis associar-se aos festejos...

Foto 69a > A entrada de Gadamael, junto ao cais; a seta lembra implacavelmente a distância a que estamos de casa: 3600 km!

Foto 69b > Durante um ano e tal tivemos uma ou duas vezes a visita de um fotocine, com filmes de 16mm do Charlot (do mal, o menos); esta era a tela de projecção, mandada construir na máquina Singer do alfaiate da aldeia, a partir de velhos lençóis.



Foto 75 > Nos anos derradeiros da guerra, de norte a sul, do leste a oeste, e salvo no miolo dos grandes centros urbanos, a Guiné era um cenário de destruição (foto que o Fur Mil Pessoa me tirou, em Ganturé).


Foto 83 > Impossível referir a constituição da Companhia sem mencionar a nossa mascote! Ainda se lembram da Marada?

Foto 84a > Entre os graduados e alguns soldados da Companhia recolhi calções e camisolas ("t-shirts") e pedi ao alfaiate da tabanca que recortasse em tecido azul a letra "A" e a cosesse em cada camisola; O "A" era de "Académico", Ronco Académico de Futebol, uma equipa constituída pelos meus alunos que ganhava muitos jogos aos adultos.

Na foto, o guarda-redes é o António Valente, então como hoje, grande locutor do Clube Asas do Atlântico (em Santa Maria/Açores), que também foi ali professor primário.


Foto 84b > Se hoje na Guiné alguém criasse um clube chamado Ronco Académico de Futebol e o historiador do "Toppo Giggio" viesse a ler estas linhas, o clube nascia já com mais de 37 anos de existência!... Há clubes em Portugal cuja "longevidade" se mede assim... Os jogadores são quase os mesmos da foto anterior, mas em baixo, o segundo a contar da esquerda é o soldado Ricardo Lima da Costa que muito colaborou a dar aulas às crianças. Por onde andará?



Foto 88 > Pequeno monumento mandado erigir pelo capitão, junto ao pau de bandeira, para perpetuar a nossa passagem no local, mas foi "sol de pouca dura"...


Foto 89a > Alguns dos soldados da Companhia, numa aula da 4.ª classe (apesar dos enormes sacrifícios e das más condições de aprendizagem, quase todos a concluiriam, vindo a ser aprovados no exame que mais tarde fariam na Escola Primária de Bafatá).

Foto 89b > Mais soldados que frequentaram as aulas da Escola Regimental, aproveitando os poucos tempos livres.

Foto 89c > Embora relativamente próxima da zona de aquartelamento, a escola ficava para lá do arame farpado e, durante as aulas nocturnas, eu levava sempre comigo uma pistola Walter (nas aulas diurnas, ia desarmado dar as aulas às crianças) .

Foto 90 > Ainda mais alguns Marados de Gadamael...

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Nota de CV:

Vd. postes de:

16 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6407: Álbum fotográfico de Daniel Matos - I
e
18 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6418: Álbum fotográfico de Daniel Matos - II parte

Guiné 63/74 - P6437: Elementos para a caracterização sociodemográfica e político-militar do Sector L1 (2): O Fula, a sua lealdade,o seu preço (José Armando F. de Almeida / Luís Graça)





Infogravura: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010). Direitos reservados


[Continuação da publicação de excertos do Cap II da História do BART 2917, Bambadinca, 1970/72, segundo versão policopiada gentilmente ao nosso blogue pelo ex-Fur Mil Trms Inf, José Armando Ferreira de Almeida, CCS/ BART 2917, Bambadinca, 1970/72, membro da nossa Tabanca Grande]


3. População (…)

c. Modo de vida

A população do Sector pratica na sua maioria uma agricultura de subsistência (arroz e milho) e “cava” a importa agricultando mancarra (Fulas e Mandingas) [,frase ininteligível].

Os Balantas produzem arroz para além das suas necessidades.

Como complemento desta actividade praticam ao longo do ano, e quando livres das culturas de subsistência, a exploração do coconote (Regulados do Corubal, Xime e Badora), artesanato (Regulados de Badora e Xime) e banana (Regulado do Xime), produtos que exportam para Bissau.

Dedicam-se também à caça e à pesca mas quase só em regime de subsistência.

É importante a quantidade de pessoal empregado na estiva dos Portos de Bambadinca e Xime.

