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sábado, 28 de setembro de 2024

Guiné 61/74 - P25989: O melhor de... A. Marques Lopes (1944-2024) (10): evacuado numa maca, no Dakota, para Lisboa, com mais 4 feridos graves, ao lado de umas senhoras de "altas patentes", que não nos nos ligaram puto...

 

Interior de um Douglas C-47 Skytrain ou Dakota. Imagem do domínio público. Cortesia de Wikimedia Commons.



1. Estamos a reproduzir alguns excertos do melhor que o A. Marques Lopes escreveu, nomeadamennte no seu livro de memórias "Cabra Cega" (*).

Seguimos o texto, respeitando a seleção que ele próprio fez na sua página do Facebook, na postagem de 9 de agosto de 2019.
  
Aqui a narrativa é já feita na 1ª pessoa do singular, assumindo o autor que o "Aiveca" do livro (edição de 2015) era o seu "alter ego", ou seja, o alferes Lopes (pp.  439-442).



Capa do livro "Cabra-cega: do seminário para a guerra colonial", de João Gaspar Carrasqueira (pseudónimo do nosso camarada A. Marques Lopes) (Lisboa, Chiado Editora, 2015,  582 pp. ISBN: 978-989-51-3510-3, Colecção: Bíos, Género: Biografia).



Evacuado numa maca, no Dakota, para Lisboa, com mais 4 feridos  graves, ao lado de umas senhoras de "altas patentes", que não nos nos ligaram puto... 
 

por A. Marques Lopes (1944-2024)


Três dias depois de ter chegado ao hospital  [HM 241, em Bissau ], passou pela minha cama um velho amigo e conhecido. Era o Herculano Carvalho, do mesmo pelotão que eu nos primeiros meses do COM.

− O que é que te aconteceu?  −  perguntou-me.

Expliquei-lhe que tinha ido ao ar com uma mina. O Herculano disse-me que estava ali porque tinham descoberto que era hemofílico e que no dia seguinte seria evacuado para a metrópole.

 E não descobriram isso logo quando foste para os comandos?

 − Parece que não sabes como é. Alguma vez os gajos se preocupam com isso? Lembras-te bem que, em Mafra, além da injeção cavalar, que diziam dar para todos os males, não se preocupavam em saber mais nada. Menos, é claro, em ver aqueles que tinham cunhas para os serviços auxiliares. Serves para o que queremos e toca a andar, era assim.

 
− É verdade, eu sei bem. Mas como é que descobriram isso agora?

−  Por acaso, foi sorte. Tive um pequeno ferimento aqui na perna durante uma operação  
− arregaçou um bocado a calça e mostrou a perna direita ligada.  − O enfermeiro viu que o sangue não estancava e topou logo.

A conversa derivou. Contei-lhe a história toda da mina e por onde andara e ele contou-me do Cantanhez onde acabara por ser ferido.

Ele foi no dia seguinte e eu foi no fim dessa semana evacuado para o HMP , para Lisboa.

Fui só com as calças e uma camisa, era o que tinha quando rebentara a mina. Nunca me lembrara quando estava a comprimidos mas ocorreu-me quando estava a entrar para o Dakota.

− Eu tinha uma mala…

 
− Não há mala nenhuma  −  disse-me um dos pilotos.

Estava a ver. O pessoal da companhia nunca mais lhe tinha ligado depois daquilo. Podia ter-lhes exigido que lhe mandassem a mala que tinha debaixo da cama lá do quarto. Eram coisas pessoais que lá estavam mas era sobretudo o livro da escola do PAIGC e a  Kalashnikov da professora que queria ter. Eram recordações minhas que iriam ser agarradas por um outro qualquer. Fiquei lixado.

Mais fiquei quando já estava dentro do avião. Iam também outros feridos. Os bancos que estavam à frente, logo após a cabina dos pilotos, foram ocupados por umas senhoras, não soube quem eram, mas os cinco feridos foram esticados em macas no corredor. Ainda disse que não estava assim tão mal e que podia ir sentado. Que não, disseram-me, tinha de ir numa maca. Quando o avião já estava alto,  comecei a deitar sangue pelos ouvidos, era o meu ferimento principal.

Ninguém me 
ligou, teve que se ir limpando com um lenço.

As mulheres cavaquearam durante a viagem. Por entre os roncos do avião uma dizia que o meu marido é isto, outra que o marido tinha feito aquilo, outra que o dela comandava o batalhão tal, uma loura gabava-se de o marido ser amigo do governador [gen Arnaldo Schulz].

Eu não ouvia quase nada, ia limpando o sangue que me pingava dos ouvidos. O que estava ao meu lado, o que tinha ficado sem uma perna numa armadilha, é que comentava o que elas diziam. Cada um deles também disse porque é que vinha ali. Esforcei-me por ouvi-los. Era o que tinha caído na armadilha, o que estava mais perto de mim, um que tinha apanhado uma roquetada e estava todo ligado, um que tinha apanhado bilharziose, um que tinha apanhado uma rajada que lhe fodera um pulmão e o quinto ia com uma hepatite aguda. No meio deles, vi que ainda era o que estava melhor.

Contavam o seu caso em voz alta mas as senhoras nunca viraram a cara, não se perturbaram. Aquele era outro mundo, estranho àquele das boas relações em que elas se moviam. Ainda pensei que lhes ficaria bem chegaram-se ao pé das macas para saber o que cada um tinha e desejarem melhoras. Mas nem isso, não se interessaram puto. Elas, senhoras das altas patentes, iam agora meter-se com a soldadesca... Nem pensar, até parecia mal ao seu estatuto.

Ao fim de cinco ou seis horas, não soube bem, não me deu para contar o tempo, chegámos ao aeroporto militar de Las Palmas. Foi o que disse um piloto, e que quem quisesse podia sair para descontrair.

– Empresta-me a tua perna 
  rosnou o que caíra na armadilha.

Deles só eu é que saí. As mulheres também, mas não soube para onde foram. Estava cheio de fome porque não lhes tinham dado nada, nem as queridas rações de combate. Vi vários militares e olhei para uma porta que me pareceu a entrada para um bar. Fui até lá e entrei.

Olharam para mim mas ninguém pareceu espantado, já deviam estar habituados a estas visitas. Pedi uma cerveja e uma sandes. Devorei-as, era a fome. No fim fiquei atrapalhado porque dei que não tinha dinheiro. Nem escudos, nem pesos da Guiné, muito menos pesetas. 

Baixei a cabeça e fui-me afastando devagar até à porta. Ninguém reparou em mim, pareceram distraídos. Já fora, zarpei o mais rápido que pude para o Dakota. Já esticado na maca e enquanto o avião arrancava para Lisboa, ainda pensava, na dúvida, se fora eu que tinha sido esperto ou se tinham sido eles que, compassivos, me deixaram sair sem me agarrarem para pagar.

