segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 - P5631: Notas de leitura (53): Katafaraum é uma nação, de José Martins Garcia (Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) , com data de 8 de Janeiro de 2010:

Queridos amigos,
Junto recensão acerca de uma das mais prodigiosas obras do José Martins Garcia, que foi nosso camarada da Guiné.

Um abraço do
Mário


Katafaraum é uma nação

Beja Santos

José Martins Garcia dominou diferentes modos e géneros discursivos: romance, conto, poesia, dramaturgia, ensaio e crítica. É surpreendente a mestria com que separou estas diferentes intervenções. Isto para dizer que quanto à guerra onde, segundo os seus críticos, teve uma abordagem original na exploração com sucesso do delírio, da derisão, da paródia, fabricando personagens entre a paranóia e demência, é um universo que dominou as suas atenções em livros que escreveu fundamentalmente nos anos 70. “Katafaraum é uma nação” será provavelmente a última das obras do antes do 25 de Abril e a primeira que se publicou logo a seguir à revolução. Não é imaginável esta paródia publicada na segunda edição (em Maio de 1974) a ter fugido ao crivo da PIDE/DGS.

O soldado-cadete Ramalho, e depois alferes Ramalho, é o centro da história. Vem no final do livro que, surpreendentemente, foi encarado como um ajuste de contas com professores universitários, ousadia que lhe terá custado a carreira universitária em Lisboa. Segundo ele escreve em 28 de Abril de 1974, katafaraum ocorreu-lhe depois de ter assistido ao I Encontros dos Professores de Língua e Literatura Portuguesa onde, segundo ele, foram apresentadas algumas das mais ridículas bacoradas que algum mortal pôde escutar. Ele desforrou-se escrevendo um conjunto de crónicas no jornal “República”.

Mas vamos aos feitos da Guiné. Primeiro, o Ramalho anda por Mafra em recruta (recorda-se que alguns parágrafos apareceram na recensão do livro de João de Melo “Os Anos da Guerra”). Destas andanças respiga-se um parágrafo:

“Barbeados, engraxados e seriamente inócuos, marcharam os soldados-cadetes ao longo das bermas, cordões de uniformes número 3, cinzentos, esfiapados, enodoados por rastejos de recruta, enquanto a raça loura fazedora de turístico sorriso abanava germanismos desde velozes descapotáveis, às quais gentilezas respondia por vezes um katafaraónico palavrão... Marcharam longamente, sem avaliarem da tipografia, por que nessa operação de competência contava simplesmente o tempo, nunca o espaço. Talvez marchassem para algum destino marcado pelos deuses, talvez que às voltas cumprissem imperscrutáveis meandros do tempo. E o semideus do jipe, director de tantos e tão secretos desígnios, passava e repassava em seu traje de campanha e sobre seus sólidos pneus, todo baboso de tanto estendal de competência, assim distribuída em dois carreiros de homens-formigas, marchando sem perguntas e sem quererem saber para onde... Ao transitar por entre as filas em que se tornara a primeira companhia, o senhor do jipe ordenou ao serviçal do volante que abrandasse o andamento. Mirou, regozijado, o disciplinado estendal e teve uma palavra amiga na direcção do capitão:

- Então, nosso capitão... os seus doutores hoje ‘stão fodidos”

Quem anda em campanha molha-se, corre o risco de ser abalroado pelo inimigo. Nos preparativos militares o inimigo é uma ficção que nunca mais nos saiu da mente, como José Martins Garcia regista:

“O inimigo guarda um conveniente silêncio. A ponte avizinhava-se escandalosamente. O pelotão tacticamente conduzido pela bravura do seu comandante, encontrava-se a descoberto, à vista de qualquer observador medíocre, a umas dezenas de metros da ponte, numa paródia de guerra, num grande desperdício de atacantes. O bravo alferes mandou fazer alto, para improvisar a vitória. Foi nessa altura que o semideus do jipe, manhosamente silencioso veio inquirir das grandes manobras. O alferes, em sentido, garantiu que ia ganhar. Mas o semideus queria certificar-se do grau de responsabilidade daqueles bravos. E, vendo o idiota do soldado-cadete ramalho muito entretido a observar a paisagem, berrou:

- Você aí! Está a ouvir?

O Ramalho estava, evidentemente, a ouvir. Encarou o semideus e continuou mudo.

- É consigo que estou a falar, ouviu? Ouviu? Estou a fazer-lhe uma pergunta.

Responda. É uma ordem.

- Ouço – resmungou o outro.

- Mais alto, que não ouço...

- Ouço – berrou o Ramalho.

- Ah ouve! Ouve o quê?

- Estou a ouvir Vossa Excelência.

- Ah! E sabe o que vai fazer?

- Com certeza, Excelência. Vou apanhar o inimigo.”

Temos agora o alferes miliciano Ramalho a chegar a Takiá (será Catió?), parece que está a levar a sério a sua entrada em cena na guerra. Do rigor das imagens passa-se para o surrealismo dos comportamentos, a demência anda à solta. O Ramalho pergunta ao médico sobre o estado de saúde dos oficiais, recebe respostas muito reservadas. Ramalho é oficial de transmissões (tal como José Martins Garcia foi na Guiné), vai fazendo perguntas, recebe respostas doidas. A segurança de Takiá é calamitosa:

“Então o alferes Ramalho, em voz baixa, perguntou ao alferes Mike:

- Em casa de ataque, quem é que defende isto?

- Ora ataque... quer dizer... há uma companhia de cavalaria que não está cá...

- Mas costuma estar?

- Às vezes está... outras não...

- E quando não está?...

- Há o alferes Carril, das auto-metralhadoras... aquele do bigode... Há aqui o gerente que tem um canhão...”

É nisto que sobrevém uma flagelação a Takiá, a guarnição entra em delírio, balbúrdia maior não pode haver. Os alferes Ramalho e Trabuco comem pernas de frango, abrem garrafas de cerveja, falam sobre Sartre e envolvem-se à porrada: “As metralhadoras insistiam na sua interminável competência. Bêbedos, incapazes de se susterem nas pernas, o veterano e o novato chafurdavam na lama”.

Afinal, o Jorge Cabral tem aqui um modelo parodiante. Há que reconhecer que esta centelha de talento é desopilante, é verdade que não nasceu agora mas continua a ser uma arma temível para descrever os frenesins de todos os tempos de todas as guerras. Tal como o desenho de humor, por sinal.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 11 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5622: Notas de leitura (52): Os Anos da Guerra, de João de Melo (6): J. M. Garcia, S. M. Ferreira e Cristóvão de Aguiar (Beja Santos)

Guiné 63/74 - P5630: Notas soltas da CART 643 (Rogério Cardoso) (2): O César e o Capitão Silveira

1. Mensagem de Rogério Cardoso (ex-Fur Mil, CART 643/BART 645, Bissorã, 1964/66), com data de 8 de Janeiro de 2010:


O César e o Capitão Silveira

O César era o chamado mancebo do mais puro e inocente que a Companhia conheceu.
Quando em Santa Margarida soube que ia para a Guiné, que não fazia a mínima ideia do que seria, quando o comboio parou na Rocha Conde de Óbidos, junto ao Uíge, abriu a boca de espanto dizendo que nunca tinha visto nada igual, julgava que o barco era como no ribeiro da aldeia dele que levava meia duzia de cada vez para o outro lado, que não seria longe no seu pensamento.

Já em Bissorã em meados de Junho, o local não tinha condições para alojar tantos homens, estou a falar em 1964, e para exemplificar nós estivemos 6 ou 7 meses sem um frigorífico, bebia-se água e cerveja quentes, a não ser puxar pelo patacão nas tascas dos civis.

Houve então uma alma caridosa da retaguarda, aquela em que diziam que estava firme que nem uma rocha, enviou um aparelho a petróleo e foi uma festa.
Esse frigorifico, claro que só podia ser aberto 2 vezes por dia, almoço e jantar e para não haver abuso e respeito pela ordem, foi colocado no terraço dos oficiais, assim se houvesse abuso eram só meia duzia.

Numa bela noite de muito calor e depois de jantar, estava o Capitão Silveira, o Tenente Médico Campos, Alf Mil Lourenço, Paulo, Mendes e Cardoso, sentados nas esperguiçadeiras de pernas estendidas conversando, quando aparece o soldado César, passando por cima deles até chegar ao frigorifico, abrindo-o, garrafão à boca bebendo o que lhe deu na vontade.
O Capitão Silveira em voz alta advertiu assim:

- Ó pazinho que confiança é esta, passas aqui por cima de todos nós, abres a porta, garrafão à boca, bebes o que te apetece, como é a confiança e o respeito?

Respondendo de pronto:

- Ó meu Capitão, que eu saiba o frigorifico não é seu mas sim da malta toda.

O Capitão não se conteve, começou a rir, o que era raro, e mandou-o embora, dizendo entre dentes para os oficiais:

- Isto sim é que é pureza, embora a hierarquia não tivesse sido respeitada, com homens assim levo a Companhia para onde quero.

Rogério Cardoso
__________

Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 9 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5619: Notas soltas da CART 643 (Rogério Cardoso) (1): A tasca do Maximiano em dia de bife

Guiné 63/74 - P5629: O Nosso Livro de Visitas (80): Aluna do 2º ano do curso de jornalismo procura ex-combatentes para entrevistar (Cátia Bruno)

1. Mensagem deixada, hoje, como comentário, no poste de 11 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5627: Dossiê Guileje / Gadamael (20): Esclarecimentos sobre a retirada, em 22 de Maio de 1973: Parte II (Coutinho e Lima)
Boa tarde,

O meu nome é Cátia Bruno e sou aluna do 2º ano no curso de Jornalismo da Escola Superior de Comunicação Social [, do Instituto Politécnico de Lisboa].

Um dos trabalhos que tenho de realizar é um guião de reportagem (uma simulação por escrito do que pretendo para uma reportagem), com protagonistas reais, que necessito de entrevistar.

Eu gostaria muito que a reportagem fosse sobre os ex-combatentes da guerra colonial. Penso que é necessário não deixar morrer a memória do que se passou e que muitos hoje em dia parecem esquecer. As gerações mais novas não têm noção do facto de que tivemos pessoas a combater, numa guerra real, ainda não há muito tempo. Mas, para falar sobre isso, necessito de arranjar contactos e pessoas disponíveis para poder entrevistar.

A vossa ajuda seria uma grande mais-valia para mim, caso estejam interessados em participar. Qualquer pessoa que lá tenha estado, que tenha sentido na pele, dá sempre uma boa história. Infelizmente, como vivo na zona da Grande Lisboa só tenho oportunidade de me encontrar por aqui e,  portanto, com alguém que viva perto.

Aguardo uma resposta da vossa parte, desde já agradecendo a ajuda na recolha de alguns testemunhos de pessoas que queiram colaborar. Caso estejam interessados ou para qualquer esclarecimento ou dúvida: catiacbruno@gmail.com

Sem outro assunto e com os meus melhores cumprimentos,

Cátia Bruno (*)
____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 8 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5612: O Nosso Livro de Visitas (79): Conheci e estimei o Ten Cor Pimentel Bastos, 1º Cmdt do BCAÇ 2852 (António Vaz, ex-Cap Mil, CART 1746, Bissorã e Xime, 1967/69)

Guiné 63/74 - P5628: Antropologia (16): Canções antigas do Natal de Bissau (Manuel Amante da Rosa)



1. Mensagem do nosso camarada Manuel Amante, cabo-verdiano, antigo embaixador do seu país, a viver e a trabalhar neste momento em Macau no quadro de uma missão da CPLP, ex-militar dos serviços de intendência (Bissau, 1973/74), membro da nossa Tabanca Grande desde Maio de 2007 (*):

Assunto - Canções antigas de Natal na Guiné-Bissau (**)


Caro Luís,

Mão amiga enviou-me este anexo. Muito provavelmente muitos dos membros da nossa Tabanca Grande que tenham passado um Natal na Guiné, terão visto e escutado grupos de crianças que, festeiramente, andavam de porta em porta com pequenos presépios ou casas de papel, iluminadas com vela por dentro, mais uns bonecos articulados, alguns com caricas de garrafas de cervejas pregadas em tábuas de ocasião a chocalhar, acompanhando um coro, por vezes desafinado. São gratas recordações dessa tradição que ainda hoje persistem em Bissau.