É muito importante, especialmente respeitada entre os Fulas, a instituição Homem Grande, para quem a única ocupação digna é a meditação do Corão ou a guerra. Como o homem ascende à situação de Homem Grande na maior parte dos casos na plenitude das suas possibilidades físicas, passa a constituir um pesado encargo para o seu agregado social, obrigando as mulheres e as crianças a um trabalho intenso nas bolanhas para a sua subsistência.


d. Línguas e dialectos


Apenas uma pequena percentagem fala portguês; o idioma veicular mais comum é o crioulo, adoptando cada grupo étnico a sua língua. Sendo portanto predominante em cada área a língua do grupo Fula, Mandinga, Balanta, etc.


e. Aspecto político


(i) Fula


Sob esta designação incluimos todo o grupo Saheliano – Ramo Fula.

Constituindo o grupo étnico, dominante no Sector, o último invasor, ocupando antes do desencadeamento da subervsão quase exclusivamente todos os lugares do baixo funcionalismo (cipaios e intérpretes, etc. ), desenvolveu contra si o intenso ódio do Beafada, e a dissimulada aversão dos vencidos Mandingas.

Islamizados, despoticamente paternalistas, com o culto da velhice (Homens Grandes) e das posições de privilégio, considerando como únicas ocupações dignas do homem a meditação religiosa ou a guerra, desprezando os que trabalham ou que denunciam vontade de progresso, os Fulas alimentaram com o seu procedimento a aversão do Balanta, individualista e trabalhador, a quem o Fula explora como dono da terra.

Por sua vez, o Fula odeia o Caboverdiano que com ele compete na ocupação dos diversos lugares do funcionalismo.

Aproveitando-se dos ódios e aversões expostas pôde, o PAIGC, com facilidade desencadear a guerra racial contra os Fulas a quem identificou com os Portugueses. Tal circunstância impermeabilizou os Fulas contra o terroismo actual, e a sua necessidade de sobrevivência tornou-os nossos aliados, levando-os a um contacto íntimo e prolongado cujas consequências não podemos ignorar.

Praticando uma agricultura de subsistência e angariando recursos para as demais necessidades imediatas pela prestação de serviços às guarnições militares locais (soldados, milícias, lavadeiras, etc.) , as inúmeras necessidades que o maior contacto com o Europeu lhe foi criando e a quase nula existência de infraestruturas do Sector, agravada para mais pela situação da guerra, habituaram o Fula a pedir tudo às unidades militares: pede dinheiro, pede transportes, pede alimentação, pede materiais para a sua casa, pede assistência sanitária, pede água, pede luz, pede, etc., etc.

Em troca dá a sua lealdade à luta em que estamos envolvidos e não dá absolutamente mais nada, pois até recusa a mão de obra para o trabalho em seu único proveito.

Apesar de muitos procedimentos tradicionais chocarem e até ferirem a nossa sensibilidade [ poligamia ? fanado ?, infanticídio ?], temos que condescender com eles porque a manutenção da sua lealdade depende da colaboração dos seus chefes e a destes é função da nossa aceitação dos seus privilégios e da satisfação das necessidades imediatas do grupo.

As facilidades de transporte, o contacto íntimo com o militar europeu começa a desenvolver na juventude fula (os nossos milícias, os nossos soldados) uma certa atitude de contestação contra a sua situação de subalternidades no grupo social, apesar de constituir a principal fonte de recursos desse mesmo grupo social. E, na medida em que, por conveniência, apoiamos as suas estruturas, pode tal juventude de hoje, seus dirigentes de amanhã, acusar-nos de travar o seu progresso, apoiando o despotismo a que as estruturas a sujeitam, e criando assim uma brecha potencial por onde o PAIGC pode penetrar na lealdade Fula.


(Continua: b. Os Mandingas)

[Revisão / fixação de texto / bold a cor / título: L.G.]

Fonte: BART 2917: História da Unidade. [Bambadinca, 1972]. XCap II, pp. 13/14.


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Nota de L.G.:

17 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6413: Elementos para a caracterização sociodemográfica e político-militar do Sector L1 (1): Populações controladas pelas NT e pelo PAIGC, ao tempo do BART 2917 (1970/72) (José Armando F. de Almeida / Luís Graça)

Guiné 63/74 - P6436: Bibliografia de uma guerra (56): Vindimas no Capim, de José Brás - Maneira mais cómoda para obter esta obra

1. Mensagem do nosso camarada José Brás (ex-Fur Mil, CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68, autor do romance "Vindimas no Capim"*, Prémio de Revelação de Ficção de 1986, da Associação Portuguesa de Escritores e do Instituto Português do Livro e da Leitura.

Carlos
Caro camarada

Quando do convívio dos blogue em 2009, vários camaradas me abordaram no sentido da aquisição do "Vindimas no Capim" sem que eu pudesse acorrer senão a quatro ou cinco solicitações.