Ao fim de não soube quantas horas chegámos a Figo Maduro. Os meus pais e a minha irmã, bem como familiares dos outros feridos, estavam lá à espera. Só lhes tinham dito que vinham evacuados, não como vinham. 

Expetativa geral, angústia nos olhares e corações de os poder ver sem pernas ou sem braços, cegos ou meio mortos. Foram lágrimas e abraços aos que conseguiam estar de pé, beijos e mais lágrimas para os que continuavam nas macas. Os meus ficaram contentes por me verem de pé. Durou pouco tempo o encontro porque nos meteram, quase logo, em ambulâncias em direcção à Estrela.

(Seleção, revisão / fixação de texto, título: LG)
______________

Nota do editor:

domingo, 16 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25647: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (129): Manuel Serôdio, eu fui o ferido mais grave da segunda armadilha, em 16 de julho de 1968, no decurso da Op Escudo Negro (CCAÇ 1787, CART 1660, CCAV 1749 e 5ª CCmds): estive um ano no hospital (Carlos Parente)





Guiné > CCAÇ 1787/BCAÇ 1932 (1967/69) > o ex-fur mil at inf, com a especialidade de minas e armadilhas, Manuel Seródio... Fotos do seu álbum. Sem legendas.

A CCAÇ 1787/BCAÇ 1932 foi mobilizada pelo RI 15, partiu para o TO da Guiné em 18/10/1967 e regressou a 21/8/1969. Passou sucessivamente por Bula, Bissau, Empada, Buba, Bissau, Quinhamel. Comandante: Cap Inf Marcelo Heitor Moreira. O BCAÇ 1932 esteve sediado em Bissau, Farim e Bigene (Comandante: ten cor inf Narsélio Fernandes Matias).

Fotos: © Manuel Serôdio (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Dispositivo das NT em 1 de janeiro de 1968. Fonte:
CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 6.º Volume - Aspectos da actividade operacional: Tomo II - Guiné - Livro II (1.ª edição, Lisboa, 2015), pág. 153. Sectores: L (Leste); O (Oeste); B (Bissau); S (Sul).



1. Comentário de Carlos Parente ao poste P10570 (*)

Caro camarada Manuel Serôdio,  o mundo é realmente muito pequeno (**):  através das novas tecnologias acabei por descobrir alguém que viveu de muito perto a situação terrível que marcou a minha vida, o ferido mais grave da dita armadilha era eu.

Lembra-se por certo que não foi possível a evacuaçâo pelo facto de ser noite,  digo-lhe que foi a noite mais terrível de minha vida. Pela manhã do dia 17,  vieram dois helis que tiveram realmente muita dificuldade em aterrar. Graças aos meus irmãos de armas conceguiram a minha evacuação, posso dizer que passei mais de um ano internado,  grande parte desse tempo entre a vida e a morte: mais de um mês em Bissau,  depois fui evacuado para Lisboa, passando mais de um ano aí.

Perdi parte do intestino,  do estômago, da bexiga,  o rim esquerdo,  os tendões da perna esquerda e sofri várias fraturas do pulso,  cotovelo e ombro esquerdo,  bacia e perna esquerda. Foi muito mal mesmo, mas com muito esforço e vontade de viver concegui dar a volta e ainda estou por cá.

Como eu gostava de o abraçar! Se por ventura chegar a ler este bocado de minha história,  deixo aqui meu email: carlos.a.parente@sapo.pt 

Sempre grato a todos os que me apoiaram.  Um abraço muito querido,  Carlos Parente.


2. Excertos da CECA (Comissão para o Estudo das Campnhas de África(:

Operação Escudo Negro - 15 a 18Jan68

Acção conjunta com a Força Aérea, nas regiões de Sarauol (golpe de mão), Ambum e a Leste de Mandingará (batida), 03(A).

Intervieram forças da CCaç 1787, CArt 1660, CCav 1749, 5ª CCmds com apoio de Artilharia.

(...) Foi accionada uma armadilha A/P, a sul de Mantém, sofrendo as NT 1 morto, 2 feridos graves e 5 ligeiros. Na mesma zona foram detectadas mais 2 armadilhas. Executado o bombardeamento de Sarauol pela FA, foi seguido de helitransporte da 5ª CCmds.

Batida a área do objectivo, constatou-se que o bombardeamento atingiu o acampamento, destruiu a enfermaria, causou a morte a 1 enfermeira e ferimentos num elemento da população, além de outras baixas que se estimam em número elevado em face dos
destroços humanos e dos rastos de sangue observados na área do objectivo e nas zonas próximas. 

Foi apreendida 1 pistola-metralhadora, 3 granadas de mão ofensivas, 8 carregadores, 343 cartuchos, peças de reserva e palamenta de armamento ligeiro, instrumentos cirúrgicos e material diverso.

Na manhã de dia 17, o lN flagelou as NT com armas ligeiras, fazendo, de seguida, um ataque com tentativa de envolvimento.

As NT reagiram e perseguiram o lN causando 1 morto e outras baixas prováveis. (...)
 

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 6.º Volume - Aspectos da actividade operacional: Tomo II - Guiné - Livro II (1.ª edição, Lisboa, 2015), pp. 152 e 154.


3. Excerto do poste P 10570, de Manuel Serôdio  (*)

Operação Escudo Negro:

 (...) Missão: 1) Destruir a base do Sará; 2) Patrulhar a região entre os rios Olom e Mansoa.; 3) Capturar ou aniquilar os elementos rebeles, destruindo instalações e meios de vida; 4) Pesquisar informações.

Em 15 de Janeiro (de 1968), pelas 10 horas, iniciou-se a operação, progredindo com grande rapidez por um trilho situado em mata fechada. 

Cerca das 15,30 horas, foi deflagrada uma armadilha por um elemento da coluna. Ferido aparentemente sem gravidade, veio o soldado nativo Ansumane, a falecer pouco depois, sem se ter conseguido ligação rádio a fim de o poder evacuar.

 [ 
Nota pessoal: o irmão do soldado falecido, que também fazia parte da coluna, recuperou as botas do irmão que eram novas, ( tinham-lhe sido oferecidas dias antes da operação) e calçou-as, já que as suas estavam em mau estado. Imagens simples e terríveis ao mesmo tempo. ]

A Companhia saíu do trilho, o que se revelou avisado, pois ao voltar ao mesmo para orientação, foram detetadas outras duas armadilhas. Quase ao anoitecer foi atingida uma clareira onde se resolveu passar a noite.

Depois de se ter reabastecido de água e quando, já de noite, o segundo grupo de combate procurava local para se instalar, foi deflagrada nova armadilha que causou dois feridos graves e quatro ligeiros. 

Entretanto foi conseguida ligação com Porto Gole a quem foi pedida evacuação dos feridos. Escolheu-se local para a mesma, montando-se a segurança. No local escolhido, os helicópteros não conseguiram poisar, pelo que foi tentado novo local, onde foi necessário abater algumas árvores.