Um forte abraço
Manuel Amante

2. Natal (de outrora) na Guiné.





Outrora e até o início dos anos 70 do século passado, era frequente, nas noites de 24 e 31 de Dezembro, as ruas da cidade de Bissau serem percorridas por grupos de jovens guineenses, oriundos dos Bairros periféricos, que consigo transportavam interessantes réplicas de igrejas e capelas. Eram as “Capelinhas”.


Feitas numa estrutura de madeira muito leve, vulgarmente denominada “tara” (Raphia sp. Exsicc. Esp. Santo 766), eram forradas a papel de seda, contendo, no seu interior, várias pagelas de santos e, ao centro, iluminadas por um coto de vela, o que, no breu da noite, conferia ao conjunto um aspecto de particular carinho.

Os grupos de miúdos percorriam as ruas de Bissau, cantando, de casa em casa, saudando, a troco de 5 tostões [1], com a seguinte cantilena os moradores. E, assim rezava:


I
S. José, sagrado e Nha Maria,
Ai quando foi, quando foi, para Bélém,
A resgatar Menino di Jesus,
L ’ ao pé, l ‘ ao pé da Santa Cruz.


II
Adório o mistério, sobrinho de minha alma,
Sobrinho de minha alma, do o Senhor,
Todo o doce encanto, todo reminado,
Todo o doce encanto, sempre a chorar.
Ai, ai, ai, ai, de vez em quando, Sempre a chorar.


III


A Angelina, a Angelina qui já moreu
Si não podia confessar se não do Papa, Si não
do Papa, se não do Bispo se confessou
Para pédir Boas Festas, boas almas.


IV


Adório o mistério, sobrinho de minha alma,
Sobrinho de minha alma, do o Senhor,
Todo o doce encanto, todo reminado,
Todo o doce encanto, sempre a chorar.
Ai, ai, ai, ai, de vez em quando, Sempre a chorar.



Acompanhada, sequencialmente pelos famosos bonecos, tipo espantalhos feitos de papelão, presos numa cana ou pequena haste de madeira, com os braços e pernas articulados, graças a um sistema de cordéis interligados, nas costas, dos referidos bonecos.

Estes bonecos eram conhecidos pela designação vulgar de “Quincões”, os quais os garotos accionavam freneticamente e, numa repetitiva ladainha, assim diziam:

Quincon, quincon
Cabeça de com [2],
Quincom, quincom
Rabada de com.

__________

[1] A que, em crioulo, designavam por “dôs xelins”


[2] Cão.

___________

Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

28 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5555: A navegação no Rio Geba e as embarcações do meu tempo: Corubal, Formosa, BOR... (Manuel Amante da Rosa)

12 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5455: Memória dos lugares (60): O Rio Geba e o navio Bubaque, do meu pai (Manuel Amante da Rosa)


27 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1787: Embaixador Manuel Amante (Cabo Verde): Por esse Rio Geba acima...

(**) Vd. último poste da série Antropologia > 24 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5331: Antropologia (15): Um dos maiores tesouros artíticos da Guiné: os Sônôs (Beja Santos)


Vd. também blogue Nós com África > 8 de Dezembro de 2009 > Tradições de Natal na Guiné-Bissau

(...) No interior do país é habitual juntarem-se grupos de jovens da etnia Balanta e também de outras etnias durante a época das chuvas para fazerem a lavoura nas terras. Estes grupos são constituídos por cerca de 15 jovens. O pagamento desse trabalho é feito pelo dono de cada terra, através do pagamento de uma certa quantia ou de produtos (um porco, sacos de arroz ou outros produtos). Um dos jovens fica responsável por guardar o pagamento até à época do Natal. Com o aproximar do Natal, o grupo constrói uma barraca com folhas de palmeira, afastada da tabanca para os habitantes da aldeia não ouvirem o barulho dos festejos. Na noite de 24 de Dezembro os jovens de cada grupo juntam-se, matam um porco e dançam até à manhã de dia 25. No dia 25 convidam os mais velhos da tabanca e fazem uma grande festa onde comem, bebem, brincam e celebram durante todo o dia.



Em Bissau há missa à meia noite na véspera de Natal. Algumas famílias fazem uma ceia na noite de 24 de Dezembro. Embora não haja nenhuma comida típica para a ceia, podem fazer pratos tradicionais da Guiné-Bissau, como caldo de chabéu, caldo branco ou outros. A etnia Bijagó tem por tradição comer caldo de chabéu. No dia de Natal a festa dura todo o dia. Algumas pessoas cortam uma árvore do Bairro da Granja e é hábito decorá-la com balões. (...)

Guiné 63/74 - P5627: Dossiê Guileje / Gadamael (20): Esclarecimentos sobre a retirada, em 22 de Maio de 1973: Parte II (Coutinho e Lima)


Guiné > s/l > s/d (c. 1973) >  "Guerrilheiros deslocando-se num carro blindado, Guiné-Bissau".

Foto do acervo documental de MárioPinto de Andrade (1928-1990), dossiê do Arquivo e Biblioteca da Fundação Mário Soares.  Estas viaturas, oriundas da base de Kandiafara, a sul de Guileje, na vizinha Guiné-Conacri, já estavam em em 1973 devidamente identificadas e referenciadas pelas autoridades militares portuguesas, contituindo um perigo potencial para as guarnições fronteiriças, tais como Guileje, Gadamael ou até Cacine.

Foto (e legenda): Cortesia de  © Fundação Mário Soares (2009). Direitos reservados



Segunda e última parte do texto do Coutinho e Lima de resposta ao poste P 4634: Dossier Guileje/Gadamael 1973 (13): A desonra da CCAV 8350 ou o direito à minha versão... (Constantino Costa)

Nota prévia de L.G.: 

Este documento, enviado em duas partes, foi  escrito pelo antigo comandante do COP 5, e tem data de 30 de Setembro último. Infelizmente, não temos registo, na nossa caixa de correio, da sua entrada naquela data ou em datas próximas. Daí termos recentemente solicitado uma 2ª via ao nosso camarada Coutinho e Lima, que é membro da nossa Tabanca Grande e que, como tal, não precisa de invocar o direito de resposta.  Ontem já foi publicada a 1ª parte do texto (*).


O Constantino pergunta ainda: "…o que diriam aqueles que, involuntariamente, perderam a vida em vão, em Guileje e Gadamael? Alguém lhes concedeu uma oportunidade para fugirem também?"

Penso que, onde está Guileje, devia estar Guidage.

Já ficou referido que as guarnições de Guidage e Gadamael  foram oportunamente reforçadas; em Gadamael, em minha opinião, se o reforço se tivesse verificado mais cedo, certamente que o PAIGC não tinha instalado o seu dispositivo com tanta facilidade e as consequências da sua acção, para as NT e população, não teriam sido tão graves.

A pergunta atrás sugere-me outra: O que diriam hoje as famílias daqueles que teriam morrido ou feitos prisioneiros, em Guileje, se não tivesse havido a retirada, por mim decidida?

Nos convívios da CCAV 8350, que esteve em Guileje, é frequente ouvir vários dos presentes referir que, se não fora a retirada, seguramente não estariam agora nesses convívios.

Diz também o Constantino que fui "…o autor do primeiro e único abandono das tropas portuguesas de um quartel militar…"

Não sei se foi o único "abandono", pois não tenho a certeza que, depois do 25 de Abril, não terão existido situações semelhantes.

De qualquer maneira, mesmo que tenha sido o primeiro e único, também fui, seguramente, o único Comandante que foi "abandonado" pelo Escalão Superior, quando pedi reforços, face à situação da acção em força do PAIGC.

Afirma ainda que "…desonrou as forças armadas…".

Se não tivesse ordenado a retirada e se verificasse um número considerável de baixas e prisioneiros feitos pelo PAIGC, será que o Constantino concluiria que teria havido uma grande honra para as Forças Armadas?

Nunca é demais repetir que a vida humana não tem preço e que, com a minha decisão, foi evitada a perda de vidas humanas.

Não sei se o Constantino leu o meu livro; parece que não, quando pergunta que medidas tomei, face ao previsível agravamento da guerra. Nas pág. 24 a 26, são referidas as "primeiras medidas tomadas…em Guileje.":

- Reforço de Guileje com 1 GC da CCAÇ 3520 (Cacine), Pelotão de Reconhecimento Fox 3115 (incompleto) e Pelotão de Milícia 236, de Gadamael.

- Proposta para serem efectuadas novas obras no aquartelamento, feita em 22 JAN 73, dia em que cheguei a Guileje.

- Proposta, em 24 JAN 73, da substituição do material de Artilharia – Peças de 11,4 cm por Obuses de 14 cm, em virtude de ter conhecimento de que as munições de 11,4 estarem a acabar; esta proposta sugeria que as Peças de 11,4 permanecessem em Guileje, enquanto houvesse munições para elas, mesmo depois da chegada do material de 14, aumentando assim o potencial de fogo.

Outra afirmação do Constantino: "Chegou-se ao ponto de…se deixar de efectuar patrulhamentos…, e com isto se facilitou que o In se aproximasse do aquartelamento em pequenos grupos…"

Já foi referido que solicitei a redução da actividade operacional, a partir de 30 ABR 73, para dedicar um esforço especial às obras, que estavam atrasadíssimas, por razões estranhas ao COP 5; a minha proposta foi aceite, devendo manter a abertura da estrada de Mejo, o que foi feito.

Não, Constantino, não foi a redução da actividade operacional que facilitou a actividade do In; este preparou o ataque durante meses e o Comando-Chefe tinha conhecimento da intenção do PAIGC, relativamente a Guileje.

Em Gadamael, no período de 22 a 31 MAI 73, foram realizados patrulhamentos intensos e frequentes, das 2 Companhias aí presentes; esta actividade operacional não impediu que o In montasse o seu dispositivo e desencadeasse, a partir de 31MAI/1 JUN, violentas flagelações sobre o aquartelamento e população de Gadamael.

Como é que o Constantino explica este último facto?

O Constantino pergunta por que não relatei, no meu livro, "…que uma parte da população de Guileje não queria abandoná-lo."

Mais uma vez parece que não leu o meu livro; nas pág. 154 a 162 constam os depoimentos dos seguintes elementos da população:

- Suleimane Djaló, Régulo de Guileje

- Amadu Djaló, irmão do Régulo e seu substituto

- Ussumane Silá

- Manga Dansó

Nas pág.166 e 167 está o depoimento do Cipaio Dauda Jaquité.

Praticamente todos estes elementos da população, quando interrogados sobre o assunto, declararam que não queriam sair de Guileje e compreende-se que pensassem assim, porque ninguém gosta de abandonar a sua terra e, neste caso, os seus haveres.

Não tenho qualquer dúvida que se tratava de um caso de sobrevivência, pois que não havia nenhumas condições de fazer face, com êxito, à ofensiva do PAIGC; foi por isso que determinei a retirada de toda a guarnição e população, para Gadamael.

