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quarta-feira, 8 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25494: Estórias do Zé Teixeira (63): O “Diário” do José Cuidado da Silva (Conclusão) (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381)


Segunda e última parte do "Diário" do José Cuidado da Silva, chegado até nós através do nosso camarada José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381[1]

Buba, 22 de julho de 1968

Neste dia saímos do quartel às seis da manhã, e fomos emboscar na estrada de Buba para Aldeia Formosa para passar a coluna vinda de Aldeia. Neste dia estivemos sem comer durante todo o dia, e a coluna chegou já de noite ao quartel. 

Ao entrar dentro do quartel os turras começaram a atacar, mas graças a Deus só houve dois feridos, um alferes e um cabo, e a mim coube-me uma coisa sem importância, pois fiquei dentro de um oleoduto [?] que cheirava mal, ainda pior do que fosse uma retrete, e assim termino este meu [...] , sobre o ataque que eu tive nesta data.


Aldeia Formosa, 19 de agosto de 1968

Neste dia, há
   volta das oito horas da noite, mais um lindo ataque dos turras, mas as morteiradas não chegaram cá, pois apenas caíram duas perto do quartel, mas com certeza eram de canhão porque nós apenas mandamos cerca de dez morteiradas e o ataque durou cerca de vinte minutos, e assim com estas palavras termino.


Aldeia Formosa, 20 de agosto de 1968

Nesta data fomos fazer uma coluna a Gandembel e partimos de cá da terra (Aldeia Formosa) eram 11.30, e sempre a picar a estrada por causa das minas. 

A primeira ponte estava destruída. Tivemos de montar as pranchas para as viaturas passarem, e assim fomos andando. Mais à frente estava o chão cheio de minas, e assim tivemos de parar e o furriel Pedro foi rebentá-las, e rebentou cerca de cinco minas e um dos meus colegas rebentou uma com a vara e caiu para o chão como morto, e foi imediatamente o enfermeiro tratá-lo e foi transferido para Bissau, para o hospital de helicóptero. 

Como a estrada estava cheia de minas, e já era quase de noite tivemos ordem para regressar para o quartel. Este pobre rapaz é de perto da Foz do Arelho e chama-se António.


Aldeia Formosa, 22 de agosto de 1968

Neste dia tivemos de ir novamente fazer a coluna a Gandembel. Partimos de Aldeia eram 6 horas da manhã, e a estrada sempre picada pelo meu pelotão. 

Chegamos ao mesmo sítio anterior onde estavam as minas. Nós rebentamos cerca de 17 minas, e levantamos também algumas, não sei quantas. E aonde estavam também os paraquedistas a montar segurança. Eles levantaram cerca de trinta minas antipessoais, e quando as viaturas iam a passar rebentou uma debaixo de uma viatura, sem haver novidade, e assim chegamos a Gandembel, e tivemos de sair de lá cerca das quinze horas e depois regressar até Aldeia Formosa.

Chegamos até a Chamarra e tudo a correr bem. Daí em diante viemos nas viaturas a cavalo, bem descansados da nossa vida, quando sofremos uma emboscada no caminho e começaram as morteiradas a cair por cima da gente e a costureirinha a trabalhar, etc...

Estava um bombardeiro em Aldeia Formosa, de aonde levantou voo, e foi ter com a gente, ainda nos encontrávamos debaixo de fogo. Ele lá largou as suas mesinhas em cima daqueles cabrões, e eles logo deixaram de dar fogo. Houve cinco feridos. Três soldados da minha companhia e um furriel que era o Samouco e um soldado dos velhos. Destruíram também uma viatura. 

No dia seguinte o primeiro pelotão foi fazer o reconhecimento, e encontraram um morto e manga de sangue, um cantil e um carregador. Assim termino esta minha história vivida pelo meu pelotão e pelo quarto pelotão e alguns homens do Pelotão Fox.


Aldeia Formosa, 25 de agosto de 1968

Na data indicada em cima, tivemos uma tarde de festa que começou cerca das cinco horas, e demorou cerca de 15 minutos. Neste dia andavam africanos a jogar a bola com colegas meus, e o jogo era na pista de aviação.

 Pois os turras quando começaram a atacar, mandaram as canhoadas e as morteiradas para a pista, mas não houve novidade nenhuma dessa parte da pista, e depois começaram a cair para os lados das tabancas, e encontravam-se pessoas [militares ?]  no lado das tabancas. Quando iam a fugir para o quartel, um homem da companhia dos velhos levou com um estilhaço na barriga, e seguiu para o hospital em Bissau.

E estas são as últimas palavras deste ataque.


Aldeia Formosa, 27 de agosto de 1968

Fomos fazer uma coluna a Buba, que nela tivemos pouca sorte, e por isso tenho sempre escrito estes grandes sacrifícios que eu tenho passado junto dos meus colegas. 

E por isso vou agora contar o que se passou nesta coluna. Ia o 4º Pelotão a picar a estrada, tudo a correr bem, e aonde estava uma anticarro debaixo de um cibe e o 4º Pelotão não deu com ela. Passou a primeira viatura, sem haver problemas e quando ia a segunda viatura a passar arrebentou, e foi a uns poucos metros de altura, e o condutor também, pois ficou a contar estar muito esmagado por dentro, e a viatura ficou toda destruída. Ia a montar segurança entre a primeira e a segunda viatura, apenas caiu terra por cima da gente, mas não houve qualquer outro ferimento, e assim começamos a andar. 

Mais à frente estava a ponte destruída, pois tivemos de a arranjar, e aonde estavam quatro minas antipessoais, e um condutor da minha companhia pôs o pé em cima que ficou com o pé todo escavacado, e as três minas o furriel alevantou-as. Pois esse pobre rapaz, desde as 9.15 horas, sempre a gritar que até metia horror, pois só quase à noite é que veio o helicóptero buscar este infeliz. Quando chegamos a Nhala eram oito horas da noite. 

Chegamos de noite devido às pontes estarem destruídas pelos turras. Passamos a noite em Nhala e só no outro dia é que partimos para Buba, tudo a correr em bem graças a Deus, mas esse pobre infeliz rapaz que arrebentou a mina debaixo do pé teve de levar a perna cortada, e assim são estas últimas palavras desta minha guerra.


Aldeia Formosa, 9 de setembro de 1968

Mais um ataque neste dia por esses grandes parvos dos turras. Já era de noite quando eles atacaram, mas as morteiradas e as canhoadas não chegaram ao quartel, e nós mandamos só quarto morteiradass e seis obuzadas e os gajos assim nos deixaram a gente em paz. Ao fim de ter passado à volta de uma hora, mandamos dez obusadas para a Guiné francesa, e assim terminou este encontro.


Aldeia Formosa, 12 de setembro de 1968

Mais outra festa neste dia acima indicado, e assim vou contar esta história. Já quase de noite, os homens da Fox saíram fora do quartel com as Daimlers, e os turras estavam emboscado para atacarem o quartel, mas como ouviram o barulho dos carros a avançarem, logo atacaram os homens das Fox e o quartel ao mesmo tempo. O morteiro do quartel mandou quatro morteiradas e os obuses mandaram duas ameixas, e assim terminou a festa e o pessoal das Fox regressou depois para o quartel sem haver problema. 