Ao cansaço moral juntou-se o esgotante cansaço físico. Finalmente os helicópteros conseguiram aterrar, evacuando-se o morto e os feridos. (...)

4. Sobre o Manuel Serôdio:

(i) Manuel de Almeida Andrade Serôdio, natural de Oliveira de Azeméis, ex-fur mil  classe de 1966, n° 95998/65;

(ii) recenseado com o n°53 em 1964, e incorporado em 16/05/1966, tendo passado à disponibilidade em 29/09/1969;

(iii) em 16/05/1966 deu entrada no RI 5 em Caldas da Rainha para iniciar a recruta;

(iv) a 21/08/1966 entrou no CISMI em Tavira para começar o 2º ciclo do curso de Sargentos Milicianos (CMS) na especialidade de atirador de infantaria;

(v) pomovido a primeiro cabo miliciano em 28/11/1967 e colocado de seguida no RI 6;

(vi) nomeado para servir na Província da Guiné, foi destacado para Tancos afim de tirar a especialidade de minas e armadilhas;

(vii) para de seguida ser colocado no RI 15 em Tomar, fazendo parte do BCAÇ 1932, CCAÇ 1787;

(viii) enviado a seguir para Santa Margarida no final do gozo da licença, foi para Lisboa no dia 28/10/1967, de onde embarcou no mesmo dia no Uíge com destino à Guiné;

(ix) e aonde chegou a 2/11/1967;

(x) regressou à Metrópole a 23/08/1969,  no final da comissão;

(xi) vive (ou vivia em 2012) em França, desde 1970, em Rennes, capital da Bretanha. 

5. Comentário do editor LG:

Meu caro  Carlos Parente, camarada da Guiné!...

 Realmente o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca ...é Grande! (**)... Cabemos cá todos, e está cá quem se procura. Terás cá lugar, na tua qualidade de antigo combatente no CTIG, se me mandares duas fotos, uma antiga e outra mais ou menos atual, com mais duas ou três linhas de apresentação, a completar a tua mensagem acima. 

Diz-nos onde vives (será no estrangeiro, na diáspora lufófona ?), qual era o teu posto na tropa e na Guiné, a que subunidade pertenceste (seria a mesma do Serôdio, a CCAÇ 1787 ?)... 

Vamos receber-te de braços abertos, e para mais sabendo que, apesar da desgraça desse fatídico dia 16 de janeiro de 1968, estás vivo e acabas de encontrar um camarada teu, que estava por perto, um "teu irmão de armas". 

Vou-te dar o endereço de email do Manuel Serôdio, que vive em França, para o poderes contactar, com calma. Ele entrou para o nosso blogue em 2012 (***), não sei se continua a acompanhar-nos regularmente. Vou-lhe retransmitir o teu texto. Tem 14 referências no nosso blogue: podes ler aqui mais textos dele sobre a atividade operacional da CCAÇ 1787.

Aqui tratamo-nos todos, em geral,   por tu como antigos camaradas de armas que fomos (e que continuamos a ser). Manda um mensagem, com os elementos que te pedi,  para o meu endereço de email: luis.graca.prof@gmail.com.   

Saúde e longa vida. Luís Graça.

________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 25 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10570: Manuel Serôdio, ex-fur mil CCAÇ 1787 (Empada, Buba, Bissau, Quinhamel, 1967/68) (Parte III): De Porto Gole a Cutia: Op Escudo Negro: conseguimos entrar no 'santuário' de Sará / Sarauol


(**) Último poste da série > 20 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25089: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (128): O José Monteiro é o autor dos aerogramas que foram parar ao OLX (Mário Fitas, ex-fur mil, CCAÇ 763, "Os Lassas", Cufar, 1965/67)


(***) Vd. poste de 14 de setembro de  2012 > Guiné 63/74 - P10381: Tabanca Grande (360): Manuel Serôdio, mais um camarada da diáspora, ex-fur mil at inf, CCAÇ 1787/BCAÇ 1932 (Bula, Bissau, Empada, Buba, Quinhamel, 1967/68)


terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Guiné 61/74 - P22851: A nossa guerra em números (11): Pedro Marquês de Sousa estima um rácio de 10 feridos por cada morto... A Guiné teve, em números absolutos e relativos, mais feridos graves em combate e Angola por acidente


Guiné > Região de Bafatá  > Sector L1 > Bambadinca > CCAÇ 12 (1969/71) > A solidariedade dos combatentes... Dois soldados, guineenses, do 3º Grupo de Combate, do Alf Mil At Inf Abel Rodrigues, amparam o 1º Cabo Carlos Alberto Alves Galvão, metropolitano (vive hoje na Covilhã, estando reformado da Direcção Geral das Contribuições e Impostos), comandante da 1ª secção, o homem que cometeu a proeza de ter sido ferido duas vezes no decurso da mesma operação (Op Boga Destemida, 9 de Fevereiro de 1970).

"Slide" do Fur Mil At Inf Arlindo T. Roda, comandante da 2ª secção, que nesses dias (8 e 9 de Fevereiro de 1970) levou para o mato  a sua máquina fotográfica... (Não era vulgar levar-se uma máquina de fotografia, para o mato, em operações, numa região como esta em que a probabilidade de contacto com o IN era muito alta. Estou muito grato ao Roda, que já não vejo desde 1994, e que vive em Setúbal, por generosamente nos disponibilizar a sua fabulosa colecção de "slides", convertidos para o digital...)

Foto: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Escrevemos em poste anterior (P22847) (*):

Segundo Pedro Marquês de Sousa ("Os números da Guerra de África". Lisboa, Guerra & Paz Editores, 2021, pág. 144), dos cerca de 28 mil feridos graves evacuados durante a guerra (nos 3 teatros de operações), "resultaram cerca de 14 mil deficientes", dos quais "5120 com grau de deficiência superior a 60%"...

Além disso, desses 14324 feridos graves e deficientes, 1852 estão classificdos na categoria de "amputados" (12,9%), dos quais 480 em Angola, 540 na Guiné, 697 em Moçambique e 135 na instrução e serviço militar. 

Algumas centenas destes amputados deverão ter sido tratados e recuperados no Hospital Militar de Hamburgo, acrescentámos nós, ao longo da guerra.

Já agora vale a pena deixar aqui mais informação estatística sobre feridos e deficientes, militares, da guerra colonial / guerra do ultramar / guerra de África (1961/74) (**). Citando o Pedro Marquês de Sousa (que por sua vez se baseia nos historiógrafos Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes,  e estes em dados  da ADFA - Associação dos Deficientes das Forças Armadas), temos o seguinte quadro, adaptado por nós,  que dá muito para reflectir:

O número de feridos graves e deficientes distribuem-se assim pelas quatro situações (os três teatros de operações e a Instrução / Serviço Militar): 

  • Angola (31%)
  • Mocambique (23%)
  • Guiné (25%)
  • Instrução / Serviço Militar (21%)

Tendo em conta que a Guiné era um território muito mais pequeno (equivalene
te ao Alentejo), mobilizou menos efetivos que Angola e Moçambique,  e em que a guerra começou mais tarde (em relação a Angola), há indícios de que naquele teatro de operações terá havido, proporcionamente, mais amputados (29% do total), mais cegos e amblíopes (31%), mais casos de surdez (total, parcial e outras deficiências auditivas) (33%)... Estes dados terão que ser analisados com cuidado, precisávamos de saber a origem dos ferimentos graves e deficiências (em combate ou acidente).

