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terça-feira, 14 de outubro de 2025

Guiné 61/74 - P27317: Convívios (1043): Rescaldo do Encontro dos Antigos Combatentes de Meimoa na Guerra do Ultramar, levado a efeito no passado dia 4 de Outubro (Ernestino Caniço, ex-Alf Mil Cav)

1. Mensagem do nosso camarada Ernestino Caniço, ex-Alf Mil Cav, CMDT do Pel Rec Daimler 2208 (Mansabá e Mansoa) e Rep ACAP - Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológica, (Bissau) (1970/1971), com data de 13 de Outubro de 2025:

Caros amigos
Votos de ótima saúde

Realizou-se em Meimoa em 2025.10.04 um convívio de ex-combatentes.
Meimoa é uma povoação portuguesa sede da Freguesia de Meimoa (20,58 km² de área e 307 habitantes - censo de 2021) do Município de Penamacor, concelho de Castelo Branco.
A freguesia da Meimoa fica a cerca de 12 Km a norte de Penamacor. Da sua fundação pouco ou nada se sabe. Presume-se que terá sido muito importante no tempo dos romanos devido à existência da ponte Romana / Filipina, erguida sobre a ribeira da Meimoa. Para a origem do seu nome aponta-se a mesma que a do Meimão. Segundo Frei de Sousa, o nome Meimão e Meimoa, são de origem árabe e derivam de Mamona, nome próprio de mulher, cujo significado é, estar segura, firme, constante, conservada, etc. Pinho Leal diz que a mais provável origem destes nomes (Meimão e Meimoa), é a palavra Mâmoa (monumento funerário). Tempos depois os romanos chamavam-lhe mamona, pela semelhança que tem com o peito da mulher (Junta de Freguesia Meimoa).
A minha presença foi proporcionada pelo amigo General João Afonso Bento Soares, ao qual estou grato.
O convívio, salutar, foi precedido de missa na Igreja Matriz de Meimoa (construída em 1673 e reconstruída em 1770, em 1905 e em 1917. Apresenta uma planta longitudinal composta por uma nave, uma capela-mor mais estreita e uma sacristia e uma torre sineira adossadas. No exterior, destaque para um cruzeiro construído reaproveitando um antigo silhar romano com inscrição votiva), em que participou na celebração o amigo Pe José Torres Neves.
Aproveitei o ensejo para entregar ao Zé Neves o texto que redigiste (Luís), com elogio mais que merecido, e, pelo qual ele ficou sensibilizado.
Anexo algumas fotografias bem como o discurso do amigo Gen. João Afonso, do evento, para postagem se for esse o vosso entendimento.

Um grande abraço,
Ernestino


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ALMOÇO DOS ANTIGOS COMBATENTES DA MEIMOA NA GUERRA DO ULTRAMAR

4 DE OUTUBRO DE 2025

VOCATIVOS

A Missa é o momento mais alto e solene dos nossos convívios em que evocamos a memória dos ex-combatentes falecidos.

1 - Quero assim agradecer a disponibilidade do nosso Pároco Rui Manique por ter podido conciliar, dentro dos seus muitos afazeres, a sua realização: Bem-haja, Pe Rui Manique.
Do mesmo jeito, agradeço a pronta aceitação do Pe Zé Torres Neves para concelebrar, ele que foi capelão militar na Guiné (aliás num tempo em que também eu lá estive como capitão, cumprindo a minha 1.ª comissão de serviço no Ultramar): Bem-hajas, Zé Torres


2 - Para além desta importante presença do Clero quero também saudar a presença da JF da Meimoa na pessoa do nosso Presidente que muito tem contribuído para dignificar os nossos encontros, quer aquando da recomposição do Painel tríptico no adro da Igreja, quer oferecendo há 2 anos atrás as T-shirts e também este ano as lembranças distribuídas: Bem-haja, Zé Madeiras

3 - Invocados os poderes religioso e administrativo da nossa terra, permitam-me também referir as gratas presenças de representantes do poder judicial, pois entre os tantos filhos brilhantes que a Meimoa deu ao país, temos hoje entre nós o juiz Desembargador Celestino Bento, meu companheiro da Comissão Organizadora e também o juiz Conselheiro Messias Bento, ambos jubilados.
Bem-hajas Celestino que tiveste a maior parte do trabalho organizativo deste Encontro e Bem-hajas, Messias que muito nos honras com a tua vinda (com a preciosa ajuda, já se vê, do filho Dr. Miguel) que igualmente cumprimento.


4 - Quero ainda referir a presença, pela primeira vez entre nós, do Dr. Ernestino, também ele um ex-combatente na Guiné, que ali conheceu e conviveu com o nosso Pe Zé Torres, nas bandas duma terra chamada Mansoa.

5 - E a TODOS VÓS meu povo, ex-combatentes, familiares, Amigos e COMPANHEIROS (do latim “cum panis”, como aqui está agora mesmo acontecendo), eu saúdo e peço vénia para dizer umas palavras.