Depois de ter passado uma hora, os obuses estiverem sempre a trabalhar toda a noite, pois mandaram dezasseis obuzadas para a Guiné francesa e já terminei.


Aldeia Formosa, 1 de outubro de 1968

Em virtude de me encontrar na Província Ultramarina da Guiné tenho de escrever mais estas seguintes palavras que foram passadas na data indicada acima em Aldeia Formosa. Assim vou escrever o que se passou durante cerca de sete horas, pois choveu tanto, e fazia tanto vento que queria levar as casernas, mas levou, apenas, as chapas de zinco, que estavam a fazer de telhas numa pequena caserna onde estava a secretaria e pessoal da minha companhia a dormir. 

Os papeis da secretaria ficaram todos molhados, e a sorte de um rapaz foi de trazer a mala às costas, senão tinha ficado ferido. Uma chapa de zinco caiu em cima da mala, aonde a cortou ao meio e ainda coisas que continha dentro, e assim com estas palavras, não houve feridos, mas sabe Deus como nós nos vimos nesta aflição. Rebentaram cerca de seis armadilhas devido ao temporal, e assim são estas as últimas palavras deste temporal.


Aldeia formosa, 22 de novembro de 1968

Mais uma história que vou contar desta minha guerra. Nesta data fomos fazer uma coluna a Gandembel, aonde iam com a gente os paraquedistas. Levávamos oito viaturas com géneros, e a malta ia a pé, porque íamos a picar a estrada. Chegamos a meio do sector com tudo a correr bem, e depois tivemos de montar a ponte para as viaturas passarem, e daí em diante nós já fomos encima dos carros, mais à frente tivemos de passar por outra ponte que é a Ponte Balana. 

Ao passar a última viatura a ponte caiu, aonde houve dois feridos da minha companhia e dos paraquedistas, aonde foram logo transportados de helicóptero para Bissau. Depois regressamos a Aldeia Formosa, e assim chegamos ao nosso destino com tudo a correr pelo melhor.


Aldeia Formosa, 31 de dezembro de 1968

Nesta data indicada acima, tivemos mais um ataque ao quartel, e nós já estávamos sabedores, porque o nosso capitão mandou formar a companhia para nos dizer. Eu estava de reforço ao portão dois, eram perto das seis da tarde quando nós ouvimos arrebentamentos. Assim que nós ouvimos arrebentamentos fomos imediatamente para a paliçada, e quando eram perto das dez horas, nós começamos a fazer fogo, quando eles atacaram com mais umas morteiradas e canhoadas. Os melros não conseguiram meter nenhuma dentro do quartel, e só acabou era meia-noite e meia. 

Assim entramos no ano de 1969 ao som das morteiradas e canhoadas. Os melros atacaram com seis canhões sem recuo e morteiros 120, e vieram com viatura pois foi a Companhia velha foi fazer o reconhecimento e nada encontraram. Esta guerra por hoje terminou.


Buba, 4 de fevereiro de 1969

Como andamos a fazer uma estrada de Buba até Aldeia Formosa, e já temos perto de dez quilómetros, e neste dia nós íamos com a nossa calma pela estrada fora quando caímos numa emboscada. Iam dois pelotões pelos flancos. Era o meu e o quarto, mas a emboscada rebentou do lado onde ia o quarto. 

Eles tinham dois fornilhos montados, e quando ia a passar o quarto pelotão, eles arrebentaram com um fornilho, aonde mataram um pobre rapaz cujo nome era o "Velhinho",  e houve cinco feridos, e nós tivemos ainda muita sorte foi o outro fornilho não ter rebentado.

Quando fomos fazer o reconhecimento, só encontramos quatro granadas de roquete. Isto será o fim [deste episódio] .


Buba, 9 de fevereiro de 1969

Neste dia tivemos um ataque ao quartel que quando começou eram 10.30h. Eu já me encontrava a dormir, mas o ataque era tão grande que eu até acordei. Alevantei-me da cama, e ia para fugir para a vala, mas já estava tão cheia que fui para debaixo da cama. 

Assim terminou o ataque, metendo só uma que furou uma parede de uma caserna aonde estava a companhia de Gandembel . Apenas houve um ferido dessa companhia, e esse foi para Bissau, e depois essa companhia foi no dia seguinte fazer o reconhecimento, aonde eles atacaram com 10 canhões e 4 morteiros 82, e encontraram manga de granadas de canhão, e pronto já está escrito.


Buba, 13 para 14 de fevereiro de 1969

Na noite de 13 para 14 de fevereiro às cinco da manhã sofremos mais um ataque estava a malta ainda a dormir quando elas começaram a cair. Eu não tive nada. Fui para debaixo da cama, e vários camaradas também. Eles meteram muitas canhoadas e morteiradas dentro do quartel, mas só houve um ferido da Companhia 2382 que foi o “Esgota-pipas”, e foi para o hospital, e o meu pelotão e o segundo foram fazer o reconhecimento donde eles nos atacaram com 14 canhões, 3 morteiros 82 e com armas ligeiras. Apenas apanhamos algumas granadas de canhão, e isto é o fim.


Buba, 19 de abril de 1969

Tudo isto é guerra. Mais um ataque que começou pelas oito da noite. Apenas meterem duas canhoada,s e uma delas furou a parede da minha caserna, mas sem haver qualquer acidente, e durou cerca de 10 minutos. No dia seguinte foram dois pelotões da minha Companhia fazer o reconhecimento, aonde estavam 18 granadas de morteiro, e encontraram postas de sangue. Atacaram com 8 canhões e 3 morteiros, e pronto por hoje já chega.


Buba, 4 de maio de 1969

Fomos fazer uma coluna até Nhala e ia a engenharia também, mas a engenharia ficou no segundo pontão, e aonde estava minada de minas, pois alevantamos 38 minas antipessoais e uma anticarro, e mais à frente nós íamos a picar, e encontramos a estrada toda escavacada e aonde alevantamos três minas, e havia outra que um rapaz da minha companhia lhe pôs o pé encima, e ficou com o pé todo partido. Foi socorrido pelos primeiros socorros e depois foi para o hospital em Bissau. 

Ao fim de cinco minutos da mina ter arrebentado, rebentou uma emboscada e caíram duas morteiradas de 82 a 3 metros da estrada aonde se encontrava o pessoal, e trabalhou a "costureirinha", e armas pesadas, mas não houve mais feridos. 

Depois eu estava à rasca da cabeça, e fui pedir ao alferes para vir para o quartel, e ele deixou-me vir. Vim mais o rapaz que tinha arrebentado a mina com o pé e chama-se Miguel. Vim sempre a segurar a perna, e o resto da malta seguiu até Nhala, e alevantaram mais mina anticarro, e depois tudo correu bem, e assim termino. Tudo isto é guerra


Mampatá, 17 de maio de 1969

Estive em Mampatá cerca de 15 dias, e no dia 16 os turras fizerem um pequeno ataque. Foi apenas com lança.roquetes, e armas ligeiras, mas não houve qualquer novidade, e no dia seguinte fomos fazer o reconhecimento e nada encontramos. 