Em 1973, por exemplo, o número de militares presentes nas 3 frentes era de cerca de 163 mil (mais exatamente, 162 996) (pág. 95), assim distribuidos pelos 3 teatros de operações 

  • Angola: 43,3 %
  • Guiné; 21,8 %
  • Moçambique: 34,9 %

2. O total de mortos, entre os combatentes portugueses,  é agora calculado em 10425 (pág. 97). 

Segundo a fonte que estamos a usar (Sousa, 2021), o total de feridos (dos três ramos das Forças Armadas) ascenderia a 117 mil, na sua grande maioria (96%) pertencentes ao Exército, e distribuindo-se do seguinte modo pelos 3 teatros de operações (pág. 142):

  • 41% em Angola
  • 29% na Guiné
  • 30% em Moçambique 

Um dado relevante apurado por Pedro Marquês de Sousa é o rácio de 10 feridos (hospitalizados)  por cada morto. Grosso modo, tivemos mais de 100 mil feridos (hospitalizados), nos 3 ramos das Forças Armadas (pág. 142). (Por "hospitalizados" entende-se entradas de feridos nos hospitais e enfermarias dos setores.)

Num outro quadro publicado na pág 143, e adaptado por nós, mostra-se a distribuição em números absolutos e relativos dos feridos graves em combate e feridos graves por acidente nos 3 teatros de operações.


Num total de 31,3 mil feridos graves, mais de metade foi em combate (N=16200), dos quais 44,5 % ocorridos no TO da Guiné. Angola teve mais feridos por acidente (43,7% mum total de 15100).

Para uma análise mais detalhada destes  (e doutros dados) recomendamos o livro do tenente-coronel, doutorado em História, Pedro Marquês de Sousa.

________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 26 de dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22847: Memória dos lugares (434): Hospital Militar de Hamburgo, onde estiveram internados, para tratamento e reabilitação, camaradas nossos deficientes como o Quebá Soncó (CCAÇ 1439) e o António Dias das Neves (CCAV 2486): não se sabe quantos, mas devem ter sido algumas centenas de um total de mais de 1800 "amputados", entre 1964 e 1974

(**) Último poste da série > 12 de dezembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22803: A nossa guerra em números (10): o Movimento Nacional Feminino tinha um orçamento ordinário de 10 mil contos (cerca de 2 milhões de euros, a preços de hoje) e uma gestão pouco profissionalizada, retirando-lhe credibilidade e apoios da sociedade civil

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Guiné 61/74 - P19216: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (São Domingos e Nova Lamego, 1967/69) - Parte LII: Fez ontem 50 anos que o meu cmtd de batalhão, ten cor Armando Vasco de Campos Saraiva, foi gravemente ferido em combate, sendo evacuado para a metrópole... A minha homenagem à sua memória,


Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3

Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69)

Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem enviado pelo Virgílio Teixeira:


Assunto - Tema 204 - Homenagem dos 50 anos sobre a perda do nosso comandante de batalhão

Data - sábado, 17/11, 16:02


Luís, o tema já percebeste, já o tinha enviado, mas dei agora uns retoques, apaga o outro que enviei em Setembro, e fica este.

No dia 20/11/2018, Terça Feira, faz 50 anos sobre o trágico acontecimento da perda do meu comandante de batalhão. Gostaria nesse dia lhe prestar a minha homenagem, no nosso Blogue, pois ele foi um dos nossos grandes guerreiros, e por isso foi gravemente ferido e acabou a sua carreira, ainda tão novo.

Não que eu tenha um grande sentimento por ele, pelos menos não tinha nessa época, eu achava que andava a ser sempre perseguido por ele, não tivemos relação fácil, como aliás não tinha com quase ninguém.

Soube há uns 5 anos atrás, que ele tinha confidenciado, ainda antes de ser ferido em combate, que tencionava dar-me um louvor, pois achava que eu merecia, comparado com tantos outros que nada fizeram e depois foram louvados por nada. Mas não teve tempo, infelizmente para ele.
Obrigado pela tua compreensão, mas sou assim, um eterno revoltado/ sentimentalista.

Abraço, Virgilio Teixeira


Virgílio Teixeira, natural do Porto,
a viver em Vila do Conde
2. Continuação da publicação do álbum fotográfico do nosso camarada Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) (*)


CTIG - Guiné 1967/69 - Álbum de Temas: 

T204 – A EVACUAÇÃO DO COMANDANTE
DO BATALHÃO DE CAÇADORES 1933

HOMENAGEM, APÓS 50 ANOS DO FUNESTO ACONTECIMENTO



I - Anotações e Introdução ao tema:


Este tema refere-se ao acontecimento de uma acção de combate, entre as NT e o IN, a pouco mais de 1000 metros do fim da pista.

Um Gr Comb, composto por elementos da CCS do BC1933, da CART1744, e do Pelotão de Nativos, o qual estava a ser comandado pelo próprio Comandante de Batalhão, Tenente Coronel Armando Vasco de Campos Saraiva, e outros oficiais, sargentos e praças, teria como missão interceptar um grupo do IN, que se deslocava ali nas imediações do Quartel.

A pouco mais de 1000 metros do fundo da pista, isto é,  a 2000 metros do Posto do Comando, acontece o imprevisto, rebentamento de minas A/P,  seguido de uma emboscada e forte tiroteio de um lado e de outro.

Acontece o imprevisível, o Comandante ele próprio pisa uma mina que lhe rebenta debaixo dele, depois outras minas explodem e gera-se a confusão total.

Não sei se outro oficial desta patente teve um fim trágico como este, mas não tenho conhecimento de mais nenhum.  O Comandante ficou com ambas as pernas ao dependuro, presas apenas pela pele e pouco mais, e foi gravemente fulminado nas zonas genitais com estilhaços de minas, cujos efeitos nunca vim a saber, apesar de ele ter sobrevivido ainda mais de 25 anos.

No combate, são ainda feridos com alguma gravidade o Capitão Serrão, da CART1744, o Alferes Miliciano Machado, da CCS /BCAÇ1933, do Pelotão de Minas e Armadilhas, e outros militares, alguns Furriéis e praças, a maioria voltou ao seu posto de trabalho, depois de tratados no HMR 241.

Na sequência deste acontecimento, o comando do sector ficou sem o seu comandante, passando a ser substituído pelo 2º comandante, até inícios de Janeiro de 1969. [Terá falecido por volta de 2006, segundo informação do camarada José Espadana, que pertencia o BCAÇ 1933 e estava em São Domingos nessa altura.]