Vou então ler uns dizeres, porque acaba por ser mais rápido, mas adianto desde já que as considerações que vou fazer se situam ao nível da rememoração dos Valores Pátrios e da Saga lusa, adiantando a significação deste tipo de Encontros (levados a cabo de Norte a Sul do país) e apresentando algumas citações, à volta do tema, por personagens ilustres. Saliento que está ausente do meu espírito, toda e qualquer conotação partidária, aliás, completamente alheia e, tão pouco, permitida à minha condição castrense, enquanto oficial General do nosso Exército.
Missa
Painel
Aperitivos
Almoço


Almoço-Convívio dos Antigos Combatentes Meimoenses – 4OUT2025

Gostaria de vos fazer uma pergunta retórica: Sabem porque eu estou aqui? Pois bem, responderia: Porque ainda estou vivo e juntamente com outros que andámos na GU, compete-nos contribuir para a preservação da memória e do respeito pela Pátria Lusa…

Neste Verão de 2025, agora findo, completaram-se 80 anos sobre o fim da II Guerra Mundial, em 2SET1945. Uma data, por todo o mundo celebrada, em que se homenageiam todos os que nela morreram. Portugal conseguiu ficar neutro nesse flagelo, mas uns 16 anos mais tarde, em 1961, viu-se envolvido no conflito da GU que teve a duração de 13 anos e ao qual, na sequência da Revolução de 25ABR74, se conseguiu por termo. Já passaram, portanto, 51 anos, mas ainda estamos vivos alguns antigos combatentes desse fatídico evento.

Na GU, de uma maneira ou de outra, todo o povo português esteve envolvido, pois foram cerca de 800.000 homens enviados para defender a Pátria nos vários TO – Teatros de Operações (Guiné, Angola e Moçambique). Tivemos cerca de 9.000 mortos e uma dessas vítimas foi um filho da Meimoa, na pessoa do Alf. Cmd João José Fonseca Nabais, cujo féretro levámos aos ombros, a inumar no nosso cemitério, no Verão de 1974. O fim da GU (com o 25ABR74) foi levado a cabo por militares do meu tempo. Embora, o fim do conflito fosse um bem reclamado por todo o Povo, não se esconde que a forma como tal aconteceu, face à gestão política da Revolução, implicou muitos transtornos para os portugueses residentes nas províncias ultramarinas e que ali tinham a sua vida montada. De facto, acabaram por ser obrigados a regressar de mãos vazias, e vieram a constituir um êxodo que se estima em mais de 600.000 concidadãos, designados de “Retornados”, mas, melhor dito, de autênticos “Refugiados”. Nesse chamado Verão Quente de 1975, estando eu a cumprir uma comissão de serviço, no comando de uma Unidade na capital de Angola, ainda pude prestar algum auxílio, nessa altura precioso, para vários portugueses desesperados ali residentes, alguns dos quais nossos conterrâneos.

É por mor de preservar a memória desses difíceis tempos que aqui nos reunimos anualmente, pelo menos enquanto um de nós, Antigos Combatentes da GU, estiver vivo (e daí, a pergunta-resposta que inicialmente vos dirigi: “Sabem porque estou aqui”?). Quero, no entanto, acreditar que mesmo quando já não restar vivo nenhum dos veteranos do conflito, os seus familiares e amigos haverão de lembrar e, quiçá, prolongar no tempo a memória destes encontros-convívio.

É bom ter em mente que “uma Nação que esquece o seu Passado, não tem Futuro” (já Churchill assim dizia). Nessa ordem de ideias, é com grande tristeza, diria até estupefação, que vejo algumas entidades responsáveis (ou pseudo-responsáveis), posicionadas em altos níveis da política e da cultura, quererem refazer a história em franco e inconcebível desprezo pela saga lusitana de outrora, cujo mérito é, aliás, amplamente reconhecido por inúmeros historiadores (portugueses e estrangeiros) de que vou dar alguns exemplos:
- Ainda recentemente li um artigo intitulado “Portugal esquece os seus soldados” da escritora Isabel Stilwell, uma insigne jornalista e escritora portuguesa, onde, em dada altura, ela dizia (e cito):
“…em Portugal recordamos pouco e temos uma dificuldade enorme em falar dos nossos soldados mortos no Ultramar, ou que ainda hoje sofrem sequelas profundas daqueles combates.
Quando não recordamos e não homenageamos aqueles que deram a vida pelo seu país, roubamos sentido à dor e traímo-los. Os combatentes em África, por força de um volte-face político, não tiveram direito a ser tratados como heróis”.