Guiné > Região de Tombali > Mampatá > CART 6250, Os Unidos de Mampatá (1972/74) > Um foto aérea de povoação e aquartelamento... A unidade de quadrícula anterior terá sido a CCCAÇ 3326 (1971/73, Mampatá e Quinhamel) a que pertenceu o nosso camarada António Amaral Brum, há 36 anos emigrado no Canadá. Em 1968, no último trimestre, esteve aqui destacado o José Teixeira, o José Cuidado da Silva, o Eduardo Moutinho Santos, o José Belo, o José Manuel Samouco  e outros "Maiorais" (CCAÇ 2381, 1968/70).

Foto: © José Manuel Lopes (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Mampatá, 31 de maio de 1969

Neste dia saímos de Mampatá na coluna de Aldeia Formosa para Buba, e foram alguns rapazes da minha companhia a picar a estrada até ao meio do sector. Ao fim de alguns quilómetros tivemos uma emboscada, onde houve dois mortos e seis feridos. Os mortos e os feridos eram de uma companhia que já tinha dezanove meses, e assim seguimos para diante. 

Mais à frente encontramos uma mina anticarro, e por cima ainda estava um antipessoal. Passei eu e mais outro rapaz ao lado dela. A nossa sorte foi ele não a ter pisado, pois se a gente a pisasse, nem sequer se viam os nossos ossos, pois alevantamos a mina e começamos a andar. Ao fim de alguns quilómetros houve outra emboscada, aonde caiu uma roquetada aquase ao pé de mim e dos meus camaradas ferindo dois rapazes da minha companhia.

Um chama-se Manuel Luís que é da Azinheira e o outro era o Silva, e nós ao fim destas duas emboscadas já não tínhamos aquase 
[sic]   nenhum material de guerra.

 Tivemos de ser abastecidos de helicóptero, e mais à frente tivemos mais outra emboscada que o fogo durou cerca de vinte minutos. Aquase que não tinha fim, e era aquase de noite. Houve um rapaz das Fox que levou um tiro na testa, e aonde veio a falecer ao fim de alguns momentos. Os bombardeiros andaram todo o dia por cima de nós, e os Fiat andaram também, cerca de quinze minutos, e também tivemos mais à frente outra emboscada, mas os bombardeiros deram com eles, e fizeram fogo, e depois daí em diante tudo nos correu bem até chegarmos a Buba, mas com muitos sacrifícios não chegamos, menos aqueles infelizes que morreram.


Empada, 13 de junho de 1969

Aqui, neste pequeno quartel de Empada, foi o meu primeiro ataque que eu tive na data indicada acima. Nada me meteu medo. Eu nessa altura estava a comer galinha e a beber aqueles copos da ordem junto de alguns camaradas.

 Nós ficamos tão descansados, como não fosse nada connosco pois elas caíram a 500 metros desviadas do quartel e assim por hoje já chega. Envio cumprimentos para os turras desta emboscada. José Cuidado da Silva


Empada, 16 de junho de 1969

Era uma hora da noite e eu estava dormindo num pequeno abrigo, mais alguns camaradas bem descansados, mas foi só ao som das canhoadas e morteiradas que nós acordamos. 

Fomos ver, eram os nossos amigos turras a darem-nos os bons dias, mas além de ser um quartel pequeno, eles ainda conseguiram meter algumas lá dentro ferindo dois rapazes. Um foi para o Hospital, o outro não foi preciso, e também caiu uma canhoada dentro da tabanca matando dois africanos e deixando um em perigo de vida. 

 No dia seguinte fomos fazer o reconhecimento e só encontramos invólucros, e agora termino. Cá fico esperando os turras para um novo ataque.


Empada, 28 de junho de 1969

Mais uma vez uma linda festa feita pelos turras. Eram oito horas quando eles começaram a mandar morteiradas e canhoadas, mas elas caíram bem longe deste pequeno quartel, pois ficaram a meio do caminho. 

Quando a festa começou eu estava no café a beber aqueles copos da ordem, e eu ainda naquele momento disse estas seguintes palavras ao Eusébio: "Dá-me agora mais um tinto, e se quiseres beber aproveita agora, pois agora vai à saúde dos turras, não é verdade? Eles de vez em quando lembram-se de nós."


Buba, 31 de julho de 1969

Mais umas palavras tenho a acrescentar, mas desta vez é em Buba. Neste dia fomos picar a estrada para a coluna de Aldeia Formosa passar. O meu pelotão picou até cerca de quatro quilómetros, e foi tudo a correr bem. Depois rebentou uma mina na viatura da frente, aonde levava cerveja e tabaco. Foi tudo pelos ares, e nós a beber cerveja e roubar tabaco. Foram aquelas bebedeiras da ordem, e os pretos a roubar sabão, pois só houve dois feridos. Um era da minha companhia, e o outro era africano. 

Depois trouxemos a viatura para Buba e a coluna seguiu para Aldeia Formosa e pronto.


Buba, 3 de agosto de 1969

E agora, mais uma vez, aproveito cinco minutos para escrever estas palavras. Mais um lindo ataque neste tão belo dia. Eram seis da tarde quando caiu uma canhoada dentro do quartel e feriu duas vacas. Foi uma pena não as ter matado…e todas. 

E não houve mais novidade. Talvez para a próxima já haja novidades. Tu és Buba o alvo de canhoadas e morteiradas, mas só me faltam sete meses para acabar os meus sofrimentos.


Buba, 19 de setembro de 1969

Eram perto das seis da tarde, quando os turras começaram a atacar, mas elas caíram todas dentro do rio, e eu nessa altura estava dentro do refeitório para arreceber  
 [sic] a comida quando elas começaram a assobiar, e houve apenas um ferido e houve apenas um ferido [repetido] , mas foi devido a fazer fogo com o morteiro 60, e esse partiu dia 20 para o hospital, e não houve mais problema, apenas um preto fugiu no mesmo dia com uma G3. Pronto.


Buba, 21 de setembro de 1969

Eram 4.30 da tarde quando os turras resolveram novamente atacar, mas as morteiradas e canhoadas caíram todas dentro do rio, e apenas só nos assustaram, e nada mais.


Buba, 29 de setembro de 1969

Mais um ataque. Pois eram perto das 4 horas da tarde quando algumas morteiradas e canhoadas caíram dentro do rio. Apenas uma caiu dentro do quartel, e algumas também assobiaram por cima, e assim se passou mais um ataque sem haver problema, e quando eram perto das seis horas voltaram novamente, mas essas ficaram todas dentro do rio. Decerto era para matarem o peixe, e nós nesse segundo ataque não fizemos fogo, e por hoje já chega.


Buba, 10 de outubro de 1969

Neste dia fomos fazer uma coluna a Nhala, e quem foi a picar foi a minha malta. Saímos do quartel eram 6 horas da manhã, e nós ao meio do setor encontramos um fornilho. Quem o encontrou foi o Rio Maior. Era um fornilho com carga elétrica. O furriel Pedro alevantou-a, e assim começamos novamente a andar. Avançamos mais um km. e ficamos emboscados. Aguardamos perto das cinco horas, e depois viemos nas viaturas até Buba. 

Era quase de noite quando nós chegamos, e foi quando começou mais um ataque, mas as morteiradas e canhoadas ficaram a meio do caminho, e nós nem sequer fizemos fogo, e assim termino este historial.