II – As Legendas das fotos:

Estas fotos já fazem parte de outros Temas mais alargados com mais de 100 fotos, sobre a aviação, e não só.

Gostaria que fossem Postadas estas imagens e comentário deste acontecimento, para que se faça um pouco o debate desta tragédia para o meu batalhão, que para mim próprio, foram as mais marcantes em toda a minha estadia naquele TO do CTIG.

Fica ao critério do editor, achar ou não relevantes, não farei nenhum juízo de valor.


F01 - O Heli, Alouette III, no momento em que carregou o Comandante do Batalhão, ferido em combate, com destino ao HM241 em Bissau, depois evacuado para o Hospital Militar Principal em Lisboa.

Dia fatídico, o corpo estava deitado numa maca, nu (em cuecas, furadas com estilhaços) os pés ao dependuro, e naquele momento tive ganas de tirar a foto, mas por razões de ética militar, respeito, vergonha ou por qualquer outra razão que não me ocorre, não o fiz, não sei se foi bom ou mau. Mas hoje gostaria de as ter.

Preferi sair do local e tirar a foto com ‘o ambiente’ envolvente de consternação total entre todos os presentes, militares, civis, população indígena, administrador de posto.  Vê-se muita população local com especial predominância os Felupes, que estavam sempre do nosso lado, e eram sempre bem tratadas pelo nosso comandante.  As Nossas Tropas estão no outro lado do Heli, a fazer a segurança.

Foto captada na pista de São Domingos no dia 20 de Novembro de 1968.

F02 – Novo Heli Alouette III, numa das viagens a SD, descarregando material, correio e outras coisas não especificadas.

Não é na mesma data, talvez não seja o mesmo Heli, mas o local é o mesmo a quando da evacuação do comandante. A ideia é mostrar não só o aparelho, que só por si vale a pena, mas também mostrar a pista de aterragem, já limpa de mato, em finais de 1968, após o tempo das chuvas, por isso muito arranjada.

Foto captada em São Domingos, em finais do ano de 1968.

F03 – No Posto de Vigia da pista de São Domingos, num dia em que estava de Oficial de Dia, passando a ‘ronda’ aos locais marcados.

O olhar pensativo, meditando, por que razão estava eu ali, a proteger-me do calor que nos sufocava, naquela pequena localidade na fronteira com o Senegal.

Esta foto tem por objectivo mostrar o local onde o Heli parou para transportar o comandante, ao fundo acaba a pista de São Domingos, e a menos de 1000 metros dá-se o ataque, as minas os feridos e evacuados. Ali tão perto. Fazia tantas vezes este percurso pela pista, nas GMC com os meus amigos e fiéis condutores para me ensinarem a conduzir, nos picos do calor, entre as 12 e 16, quando estava o resto do pessoal a fazer a sesta de descanso. Nunca imaginei que o perigo estava ali tão perto.

Foto captada em São Domingos, nos inícios de Janeiro de 1969


NOTA FINAL DO AUTOR:

#As legendas das fotos em cada um dos Temas dos meus álbuns, não são factos cientificamente históricos, por isso podem conter inexactidões, omissões e erros, até grosseiros. Podem ocorrer datas não coincidentes com cada foto, motivos descritos não exactos, locais indicados diferentes do real, acontecimentos e factos não totalmente certos, e outros lapsos não premeditados. Os relatos estão a ser feitos, 50 anos depois dos acontecimentos, com material esquecido no baú das memórias passadas, e o autor baseia-se essencialmente na sua ainda razoável capacidade de memória, em especial a memória visual, mas também com recurso a outras ajudas como a História da Unidade do seu Batalhão, e demais documentos escritos em seu poder. Estas fotos são legendadas de acordo com aquilo que sei, ou julgo que sei, daquilo que presenciei com os meus olhos, e as minhas opiniões, longe de serem ‘Juízos de Valor’ são o meu olhar sobre os acontecimentos, e a forma peculiar de me exprimir.#

«Propriedade, Autoria, Reserva e Direitos, de Virgílio Teixeira, Ex-alferes Miliciano do SAM – Chefe do Conselho Administrativo do BATCAÇ1933/RI15/Tomar, Guiné 67/69, Nova Lamego, Bissau e São Domingos, de 21SET67 a 04AGO69».


Em, 2018-09-27

Virgílio Teixeira

Legendas actualizadas hoje,

Em, 2018-11-17,

Virgílio Teixeira

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Nota do editor:

Último poste da série > 16 de novembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19201: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (São Domingos e Nova Lamego, 1967/69) - Parte LI: Sentado à sombra do grande poilão...

sábado, 16 de março de 2013

Guiné 63/74 - P11260: Álbum fotográfico do Jorge Canhão (ex-fur mil inf, 3ª CCAÇ / BCAÇ 4612/72, Mansoa e Gadamael, 1972/74) (6): Vítimas da emboscada na estrada de Farim-Mansabá-Mansoa, em 15 de julho de 1973: 1 morto, 8 feridos graves, 2 viaturas danificadas




  1. Foto s/ nº >Chegada a Mansoa dos mortos na emboscada à coluna de Farim (1)


Foto s/ nº >Chegada a Mansoa dos mortos na emboscada à coluna de Farim (2)



Foto s/ nº > Evacuação dos feridos da emboscada à coluna de Farim (1)



Foto s/ nº - Evacuação dos feridos da emboscada à coluna de Farim (2)



Foto s/ nº - Constantino_Veira_da_Rocha,. sold cond auto, da 3ª CCAC/BCAÇ 4612 (1972/74), subindo para a sua Berliet


Guiné > Região do Oio > Mansoa > 1972/1974 > BCAÇ 4612 (1972/74) > Imagens da chegada de mortes e feridas, na sequência a uma emboscada a um coluna de reabstecimento, na estrada   de Mansoa-Farim, possivelmente em 15 de julho de 1973.


Fotos: © Jorge Canhão (2011). Todos os direitos reservados


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do nosso amigo e camarada Jorge Canhão, que vive em Oeiras (ex-Fur Mil At Inf da 3ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, Mansoa e Gadamael, 1972/74).

Estas fotos, relativas a Mansoa, chegaram-nos às mãos através de outro grã-tabanqueiro, o Agostinho Gaspar, ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74), residente em Leiria. Os nossos especiais agradecimentos aos dois, e muito em especial ao nosso camarada Jorge Canhão-

Não sabemos quem é o autor (ou quem são aos autores) das fotos,,, Estas fotos constam de um CD, do Agostinho Gaspar, estão sob um ficheiro com a seguinte designação: Jorge Canhão > Vários Batalhão. Também não sabemos a que emboscada se referem. Sabemos, pela história da unidade, que houve uma violenta emboscada no dia 15/7/1973, na estrada Farim-Mansoa, no troço entre Mansabá e Mansoa...Mas nessa ocasião houve 1 morto (e não mortos) e 8 feridos graves, conforme se pode ler na HU- Cap II / Fasc VIII, pág. 60:

- (...) Às l5 de julho de 1973,  às 13h30 na região de Mansoa  8HO.65, um grupo IN estimado em 60 elementos emboscou no regresso a coluna de reabastecimento a Farim, com armas automáticas, RPG-2, Mort 60 e Granadas de Mão.

