quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5337: Notas de leitura (36): Os Movimentos Independentistas, o Islão e o Poder Português de Francisco Proença Garcia (Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 29 de Outubro de 2009:

Malta,
Aqui estou a oferecer-vos mais uma lembrança antes de passar à clandestinidade para acabar um livro. O trabalho de Francisco Proença Garcia é de um rigor e isenção admiráveis. Recomendo-o aos entusiastas por estas incursões ao passado para compreender o presente. Sou hoje percebi porque é que o livro não está visível, só por encomenda à Comissão Portuguesa de História Militar (que funciona no Palácio da Independência).

Um abraço do
Mário


Guiné 1963 – 1974:
Os Movimentos Independentistas, o Islão e o Poder Português


PorBeja Santos

Francisco Proença Garcia é oficial do Exército Português e Mestre em Relações Internacionais da Universidade Portucalense. Como dissertação de mestrado, escolheu a Guiné, os movimentos independentistas, o Islão e o Poder Português, editado em 2000 pela Comissão Portuguesa de História Militar de colaboração com a Universidade Portucalense Infante D. Henrique.

Trata-se de uma obra de grande importância para todos nós. Começando por uma abordagem geral da presença portuguesa em África, com especial enfoque no século XIX, Proença Garcia sintetiza admiravelmente os principais marcos, caso da Conferência de Berlim, os acordos luso-franceses e a Questão do Casamansa, a intervenção da Sociedade das Nações e da Organização das Nações Unidas e progressiva ascensão do Terceiro Mundo à cena internacional, após Bandung. É nesse contexto do princípio da autodeterminação dos povos e no clima da Guerra Fria que se desencadeia a política anti-colonial da ONU, com sérios e imediatos reflexos na política portuguesa. O Autor apresenta as superpotências desenvolvidas e o seu protagonismo na questão colonial. Após esta apresentação, Proença Garcia revela-nos os movimentos independentistas guineenses, a saber: Movimento de Libertação da Guiné, Frente de Libertação e Independência Nacional da Guiné e o PAIGC. Por razões compreensíveis, a história do PAIGC é a mais desenvolvida e a sua inserção em diferentes instâncias à procura de reconhecimento internacional. Fica-se com um quadro claro de perda de influência de todos os concorrentes do PAIGC e quem apoiava este, desde o movimento comunista internacional até aos sindicatos norte-americanos, sociais-democracias nórdicas e o Conselho Mundial das Igrejas.

Perfilados os actores em prole da independência, o autor descreve o artificialismo das fronteiras, o peso das etnias, os graus de influência do Islão na região ao longo da História, e particularmente o relacionamento das comunidades muçulmanas da Guiné com o poder português e com a subversão. Fica-se com um retrato nítido das dificuldades encontradas pelo PAIGC com os Fulas e os Mandingas, são identificadas as confrarias religiosas e o papel desempenhado até à independência. De seguida, Proença Garcia avalia o comportamento da política portuguesa face à emergência dos movimentos independentistas e as tentativas de captação das populações para projectos socioeconómicos e culturais que barrassem o caminho à influência do PAIGC. É um capítulo de uma grande riqueza que o autor nos oferece e que, face à evolução brutal da guerra em desfavor das tropas portuguesas leva a negociações para a paz a partir das conversações de Spínola e Senghor e que culminam, na fase final, na reunião de Londres que ocorreu em 26 e 27 de Março entre um representante do governo português e uma delegação do PAIGC, e em que Marcelo Caetano propunha um cessar-fogo na Guiné, seguido de abertura de negociações formais para o reconhecimento da independência. A delegação do PAIGC mostrou reservas, pois queria incluir Cabo Verde nas negociações. Ficara agendada uma reunião para 5 de Maio, obviamente que não ocorreu com os acontecimentos do 25 de Abril.

Em suma, uma obra de inegável importância, indispensável para quem queira investigar o papel dos movimentos de libertação na Guiné, a influência do Islão e o seu relacionamento com as autoridades portuguesas e com o PAIGC, e como o Islão desempenha um papel de relevo na Guiné-Bissau, a despeito do descrédito ideológico marxista e das guerras pós-independência, no mesmo território.
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de de 24 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5331: Antropologia (15): Um dos maiores tesouros artíticos da Guiné: os Sônôs (Beja Santos)

Vd. último poste da série de 23 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5326: Notas de leitura (35): A Geração do Fim, memórias de um Curso de Infantaria de 1954 (Beja Santos)

1 comentário:

Torcato Mendonca disse...

Caríssimo:

Mostras o rebuçado, começas a desembrulhar e, quase pronto a ser comido, voltas a guardar...ora bolas.

Como é que um cidadão como eu tenho acesso ao livro?

A interioridade tem o verso e o reverso...

Abraço Mário B. Santos do Torcato