Buba, 12 de outubro de 1969

Eram 5.30 horas da tarde quando os turras mais uma vez nos atacaram. Caiu manga de canhoadas e morteiradas dentro do quartel, mas não houve feridos, e assim que acabou o fogo, a malta saiu fora do quartel, e fomos ao local que eles estiveram a atacar.

 Nada encontramos, e já era quase noite, e amalta regressou ao quartel. Também estavam cerca de trezentos turras do outro lado com armas ligeiras para fazer a tentativa para entrar dentro do quartel, estava um pelotão da 2382, e a milícia emboscados, e quando os turras fizeram o seu esforço para entrar, a malta abriu fogo, e assim eles fugiram, pois no dia seguinte foram os fuzileiros fazer o reconhecimento, aonde encontraram 150 granadas de morteiro 82, 3 de roquete, seis de canhão e também uns binóculos, manga de fio e ainda telefone. Atacaram-nos com 8 canhões e quatro morteiros 82, e pronto e nada mais por hoje.


Empada, 9 de janeiro de 1970

Mais um ataque no qual arderam 6 tabancas, e não caiu nenhuma dentro do quartel. Eram 11.30 horas quando nos atacaram. Noutro dia seguinte fomos fazer o reconhecimento, e nada encontramos, e eles roubaram mandioca aos pretos, pois fomos atacados a quinhentos metros do arame com roquetes e outras armas ligeiras.


Empada, 13 de janeiro de 1970

Eram dez horas da noite quando a festa começou pelos turras, mas desta vez ainda não caiu nada dentro deste tão pequeno alvo. Apenas queimaram seis tabancas. Noutro dia seguinte fomos fazer o reconhecimento, e nada encontramos. Atacaram-nos com um canhão, um morteiro 82, roquetes e outras armas ligeiras.


Empada, 31 de janeiro de 1970

Mais um ataque com canhões e morteiros 82, mas não caiu nada dentro do quartel. Ficaram ao meio do caminho. Noutro dia seguinte fomos fazer o reconhecimento. Os nossos morteiros não chegaram lá, e assim foi o último ataque que nós tivemos. Depois viemos para Bissau, e aonde nos encontramos à espera de um autocarro para nos levar até à Metrópole, para visitar as nossas famílias.

Parti para esta Província da Guiné em defesa da Pátria - 1 de maio de 1968 e terminei a 9 de abril de 1970

Assim termino esta minha comissão de reforço com suor e lágrimas no meio destas matas em defesa da Pátria. Agora quero ir embora abraçar os meus pais.

Quero ir embora para matar as saudades que há tanto tempo me encontro ausente. A caminho de 24 meses gozando (?) estas terras desta tão pequena Província da Guiné com suor e lágrimas, e assim defendi, e lutarei sempre pela Pátria.

José Cuidado da Silva

(FIM)

(Revisão / fixação de texto: José Teixeira / LG)
_____________

Nota do editor

[1] - Vd. post anterior de 7 DE MAIO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25491: Estórias do Zé Teixeira (62): O “Diário” do José Cuidado da Silva (1) (José Teixeira, ex-1.º Cabo Auxiliar Enfermeiro da CCAÇ 2381)

terça-feira, 7 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25491: Estórias do Zé Teixeira (62): O “Diário” do José Cuidado da Silva (1) (José Teixeira, ex-1.º Cabo Auxiliar Enfermeiro da CCAÇ 2381)

O Diário de José Cuidado da Silva

1. Em mensagem enviada ao Blog no dia 3 de Maio de 2024, o nosso camarada José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381 (Buba, Quebo, Mampatá e Empada, 1968/70) fala-nos de José Cuidado da Silva, um militar, como muitos outros que todos conhecemos, inadaptado à dura vida em campanha que lhe deixou marcas psicológicas para toda a vida. Só muito recentemente, há dois anos, deu a conhecer ao "seu furriel" Samouco, um diário que escreveu durante a comissão, que manteve em segredo até então.


O “Diário” do José Cuidado da Silva

O “Diário” em verso e em prosa, do meu camarada Maioral (CCAÇ 2381), José Cuidado da Silva, foi o que mais me comoveu e mais gozo me deu a ler e a transcrever para que os camaradas que passaram pela guerra do ultramar, possam apreciar.

Comecemos por descobrir o José Cuidado da Silva. Apareceu na Companhia, já esta estava a preparar-se para partir para a Guiné. Foi parar ao terceiro pelotão e acolhido na equipa do Furriel José Manuel Samouco. Este, começou por perguntar-lhe o nome, de onde vinha e qual a profissão. O pobre do José, aparentemente um simplório, na forma de se apresentar e de falar, disse-lhe que era “cortador de calipos”. Que bela profissão pensou o Furriel e disse estás apresentado. Logo pela aragem viu que era mais um, uma figura típica como soe dizer-se, que tinha de acompanhar de perto e… de “proteger”.
O José Cuidado da Silva

Eu, que fui uma das últimas peças a “encaixar” na Companhia, só me apercebi do José Silva em Ingoré. Aparentemente muito ingénuo, mas bem-educado e respeitador. Eu era “o nosso cabo enfermeiro” tratado por você, a quem foi pedir comprimidos para dores de cabeça. Só muito mais tarde, já em Buba, voltamos ao convívio, quando me juntei ao grosso da Companhia e nos aproximamos nas saídas para a estrada e colunas. A sua forma de se expressar em voz alta escondia um jovem sensível, educado, que pensava, mas não expressava o seu pensamento. Muito disponível e cumpridor de ordens, segundo afirma o Furriel J. M. Samouco. Um militar que nunca deu problemas, mas era marcadamente uma “peça” típica pela forma “atabalhoada” de falar e sujeita a ser gozada pelos camaradas, pelo que precisava de especial atenção.
O Alferes Magro e o Furriel Samouco, ao centro da foto, ladeados por praças do 3.º Pelotão. À direita o Zé da Silva
Da esquerda para a direita: O "Calhordas", o Furriel José Manuel Silva,  Furriel José Manuel Samouco e o Zé da Silva, como era conhecido o nosso herói.

Acabada a Comissão, o José Cuidado da Silva, regressou a Rio Maior, organizou a sua vida, casou e da união nasceu um rapaz.

Em 2016, após alguns anos de batalha, por parte de alguns de nós, foi possível que uma Junta Médica o classificasse como doente psíquico, com stresse pós-traumático de guerra, e assim, aumentar a sua reforma mensal em perto de 500€, para além do acesso ao Hospital Militar. Um bónus bem merecido para uma vítima de uma guerra cujos mentores, até atrasados mentais classificavam como aptos e enviavam para a frente de batalha. Tenho provas disso, num outro camarada – O José Salvaterra, já falecido, que ao atraso mental, agregava uma deficiência físico-motor.

Em 1990, O José Silva foi um dos primeiros a apresentar-se ao toque de clarim que lancei, para iniciarmos os convívios anuais. Logo no primeiro convívio, apresentou-se na sua motorizada, ele, a mulher e o filho. Fizeram a viagem de Rio Maior a Coimbra. Infelizmente, o filho tem um grau de deficiência mental elevada, mas durante uns anos seguidos, lá vinham os três na motorizada.