- No mesmo sentido vêm as palavras publicadas a 01 de Junho de 2013 pelo historiador inglês Jonathan Llewellyn num seu artigo terminando assim:
… “Em resumo, territórios portugueses foram atacados por forças de guerrilha treinadas, financiadas e armadas por países estrangeiros.
Segundo o Direito Internacional, Portugal estava a conduzir uma guerra legítima. E ter combatido em três frentes simultâneas, durante 13 anos, … é um feito que, militarmente falando, é único na História contemporânea.
Então, porque é que os portugueses parecem ter vergonha de se orgulharem do que conseguiram?"


Sou, portanto, levado a concluir que não tem havido a capacidade/lucidez política para distinguir:
- por um lado, a óbvia caracterização de falha de justeza dessa guerra (ou de qualquer outra guerra, porque não há guerras justas);
- e, por outro, a generosidade de quem cumpriu o seu dever.

Corroborando o atrás dito, um país que não é capaz de recordar e honrar a sua memória é, paradoxalmente, um país sem futuro.

Citei exemplos de historiadores nacionais e estrangeiros que enalteceram a História Lusa em contraponto a algumas teses correntes defensoras do politicamente correcto (e do wokismo*), as quais se afadigam a denegrir a epopeia histórica portuguesa. Todavia, felizmente, ainda há e sempre houve vozes que defendem a saga lusa com seus heróis e entre estes os seus valorosos elementos das FA.

Neste particular, posso destacar palavras do ex-PR, Jorge Sampaio, quando em Abril de 2004, deslocando-se ao Mosteiro da Batalha para celebrar o Dia do Combatente, proferiu um discurso, de que cito as seguintes passagens (que, de alguma forma, traduzem o real significado deste nosso Convívio). Dizia o ex-PR:
“Agradeço o convite que a Direcção da Liga dos Combatentes me dirigiu para presidir a esta cerimónia do Dia do Combatente. Faço-o com muito gosto, com a convicção de que cumpro um dever para com Portugal e os portugueses e para com a memória de todos quantos deram a sua vida ao serviço do País. Lembramos hoje todos aqueles que combateram em nome de Portugal. O que somos hoje como Nação e como País depende, em larga medida, do contributo que deram para ultrapassar os momentos mais difíceis da nossa História e garantir a perenidade da nossa identidade nacional. A República não esquece, nem pode esquecer, a dedicação e o sacrifício de todos esses portugueses, e por isso lhes presta esta sentida homenagem… E, mais à frente, conclui:
…Homenageamos assim todos os militares que, ao longo dos séculos, caíram por Portugal, ao serviço da perenidade da Pátria. É esta a forma de os lembrarmos, de os honrarmos, de reiterarmos a confiança no nosso desígnio nacional e de, ao mesmo tempo, motivarmos a juventude portuguesa para servir o País também nas fileiras das suas Forças Armadas de que todos, legitimamente, nos devemos orgulhar…. (fim de citação)

Mas, para terminar num tom menos saudosista e mais motivador, quero acreditar que embora na Europa e por esse mundo fora se estejam vivendo guerras trágicas e muitas situações de conflito, neste cantinho à beira-mar plantado, ainda vamos vivendo uma situação de Paz e, em particular, aqui na nossa santa terrinha estamos hoje convivendo e fruindo um momento de verdadeira Felicidade.

Dentro deste tom, permitam-me concluir com uns poéticos dizeres a que já vos habituei, e a que chamei: “Berço Beirão”

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Nota*: A doutrina woke (ou, à letra "estar acordado") refere-se a uma consciência política e social sobre as injustiças e desigualdades raciais e sociais, originária da comunidade afro-americana e ampliada para incluir o ativismo feminista, LGBT e outras causas identitárias. Enquanto alguns a veem como uma busca por justiça social, outros a criticam, usando o termo de forma pejorativa para descrever o que consideram fanatismo, imposição de ideias progressistas e uma suposta superioridade moral.


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BERÇO BEIRÃO

(À Meimoa, minha terra natal)

Em ti moram meus sonhos de menino,
É forte o chamamento a que me atenho,
Nem fria noite, nem o sol a pino
Abalam o amor que por ti tenho.

A ti sinto agarrado o meu destino
Ligado a um querer em que me empenho;
Um grito de alma, se converte em hino,
Ou simples Graça vinda por engenho.

Percorri teus caminhos e veredas,
Bebi teus cheiros e comi azedas,
Mergulhei no açude da Ribeira…

Sou grato à sorte, ou divina virtude
Por ter vivido a minha juventude
Nesta Princesa da Cova da Beira.


Cumprimentando o povo da Meimoa, seus ex-combatentes, familiares e amigos.
João Afonso Bento Soares
Meimoa, aos 4 de Outubro de 2025

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Nota do editor

Último post da série de 10 de outubro de 2025 > Guiné 61/74 - P27305: Convívios (1042): 62º almoço-convívio da Magnífica Tabanca da Linha, quinta feira, 23/10/2025, Algés; há já 44 inscritos...Camarada, sê mais um "magnífico", junta-te aos "magníficos" (Manuel Resende, régulo)

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