Esperava encontrar, no auto de corpo de delito que me foi instaurado, o modo como o Comando-Chefe e o seu Estado Maior pensavam resolver a situação de Guileje; só em parte fiquei a saber a ideia do Sr. Comandante-Chefe sobre o assunto. O Coronel Pára-quedista Rafael Durão, ao ser nomeado novo Comandante do COP 5, viu alterada a Missão deste (pág. 117 do meu livro – resposta à 1ª. pergunta):

"…No dia 21 recebi directamente de Sua Excelência o General Comandante-Chefe ordem para manter a todo o custo o destacamento de Guileje, naquele local, para o que devia verificar as necessidades em meios para lá colocar os abastecimentos de toda a ordem, mais de 200 toneladas…"

A missão de "manter a todo o custo", era a mais exigente e que, no limite, poderia significar que era preciso aguentar até ao último homem; não era esta a Missão que me estava confiada, pois se o fosse, não poderia ser efectuada a retirada.

Não posso deixar de referir que, naquela data (21 MAI), com o aquartelamento de Guileje sujeito a intensas, constantes e prolongadas flagelações, desde as 20 horas do dia 18 MAI, a preocupação era " colocar lá os abastecimentos…", em vez de, em primeira prioridade, desarticular o dispositivo do Inimigo, de modo a aliviar a forte pressão que estava a ser exercida sobre as Nossas Tropas. Só quando a situação o permitisse é que se poderia tentar realizar as colunas de reabastecimento, o que, seguramente, o In iria dificultar ao máximo, ou até impedi-las, através de emboscadas e implantação de minas no itinerário.

Só quando, no Arquivo Histórico Militar do Exército, procedia à recolha de elementos para o meu livro, encontrei a Acta da Reunião de Comandos, realizada em Bissau, em 15 MAI 73; essa reunião foi presidida pelo General Comandante-Chefe, estando presentes os Chefes dos 3 Ramos das Forças Armadas, o Comandante Adjunto Operacional, o Chefe de Estado Maior e os Chefes das Repartições de Informações e Operações do Comando-Chefe.

O General Comandante-Chefe abriu a sessão, afirmando: 

"…Estamos de novo em presença de ponderosas determinantes de uma reavaliação da situação no TO, face à evolução há muito prevista e recentemente verificada, e perante a qual se impõe não só a tomada, no plano interno, de medidas imediatas que permitam fazer face aos aspectos mais prementes da nova ofensiva que defrontamos, como ainda a consideração do grau de afectação sofrido face ao aumento de potencial do In, em ordem à definição urgente dos meios essenciais a mobilizar com vista à continuação do cumprimento da missão…

"Encontramo-nos, indiscutivelmente, na entrada de um novo patamar da guerra, o que necessariamente impõe o reequacionamento do trinómio missão-inimigo-meios. Começaremos esta reunião pela consideração da situação no T.O. face ao inimigo actual e à sua evolução futura, análise a apresentar pelo Chefe da Repartição de Informações a que se seguirá a apresentação do estudo das incidências da evolução do In na situação das NF, no seu potencial, capacidade de manobra, liberdade de acção e suficiência para o cumprimento da missão em termos de prosseguimento da manobra de contra-subversão. Apresentará este estudo o chefe da Repartição de Operações em cujo âmbito se projectam em pleno os condicionamentos actuais. Solicitarei em seguida, aos Senhores Comandantes-Adjuntos a sua impressão sobre o In e a situação das nossas Forças, bem como sobre o reflexo da situação actual e futura na sua esfera de responsabilidade; e ainda a definição das necessidades cuja carência se reflita no cumprimento das respectivas missões. Dou a palavra ao Chefe da Repartição de Informações."

Da intervenção do Chefe da Repartição de Informações, transcreve-se:

"A situação no T.O., analisada à luz da evolução do In e do seu potencial e processos de acção, sofreu, em especial nestes últimos dois meses, um substancial agravamento de resto já oportunamente previsto face às informações processadas, e que se traduz em franca subida de grau no desenvolvimento em escalada na sua manobra político--militar, constituindo o tempo inicial de uma nova fase do conflito: o empenhamento na passagem para acções do tipo convencional, embora ainda isoladas, visando objectivos limitados, e não integrados em qualquer plano de ofensiva geral em moldes clássicos, só próprios, aliás, de uma ulterior e última fase…

O ponto de viragem característico desta subida de grau materializou-se no explosivo incremento da eficácia dos meios In de neutralização da nossa até aqui total liberdade de acção da arma aérea, meios aqueles de que o In largamente dispõe em todo o T. O., desse modo resultando afectada a mais poderosa senão mesmo a única determinante da nossa superioridade de meios no balanço do potencial relativo de combate das forças em presença. E o acréscimo de liberdade de acção daí resultante para o In, adicionado às múltiplas incidências das resoluções que do mesmo facto advêm, confere ao desenvolvimento ulterior da manobra inimiga um grau de perigosidade jamais atingido.

Como factos marcantes…julgam-se de referir…os seguintes factos expressivos:

- Súbito crescimento em qualidade e quantidade da acção ofensiva directamente orientada para objectivos pontuais em áreas enfraquecidas pela nossa deslocação de meios para as áreas de esforço, em nítida intenção de conquista territorial;

- aparecimento no T.O. de unidades In quase totalmente constituídas por elementos não-africanos em acções frontais contra as NF;

- recrudescimento notável da agressividade do In, cujas acções se revelam já perfeitamente delineadas nos seus tempos de fixação, envolvimento, assalto e perseguição;

- disponibilidade de meio aéreos pelo In – próprios ou de reforço – e de carros de combate nas bases de onde normalmente irradia para as acções nas fronteiras Leste e Sul;

- transferência para o BOÉ da área tentativa para a implantação do novo estado."


No que diz respeito à SITUAÇÃO MILITAR:

"…No domínio dos armamentos, refere-se:

- a disseminação dos mísseis terra-ar inimigos em todo o T.O., eficazmente utilizados e referenciados em…

- as notícias insistentes referindo a disponibilidade para o In de armamento antiaéreo mais poderoso e eficaz, ainda não identificado;

- a confirmação de que o In dispõe já, apenas aguardando a chegada dos especialistas respectivos em treinos nos países comunistas de:

- lança torpedos e novos tipos de minas aquáticas para emprego contra as FN

- carros de combate e viaturas anfíbias

- novos mísseis terra-ar e tubos múltiplos lança-foguetões.

…Para completar o quadro da evolução do potencial material do In…no que se refere a meios aéreos, que o PAIGC dispõe já de 4 aviões ligeiros e aguarda o fornecimento de mais 6 de tipo não revelado, contando já com 28 pilotos; e no que se refere a meios navais, a posse de três vedetas rápidas do tipo P-6, de origem soviética.

…os meios que a REP GUINÉ pode empenhar e em relação aos quais se refere:

- A recente chegada de 6 pilotos estrangeiros (líbios e argelinos) à REP GUINÉ

para substituir, nos MIG-15 e MIG-17, os pilotos guineanos cuja perícia se revelou  em alguns acidentes.

- A chegada à REP GUINÉ de 2 helicópteros MI-8 em fins de Abril.

- A promessa da REP GUINÉ ceder uma pista ao PAIGC para manobra dos seus  Aviões.

…Na ZONA SUL, …o IN ameaça directamente as guarnições de GADAMAEL e GUILEJE, a partir da REP GUINÉ, para o qual concentrou meios sobre a fronteira dentre os quais se destacam os carros de combate referenciados em KANDIAFARA, a cuja acção aquelas guarnições se apresentam particularmente expostas." (Negritos meus).

Relativamente às Possibilidades do Inimigo, o Chefe da Repartição de Informações, afirmava:

"…Esta actividade incidirá, mais provavelmente, nas guarnições de fronteira, em especial nas mais vulneráveis às acções de carros de combate, pelo que se consideram áreas de preocupação:

…a região de ALDEIA FORMOSA e, em especial, as guarnições de GADAMAEL e GUILEJE, expostas a uma acção de carros irradiando da REP GUINÉ;

No imediato, julga-se que o In;

…intente uma acção tipo convencional com carros de combate contra GADAMAEL, GUILEJE e/ou BURUNTUMA…visando o aniquilamento ou captura das guarnições.

…e apenas pode concluir-se por uma situação na qual todo o T.O., sem qualquer exclusão, acaba por constituir uma vasta área de preocupação, na qual dificilmente se podem, no momento, visualizar priorizações."

(Os negritos são meus).

A intervenção seguinte foi a do Chefe da Repartição de Operações. Da sua intervenção, salienta-se:

" Se não forem concedidos os reforços solicitados e as armas que permitam às NF enfrentar o In actual, para lhe evitar, a breve prazo, a obtenção de êxitos de fácil exploração psicológica e graves efeitos tácticos da maior influência no moral das NT, julga-se que será necessário remodelar o dispositivo, reforçando guarnições que sob o ponto de vista militar se considerem essenciais e que permitam, à luz de outras concepções de manobra, desencadear mais tarde acções ofensivas com forças de grande envergadura para recuperação de posições enfraquecidas, ou estruturar uma manobra de feição caracterizadamente defensiva baseada na implantação de um certo número de pontos de apoio a sustentar a todo o custo…".

Seguidamente intervieram os Comandantes dos 3 Ramos das Forças Armadas, que fizeram várias considerações e apresentaram as necessidades dos meios para enfrentar a nova situação.

Para dar um exemplo, refiro que o Comandante da Zona Aérea considerava necessário substituir todos os meios aéreos, bem como fornecer um radar de detenção e mísseis terra-ar do tipo REDEYE (não existentes).

As necessidades de reforços apresentadas eram de tal montante que, ainda que na Metrópole houvesse meios financeiros, para o efeito, haveria muita dificuldade, senão mesmo impossibilidade, de encontrar Países disponíveis, dispostos a fornecer o que pretendíamos.

Na mesma Reunião de Comandos de 15 MAI 73, o Brigadeiro Leitão Marques, Comandante Adjunto Operacional do Comando-Chefe (oito dias mais tarde seria nomeado para proceder a Auto de Corpo de Delito contra mim), afirmava, conforme consta na acta da referida reunião:

"…No mínimo, e disso não restam quaisquer dúvidas, o In está a preparar as necessárias condições para conquista e destruição de guarnições menos apoiadas por dificuldades de socorro (GUIDAGE, BURUNTUMA, GUILEJE, GADAMAEL, etc), a fim de obter os êxitos indispensáveis à sua propaganda internacional e manobra psicológica – isto está já ao alcance das suas possibilidades militares.

Quanto às vantagens para a manobra psicológica In, não podemos esquecer que qualquer êxito pode conduzir à captura de prisioneiros em número tal que possa constituir um elemento de pressão psicológica sobre a Nação Portuguesa.

…tal elemento será aproveitado ao máximo para desmoralizar a retaguarda e manter-se-á até serem atingidos os objectivos finais em todas as PU.

Assisti ao pressionamento psicológico do povo americano por causa dos seus prisioneiros no Vietnam do Norte durante quatro anos; e senti em toda a profundidade o efeito desmoralizador desse pressionamento, o qual, em larga medida, juntamente com o elemento económico, levou à agitação interna das massas e à capitulação, apesar de todo o poderio militar americano."  (Negritos meus).

Da análise das transcrições feitas da Acta da importante Reunião de Comandos, realizada em 15 MAI 73, verifica-se a situação, muito difícil, das Forças Armadas na Guiné, face ao agravamento da situação, resultante entre outros factores, do aparecimento e actuação eficaz dos mísseis terra-ar, pelo In.

À data da reunião, a acção em força do In, sobre Guidage, já decorria desde o dia 8 MAI e, 3 dias depois – 18 MAI, iniciava o PAIGC o ataque a Guileje.