O IN iniciou a emboscada com uma granada de mão. A emboscada estava montada do lado direito da estrada Mansabá/Mansoa com um pequeno grupo IN  no lado esquerdo. As NT sofreram 1 morto (Fur Mil), 8 feridos graves (1 Oficial e 7 Praças). 2 viaturas ficaram danificadas (1 Berliet que ardeu; e Unimog 404).

O IN deixou no terreno 1 morto, fardado de amarelo e armado de LGF RPG-2, vários rastos de sangue, 2 Minas A/P PMD-6 e 2 granadas de  RPG-2. Retirou na direcção do Morés,  sendo executado tiro de artilharia sobre o itinerário de retirada. (...) 


Talvez o Jorge Canhão nos possa esclarecer a que data se referem estas fotos. Nas colunas a Farim houve diversas emboscadas de que resultaram baixas. A do 15 de julho de 1973 pareceu-me a mais grave, a avaliar pelo nº de baixas das NT e das viaturas atingidas.
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Nota do editor:

Últmo poste da série > 9 de março de 2013 > Guiné 63/74 - P11222: Álbum fotográfico do Jorge Canhão (ex-fur mil inf, 3ª CCAÇ / BCAÇ 4612/72, Mansoa e Gadamael, 1972/74) (5): Balantas, mandingas e mansoancas

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Guiné 63/74 - P10706: Memória dos lugares (195): Alcoitão, o CMRA - Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, inaugurado em 1966, para dar resposta aos grandes incapacitados da guerra colonial



Antigo sítio institucional da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, hoje alojado aqui.


O CRMA está localizado em Alcoitão, uma localidade, no eixo Estoril/Sintra/Cascais. Dista a 4 Kms do Estoril, a 6 Kms de Cascais e cerca de 7 Kms de Sintra. Está servida de transportes públicos rodoviários a partir do Estoril, Cascais e Sintra. A Auto-estrada A5, com saída no Estoril ou Alcabideche, coloca o CMR a 20 minutos de Lisboa. Contactos: Morada: CMRA – Rua Conde Barão – Alcoitão 2649-506,  Alcabideche / Tel.: 21 460 83 00

1. Com a devida vénia transcrevemos, da antiga página da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, o seguinte apontamento sobre o Centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão (CMRA) (Realce nosso, a amarelo). Solicitamos fotos, testemunhos e outros documentos a quem teve  o azar (e a sorte) de por lá passar no decurso da guerra colonial (, de 1966 a 1975). Infelizmente não temos (ainda) dados históricos sobre o movimento assistencial do CMRA aos deficientes das Forças Armadas... Quantos dos nossos camarados terão por lá passado ? E pelo hospital de Hamburgo ?

CMRA > História 

Em 1956, sendo Provedor o Dr. José Guilherme de Melo e Castro, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) decidiu dar início à construção de um Centro de Reabilitação.

O contexto social e político nacional ditou a criação de um centro com estas características, sendo a principal motivação dar resposta às necessidades dos lesionados da Guerra do Ultramar.

O autor do projecto foi o Arquitecto José Maria Ferreira da Cunha.

De referir ainda a colaboração do Escultor Martins Correia, autor da escultura que embeleza o jardim e cuja imagem foi escolhida para logótipo da instituição. Todas as despesas foram suportadas pelas verbas provenientes dos lucros do Totobola (então principal jogo social da SCML).

Em 2 de Julho de 1966, o Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão (CMRA) foi solenemente inaugurado com a presença do Presidente da República, Almirante Américo Tomás, definindo dois objectivos principais: (i) ba reabilitação de pessoas com incapacidade motora; e (ii) a formação de pessoal especializado.

A preparação de pessoal, compreendeu cursos segundo programas de nível internacional e teve substancial cooperação de entidades internacionais, particularmente do World Rehabilitation Fund. Os cursos funcionaram de Janeiro de 1957 a Outubro de 1965 em colaboração com as Casas de S. Vicente de Paulo, em Lisboa, tendo sido formadas 47 alunas nas áreas de enfermagem, fisioterapia e ortoprotesia, entre outras.

À data da sua criação este Centro foi desde logo aclamado como uma das melhores instituições na área da medicina de reabilitação no mundo.

Nas últimas três décadas tem-se assistido a uma adaptação da estrutura organizacional, de forma a ir acompanhando as necessidades dos profissionais e dos destinatários. Disto são exemplos paradigmáticos os cuidados de reabilitação prestados a doentes com Acidentes Vasculares Cerebrais, com Sequelas de Politraumatismos e com Traumatismos Craneo-encefálico graves.

Empenho na diferenciação técnica e científica dos profissionais

Modernização das instalações e do equipamento de diagnóstico e terapêutica

Tem-se verificado igualmente um crescente empenho na diferenciação técnica e científica dos profissionais e assistido à modernização das instalações e do equipamento de diagnóstico e terapêutica, mantendo elevados padrões de qualidade, inovação e excelência.

Actualização contínua dos equipamentos e tecnologias

É na associação de uma política de actualização contínua dos equipamentos e tecnologias, com a constante promoção do desenvolvimento científico, profissional e humano dos seus colaboradores que o CMRA dá substância à sua assinatura de marca "Excelência em Reabilitação", e assim se mantém uma referência desde a sua fundação.

domingo, 16 de outubro de 2011

Guiné 63/74 - P8914: Álbum fotográfico de Antóno Dias das Neves: a parte final, germânica, de um doloroso calvário... A reabilitação no Hospital Militar de Hamburgo (Marisa Neves)

Alemanha Ocidental > Hospital de Hamburgo > Possivelmente, em 1972 > "O meu Pai é o que está na cadeira de rodas com o prato na mão. Esteve lá 8 meses. Antes passou pelo anexo de Campolide, em Lisboa, onde fez 18 operações" (MN).
Alemanha Ocidental > Hospital de Hamburgo > Possivelmente, em 1972 > "O meu pai é o que vêm com duas canadianas de camisola branca" (MN)


Alemanha Ocidental > Hospital de Hamburgo > Possivelmente, em 1972 > "O meu pai é o que esta de frente camisola acastanhada" (MN)


Alemanha Ocidental > Hospital de Hamburgo > Possivelmente, em 1972 > "O meu pai é o que está no  lado direito, de camisola acastanhada, sentado na cadeira de rodas"

Alemanha Ocidental > Hospital de Hamburgo > Possivelmente, em 1972 > "O meu pai é o de camisola castanha, sentado na cadeira de rodas" (MN)


Alemanha Ocidental > Hospital de Hamburgo > Possivelmente, em 1972 > "Pai sentado na cadeira de rodas" (MN)

Alemanha Ocidental > Hospital de Hamburgo > Possivelmente, em 1972 >

"O meu pai é o mais baixinho" (MN)...