No primeiro almoço da Tabanca do Centro a cena repetiu-se e, tendo apenas meia dúzia de exemplares, voltei a não poder satisfazer o desejo de aquisição demonstrado pelos camaradas.

No sentido de remediar isto e na perspectiva de que no próximo dia 26 de Junho, continue a solicitação do livro, coisa que, naturalmente, a mim me agrada, tenho necessidade de conhecer aproximadamente quantos exemplares terei de levar comigo para solicitar o seu fornecimento atempado.

Assim, lembrei-me de pedir através do blogue ao conjunto dos camaradas que irão estar presentes no convívio que, se interessados me façam chegar notícia do interesse com alguma urgência.

O preço do livro através do autor é de 14,00€ e no livreiro ou em loja, penso que é de 17,00€.

Por outro lado, a quem não tenha planeado estar (de corpo) no convívio, se me contactar através do endereço jasbras1@sapo.pt, ou pelo telefone 266891748, fornecendo-me o seu endereço, poderei enviar-lhe o livro, contra transferência bancária para NIB que fornecerei, acrescentando aos 14,00€, apenas a despesa de correio que andará na casa do 1,50€.

Agradecido, abraços a todos
José Brás


2. Comentário de CV:

De acordo com a mensagem do camarada José Brás, quem for ao Encontro de Monte Real, deverá atempadamente manifestar o seu desejo de aquisição do livro Vindimas no Capim para que ele possa ir munido dos exemplares necessários.

Os camaradas que não se vão deslocar a Monte Real poderão pedir o livro para o endereço do nosso camarada Brás.

A mensagem aqui publicada vai ser reencaminhada para a tertúlia, para que ninguém fique sem a informação do modo como pode obter a esta obra.
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Notas de CV:

(*) Vd. postes de:

28 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6268: Bibliografia de uma guerra (56): A Propósito de Até Hoje (Memória de Cão) (José Brás)

8 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6347: Notas de leitura (103): Vindimas no Capim, do nosso camarada e tertuliano José Brás (1) (Mário Beja Santos)
e
9 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6353: Notas de leitura (104): Vindimas no Capim, do nosso camarada e tertuliano José Brás (2) (Mário Beja Santos)

Vd. último poste da série de 14 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5646: Bibliografia de uma guerra (55): Armados Para a Paz, de Albino Silva

Guiné 63/74 - P6435: Agenda cultural (77): Lançamento do livro Nha Carlota, de António Estácio, dia 21 de Maio de 2010 em Lisboa






Lançamento do livro Nha Carlota**, de António Estácio, edição de autor: Djubi dé, si bu pudi, budi ta tchómam um alguim más, má si bu cá pudi, djanti bu lébal um livro bó - Se puderes, chama mais alguém, mas se não puderes, apressa-te a levar-lhe um livro.

Amanhã dia 21 de Maio de 2010, pelas 18 horas, em Lisboa, no Palácio da Independência, n.º 11, do Largo de S. Domingos.



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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 20 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6432: Tabanca Grande (220): António Estácio, nascido em Bissau, no chão papel, escritor, sinólogo, amigo do Zé Neto, do Mário Dias, do Pepito e do Graça de Abreu, autor de Nha Carlota

(**) Vd. poste de 20 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6434: Notas de leitura (109): Carlota Lima Leite Pires, 'Nha Carlota' (1889-1970), de António Estácio (Mário Beja Santos)

Vd. último poste da série de 14 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6390: Agenda cultural (76): Memória do Campo de Concentração - Tarrafal, até 27 de Agosto no Museu do Neo-Realismo, Vila Franca de Xira (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P6434: Notas de leitura (109): Carlota Lima Leite Pires, 'Nha Carlota' (1889-1970), de António Estácio (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso Camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil At Inf, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Maio de 2010:

Luís,
Nem a propósito! Este livrinho da Nha Carlota bem podia abrir as portas a várias histórias de gente que nos tratava bem à mesa.
Gostei muito da ideia do António Estácio em trazer para a ribalta esta senhora cuja memória perdura em muitos corações da Guiné.
É bom vê-la elogiada, num tempo em que fazer bem e oferecer a mesa não é norma comum.

Um abraço do
Mário


“Nha Carlota”: Saudades de uma Mindjer Garandi de Nhacra

por Beja Santos

O que pode levar um guineense da nossa idade, um regente agrícola que passou a maior parte da sua vida profissional a trabalhar em Macau, a escrever um livrinho sobre uma gentil senhora cabo-verdiana que deixou saudades a muita gente depois de 60 anos a viver na região de Nhacra?