Em função do que fica escrito, não posso deixar de considerar, no mínimo, muito estranha a actuação do Comando-Chefe, relativamente a Guileje. Afirmando o Chefe da Repartição de Informações que:

",,,no imediato, o In…intente uma acção com carros de combate contra GADAMAEL, GUILEJE…, visando o aniquilamento ou captura das guarnições.";

afirmação confirmada pelo Comandante Adjunto Operacional (Brigadeiro Leitão Marques):

"…No mínimo e disso não restam quaisquer dúvidas, o In está a preparar as necessárias condições para conquista ou destruição de guarnições…GUILEJE, GADAMAEL…isto está já ao alcance das suas possibilidades militares…qualquer êxito pode conduzir à captura de prisioneiros em número tal que possa constituir elemento de pressão psicológica obre a Nação Portuguesa."

Perante este cenário, o Chefe da Repartição de Operações afirmava:

"…julga-se necessário remodelar o dispositivo, reforçando guarnições que sob o ponto de vista militar se considerem essenciais…"

Se Guileje fosse considerada uma dessas guarnições, deveria ter sido reforçada, em tempo oportuno; não só não o foi, como nem sequer lhe foi atribuído um Pelotão de canhões sem recuo, à semelhança do que tinha sido feito em Gadamael, para fazer face à defesa contra carros de combate, ameaça que pendia também sobre Guileje.

Julgo ter interesse referir a opinião dos elementos do PAIGC sobre a retirada de Guileje. Na pág. 378 do meu livro, refere o Sr. Dr. Delfim da Silva, participante no Simpósio Internacional de Guiledje e ex- Ministro dos Transportes da Guiné Bissau refere:

"…Aos combatentes portugueses aqui presentes exprimo as minhas saudações. Em particular, quero saudar o comandante do COP 5 Coronel Coutinho Lima pela decisão inteligente de ter sabido retirar-se, em boa ordem, da localidade de Guiledje, bombardeada intensamente, estrategicamente vulnerável sem a tradicional cobertura de uma força aérea portuguesa, radicalmente inibida pela acção dos mísseis terra-ar Strella com que os combatentes do PAIGC já operavam desde Março de 1973.

Com a retirada digna, ordenada pelo Coronel Coutinho Lima, pouparam-se muitas vidas de militares que ele responsavelmente comandava. Mas também se pouparam certamente muitas vidas de civis ao redor deste importante aquartelamento.

Sabe-se hoje que o General Costa Gomes, então, Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas de Portugal, defendia a retirada de Guiledje, percebendo a evidente fragilidade estratégica daquele dispositivo militar, debruçado sobre uma linha de fronteira "hostil".

…Para o General Costa Gomes, Guiledje era posição estrategicamente má, e, por isso, não era improvável que esse quartel viesse a ser submetido a uma pressão excessiva por parte das forças do PAIGC, apoiadas de perto a partir de uma linha de fronteira segura.

O General Spínola, teimoso, não valorizou aquela opinião, deixando assim ao Comandante do COP 5 o risco de, em caso de alteração desfavorável dos dados da conjuntura, ter de assumir inteligentemente a retirada sem a devida autorização da cadeia de comando."

A opinião do General Costa Gomes foi transmitida, na sua visita à Guiné, em Junho de 1973 (ver pág. 352 do meu livro). Essa retirada (no que dizia respeito a Guileje) defendida pelo Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas de Portugal, não fazia sentido, porquanto já se tinha processado a retirada em 22 de Maio de 1973, por minha exclusiva decisão, sem autorização superior, em virtude de o Centro de Comunicações de Guileje ter sido totalmente destruído, na flagelação da tarde do dia 21 MAI 73.

No Simpósio Internacional de Guiledje vários ex-combatentes do PAIGC manifestaram-me a sua opinião de que a retirada, por mim decidida, foi a mais adequada à situação, dessa maneira evitando-se baixas nas Nossas Tropas e na População; de salientar o facto de o Ex- Comandante do PAIGC, Manuel dos Santos (Manecas), me ter dito que eu fizera aquilo que tinha de ser feito.

Também a população, que quando soube, ainda em Guileje, em 21 MAI 73, que íamos para Gadamael, informou, através dos seus representantes, que não queria sair, tem agora opinião contrária. Na verdade, quando no âmbito do Simpósio Internacional de Guiledje, nos deslocámos a esta região (1 MAR 08), o Régulo manifestou o reconhecimento da sua população pela minha decisão, tomada em 22 MAI 73, referindo que, se tal não tivesse acontecido, certamente muitos dos presentes (estava a população inteira, agora instalada em Mejo), não estariam ali.

Por ocasião do lançamento do meu livro, 4 Homens Grandes de Guileje, enviaram-me uma mensagem, gravada em vídeo, congratulando-se com o acontecimento, realçando que a decisão da retirada salvou muitas vidas e que esse facto "coloca" Guiledje na História que, sem ele, seria uma das inúmeras povoações desconhecidas, no futuro.

Por iniciativa e promoção da AD, uma ONG (Organização Não Governamental) da Guiné Bissau, está em andamento a implantação, em Guileje, de um Núcleo Museológico, alusivo à história daquela que foi, seguramente, das mais sacrificadas povoações, durante a guerra.

Para terminar esta extensa intervenção, provocada pela opinião do Constantino Costa, devo esclarecer que entendi acrescentar alguma informação complementar, nomeadamente transcrições da Acta da Reunião de Comandos de 15 MAI 73, para melhor se perceber o contexto em que estava inserido a situação do COP 5, no avalizado Estudo do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné.

Embora não dispusesse da informação privilegiada do Comando-Chefe, os elementos que deste recebi, nomeadamente da Repartição de Informações, juntamente com a minha experiência das duas comissões anteriores, o conhecimento pormenorizado da região Guileje/Gadamael (1ª. Comissão) e as condições concretas que se verificavam em 21 MAI 73, em Guileje, levaram-me a tomar a decisão de retirar; esta decisão, no meu ponto de vista, foi a mais adequada à conjuntura real e evitou a perda de mais vidas humanas.

Em Guileje evitou-se, como consequência da retirada, o que o General Costa Gomes afirmou, na sua deslocação à Guiné, em JUN 73, que pode ser lido na pág. 352 do meu livro:

" …A solução, sob o ponto de vista milita, passaria pela adopção de uma manobra visando o encurtamento de área efectivamente ocupada, evitando-se desse modo a contingência de aniquilamento das guarnições de fronteira que se impõe a todo o transe evitar, atentas as repercussões militares e políticas externas e internas".

Não sei se o General Costa Gomes foi devidamente informado da retirada de Guileje, em 22 MAI 73, portanto em data anterior à sua deslocação à Guiné.

A decisão de efectuar a retirada de Guileje foi, seguramente, a mais difícil de tomar, durante toda a minha vida militar; foi tomada, conscientemente, sem me preocupar com as consequências dela resultantes, porque, principalmente, estavam em jogo centenas de vidas humanas, cuja responsabilidade me cabia. Nunca me arrependi dessa decisão e, passados 36 anos, tal como na altura (MAI 73), estou de consciência perfeitamente tranquila. [Sublinhado do editor]

Lisboa, 28 de Setembro de 2009

Alexandre da Costa Coutinho e Lima

(Coronel de Artilharia Reformado – Ex Comandante do COP 5)

[ Fixação / revisão de texto / título: L.G.]

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Nota de L.G.:

Guiné 63/74 - P5626: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/Mai 71) (8): Recordações da Belmira, da Manjaca, da Maria, da Safi, do Jamil...

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > 6 de Dezembro de 2009 > Mulheres (nalus ?). Foto de João Graça,  médico, que esteve como voluntário no Centro de Saúde Materno-Infantil de Iemberém, de 5 a 10 de Dezembro de 2009.

Foto: © João Graça (2009). Direitos reservados


1. Mensagem do  nosso camarada e amigo Arsénio Puim, natural de Santa Maria,  Açores, a viver na Terceira, antigo Alf Mil Capelão do  BART 2917 (Bambadinca, 1970/72):

Luis Graça

Envio um novo trabalho sobre mais algumas personagens da Guiné que eu conheci, o qual publicarás se tiver interesse e quando achares oportuno.

Um abraço
Arsénio Puim


2. RECORDANDO... VIII > ALGUMAS PESSOAS DA GUINÉ

(i) BELMIRA (Bambadinca)

Belmira é uma guineense mandinga que vivia em Bambadinca. De vinte e poucos anos, inteligente, alegre, era lavadeira no Quartel.

Vive só e pobre, com o seu filho, de cor mestiça, cujo pai é um soldado português pertencente a uma unidade antiga de Bambadinca. Por causa disso, tem problemas na tabanca. As pessoas olham mal as mulheres que têm filhos de brancos e ostracizam-nas.

Belmira mostrou ter apreço por certos valores do cristianismo, como a escola, que quer dar ao seu filho, e o casamento monogâmico. Não gostava da casar com um homem que tivesse outras mulheres. Diz que os Fulas e os Mandingas têm muitas mulheres, e estas brigam entre si e são elas que trabalham na bolanha.  «Os cristãos só têm uma mulher, e esta não trabalha na bolanha, e são civilizados», sem deixar, porém, de dizer que «os soldados brancos são malcriados».

Esta conversa com Belmira ocorreu num dia em que ela veio falar comigo para baptizar o seu filho, embora ela seja muçulmana.

(ii) A MANJACA (Xitole)

O mesmo aconteceu, no Xitole, com uma rapariga de apenas 17 anos,  chamada  A Manjaca. Tem dois filhos de soldados brancos e quer baptizar os «mininos», sendo também muçulmana. Enquanto falava comigo, dava o seu volumoso seio ao filho, que o suga com ar bem-aventurado.

Este é um fenómeno corrente na Guiné: as raparigas que têm filhos de pais brancos acham que eles devem ser baptizados, ainda que elas próprias professem a religião muçulmana. Talvez, por uma associação do cristianismo à civilização branca ocidental. «Branco», em África, além de identificar a cor da pele não negra, é um conceito histórico e civilizacional.

Claro que tive que explicar àquelas mães que não fazia sentido baptizar os seus meninos só por serem filhos de pais brancos, uma vez que eles iriam viver num meio onde não receberiam qualquer influência duma educação cristã.

(iii) MARIA (Xitole)

A Maria, filha do chefe de tabanca do Xitole, é uma rapariga de personalidade forte, espírito claro e conversação interessante. Senhora das suas ideias, ela não concorda com o fanado e recusou realizar a excisão, o que lhe acarreta algumas críticas na tabanca.

Gosta dos brancos, mas não para casar. «Famílias africanas não aceitam, nem famílias brancas. E deixam os filhos e vão-se embora. E não mandam patacão. É feio. É um picado», referiu.




Guiné-Bissau > Zona Leste > Xitole  > 2001 > Restos do aquartelamento e povoação de Xitole. A antiga casa do comerciante libanês Jamil Nasser, amigo dos tugas das várias unidades de quadrícula que por lá passaram durante a guerra colonial (**).


Foto: © David Guimarães (2005). Direitos reservados


(iv) JAMIL (Xitole)

Outra pessoa muito conhecida no Xitole é o sr. Jamil, um próspero comerciante libanês, já idoso, inteligente e sabido, que aqui se fixou há muitos anos. Sobre ele recaem algumas suspeitas de que faz comércio com os «turras». No entanto, mostra grande animosidade contra o programa «guerra da paz» de Spínola, porque, desta forma, «os nativos habituaram-se à manha e os turras são tratados como reis».
- És turra?
- Não sou.
- Então vai-te embora.

É a história que o sr. Jamil conta de Spínola uma vez que ele encontrou um prisioneiro do PAIGC num aquartelemento que visitou.

Por outro lado, ele exprime apreço e hospitalidade para com os militares estacionados no Xitole. Numa ocasião em que estive lá, também fui convidado, juntamente com outros militares, para um almoço de chabéu na casa dele: um prato, feito com carne do mato cozinhada em óleo de palma e bem temperada de piripiri, que é típico da Guiné e muito saboroso.