A esposa, que é uma mulher, tão simples quanto ele, mas de garra apurada, e muito trabalhadeira, sempre fez questão de vir, e o Zé lá vinha, e ainda vem. Nunca falhou. Ela até conseguiu tirar a carta e juntar dinheiro para comprar um carrito (diz ela) para vir à festa dos Maiorais. O filho, esse teve de ser internado num Lar.

Infelizmente, a esposa, sofreu um acidente e partiu o perónio há mais de um ano. A recuperação não está a correr bem e ela tem muita dificuldade em se deslocar, mesmo com duas canadianas, mas, dizia-me há dias, que já consegue conduzir e não ia faltar ao Convívio que se realizou no passado dia 13 de abril. Foi um dos primeiros casais a aparecer naquela manhã de sábado, onde juntamos oitenta pessoas entre combatentes e familiares. Mulher sorridente, resistente, é ela que motiva o Zé.
Convívio de 2024, em Fátima. O José Cuidado da Silva à mesa com o Acácio

Há dois anos, o Jose Cuidado da Silva, entregou ao “meu furriel” Samouco, como ainda o chama, um tesouro. É verdade, um tesouro. O seu “Diário de guerra” escrito em verso e prosa, durante a sua estadia na Guiné e guardado, anos e anos.

Escrito num português simples por uma pessoa simples, conforme foi sendo vivido. Reflete um jovem ligado à sua família e bem-querido na sua terra. Um homem atento ao que o rodeava e seguro de si. Um homem que viveu como todos nós o drama da separação da família, a ansiedade de partir para o desconhecido, que não se envergonha de ter chorado, quando entrou no Niassa. Que conta pormenores do seu sofrimento com uma agudeza de espírito. Uma autêntica lição de vida. Não desce a pormenores, nem regista todos os momentos em que se cruzou com o inimigo. Talvez tenha registado apenas os que mais o marcaram.

Termina escrevendo: Quero ir embora para matar saudades, que há tanto tempo me encontro ausente. Agora quero ir embora abraçar os meus pais.

É esse diário que apresento aos estimados camaradas, leitores do Blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné.

José Teixeira


********************

História da minha vida militar em verso

José Cuidado da Silva

Assentei praça em Viseu
No dia 24 de outubro (e não em abril),
Na parada superior
Nós eramos mais de mil.

Recebi a farda inteira
Para vestir naquele dia,
As calças eram grandes,
O blusão não me servia.

Tocou para o almoço,
Para a formatura fui então,
Quando entrei no refeitório
Só havia massa e feijão.

Na maior força de Inverno
Esta semana passou,
Só vos tenho a dizer,
Que muito mesmo me custou.

E assim passou a recruta,
(Numa grande bandalheira),
E quando tudo acabou
A continência fiz, à bandeira.

Estive por ali mais uns dias,
E o que aconteceu depois,
Voltei a fazer as trouxas
E fui parar ao R.I.2

Quando ao R.I.2 cheguei,
Cansado de caminhar,
Para aquelas paradas olhei,
E deu-me vontade de chorar.

Quando lá dentro entrei
Chegou-me uma grande saudade,
Da casinha que deixei,
Tão longe daquela unidade.

Lá do alto do quartel
Ouviu-se cantar o fado,
Mas logo para meu azar
De lá fui mobilizado.

Fui transferido para Abrantes,
Terra ribatejana,
Para tirar o IAO,
Logo na mesma semana.

Fui com a mochila às costas
Cinco horas a caminhar,
Já tão longe da cidade
A um deserto fui parar.

Quinze dias lá acampado
No meio de pinheirais,
E aqui fomos tratados
Como se fossemos animais.

Quando cheguei ao quartel,
Para me recompensar,
Deram-me o fim de semana
Para ir até casa gozar.

Quando ao quartel voltei,
Disse-me o capitão,
Vai gozar vinte e dois dias,
Que são da mobilização.

Logo apanhei o comboio
Para a casa regressar,
E assim que lá cheguei
Minha mãe fui abraçar.

Passei lá os vinte e dois dias
Dos melhores da minha vida,
A seguir veio a tristeza
Da hora da despedida

Deixei meu pai e minha mãe,
Toda a família a chorar,
Deixei todo o meu bem,
E lá fui parar ao Ultramar.

Quando de casa eu saí,
E a despedir-me dos meus,
Muita gentinha eu vi
A chorar, dizer-me adeus.

Quando cheguei a Lisboa
Senti minha alma gritar,
Entrei para dentro do Niassa
E comecei a chorar.

Às doze horas e cinco
O Niassa deu a partida,
Tanta gentinha a chorar
Pela nossa despedida.

Quando a Bissau cheguei
Já não aguentava em pé,
Embarquei numa LDG
E fui parar a Ingoré.

Quando a Ingoré cheguei,
Triste, me pus a pensar,
Minha família deixei
E para a selva, vim parar.

Setenta dias lá estive,
Era um lugar sossegado,
Fui transferido para o sul
Onde fui um desgraçado.

Quando a Buba cheguei,
A três dias de lá estar,
Apareceram por lá os turras
Para o quartel atacar.

Estive lá quase um mês,
Sabe Deus a minha dor,
E logo para meu azar
Fui para o sítio pior.

Mudei para Aldeia Formosa
Onde era sempre atacada,
Dia sim e dia não,
À canhonada e morteirada.

Tantas colunas eu fiz,
Patrulhas e operações,
Muitas vezes rastejei
Quando ouvia os canhões.

Por vezes de madrugada
Estava eu, a dormir,
E ouvia as canhonadas
Perto de mim a cair.

Levantava-me em cuecas
Mesmo sem alguém mandar,
E com a G3 na mão
Numa vala me ia deitar.

Triste vida eu passei.
Fui homem de pouca sorte,
Tive dias que cheguei
A pedir a Deus, a morte.

Depois voltamos para Buba,
A malta andava arrebentada,
E ainda por cima nos disseram,
Que íamos parar à estrada.

Então andávamos na estrada,
Fartos de cansaço e porrada,
Uns tempos depois nos disseram
Que íamos parar a Empada.

José Cuidado da Silva

(continua)

_____________

Nota do editor

Último post da série de 10 DE DEZEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24938: Estórias do Zé Teixeira (61): Crónica de uma tarde, em sábado de Festas Natalícias (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381)

quarta-feira, 30 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13448: Diário da CART 1742 (Mário Alves, 1.º Cabo Corneteiro) (4): Conclusão: Período entre Fevereiro e Junho de 1969 (Abel Santos)

1. Conclusão do "Diário da CART 1742" de autoria de Mário dos Anjos Teixeira Alves, 1.º Cabo Corneteiro, enviado ao Blogue pelo nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69).



Diário da CART 1742

Autoria de Mário dos Anjos Teixeira Alves
1.º Cabo Corneteiro
Guiné, 1967/1969

Este diário foi oferecido aos camaradas presentes no 9.º convívio da Companhia de Artilharia 1742, em Campeã - Vila Real de Trás-os-Montes em 25 de Maio de 2013.

Eis a razão
Dos momentos
Da nossa indisposição,
Mandaram-nos para a guerra
Sem a nossa opinião.
Por isso o Salazar
Não terá o nosso perdão.