Fotos (e legendas):  © Marisa Neves (2011) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


Antiga Alemanha Ocidental > Hamburgo > Hospital de Hamburgo >  Álbum fotográfico de António Dias das Neves (1947-2001) (*) > Depois de ter ficado sem as duas pernas, devido ao acionamento de uma mina A/P, a norte de Bula, no decurso da tão mediatizada Op Ostra Amarga, 18 de Outubro de 1969, o sold at cav António Dias das Neves, da CCAV 2486/BCAV 2868 (1969/70), foi evacuado para a metrópole, longe dos holofotes da televisão e do voyeurismo dos jornalistas franceses... 

Sabemos que passou esteve no Hospital Militar da Estrela, anexo de Campolide, possivelmente mais de dois anos (desde finais de 1969). Não sabemos se passou pelo Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, inaugurado em 1966....No prestigiado Hospital de  Hamburgo, na Alemanha (, hospital que pertence à Universidade de Saarland),  recebeu, com sucesso, duas próteses que lhe permitiram refazer a sua vida como civil... na sua terra natal, Ramada, Odivelas. 

"O meu pai fez bastantes amigos durante os 8 meses que esteve em recuperação no hospital de Hamburgo. Sei que fartou-se de passear, pois tenho alguns postais de vários sítios da Alemanha que o meu pai mandava para a minha avó", escreve-nos a sua filha Marisa.

"Sei também que o meu pai foi um caso de sucesso na adptação das próteses, sei que fizeram bastantes arquivos documentados para próximos doentes". 

"As pessoas que acompanham o meu pai nas fotos, infelizmente não sei quem são, só ele poderia dizer ou a minha avozita que infelizmente faz agora dia 6 de Novembro um ano que me deixou. O meu pai sempre foi um homem de coragem e de orgulho".

Em 1979 nasceu a sua primeira filha, Marisa Neves, hoje com 31 anos. Estas fotos, recebidas originalmente sem legenda, documentam a parte final, germânica,  do seu calvário da Guiné... 


Sobre a hospitalização do seu pai, a Marisa disse-nos o seguinte: "Em relação aos hospitais,  infelizmente não sei datas concretas, acho que ele foi, primeiro,  para Bissau  e depois veio para Portugal. A seguir foi transferido para Alemanha. Sei que esteve algum tempo na Alemanha em tratamentos e recuperação para adaptação das próteses". E, ao que parece, adaptou-se bem, do ponto de vista funcional,  às suas novas pernas artificiais, segundo o testemunho da filha.

Há um ponto que gostaríamos de esclarecer com a Marisa. Diz ela que, de acordo com a caderneta militar, o pai foi "evacuado para o HMP em 6/11/71" (?)... "por despacho de 30/12/70 de sua Excia o Secretário do Estado do Exército"... Admitamos que é um erro de transcrição, dela ou do burocrata do exército... Não é crível  que tenha ficado mais de dois anos no HM 241, em Bissau (contando o período que medeia entre a data dos ferimentos em combate, 18/10/1969, e a alegada mas improvável data de evacuação para o HMP, 6/11/71)...  Até por que no tempo de contagem da comissão de serviço militar no TO da Guiné, não aparece mencionado, na caderneta, o ano de 1971...

De qualquer modo, o que importa é sublinhar a novidade destas fotos: julgo que é a primeira vez, em oito anos, que aqui se fala, no nosso blogue, de camaradas nossos, feridos na guerra de África, que foram beneficiários do programa de reabilitação do Hospital de Hamburgo... E isso fica aqui documentado. Não sabemos quantos por lá passaram, por causa das próteses... O mesmo se passa com o CMRA - Centro de Medicina de Reabilitação (**)... Não sei se a ADFA - Associação dos Deficientes das Forças Armadas tem informação informação estatística, ou dados históricos,  adicionais, com referência a este doloroso dossiê...  

À Marisa, mais uma vez, o nosso profundo reconhecimento por querer partilhar, connosco, com os camaradas do seu pai, este cantinho da sua intimidade, o álbum fotográfico do seu querido pai e seu grande herói... LG

[ Seleção e edição das fotos: L.G.]


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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 15 de Outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8910: In Memoriam (94): António Dias das Neves (1947-2001), Sold At Cav, CCAV 2486 (Bula, 1969/70), "o meu herói" (Marisa Neves)

(**) Apontamento histórico sobre o Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, sito no concelho de Cascais:

(...) "Em 1956, sendo Provedor o Dr. José Guilherme de Melo e Castro, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) decidiu dar início à construção de um Centro de Reabilitação. O contexto social e político nacional ditou a criação de um centro com estas características, sendo a principal motivação dar resposta às necessidades dos lesionados da Guerra do Ultramar.

 
"O autor do projecto foi o Arquitecto José Maria Ferreira da Cunha. De referir ainda a colaboração do Escultor Martins Correia, autor da escultura que embeleza o jardim e cuja imagem foi escolhida para logótipo da instituição [, foto à esquerda]. Todas as despesas foram suportadas pelas verbas provenientes dos lucros do Totobola (então principal jogo social da SCML).
 
"Em 2 de Julho de 1966, o Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão (CMRA) foi solenemente inaugurado com a presença do Presidente da República, Almirante Américo Tomás, definindo dois objectivos principais: a reabilitação de pessoas com incapacidade motora e a formação de pessoal especializado.

"A preparação de pessoal, compreendeu cursos segundo programas de nível internacional e teve substancial cooperação de entidades internacionais, particularmente do World Rehabilitation Fund. Os cursos funcionaram de Janeiro de 1957 a Outubro de 1965 em colaboração com as Casas de S. Vicente de Paulo, em Lisboa, tendo sido formadas 47 alunas nas áreas de enfermagem, fisioterapia e ortoprotesia, entre outras. 

À data da sua criação este Centro foi desde logo aclamado como uma das melhores instituições na área da medicina de reabilitação no mundo. Nas últimas três décadas tem-se assistido a uma adaptação da estrutura organizacional, de forma a ir acompanhando as necessidades dos profissionais e dos destinatários. Disto são exemplos paradigmáticos os cuidados de reabilitação prestados a doentes com Acidentes Vasculares Cerebrais, com Sequelas de Politraumatismos e com Traumatismos Craneo-encefálico graves." (...) (Fonte: CMRA)

Do portal da A25A, Guerra Colonial, reproduzimos com a devida vénia a seguinte entrada sobre Feridos:


Feridos

(...) "Os feridos eram habitualmente evacuados de helicóptero ou de viatura para a unidade do serviço de saúde mais perto, um posto de socorros ou uma enfermaria de sector, onde recebiam os primeiros tratamentos. Neste primeiro nível pretendia-se, antes de mais, manter o ferido vivo e em condições de ser tratado num hospital, se fosse caso disso.