(v) SAFI (Bambadinca)

A terminar este apontamento, recordo mais uma pessoa de Bambadinca, com quem tive relação de trabalho. É a Safi, uma jovem mandinga, de 16 anos ou pouco mais, que era a minha lavadeira. Tinha um feitio algo reservado, mas, ainda assim, era amiga de fazer perguntas e sempre delicada. Conhecia algumas canções mandingas, que, com agrado, ouvi ela cantar, na sua voz de timbre africano. Com ela também aprendi algumas palavras, mais correntes, da língua mandinga, como a saudação habitual entre as pessoas desta etnia, que acho muito bonita e sonante:
- Kairacita?
- Kaira.

É equivalente ao «Jamtum?»; «Jamtum», dos Fulas, que era frequente ouvirmos, em interminável repetição, entre pessoas desta etnia.

Conheci a família de Safi, muito carenciada, como a grande maioria dos guineenses, que me recebeu com muita simpatia nas poucas vezes que me desloquei à sua casa. Uma vez, estando a comer, fui convidado para tomar a refeição com eles, a qual constava de arroz com alguns pedacinhos de carne misturados, que todos tirávamos dum recipiente único e comíamos às bolinhas com a mão.

À Safi, que hoje já vai caminhando para os 60 anos de idade, devo-lhe o meu respeito e apreço pelo trabalho que desempenhou para mim, pela graça que, juntamente com as outras raparigas lavadeiras, traziam ao nosso Quartel quando a ele se deslocavam, e pela sua simpatia para com o «padre-capilon».

[Revisão / fixação de texto / título: L.G.]

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Notas de L.G.:

(*)  Vd. último poste da série > 2 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5578: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917, Dez 69/Mai 71) (7): Mancaman, mandinga, filho do chefe da tabanca do Xime, um homem de paz

(**) Vd. psote de 11 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P952: Evocando o libanês Jamil Nasser, do Xitole (Joaquim Mexia Alves, 1971/73)

(...) Caro Luis Graça



Visitei hoje, mais uma vez, esta página e fui ver as fotografias do Xitole.


Deparei-me com a fotografia das ruínas da casa do Jamil Nasser (1), do Tio Jamil, como eu lhe chamava, e veio-me uma nostalgia difícil de explicar (2).


Quase todos os dias, ao fim da tarde, ía a casa do Jamil e,  no seu alpendre de entrada, bebiamos uns uísques, acompanhados de pedaços de tomate com sal, enquanto ele ouvia as notícias do Libano no seu rádio, em árabe, claro está, e comentava o que por lá se passava.


Para mim era como sair um pouco da tropa e entrar numa vida social, o que dava um certo equilíbrio emocional.


Um dia, quando me preparava para ir ter com o Jamil, apareceu o seu criado Suri, oriundo da Gâmbia, salvo o erro, para me dizer que o Jamil pedia para eu não ir ter com ele naquele dia.

Fiquei admirado, mas bebi o que tinha a beber no quartel. Mal anoiteceu, houve um tremendo ataque ao Xitole que, graças a Deus, não provocou quaisquer vítimas ou sequer ferimentos, mas destruiu bastante alguns edifícios.


Percebi o recado do Jamil, mas nunca falámos nisso. Tenho algumas histórias com ele e até fotografias, se não me engano, não tenho é muito tempo, mas logo verei o que posso arranjar.


A memória falha de vez em quando, mas penso que ainda me encontrei com o Jamil em Lisboa depois de ter vindo da Guiné.

Lembro-me que ele costumava ficar num Hotel, ao lado do Cinema Tivoli, se não me engano Hotel Condestável.

Abraço


Joaquim Mexia Alves  (...)

domingo, 10 de janeiro de 2010

Guiné 63/74 - P5624: Dossiê Guileje / Gadamael (19): Esclarecimentos sobre a retirada, em 22 de Maio de 1973: Parte I (Coutinho e Lima)


I. Mensagem do nosso camarada Alexandre Coutinho e Lima (*), com data de 6 do corrente, em resposta ao meu pedido para nos enviar, de novo, cópia do seu texto de resposta o Poste P4634, que entretanto se havido extraviado:

Caro Luis, Junto envio, novamente, em anexo, a minha resposta ao Constantino Costa (CC) - 1ª. e 2ª. Partes. A 1ª edição do meu livro [A Retirada de Guileje, 22 de Maio 1973: A Verdade dos Factos, edição de autor, 2008] foi de 500 Exemplares; a 2ª. de 200; a 3ª. também de 200 Exemplares está em distribuição. Podes publicar estes dados.

Espero que agora a resposta ao CC seja publicada rapidamente. Um abraço. Alexandre



II. Comentário de L.G.:

Uma das provas de maturidade do nosso blogue  é o respeito pela liberdade de pensamento e de expressão de cada um dos seus membros, dentro dos limites do nosso estatuto editorial.  O texto (I Parte) que se agora se publica, já deveria  ter sido publicado, no nosso blogue, há muito mais tempo, nomeadamente depois das férias de verão. Ao Coutinho e Lima apresentamos as nossas desculpas. O texto andou perdido pelas nossas várias caixas de correio. De qualquer modo, não perde qualquer actualidade. O nosso dossiê Guileje / Gadamael vê-se assim enriquecido com estes novos esclarecimentos.

 A escasso dias de se inaugurar, na Guiné-Bissau, o Núcleo Museológico "Memória de Guiledje", faço meus os votos de um antigo combatente do PAIGC que para possamos, finalmente, depois de "estabelecidas as pontes emocionais entre aqueles que, em lados opostos da barricada, viveram,  com o seu ser,  momentos de sangue, de sofrimento e de destruição, e que hoje se dão as mãos na construção de um mundo feito de compreensão, amizade e respeito mútuo, a história comum pode ser escrita com objectividade, como legado às gerações vindouras".  (citado em documento inserido na página oficial da Ad - Acção para o Desenvolvimento, com sede em Bissau).


III.  Resposta ao P 4634: Dossier Guileje/Gadamael 1973 (13): A desonra da CCAV 8350 ou o direito à minha versão... (Constantino Costa) (**)

Texto de Coutinho e Lima

1ª. PARTE

O documento referido merece-me a seguinte resposta.

Começo por discordar do termo "versão", empregue pelo articulista; não há várias versões dos acontecimentos de Guileje; o que se passou, na realidade, foi o que consta no meu livro A RETIRADA DE GUILEJE". O que o Constantino Costa [, aqui na foto, à direita, em Guileje, em 1973, ] entendeu divulgar é a sua opinião e interpretação daqueles acontecimentos.

O  texto, no seu início, refere:  "foram omitidos factos importantes que, em meu entender, provocaram a fuga de Guileje".

Desde já devo salientar a palavra "fuga"; quer o Constantino quer queira quer não queira, o que aconteceu foi uma retirada, sob pressão do Inimigo; a retirada é uma manobra militar, não faltando exemplos de retiradas em diversos conflitos. Se em Guileje houve uma "fuga", como classifica o Constantino o que se passou em Gadamael, na sequência das flagelações do Inimigo (In) dos dias 31 MAI 73 e 1 JUN 73?

Afirma também que "a actividade operacional se limitou, portanto, no interior do aquartelamento ,registando-se apenas algumas saídas esporádica."

Omitiu que havia um patrulhamento diário para reabastecimento de água e que se realizaram, desde meados de Abril, as seguintes colunas de reabastecimento:

ABR – dias 14, 21 e 25.

MAI – dias 1,4,7,11 14 e 16.

Estas colunas constam de documento elaborada pelo Chefe da 4ª Repartição do CTIG (Comando territorial Independente da Guiné, isto é, o Comando do Exército), que foi junto ao processo que me foi instaurado, a meu pedido (pág. 408 do meu livro).

Não admira que o Constantino tenha omitido a realização das colunas referidas, pois que, a própria Repartição de Operações do Comando-Chefe (REPOPER), na sua apreciação semanal da actividade operacional das Unidades, também não as considerou. Devo referir que as colunas de reabastecimento eram verdadeiras operações, hipotecando todos os meios operacionais e logísticos das duas guarnições (Gadamael e Guileje) e estavam sujeitas à acção do In, que sabia da nossa necessidade de as executar, utilizando a única "estrada" existente.

Ainda relativamente à actividade operacional, enviei em 28 ABR 73, uma mensagem para a REPOPER, solicitando autorização para reduzir ao mínimo a actividade da CCAV 8350 (Guileje), a partir de 30 ABR 73, devido à proximidade da época das chuvas e ao grande atraso das obras em Guileje, por motivos alheios ao Comando do COP 5 (Comando Operacional nº 5, em Guileje). Esta mensagem foi respondida, em 30 ABR, autorizando o solicitado devendo, na medida do possível, "continuar a abertura da estrada de Mejo". Esta actividade continuou, tanto que, nos primeiros dias de MAI, o Alferes Lourenço (especialista de Minas e Armadilhas), foi vítima mortal, quando procedia ao levantamento de um engenho explosivo, implantado pelo In, na referida estrada; em 12 MAI, sucedeu o mesmo a 2 Chefes de Secção de Milícia, ao tentarem levantar uma mina anti-carro, na mesma estrada.

A afirmação do Constantino de que procedia à elaboração de relatórios de patrulhamentos não efectuados, sugere-me a formulação das seguintes perguntas:

- Quem teve a iniciativa (não foi com certeza sua) e quando começou a "prática" de viciar os relatórios dos patrulhamentos?

- Este "procedimento" teve lugar apenas em Guileje ou continuou em Gadamael e nas outras localidades em que esteve a CCAV 8350?

- Na actividade do seu Grupo de Combate (GC), em que tomou parte, verificou que os locais patrulhados não foram os que tinham sido determinados e como é que conhecia estes?

- Na actividade dos outros GC, quem o informou o que afirma, isto é, os relatórios não correspondiam aos patrulhamentos efectuados?

Não digo que a afirmação, sobre este assunto, não corresponde á verdade. No entanto, terá que haver provas concludentes do que é afirmado: indicação de testemunhas que confirmem tal "prática", apresentação de algum desses relatórios, etc. E isto porque as observações dos ex-Alferes Reis e Seabra contrariam o afirmado e não tenho outros elementos favoráveis à afirmação do Constantino. Embora não estivéssemos em guerra (o Governo Português nunca declarou este estado), a viciação dos relatórios de actividade operacional era um procedimento muito grave que, a confirmar-se, esse sim, "desonraria" a CCAV 8350.

Se a situação fosse de guerra declarada, a alteração dos relatórios estaria no âmbito de crime militar; pode o Constantino ter a certeza de que, se em Guileje, eu tivesse tido conhecimento destes factos, iniciaria, de imediato, as averiguações indispensáveis, no sentido de apurar a verdade, ao mesmo tempo que faria a respectiva comunicação ao Comando-Chefe; o Constantino seria, seguramente, incluído nos infractores, no mínimo, como conivente.

Tendo estado presente nos convívios efectuados em Condeixa, Santa Maria da Feira e Pombal, porque não apresentou as críticas que agora incluiu no blogue, especialmente o facto da viciação dos relatórios? Não obstante não comparecerem, nesses convívios, mais de 50% da CCCAV 8350 (afirmações suas), tinha sido uma boa oportunidade para debater este assunto, bem como outras questões.

A certa altura afirma que, quando algumas mulheres africanas se deslocaram à bolanha para se abastecerem de água, …"tendo o major de se colocar à frente dos nossos camaradas para que lhe fosse prestado o devido auxílio". Isto é absolutamente falso, porque este episódio passou-se na tarde de 21 MAI (segundo os depoimentos de testemunhas no processo) e, nessa altura, deslocava-me eu, de Gadamael para Guileje, em coluna apeada, não me encontrando em Guileje.