O António Estácio de vez em quando vem ao nosso blogue e clarifica acertadamente algumas matérias. Nasceu no “Chão Papel”, frequentou o liceu Honório Barreto, preparou-se para regente agrícola em Coimbra, trabalhou em Malange no Instituto do Algodão em Angola, onde cumpriu o serviço militar de 1970 a 1972, depois seguiu para Macau. Decidiu agora investigar esta figura ímpar da Guiné, “Nha” Carlota, que deixou saudosa recordação em muita gente, pela sua forte personalidade, pelo seu proverbial acolhimento, quem lhe batia à porta tinha sempre refeição.

O livro do António Estácio foi lançado recentemente, quem quiser contactá-lo para qualquer esclarecimento, pode fazê-lo através dos telefones 219229058 ou 96269655.

Chamava-se Carlota Lima Leite Pires, não se sabe exactamente em que ilha nasceu em Cabo Verde, nem em que ano, morreu no hospital de Sant’ Ana em 1970. Viveu seis décadas na Guiné, foi uma comerciante muito bem sucedida, casada com João José Pires que durante anos foi seu empregado. Terá chegado à Guiné entre 1906 e 1907. Por essa data, ainda conheceu a muralha que cercava a ilha de Bissau, considerada muito importante para a segurança da povoação, ao tempo sempre ameaçada pelas populações circunvizinhas.

Reza a lenda que terá combatido e apoiado o capitão Teixeira Pinto, mas não há documentos que comprovem tal temeridade. O importante é que se tornou numa pessoa de grande influência, uma conselheira permanentemente procurada, a proprietária de uma casa comercial onde ela recebia e preparava comida variada e petiscos.

Dos depoimentos colhidos, Estácio ouviu os suficientes para confirmar que era tratada como “a mãe dos pobres de Nhacra”. Falava fluentemente crioulo e balanta, as suas lojas estavam sediadas no Cumeré e em Nhacra, mas os seus negócios eram diversificados. Nha Carlota comprava aos agricultores da região a mancarra e, ao que parece, os seus preços eram justos.

António Estácio obteve depoimentos elogiosos de quem frequentava a mesa da Mulher Grande de Nahcra, desde Elysée Turpin (fundador do PAIGC), o alferes Sebastião Alves (da CCaç 564) até ao coronel Nuno Rubim, nosso confrade.

O que ninguém esqueceu foi mesmo a instituição da comida: sobretudo aos fins-de-semana, as pessoas punham-se a caminho para almoçar no alpendre da Nha Carlota. Alguém descreveu que nada havia de comum naquela sala da Nha Carlota com um restaurante convencional, as pessoas comiam mesmo na sala de jantar da dona de casa ou na parte sombria da varanda.

Combinava-se com antecedência a ementa (cabrito assado, chabéu ou cachupa), tudo começava com ostras ou camarão e a refeição terminava com a fruta disponível. Frequentemente, Nha Carlota sentava-se à mesa e conversava com toda a gente.

Um aspecto curioso que alguém registou é que havia nesta sala de jantar, dependurado do tecto, sobre a mesa, um grande pano enfiado num pau que uma corda, passando por uma roldana fazia oscilar proporcionando uma suave brisa. Quem puxava essa corda era um pequenito que toda a gente tratava por “Ventoinha”, que no final do repasto recebia uma gratificação. Os negócios sucederam-lhe bem, para além dos estabelecimentos do Cumeré e Nhacra, adquiriu prédios em várias localidades.

Uma das singularidades da Nha Carlota foi o seu salazarismo indefectível, proibia que se falasse mal de Salazar. Fez sociedade com um dos filhos do antigo Presidente da República António José de Almeida, Manuel Alexandre Toscano de Almeida (confesso que de algum modo me baseei nesta personagem para criar o primeiro marido da Benedita, Albano Toscano, do meu livro “Mindjer Garandi”).

Este Manuel Toscano era opositor ao regime de Salazar, participou na sublevação da Guiné de 17 de Abril de 1931, foi demitido da função pública e depois enveredou pelos negócios. Viajou várias vezes a Portugal, numa delas, já perto do final da sua vida, foi recebida por Salazar. Nessa audiência ofereceu ao ditador um retrato dele próprio feito a carvão com a seguinte dedicatória: “Um homem tão grande para um país tão pequeno”.

O seu altruísmo permanece na memória de muitos, bem como a simplicidade no convívio e hospitalidade. É muito bonito dedicar um livrinho a uma mulher que fez bem às suas gentes e seguramente aos nossos camaradas que beneficiaram do seu aprazível acolhimento.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 19 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6427: Notas de leitura (108): Os Resistentes de Nhala, de Manel Mesquita (2) (Mário Beja Santos)