Fevereiro 69 
Dia 7 - sexta-feira: 
Fui mais uma vez ver o Adão ao hospital, e ele disse-me que ia ser transferido para Portugal.
E tudo continuou normalmente até ao dia 14, sexta-feira, em que fui chamado à secretaria, e me disseram que a minha companhia tinha mandado uma mensagem para me apresentar, pois pensavam que eu já tinha sido operado, e que continuava cá desenfiado. Então, levei as guias que me deram na secretaria para ir ao hospital para as assinarem, mas como já era tarde, mandaram-me voltar na segunda-feira dia 17.
Nesse dia lá compareci, e o médico consultou-me, e disse que me queria voltar a ver na sexta-feira dia 21, e que depois decidia.

Dia 18 - terça-feira: 
É dia de carnaval em Portugal, mas aqui o carnaval é outro.
De manhã encontrei cá nos Adidos o 1.º Sargento da minha companhia, que me entregou o ordenado do mês anterior, e eu contei-lhe como estava a minha situação, sobre a qual ele se mostrou compreensivo. 

Dia 22 - sábado:
Faz 19 meses que deixámos Portugal a caminho desta terra.
Ainda continua cá o sargento Bonito, e pagou-me o corrente mês, e assim continuou tudo normal até ao dia 27.

Dia 28 - sexta-feira: 
Mais um fim do mês.
De manhã fui ao hospital, mas ainda não fiquei internado, e marcaram-me nova consulta para segunda-feira do próximo mês.

Março 69
Dia 3 - segunda-feira:
De manhã fui á consulta no hospital, e o médico que me consultava já não tinha forma de resolver o meu caso, e foi chamar o chefe da cirurgia. Estiveram a ver se havia vaga para os próximos dias, mas não conseguiram, e deram-me alta por 30 dias, com a possibilidade de poder ir à companhia.
De tarde fui à secção de transportes, e deram-me uma requisição para o avião Dakota. Assim, fui de seguida assinar a mesma ao quartel-general onde me marcaram passagem para o dia 5, quarta-feira.

Dia 4 - terça-feira: 
Andei a tratar das guias de marcha.

Dia 5 - quarta-feira:
Às 7h fui ter com o delegado do batalhão de Nova Lamego, e disse-me que o avião tinha ido fazer um voo a Cabo Verde e, que a viagem ficava cancelada. Fui então ao Q.G. marcar nova passagem para o dia 7.

Dia 6 - quinta-feira:
Entre outras coisas, levantei as guias de marcha para amanhã fazer a viagem.

Dia 7 - sexta-feira:
Fui novamente ter com o delegado do respectivo batalhão para me levar ao aeroporto, mas disse-me que tinham cancelado novamente a viagem para Nova Lamego. Então fui novamente fazer a apresentação à secretaria, por não ter ido de viagem.
Até ao dia 20 não consegui viagem alguma.

Dia 21 - sexta-feira:
Às 8h fui avisado para levantar as guias, visto que amanhã a lancha da marinha vai a Bambadinca, e todos os que estão aguardar viagem para aquela região vão poder fazê-la. Assim o esperamos.

Dia 22 - sábado: 
Fazemos 20 meses de missão.
Às 7h30 entrei na porta de armas, na viatura que nos levou ao cais, e depois foi um dia de juízo para embarcarmos, só partimos às 9h na dita L D M, e chegámos a Bambadinca às 16h, e aí pernoitámos.

Dia 23 - domingo:
Eu e um colega do batalhão de Nova Lamego, às 8h conseguimos transporte para Bafatá numa viatura que veio buscar gelo, onde chegamos às 9h30. Como não havia transporte para Nova Lamego, tivemos que nos apresentar à secretaria do esquadrão e assim pernoitamos cá

Dia 24 - segunda-feira:
De manhã saímos para ver se conseguíamos transporte, e encontrámos uma coluna de viaturas civis que iam a Bambadinca buscar material para a engenharia de Nova Lamego. Então os tropas que iam a fazer a escolta mandaram-nos esperar por eles. Por volta das onze horas fomos ao esquadrão levantar as guias, e às 12h30 eles chegaram, e assim partimos para Nova Lamego onde chegamos às 16h, de seguida fiz a apresentação no batalhão e cá pernoitei.

Dia 25 - terça-feira: 
Ao meio-dia estava a almoçar no refeitório, quando o sargento de dia me entregou as guias de marcha, e disse-me para estar às 14h no aeroporto para seguir de avioneta para Buruntuma.
Às 14h lá iniciei a viagem com o piloto Honório. Passados 30 minutos aterrámos em Piche, retomando a viagem em poucos minutos, viagem essa que terminou em Buruntuma às 15h.
Após cumprimentar os colegas fui à secretaria fazer a apresentação, e, como o meu camarada Oliveira estava a comer juntamente com os mecânicos, também acabei por comer com eles.
A partir de agora vou passar a dormir no abrigo 8.

Dia 26 - quarta-feira:
De manhã fui à enfermaria fazer o curativo e, expor o meu caso da consulta externa.
Até ao dia 31 segunda-feira, tudo normal.

ABRIL 69 
Dia 6 - domingo, Páscoa em Portugal: 
Mesmo assim, eu, o Oliveira, e os mecânicos arranjámos 6 frangos, e foram assados no forno com batatas, e apesar de já não haver cerveja há alguns dias, o alferes Cruz arranjou algumas na messe deles, e claro também almoçou connosco, tal como o furriel mecânico Neves.
A restante semana tudo normal, excepto a alimentação, já que vai faltando quase tudo, inclusivamente o pão.

Dia 13 - domingo:
Fui avisado que amanhã vai uma coluna a Piche, e eu vou com eles, para regressar a Bissau e tratar do meu problema de saúde.

Dia 14 - segunda-feira: 
Às 7h30 deixei Buruntuma definitivamente, e partimos em direcção a Piche onde chegámos às 10h30. Uma vez aí, encontrei alguns amigos da minha terra, e para bebermos algumas cervejas fomos ao comércio civil, pois na cantina também estavam esgotadas, tal como em Buruntuma. Também vai comigo para Bissau à consulta externa o cabo cozinheiro Saraiva e o Ribeiro, o furriel Pinto vai tratar de outros assuntos. Foi o Pinto que tratou da entrega das guias na secretaria.
À noite pernoitámos cá em Piche.

Dia 16 - quarta-feira:
Às 8h30 partimos numa coluna para Nova Lamego tendo cá chegado às 9h45. A seguir fui com o furriel fazer compras para mandar à companhia, e depois fomos entregar as guias na secretaria, e à noite cá pernoitámos.

Dia 17 - quinta-feira: 
Ainda continuámos cá em Nova Lamego, com a passagem do dia sossegado.

Dia 18 - sexta-feira: 
Às 9h45 fomos ao aeroporto aguardar que chegasse o avião Dakota, e ver se havia vaga para nos levar. Foi nos ditos que sim, e então fomos levantar as guias e às 10h45 partimos em direcção a Farim, onde aterrou por 10 minutos, e depois, seguimos para Bissau onde chegámos às 12h10. A seguir apanhamos boleia para os Adidos, onde entregámos as guias na secretaria, e assim passou mais um dia.