Afirma também que …"os abrigos estavam praticamente intactos", o que corresponde à verdade e ninguém afirmou o contrário; mais á frente, referirei as instalações atingidas pelas flagelações.

Parece haver outro equívoco na pergunta: "Quem se recusou a efectuar a protecção do major, quando este pretendia deslocar-se de Guileje para Gadamael?"

Naquele período, a minha deslocação de Guileje para Gadamael, foi na manhã de 19 MAI, comandando a coluna de evacuação de feridos, resultantes da emboscada da véspera (e também com a finalidade de contactar os Delegados de Bissau, que solicitei que fossem a Guileje e não apareceram); a evacuação fez-se em coluna auto até ao Rio Afiá (onde também seria feito o reabastecimento de água) e depois, via fluvial até Cacine; tanto quanto seja do meu conhecimento, ninguém se recusou a fazer a respectiva protecção.

Pergunta ainda porque é que não falaram do que se passou "durante a reunião de oficiais na véspera da fuga"; porque é que o Constantino também não falou?

Após a minha chegada a Guileje, no final da tarde do dia 21 MAI, fiz uma visita rápida ao quartel e, de seguida, ouvi o relato do Capitão Quintas, Comandante da Companhia, do que se passara na minha ausência; depois de ter reflectido algum tempo, comuniquei aos presentes (além dos Oficiais, estavam alguns Furrieis e outros elementos), a decisão de retirar no dia seguinte – 22 MAI, logo que a claridade o permitisse.

Nesta altura, importa salientar outras omissões do Constantino, bem como as providências que tomei, desde a emboscada In do dia 18 MAI, até à tomada de decisão de efectuar a retirada.

A primeira omissão diz respeito à última visita do General Comandante-Chefe a Guileje, em 11 MAI 73;perante formatura geral, o General Spínola afirmou que se esperava um agravamento A da situação, que a Força Aérea não podia executar as missões como até há pouco fazia, mas que, apoiaria as Nossas Tropas (NT)., voando mais alto e utilizando bombas mais potentes; afirmou ainda que, no caso de haver feridos graves, seria feita a sua evacuação, não a partir do mato, mas sim de Guileje.

Na emboscada In de 18 MAI, resultaram para as NT, 1 Morto (Comandante do Pelotão de Milícia), 7 Feridos graves e u Feridos ligeiros; pedida a evacuação dos feridos, a mesma não foi efectuada e passadas umas 3-4 horas, um dos feridos graves (Cabo metropolitano), acabou por morrer; enviei então para a REPOPER, a seguinte mensagem:

-"NÃO SATISFAÇÃO…EVACUAÇÕES, CAUSOU GRANDE MAL ESTARENTRE TODO PESSOAL POIS ÚLTIMA VISITA SEXA GENERAL ESTE DISSE MESMAS SERIAM EFECTUADAS QUANDO NT SITUAÇÃO DIFÍCIL".

A afirmação do Comandante-Chefe sobre a satisfação das evacuações, consta não só das minhas declarações, no processo, como no depoimento de várias testemunhas; para confirmar, se isso fosse necessário, basta ler o 5º. Parágrafo da Promoção de Justiça (pág. 438 do livro):

"…tanto mais que dias antes, perante uma formatura geral…Sua Excelência o General Comandante-Chefe…assim como, no caso de haver feridos graves, faria a sua evacuação para Bissau."

Se isso não correspondesse á verdade, não seria incluído, seguramente, no documento citado.

Após a emboscada de 18 MAI, que inviabilizou a realização da coluna de reabastecimento (foi a primeira vez que tal acontecera, por acção do In), apercebi-me da gravidade da situação; enviei uma mensagem para a REPOPER, solicitando a vinda a Guileje de um seu delegado e outro do COAT (Centro de Operações Aero-Tácticas, da Força Aérea), para expor a situação; nessa altura, estava certo que isso seria possível e só constatei o contrário quando as evacuações não foram feitas.

Entretanto decidi evacuar os feridos, por via fluvial, na manhã do dia seguinte, porque nesse dia a maré não o permitia; informei a REPOPER que me deslocava para Cacine, onde esperava encontrar os delegados. A REPOPER comunicou-me que devia expor a situação, por mensagem, o que apenas fiz no dia 20 MAI, às 03H20, hora a que tive conhecimento do pedido da REPOPER, porque esta enviou a mensagem somente para Guileje (onde eu já não estava) e daqui foi retransmitida para Cacine.

"…CMDT COP 5… INFORMA NECESSITA UMA COMPANHIA TROPA ESPECIAL REFORÇO TEMPORÁRIO FIM EFECTUAR REABASTECIMENTO GUILEJE: NECESSÁRIO TAMBÉM REFORÇO VIATS E ESTIVADORES".

A REPOPER, do meu ponto de vista, não reagiu, de forma atempada, à situação; se houvesse intenção de enviar os delegados (e, manifestamente, não foi o caso), estes poderiam ter aproveitado os helicópteros que fizeram as evacuações de Cacine, na manhã do dia 19 MAI; se isso tivesse acontecido, eu poderia regressar, nesse mesmo dia, a Guileje.

Outra omissão do Constantino, diz respeito ao facto de, na tarde do dia 18 MAI, o GC encarregado de proceder ao reabastecimento de água, se ter recusado a fazê-lo, enquanto não fosse esclarecido o problema das evacuações; mandei formar o GC e após lhes ter falado, eu próprio comandei essa operação de reabastecimento de água; devo esclarecer que, contrariamente ao que o Constantino afirmou que, nesses reabastecimentos, apenas alguns homens iam armados (mais uma afirmação que carece ser devidamente confirmada), neste verifiquei que todos os militares, como não podia deixar de ser, apresentaram-se devidamente armados e equipados.

Estive em Cacine até ao fim do dia 20 MAI, enviando mensagens a insistir com a comparência dos delegados ou a minha ida a Bissau, regressando, de imediato. Na tarde de 20 MAI, fui transportado de helicóptero a Bissau, onde expus a situação ao General Comandante-Chefe, no final do "briefing" diário; o General Spínola, disse que não me concedia qualquer reforço, sem nenhuma explicação, que devia regressar a Guileje no dia seguinte e que ia nomear o Coronel Pára-quedista Rafael Durão para comandar o COP 5, passando eu a 2º. Comandante. Importa referir que o Coronel Durão se encontrava em Mansoa e que, se o General Comandante-Chefe entendesse, teria sido possível um encontro comigo, nessa noite e, inclusivamente, poderíamos seguir juntos para Guileje; assim não foi entendido, o que, em minha opinião teria toda a lógica e ganhar-se-ia um tempo precioso.

Na manhã do dia 21 MAI, fui transportado, de helicóptero, para Cacine, donde segui de "sintex" para Gadamael. No dia seguinte, 22, o Coronel Durão foi transportado, de helicóptero, directamente para Gadamael, certamente porque a sua ida era uma emergência, mas não a minha (de acordo com informação da REPOPER, a Força Aérea só ia a Gadamael em emergência); se tivesse sucedido o mesmo comigo, teria tido oportunidade de chegar a Guileje muito mais cedo (só lá cheguei ao fim do dia 21 MAI); com as comunicações ainda funcionais, teria exposto a situação, por mensagem, à REPOPER.

Entretanto, durante todo o período, Guileje continuou a ser atacada pelo fogo In; as flagelações começaram às 20 horas do dia 18 MAI e até às 4 horas do dia 22 MAI, a guarnição de Guileje foi sujeita a 37 flagelações.

Cheguei a Guileje no final de 21 MAI, escoltado por 2 GC da CCAÇ 3520 (Gadamael); o percurso Gadamael/Guileje foi efectuado, em coluna apeada, por um trilho que até então era apenas utilizado pela população. Durante o percurso, ouvimos a flagelação do In a Guileje (das 14H30 até às 16H30).

A situação que encontrei, em Guileje, foi a seguinte:

- Destruição total do Centro de Comunicações, incluindo todas asa antenas, o que impedia a ligação rádio, com quem quer que fosse.

- Na flagelação dessa tarde, um Furriel tinha sido morto, por ter sido atingido pelo rebentamento de uma granada, num abrigo de fraca protecção.

- Estavam destruídas, em consequência das flagelações inimigas:

. dois depósitos de géneros;

. depósito de artigos de cantina;

. cozinha;

. forno;

. celeiros de arroz da população (ainda a arder);

. grande parte das moranças da população.

- Vários abrigos tinham sido atingidos, sem consequências para as NT ou população.

- Muitos impactos de granadas nas valas.

- Falta de água potável; o último reabastecimento tinha sido feito no dia 19 MAI, de manhã.

- Escassez de munições de Artilharia.

- Escassez de alguns medicamentos e material de primeiros socorros.

- Tinha sido verificada, nessa tarde, a presença do In nas proximidades do quartel (do lado de Mejo), tendo flagelado elementos da população, que tinham ido tentar abastecer-se de água.

- Todo o pessoal estava arrasadíssimo, quer física, quer psicologicamente, ao fim de 3 dias e 3 noites consecutivas de flagelações.

- A vida no interior dos abrigos (onde, desde início, se recolhera toda a população) era pouco menos que insuportável; com a superlotação dos mesmos abrigos, o calor e cheiro nauseabundo, a situação era muitíssimo difícil, além de que a presença dos civis limitava grandemente os movimentos dos militares.

- Garantia de não evacuação de feridos; este facto era de extraordinária importância, contrariamente à opinião do Constantino; se houvesse feridos graves, estes ficariam entregues à sua sorte, cujo desfecho poderia ser a morte, como já tinha acontecido com um deles, na manhã de 18 MAI.

Todo o pessoal tinha muita esperança que a minha ida a Bissau fosse bem sucedida, com a atribuição de reforços.

Depois de me inteirar do que havia sucedido na minha ausência (embora, através das mensagens, soubesse o que se ia passando), fiz uma reunião informal com o Comandante da CCAV 8350 e outros Oficiais, estando também presentes outros elementos.

Os factores que considerei, para tomar uma decisão, foram os seguintes:

1. Forte pressão do In, que não abrandava; pelo contrário, a flagelação dessa tarde tinha sido a maior; a Repartição de Informações enviara, às 19 horas do dia 20 MAI, informando que o 3º. Corpo de Exército estava nas matas de Mejo, admitindo a pos- sibilidade de vir a actuar sobre Guileje; isto era a confirmação de que o In continuava a reforçar o seu dispositivo, à volta de Guileje.

2. Não atribuição de reforços.

3. Não evacuação de feridos; a evacuação, via fluvial, como fora feita em 19 MAI, não mais era possível, porque os barcos ficaram em Cacine, em virtude da falta de segurança, do seu regresso, pela mesma via, a Guileje.

4. Escassez de munições, especialmente de Artilharia; o seu reabastecimento só podia ser feito por estrada e não mais era possível, com os meios do COP 5, pela acção do In, que já tinha impedido a realização da coluna do dia 18 MAI.

5. Falta de água potável no aquartelamento e impossibilidade \de fazer o seu reabastecimento, pois o In, instalado nas matas do Mejo, não o permitiria.

6. Defesa da população

Na Missão do COP 5, constava:

…(5) Assegura a defesa eficiente dos aglomerados populacionais ocupados pelas NT.

Nas condições existentes, não podia garantir essa defesa.

7. Destruição do Centro de Comunicações

Como poderia eu ou o novo Comandante, Coronel Durão,  exercer a acção de Comando sem comunicações?