"O sistema de evacuação sanitário passava depois pelos hospitais militares existentes em cada um dos teatros[, HM 241, em Bissau, no caso do TO da Guiné,] e podia terminar no Hospital Militar Principal, em Lisboa. Os feridos com necessidade de tratamentos de recuperação eram, posteriormente, transferidos para o Centro [de Medicina] de Recuperação do Alcoitão ou para o Hospital de Hamburgo, ao abrigo do acordo estabelecido entre Portugal e a Alemanha no âmbito das facilidades concedidas pelo uso da Base Aérea de Beja".(...)

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7813: Blogues da nossa blogosfera (42): Coisas da Guiné, de A. Marques Lopes



Coisas da Guiné, o blogue do nosso camarigo A. Marques Lopes (*)... Desde Setembro de 2010. Já lá vão cerca de 70 postes.  O que se pode ver e ler ?  "É conforme me vou lembrando, e vou também pescando algumas coisas minhas que já publiquei ou que outros publicaram em blogues existentes" (incluindo o nosso, Luís Graça & Camaradas da Guiné)... 

Recorde-se que o   A. Marques Lopes, ex- Alf Mil At Inf, CART 1690 (Geba) / CCAÇ 3 (Barro) (1967/69)  tem uma vasta colaboração no nosso blogue, e em especial na I Série (entre Maio de 2005 e Maio de 2005). A actividade operacional das subunidades por onde ele andou (CART 1690 e CCAÇ 3) está aqui bem documentada, em texto e fotografia.


O A. Marques Lopes tem alguns dos melhores postes publicados no nosso blogue... De entre todos quero, mais uma vez,  destacar a história da professora de Samba Culô, morta por ele num ataque à aldeia sob controlo do PAIGC...  Foi uma história que o atormentou durante anos, até pelo menos a 2005, ano que voltou (de novo) à Guiné e a Samba Culo, tendo aí feito as pazes (o luto ou a catarse) consigo próprio e com a memória da guerrilheira abatida (**)...

Vou (re)negociar com o António a publicação, aqui, de uma ou outra das suas novas histórias. Para já, e para "abrir o apetite", tomo a liberdade de publicar a seguir um excerto do poste onde ele conta a sua viagem, em Dakota, de evacuação para o Hospital Militar Principal, ma sequência de graves ferimentos em combate (em 21 de Agosto de 1967, apenas 4 meses depois de ter chegado ao TO da Guiné):

Quinta-feira, 23 de Dezembro de 2010 > 29-Como fui evacuado 


(...) A 21AGO67, fui ferido por uma mina no caminho de SARE BANDA  [, link quebrado,] para BANJARA (A mina da minha vida) [, link quebrado]. Estive uma semana no Hospital de Bissau (HM241) e daí saí para a Base Aérea para ser evacuado para a Metrópole. Foi num Dakota C47.




Fui só com as calças e uma camisa. Foram também outros feridos que entraram no avião. Os bancos que vêem na gravura foram ocupados por uma senhoras, não sei quem eram, nós os feridos, uns cinco ou seis, fomos esticados numas macas no corredor. Ainda disse que não estava assim tão mal e que podia ir numa cadeira. Mas que não, que devia ir numa maca. Lá fui, e quando o avião já estava alto comecei a deitar sangue pelos ouvidos (era o meu ferimento principal), por causa da descompressão. Ninguém ligou mas eu tratei de mim. 

Ao fim de cinco ou seis horas, não sei bem, chegámos ao aeroporto militar de Las Palmas [, nas Canárias,], disseram-nos. Que quem quisesse podia sair para descontrair. Saí e estava cheio de fome, não nos tinham dado nada para comer, nem as "queridas" rações de combate. Vi vários militares e olhei para uma porta que me pareceu a entrada de um bar. Fui até lá e entrei.

Olharam para mim, mas ninguém pareceu espantado, já deviam estar habituados a estas visitas. Pedi uma cerveja e uma sandes. Devorei-as, era a fome. No fim fiquei atrapalhado porque vi que não tinha dinheiro. Nem escudos, nem pesos, muito menos pesetas. Baixei a cabeça e fui-me afastando do balcão até à porta. Ninguém olhou para mim, pareceram-me distraídos. Zarpei para o dakota e estiquei-me na minha maca. Passados tempos o avião arrancou até Lisboa. Ainda agora não sei se fui eu que fui esperto ou se foram eles que me deixaram ir sem me agarrarem para pagar.

Depois de quatro ou cinco, ou cinco ou seis horas, não sei, chegámos ao Figo Maduro. Estava lá os meus pais e a minha irmã, tinham-lhes dito que eu fora ferido e vinha. Choraram e ficaram contentes por me ver de pé. Foi pouco tempo, porque me meteram numa ambulância para ir para a Estrela, o HMP. (...)


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Notas de L.G.:

(**) Vd. postes de: 

29 Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXX: A professora de Samba Culo (A. Marques Lopes) 

(...) "Tenho de partir, de voltar a Portugal. Gostei muito de falar contigo, tinha mesmo necessidade de o fazer, já que, naquele dia em que nos encontrámos pela primeira vez, só eu te disse “firma lá!” e tu não me disseste nada. Percebo que nem me quizesses ouvir... E nunca mais dormi descansado até agora. (...)

"Quero pedir-te uma última coisa, que desculpes aquele meu soldado que tentou violar-te quando estavas agonizante. Conseguiste ver ainda que não o deixei fazer isso. Perdoa-lhe, era bom rapaz, um camponês minhoto que para aqui foi lançado e, sabes, é fácil perder a cabeça numa guerra de inimigos fabricados. Talvez o encontres por aí, o teu camarada Gazela matou-o em Jobel e o corpo dele por cá ficou. Deve andar, como tu, no meio desta floresta do Oio. Fala com ele agora". (...)
7 de Junho de 2005 > Guiné 69/71 - XLIX: Samba Culo II (A. Marques Lopes)

" (...) o que mais me impressionou nesta operação foi o seguinte: Samba Culo tinha uma escola; quando lá chegámos, vi escrito no quadro preto, em perfeito português: "Um vaso de flores". Tinha desenhado, a giz, por baixo, um vaso de flores.

"E o que nunca mais esquecerei na minha vida: quando atacámos a base, uma jovem dos seus 18 anos ficou com a barriga aberta por uma rajada de G3. E mais (coisas terríveis desta guerra!): o Bigodes, o Armindo F. Paulino (que foi, depois, feito 
prisioneiro pelo PAIGC e que acabou por morrer em Conakri), quis saltar para cima dela. Tive que lhe bater. Esta é uma situação que nunca me sai do pensamento... e da minha consciência.

"Tinham muitos livros em português, que era o que estavam a ensinar aos alunos (miúdos ou graúdos?). Trouxemos também (imaginem!) uns paramentos completos de um padre católico! Lembranças que se me pegaram para toda a vida" (...).