Dia 19 - sábado: 
Como é fim de semana não dá para tratar de nada, mas deu para dar um passeio por Bissau, tal como no domingo.

Dia 21 - segunda-feira:
De manhã fui ao hospital a uma consulta, e mandaram-me voltar na sexta-feira a fim de ser operado.

Dia 22 - terça-feira:
Completo 21 meses de missão. De resto tudo normal, tal como os dias 23 e 24.

Dia 25 - sexta-feira:
De manhã fui ao hospital e disseram-me para baixar já amanhã até ao meio-dia. De tarde entreguei nos Adidos o boletim da consulta, e da baixa para assinar, mas como o capitão da companhia estava ausente, não foi possível.

Dia 26 - sábado:
Às 10h o capitão assinou os documentos necessários e às 11h30 dei entrada no hospital, fiquei no pavilhão A, cama 31.

Dia 28 - segunda-feira: 
Pedi ao médico para não demorarem a operar, em virtude de estar a aproximar-se o dia de regressar a Portugal.

Dia 29 - terça-feira:
À noite avisaram-me para amanhã não tomar o pequeno-almoço, com a finalidade de ser operado.

Dia 30 - quarta-feira:
Às 9h45 levaram-me para a sala de operações e fui anestesiado, e acordei cheio de dores.
Foi uma tarde e noite difíceis.

Maio 69 
Dia 1 - quinta-feira: 
Um dia difícil com dores, tal como na sexta-feira, pois no sábado já comecei a resistir com mais facilidade.

Dia 4 - domingo:
Além das dores, fiquei triste com a notícia da morte por acidente de viatura de João Fernandes Caridade, um camarada da companhia.

Dia 5, 6 e 7: 
Tenho vindo a melhorar aos poucos.

Dia 8 - quinta-feira: 
De manhã tiraram-me os pontos na sala de tratamentos, e logo senti um grande alívio.

Dia 9 - sexta-feira: 
Ao fazer o curativo o enfermeiro disse-me que o golpe tinha aberto, e chamou o médico, este disse-me que foi por eu me ter posto de pé, mas já nada havia a fazer.

Dia 12 - segunda-feira: 
O médico disse que me ia propor alta, e que ficava em consulta externa a fazer o penso diário até que ficasse bom.

Dia 13 - terça-feira:
Foi-me dada alta da parte de tarde, então entregaram-me a roupa e as guias e passei para a enfermaria dos Adidos que também pertence ao hospital, se bem que continuo a ir ao hospital fazer o penso diariamente.
Foi o que aconteceu até ao dia 29, quinta-feira.

Dia 30 - sexta feira:
De manhã vi um desfile de militares chegados de Portugal, e fui fazer o penso ao hospital, à tarde fui até ao cais ver o NIASSA que os trouxe, e nos vai levar de regresso à nossa terra.

JUNHO 69 Dia 3 - terça-feira:
Chegou o 1.º sargento Bonito para tratar do assunto do embarque, e disse-me que a companhia chega depois de amanhã, ele fica instalado no quartel dos 600 em Sta. Luzia.

Dia 4 - quarta-feira:
De manhã fui ao hospital, e disse ao médico que ia embarcar no dia 6, e ele divertiu-se comigo, dizendo que não me dava alta e por isso eu ficava, mas lá ma passou, e deu-me uma carta para eu apresentar na enfermaria do barco para me fazerem o curativo.

Dia 5 - quinta-feira:
Fui à secretaria levantar as guias para passar para a minha companhia, visto que ela chega às 20h.
Ao meio da tarde fui para o cais à espera do meu pessoal, mas quando chegaram já eram 22h30, e com a demora do desembarque chegámos aos Adidos à meia-noite e meia.

Dia 6 - sexta-feira: 
Desde que chegámos, das 0h30 até às 6h30 estive com o meu colega Oliveira e o sargento Ribeiro a receber o fardamento, as armas e o restante material para entregar.
Depois fui feliz da vida dizer adeus a Bissau.
Às 16h regressei aos Adidos, e às 17h partimos para o local onde embarcámos, neste grande barco NIASSA, que à meia-noite deu a partida para a viagem tão desejada.

Niassa

Dia 7 - sábado:
Às 14h30 o barco fez uma curva e começaram os rumores que o barco voltava para Bissau, a fim de levar um furriel que estava em perigo de vida.

Dia 8 - domingo:
Às 6h acordei e ouvi o barulho de um helicóptero, então levantei-me e fui para o convés, ver o que se estava a passar. Então vi que o barco estava parado e o helicóptero fazia todas as tentativas para pegar no doente, mas não conseguia. Então, desceram uma baleeira e foram levar o doente a uma pequena ilha que se via à distância, e só lá o helicóptero consegui resgatar o doente, tudo isto se passou na região de Cabo Verde.
Às 7h30 o barco reiniciou a viagem.

Dia 9 - segunda-feira:
Continua tudo razoavelmente bem, embora com um pouco de enjoo, mas a ansiedade de chegar a Lisboa nada nos incomoda.

Dia 10 - terça-feira:
Tudo bem, embora tenha tocado o alarme de perigo para formarmos com o devido equipamento de salva-vidas mas nada passou de um simulacro.

Dia 11 - quarta-feira:
Quando tomávamos o pequeno-almoço deu para ver terra à distância, quando nos foi dito que eram as Canárias.
Às 13h voltou a tocar o alarme, e lá formámos de novo com os respectivos coletes salva-vidas, mas nada aconteceu de mal.

Dia 12 - quinta-feira:
Tudo continua bem.
À noite houve mais uma sessão de cinema como é habitual todas as noites, só que esta tem um significado especial, pois acreditámos que seja a última passada aqui no barco.

Dia 13 - sexta-feira: 
O dia mais alegre da vida até hoje.
Logo de manhã tirámos as malas do porão para o convés, às dez horas já começámos a ver terras e não deu para ver mais cedo por estar nevoeiro.
Às 11h chegámos ao cais de Alcântara, e às 12h30 desembarcámos dando assim largas aos abraços dos familiares que nos esperavam, e que assim faziam esquecer todo o sofrimento passado ao longo de quase dois anos.
Às 16h despedimo-nos desses familiares, e partimos de combóio para Penafiel, onde chegámos sábado dia 14 pela madrugada. Logo a seguir fizemos espólio da roupa que trazíamos vestida e a mochila com o restante, vestimos a roupa civil, dando um abraço de amizade aos camaradas, com o desejo de nos voltarmos a encontrar um dia.
Assim dei por terminada a minha missão obrigatória chamada de soberania, na dita Guiné, dando graças a Deus por me trazer de volta aos braços da minha família, e a esta terra querida do lugar do Cotorinho, Campeã, Vila Real.