8. Novo Comandante do COP 5

Além de não saber quando o Coronel Durão chegaria a Guileje, considerei que não iria resolver a situação, porque:

- Não viria acompanhado dos reforços necessários; estes, ser-lhe-iam atribuídos, mas demorariam a chegar a Gadamael, no mínimo, uns dois dias, após a decisão de os enviar, que só seria depois de o novo Comandante do COP 5, os solicitar; seguir-se-ia a deslocação para a região de Guileje; esta guarnição não estava em condições de lhes prestar qualquer espécie de apoio, nem tão pouco proporcionar nenhum descanso, no intervalo da actividade operacional; além disso, iriam actuar em condições particularmente difíceis, no que respeita à evacuação dos possíveis/muito prováveis feridos, que teriam que ser transportados para Gadamael, pela própria força e só a partir dali poderiam ser evacuados.

- Sem comunicações, como poderia exercer a sua acção de Comando?

- Não solucionaria o problema do reabastecimento de água.

- Não estava em condições de fazer chegar a Guileje, enquanto não chegassem os reforços, munições de Artilharia e outros artigos críticos.

- Não garantiria a evacuação de feridos, a partir de Guileje.

9. Previsão do futuro, a curto prazo

A pressão do In não abrandava, pelo contrário recrudescia e as NT não estavam em condições de aguentar, pelos motivos apontados, até à chegada de reforços, que certamente seriam atribuídos ao novo Comandante e que a mim tinham sido negados.

10. Existência de um Morto

Naquele momento existia, infelizmente, um Morto, provocado pela flagelação dessa tarde de 21 MAI. Considerei que era exequível o transporte do cadáver; se houvesse meia dúzia de baixas, isso seria impeditivo de poder retirar, por impossibilidade do seu transporte, em coluna apeada.

11. Efeito de surpresa

Tendo eu chegado a Guileje ao fim desse dia 21 MAI, sem ter sido detectado pelo IN, este não teria possibilidades, durante a noite, de verificar a utilização, pelas NT, do trilho da população, utilizado no regresso a Guileje.

Ponderados os factores apontados, considerei que não havia condições de aguentar a posição, decidindo pela retirada que, do meu ponto de vista, deveria ser efectuada o mais cedo possível, isto é, no dia seguinte, logo que as condições de visibilidade o permitissem, aproveitando principalmente o efeito de surpresa.

A finalidade da retirada foi, prioritariamente, evitar que as NT e a população ficassem à mercê do In, retirando-lhe a possibilidade de completar o cerco e causar mais baixas que, naquelas circunstâncias, seriam baixas não justificáveis; a vida humana não tem preço e a sua perda deve ser minimizada.

O objectivo primeiro de uma guerra é impor a nossa vontade ao Inimigo, infligindo-lhe a derrota. Neste caso concreto, a desproporção de meios humanos e, nomeadamente de meios materiais, com relevância para o armamento pesado, era de tal maneira favorável ao PAIGC que a nossa vitória, na minha avaliação, não era possível.

Nas condições concretas, naquele momento em Guileje, não podia assegurar a segurança eficiente da população, como estava na minha Missão.

A decisão de retirar foi tomada de forma consciente e comunicada aos presentes, na reunião informal que efectuei, não havendo nenhuma discordância.

Lamento que o Constantino, não tenha apresentado a sua não concordância com a decisão, logo que dela teve conhecimento; perdeu uma boa oportunidade de marcar a sua posição; agora, passados 36 anos sobre os acontecimentos, é bem mais fácil argumentar contra a decisão.

Logo que tomei a decisão, tive a convicção que a mesma não iria ser aceite pelo Comando Superior, tendo declarado aos presentes, que a minha vida militar poderia ter chegado ao fim.

O cenário descrito foi resultante das informações que eram recebidas do Comando-Chefe, nomeadamente da Repartição de Informações, no que dizia respeito à actividade do In.

No processo que me foi instaurado, em consequência da decisão de retirar de Guileje, tomei conhecimento de outros documentos. A primeira referência à preparação de um ataque em força sobre Guileje, consta do extracto de relatório, com data de 27 DEZ 72 (isto é, antes da criação do COP 5) – pág. 410 do meu livro.

Desse relatório transcrevo:

" Intenções do IN

…a. NA FRONTEIRA -Refere que o In pretende fazer um ataque com bastante força a GUILEJE, porque pretende obter uma maior liberdade de movimentos logísticos e de pessoal no Corredor de Guileje. Para isso, ficaram em KANDIAFATRA alguns elementos que vieram recentemente dum estágio de Artª. na Rússia, para fazerem reconhecimentos na área de GUILEJE e preparar essa acção…

………MODO DE ACTUAÇÃO

Os chefes sabem que as flagelações aos aquartelamentos não têm obtido resultados compensadores e por isso resolveram mandar vários elementos ao estrangeiro receber uma instrução mais adiantada de Artilharia

…Estes elementos ficarão normalmente em observadores avançados durante as flagelações, ligados por telefone às bases de fogos, dirigindo a acção e regulação de tiro…"

No Jornal PÚBLICO de 20 JUL 04, foi publicado um artigo, com o título Amílcar Cabral "Se o quartel de Guileje cair, cai tudo à volta".

O artigo é da autoria de Osvaldo Lopes da Silva (OLS), antigo Comandante do PAIGC, está transcrito, integralmente, no meu livro (pág. 358 a 365) e reporta-se a um outro artigo, inserido no PÚBLLICO de 16 MAI 04.

Desse artigo, transcreve-se:

"…É na qualidade de protagonista importante que fui na preparação e condução da Operação Amílcar Cabral, que determinou a queda de Guiledje, que trago informações e comentários que podem completar o quadro apresentado no artigo em referência.

Foi em Agosto ou Setembro de 1972, num momento de muita tensão no seio do PAIGC em CONAKRY, que Cabral me confiou a tarefa de preparar as condições para um ataque força a Guiledje…

Cabral terminou a sua exposição com este desabafo: "Se este quartel cai, tudo à volta também cai". Calou-se, olhou para mim à espera da minha resposta. E eu, com convicção, disse; "Posso destruir o quartel, só preciso de tempo para preparar os dados de fogo e os meios"….

Cabral deu logo instruções no sentido de serem colocados à minha disposição os meios necessários. Para começar, uns 30 homens, guineenses e cabo-verdianos, para o meu grupo especial de reconhecimento, com o que fosse necessário para a missão…

O que finalmente resultou foi o levantamento topográfico, ligando posições distantes do quartel entre 4 e 12 kms, de acordo com os alcances das peças de artilharia que iríamos utilizar…

Feito o levantamento topográfico, procedemos a vários flagelamentos com morteiros 82, tendo em vista provocar a resposta do inimigo e podermos assim determinar…o azimute do quartel…

Destinámos uma posição a 12 kms para canhões que teriam a missão de desgastar psicologicamente o inimigo com um disparo com intervalos de meia ou uma hora; uma a 4 kms ara morteiros 120 com missão de destruir os abrigos com fogo de saturação sobre eles concentrado e, finalmente, uma posição para GRAD ("catiucha") …entre 6 e 7 kms…A posição de GRAD só foi utilizada em finais de Março de 1973, com o lançamento de 2 ou 3 foguetes, numa operação que se destinava a testar o comportamento das nossas tropas a ataques prolongados, de dia, e a reacção da aviação. Esta veio, tendo sido abatidos 3 aviões com foguetes terra-ar Strela.

A Operação Amílcar Cabral pôs em evidência a grande supremacia das forças do PAIGC (infantaria, artilharia, logística); supremacia de tal ordem que me permito dizer que as acções eram em sentido único e que prosseguir na resistência seria uma loucura que só poderia ter como epílogo o esmagamento do contingente cercado em Guiledje pelas nossas forças, pela mata e pelas minas que pretendiam protegê-lo. A nossa supremacia em meios (quantitativa e sobretudo qualitativa) e em homens era reforçada pelo minucioso conhecimento que tínhamos do dispositivo contrário, conseguido ao fim de vários meses de reconhecimento. Desencadeada a operação, não houve necessidade de correcção do fogo de artilharia…

Nem a artilharia apontada para Kandiafara, nem a aviação, nos causava mossa. A aviação, particularmente os Fiat, passavam por cima das nossas cabeças sem nos desviar do que estivéssemos a fazer. O mesmo não direi dos helicópteros e das minas que tínhamos que ter sempre em conta".

Das transcrições do artigo referido, verifica-se que a Operação em força sobre Guileje, foi preparada minuciosamente, com reconhecimentos ao longo de vários meses, devidamente acompanhada da preparação de especialistas, especialmente de Artilharia.

A referência ao abate de 3 aviões não é correcta; o incidente verificou-se em 25 MAR 73 e foi abatido 1 Avião FIAT, pilotado pelo Tenente Piloto Aviador Miguel Pessoa, que conseguiu ejectar-se e foi recuperado no dia seguinte.

Posso confirmar a afirmação do Lopes da Silva, quando afirma que "não houve necessidade de correcção de fogo de artilharia", de facto, desde o início das flagelações, verificaram-se muitos rebentamentos dentro do quartel.

O Comando-Chefe e, em especial a sua Repartição de Informações, teve conhecimento da preparação que o PAIGC estava a fazer, tendo em vista uma acção em força sobre Guileje, pelo menos desde DEZ 72, conforme extracto de relatório referido atrás.

Para fazer face à intenção do PAIGC, relativamente a Guileje, o Comando-Chefe criou o COP 5 (22 JAN 73), para o qual me nomeou Comandante, sem atribuição de qualquer reforço; até essa altura, todos os Comandos Operacionais criados tinham recebido reforços; é caso para perguntar porque é que o COP 5, logo na sua criação, não foi reforçado, sabendo-se que o In tinha intenção de actuar em força sobre aquele aquartelamento.

Reportando-me ainda ao artigo de OLS, saliento a afirmação da "grande supremacia das forças do PAIGC".

Relativamente aos efectivos empregues pelo PAIGC na acção em força sobre Guileje, o Chefe da Repartição de Informações, no seu depoimento, quando ouvido no âmbito do processo que me foi instaurou, afirmou que eram da ordem de 300 a 350 homens, incluindo o 3º. Corpo de Exército. Esta estimativa parece-me avaliada por defeito. Com efeito, no livro GUERRA COLONIAL, da autoria de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes (pág. 513 a 515), pode ler-se:

"No total, o PAIGC concentrou na zona de Guileje, um corpo de exército (3º. CE), no Mejo, dez bigrupos em reforço do sector de fronteira e uma bateria de artilharia, com um grupo de reconhecimento, Ao todo, considerando a base numérica de cada unidade do PAIGC utilizada pelos serviços militares portugueses, seria de 650 homens, efectivo idêntico ao que foi concentrado em Guidage."

No que se refere a outros meios utilizados, pode também ler-se, no mesmo livro:

" Para o início da operação, o PAIGC concentrou em redor de Guileje, a bateria de artilharia de KANDIAFARA, com morteiros de 82 e 120 mm, canhões sem recuo de 85 e de 130 mm, um grupo de reconhecimento e observação e cinco bigrupos do sector de fronteira. Deslocou o 3º. Corpo de Exército do Unal para a mata de Mejo e transferiu três bigrupos da região do Boé e dois bigrupos do 2º. Corpo de Exército, no Tombali, para reforço do sector de fronteira".

Os meios das NT em Guileje eram:

- CCAV 8350, Pelotão de milícia e Secção de auto-metralhadora Fox – cerca de 200 homens.

- Armamento pesado:

. 2 Obuses de 14 cm;

. 1 Morteiro de 10,7 cm;

. 2 Morteiros de 81 mm,

O número de 650 homens, estimado por Aniceto Afonso e Matos Gomes, no seu livro, parece-me mais realista, porque foi calculado a partir da base numérica das unidades do PAIGC, do que o de 300/350, referido pelo Chefe da Rep  Info, não esclarecendo este como chegou à sua estimativa.

O efectivo de 650 homens do PAIGC, diz respeito a pessoal combatente; acrescentando todo o pessoal de apoio logístico, carregadores e outro, o número total não terá andado longe de 1 000 homens, número indicado por Nino Vieira, quando lhe fiz a pergunta sobre este assunto.

Através do processo que me foi instaurado, tomei conhecimento do que se passou em Guidage, onde o PAIGC desencadeou uma acção em força semelhante à de Guileje, num documento elaborado pelo Chefe da REPOPER (pág. 87 e 88 do meu livro).

Nesse documento verifica-se que a acção do In se iniciou, no dia 8 MAI 73, de maneira idêntica à de Guileje, com uma emboscada a uma coluna que tinha partido de Farim; a coluna foi retida pelo accionamento de mina anti-carro, obrigando o pessoal a pernoitar no local, tendo sofrido um forte ataque, durante a noite. A coluna regressou a Binta, deixando no local 4 viaturas que, foram destruídas pela força Aérea; as NT sofreram 4 Mortos e 30 Feridos; o In teve 13 Mortos e outras baixas prováveis.

No dia 10 MAI 73, foi realizada uma nova coluna de reabastecimento Binta-Guidage.

Foram executadas, no total, 7 colunas, das quais 5 chegaram a Guidage; as NT sofreram 22 Mortos e 70 Feridos.

Em 29 MAI 73, foi feita uma operação de abertura de um novo itinerário Binta-Guidage, envolvendo efectivos, entre outros, a 38ª. Companhia de Comandos, a Companhia de Pára-quedistas 121 e os Destacamentos de Fuzileiros 1 e 4.

De 17 a 21 MAI 73, o Batalhão de Comandos Africanos realizou a Operação Ametista Real, com forte apoio da Força Aérea, que nela emprenhou praticamente todos os seus meios; a missão dessa operação era aniquilar ou, no mínimo, desarticular o In na zona, atacando a sua base de CUMBAMORY (Rep. do Senegal). Os resultados da operação foram: o In teve 67 Mortos e bastantes baixas prováveis; destruída uma quantidade enorme de material e capturado diverso armamento; As NT sofreram 10 Mortos, 22 feridos graves e 3 Desaparecidos.

Pelo depoimento do Chefe da REPOPER; no processo, fiquei a saber que:

- as flagelações a Guidage se iniciaram em 8 MAI 73;

- as flagelações terminaram em 1 JUN, não tendo havido flagelações nos dias 20, 24, 26, 30 e 31 MAI;

- chegaram colunas de reabastecimento, a Guidage, em 10, 12, 15 e 29 MAI;

- a guarnição de Guidage foi reforçada, por iniciativa do Comandante do COP 3 (a que pertencia), em 8 MAI, com 2 Grupos de Combate (GC) da CCAÇ 3 e, em 12 MAI, com mais um GC da CCAÇ 3 e os Destacamentos de Fuzileiros Especiais 1 e 4;

- os reforços atribuídos a Guidage foram:

. 12 MAI (coluna de reabastecimento): 5 GC do Batalhão de Caçadores 4512 (Farim), 1 bigrupo da 38ª. Companhia de Comandos e 1 Secção do Pelotão de Morteiros 4274, até às 06H40 do dia 13 MAI;

. 15 MAI (coluna de reabastecimento): 2 GC do Comando de Bissau, 1 GC da Companhia Eventual Africana e 1 Grupo de Milícias de Jemberem, até às 10h30 de 16 MAI;

. 23 a 30 MAI: Companhia de Caçadores Pára-quedistas 121;

. Pelotões de Caçadores (tropa nativa) 56 e 65, em data não indicada, para suprir as baixas da CCAÇ 19 (Guidage);

. após 29 MAI, outras forças, não discriminadas;

. as flagelações a Guidage causaram às NT, 7 Mortos, 17 Feridos graves e 13 Feridos ligeiros.

Em 8 MAI 73, a guarnição de Guidage era constituída pela CCAÇ 19 (Tropa nativa) e pelo 24º. Pelotão de Artilharia.

Refere-se ainda que em 8 MAI, por solicitação do Comandante do COP 3 (sede em Bigene, tendo-se deslocado para Guidage em 11 MAI), foi feito um reabastecimento de emergência de munições de Morteiro 81, Obus \10,5 e Espingarda G3, por 5 helicópteros para Bigene e um avião Nord Atlas para Farim.

Nos dois documentos referidos (relatório do  Chefe da REPOPER e seu depoimento), verifica-se que Guidage foi fortemente reforçado, desde o 1º. dia do ataque In.

Tais documentos permitem comparar a actuação do Comando-Chefe nas duas situações: Guidage foi objecto do reforço adequado e imediato, sendo de destacar a Operação Ametista Real do Batalhão de Comandos Africanos, sobre a base do PAIGC em Cumbamory (Rep. do Senegal).

Guidage pôde ser socorrido por tropas de Farim, tendo o próprio Comandante de Batalhão comandado a coluna de reabastecimento de 12 MAI; recebeu também reforços de Binta e Bigene.

Guileje estava ainda numa situação mais difícil, relativamente a possíveis reforços locais, pois a única ligação terrestre era com Gadamael e esta foi cortada pelo In, pela emboscada de 18 MAI.

Durante o Simpósio Internacional de Guileje, realizado em Bissau, em MAR 08, tomei conhecimento, através de elementos do PAIGC, que estava planeado que as acções contra Guidage e Guileje se realizassem simultaneamente; devido ao facto de as forças do PAIGC terem sido detectadas, durante a montagem do dispositivo, em Guidage, a acção sobre esta guarnição foi desencadeada em 8 MAI, mantendo-se a data prevista em Guileje – 18 MAI.

Tenho a firme convicção que, se os dois ataques tivessem sido simultâneos, o Comando-Chefe teria repartido os reforços pelas duas guarnições – Guidage e Guileje.

Ao hipotecar praticamente todos os seus reforços em Guidage, o Comando-Chefe e o seu Estado Maior falhou a previsão dos acontecimentos em Guileje, onde sabia que o In iria actuar em força, como aconteceu.

Se Guileje tivesse sido reforçado, como o foi Guidage, não teria eu ficado com toda a responsabilidade da situação e, seguramente, não teria decidido retirar.

E não se argumente que o Comando-Chefe não tinha reservas disponíveis; se assim fosse, isso em nada abonaria a favor de um Comando responsável, empregando os seus reforços numa área do teatro de operações, estando outras sob forte ameaça.

Na verdade estava, em Cacine, um Destacamento de Fuzileiros Especiais, que poderia, de imediato, reforçar o COP 5; em Cufar (Sector do COP 4) encontravam-se as Companhias de Pára-quedistas 122 e 123; em Bissau, estava a Companhia de Paraquedistas 123, em descanso, desde 20 ABR 73; esta foi também reforçar Guidage.

Ao abordar o problema da retirada de Guileje, de uma forma séria, não pode deixar de se comparar com o que se passou em Guidage.

O procedimento do Comando-Chefe, em duas situações semelhantes, foi profundamente diferente: Guidage foi reforçado com a maioria das suas reservas, destacando-se a Operação Ametista Real, sobre a base do PAIGC, em Cumbamory; a Guileje não foi atribuído nenhum reforço.

Devo esclarecer o Constantino que não pretendi "sacudir a água do capote", nem "agi como Pilatos". Assumi inteiramente a responsabilidade da situação, decidi efectuar a retirada, por considerar que era a maneira de evitar um grande número de baixas (militares e população) e a tomada de prisioneiros, pelo In.

A certa altura, o Constantino afirma que eu nunca fui "ilibado, mas sim amnistiado", o que é verdade. Devo esclarecer que, se tivesse sido sujeito a julgamento (e este só não se realizou, por virtude do 25 de Abril de 1974), certamente que o Chefe da REPOPER teria sido chamado a depor, como testemunha e seria interrogado sobre a maneira como resolveria o problema de Guileje, o que não aconteceu quando foi ouvido, no âmbito do processo, em que não lhe foi feita nenhuma pergunta acerca de Guileje.

Será que o Constantino concorda que, num processo sobre a retirada de Guileje, destinado a averiguar a verdade dos factos, o Chefe da REPOPER, primeiro responsável pela conduta das Operações, não tenha sido instado a pronunciar-se sobre o objecto dos autos?

E, no julgamento, o Comandante-Chefe também seria, eventualmente, posto perante os factos e solicitado a pronunciar-se sobre os mesmos.

O Constantino afirma que eu, como militar, não cumpri. É a sua opinião, que vale o que vale; para mim vale muito pouco, porque considero que não tem conhecimentos militares nem capacidade para me julgar.

Pede-me que, "sensatamente", me "remeta ao silêncio". Pois terá que me ler, se quiser, porque não prescindo do meu direito de resposta e defesa.

Pergunta ainda porque é que noutras zonas, "os militares altamente massacrados pelo In, não abandonaram as suas instalações"; só me posso pronunciar sobre Guidage e Gadamael; no primeiro caso, foram apresentadas atrás os avultados reforços que lhe foram atribuídos; Gadamael, não obstante ter sido pedida a sua evacuação, pelo então Capitão Manuel Monge, não aceite pelo Comando-Chefe e foi reforçado com o Batalhão de Caçadores Pára-quedistas nº.12 (3 Companhias).

Outra afirmação é que os Obuses de 14 cm não faziam fogo para não denunciarem as suas posições; isto não corresponde minimamente à verdade; nas declarações dos Senhores Oficiais presentes em Guileje, no âmbito do processo, todos foram unânimes em afirmar que, a reacção pelo fogo às flagelações inimigas, era feita também pelos Obuses de 14 cm. O Alferes Pinto dos Santos, Comandante do 15º. Pelotão de Artilharia, em Guileje, declarou que "executei cerca de 70 tiros…, em reacção à emboscada de 18 MAI"; o mesmo Oficial afirma que, no início do período, havia cerca de 400 munições completas; na noite de 21/22 MAI, depois de ter decidido retirar, dei-lhe ordem para, em reacção às flagelações (foram 3), gastar todas as munições completas existentes, o que aconteceu.

Desde o início das flagelações (dia 18 MAI às 20H00), houve a preocupação de "poupar" as munições de Artilharia, porque sabíamos que não seríamos reabastecidos; o reabastecimento de munições de emergência, como aconteceu no apoio a Guidage, no primeiro dia do ataque (8 MAI), não era viável em Guileje, porque nenhum meio aéreo o faria.

O Constantino diz que "o Major Coutinho e Lima infringiu gravemente regulamentos militares de então….é facto que desobedeceu a uma ordem legítima do Comandante-Chefe do CTIG".

Não é de admirar que confunda Comando-Chefe e CTIG, que são duas entidades distintas: o Comando-Chefe, comandava os 3 Ramos das Forças Armadas: o CTIG era o Comandante do Exército; Comandante-Chefe do CTIG não só não existia, como não faz nenhum sentido.

Esclareço que na Missão do COP 5, não constava a "defesa a todo o custo", missão que, no limite, há que aguentar até ao último homem; se tal estivesse expressamente na minha Missão, não poderia ter decidido e efectuado a retirada.

No despacho do Comandante-Chefe, que manda instaurar auto de corpo de delito contra mim (pág.414 do meu livro), é referido que ordenei a retirada, "sem que para tal estivesse autorizado"; porque o Centro de Comunicações foi totalmente destruído, foi impossível solicitar autorização.

[Itálicos e negritos do autor]
(Continua)

[Revisão / fixação de texto / título: L.G]
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Notas de L.G.:

(*) 21 de Setembro de 2009  >  Guiné 63/74 - P4986: Parabéns a você (27): O veterano Coutinho e Lima, Cor Art Ref, Gadamael (1963/65), Bissau (1968/70), COP 5 (1972/73)

(**) Vd. poste de 3 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4634: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (13): A desonra da CCAV 8350 ou o direito a contar a minha versão... (Constantino Costa)