Mário dos Anjos Teixeira Alves.
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Nota do editor

Vd. postes da série de:

24 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13434: Diário da CART 1742 (Mário Alves, 1.º Cabo Corneteiro) (1): Período entre Agosto de 1967 e Janeiro de 1968 (Abel Santos)

26 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13437: Diário da CART 1742 (Mário Alves, 1.º Cabo Corneteiro) (2): Período entre Fevereiro e Julho de 1968 (Abel Santos)
e
28 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13441: Diário da CART 1742 (Mário Alves, 1.º Cabo Corneteiro) (3): Período entre Agosto de 1968 e Janeiro de 1969 (Abel Santos)

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13441: Diário da CART 1742 (Mário Alves, 1.º Cabo Corneteiro) (3): Período entre Agosto de 1968 e Janeiro de 1969 (Abel Santos)

1. Continuação do "Diário da CART 1742" de autoria de Mário dos Anjos Teixeira Alves, 1.º Cabo Corneteiro, enviado ao Blogue pelo nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69).




Diário da CART 1742

Autoria de Mário dos Anjos Teixeira Alves
1.º Cabo Corneteiro
Guiné, 1967/1969

Este diário foi oferecido aos camaradas presentes no 9.º convívio da Companhia de Artilharia 1742, em Campeã - Vila Real de Trás-os-Montes em 25 de Maio de 2013.

Eis a razão
Dos momentos
Da nossa indisposição,
Mandaram-nos para a guerra
Sem a nossa opinião.
Por isso o Salazar
Não terá o nosso perdão.


AGOSTO 68
Dia 1 - quinta-feira:
De manhã, por opinião do nosso alferes Cruz, eu e o Oliveira resolvemos deixar de dormir na arrecadação, eu passei a minha cama para o abrigo 7 devido a fazer lá reforço, e o Oliveira continua a dormir no abrigo dos mecânicos.

Dia 2 - sexta-feira:
A manhã passou-se dentro da normalidade, e à tarde veio cá a avioneta com o correio.

Dia 3 - sábado:
De manhã andei ajudar a abrir uma vala no abrigo 7 e a recompor outra que não estava em condições.

Dia 4 - domingo:
Às 9h30 fui à enfermaria dar uma massagem na perna que já está quase boa. Como já há medicamentos para me tratar a fístula na agulha vertebral, deram-me duas injecções para esse efeito.

Dia 5 - segunda-feira:
De manhã foi o pessoal a Camajabá e trouxeram correio.
De tarde às 16h30 estivemos a receber lençóis e outras coisas do pelotão que amanhã vai render o outro que está em Camajabá e em Ponte Caium.

Dia 6 - terça-feira:
Às 13h chegou o pelotão que foi rendido e, estivemos distribuír-lhes entre outras coisas os respectivos lençóis, esses já não tem o mínimo de qualidade.

Dia 12 - segunda-feira:
Foi uma coluna a Bambadinca para reabastecimento da despensa.

Dia 14 - quarta-feira:
Às 11h chegou a coluna com os géneros de Bambadinca, e com o correio.

Dia 15 - quinta-feira:
Tivemos um almoço melhorado, em relação ao costume: batatas com bacalhau, por terem chegado ontem os géneros, ofereceram também uma cerveja pequena a cada um, por causa da vaca que ontem mataram, e não tinham a quem pagar, por outra forma, porque, de outra forma o nosso furriel vagomestre, Romão, só está bem a arranhar para dentro, tal como os macacos.

Dia 16 - sexta-feira:
Tivemos um jantar com alguns amigos, cabrito com batatas no forno e foi comido na arrecadação, acompanhado com uma respectiva cerveja.

Dia 18 - domingo:
Foi um dia bastante atribulado, mas compensado com um jantar de cabrito com batatas assadas no forno. Foi organizado pelo pessoal do nosso abrigo (7), para inaugurar as novas reparações. Participou também no jantar o sargento Bonito, o alferes Cruz, o furriel Nogueira e o furriel Amaro. Comeu-se bem e, bebeu-se ainda melhor sempre acompanhado de boa disposição.

Dia 21 - quarta-feira:
A avioneta veio trazer os frescos, frango e outros artigos.

Dia 22 - quinta-feira:
De manhã saiu uma coluna para Camajabá buscar correio, chegaram às 10h.
Ao meio-dia almoçámos frango e, também houve fruta-maçã, o que é difícil chegar à nossa cozinha.

Dia 27 - terça-feira:
Um dia aborrecido. Estivemos a receber material dos que vão ser transferidos para outra companhia, devido ao castigo que lhes foi aplicado, castigo esse que foi por se terem ausentado durante um ataque do IN, quando a companhia se encontrava no mato debaixo de fogo. Pelo que dizem, a maior culpa foi do alferes Magalhães do mesmo pelotão, que se dirigira aos outros comandos, e deixou as secções sozinhas, isto relatam os camaradas.

Dia 28 - quarta-feira:
De manhã saiu uma coluna para Nova Lamego, chegaram à noite e trouxeram correio.
O resto do dia correu tudo normal, e assim até ao dia 31.

Setembro 68
Dia 4 - quarta-feira:
Da parte de tarde a avioneta veio trazer correio mais o nosso capitão, que chegara de gozar férias em Portugal.

Dia 8 - domingo:
Ao meio-dia veio cá a avioneta para levar um doente para o hospital.

Dia 9 - segunda-feira: 
Ao meio-dia voltou a avioneta e trouxe correio. O resto do dia tudo normal.

Dia 12 - quinta-feira:
Eu, o Lemos e o nosso faxina da arrecadação, fomos ver se comprávamos um frango ou uma galinha mas não conseguimos, já nem com dinheiro se consegue o que é preciso, isto porque no rancho geral só há esparguete e vianda.

Dia 13 - sexta-feira:
Saiu uma coluna para Piche, e regressou às 13h30 com os dois obuses, e com o pelotão que trabalhava com eles. A seguir estivemos a armazenar os cunhetes das granadas dos ditos obuses. Depois distribuímos-lhes mantas, porque as que há são só fitas.

Dia 14 - sábado:
De manhã andámos nós e os mecânicos, a arranjar o chuveiro que serve a eles e, a nós. O conserto foi demorado, porque o dito chuveiro é montado em quatro paus ao alto e, depois umas travessas para aguentar com um bidão de 200 litros com uma torneira e uma lata de coca-cola na ponta para fazer de chuveiro. A água é abastecida com um carro próprio, sempre que possível, e assim é a forma de tomar banho em todos os destacamentos.

Dia 15 - domingo:
Veio cá a avioneta com correio, o resto do dia normal.

Dia 16 - segunda-feira:
Às 11h chegou a avioneta com o capitão de operadores dos obuses, que a seguir estiveram a fazer fogo com eles para um acampamento IN, que segundo eles fica a 10 quilómetros daqui, junto à fronteira.

Dia 21 - sábado:
Foi melhor que os dias anteriores, veio a avioneta trazer-nos correio, tirando isso tudo normal.

Dia 22 - domingo:
Dia especial, porque completámos 14 meses de comissão, e de tarde estivemos a ouvir o relato da bola, que hoje deu para ouvirmos através da emissora de Bissau, talvez daqui em diante utilizem o mesmo sistema, assim o esperamos.

Dia 23 - segunda-feira:
De manhã saiu a companhia para uma operação e, ao passar em Camajabá o capitão verificou que havia falta de luz e, mandou-nos preparar petromaxes para os enviar ao destacamento.
Junto à noite formou-se uma tempestade que tirou os oleados que servem de cobertura da arrecadação e, continuava a arrancar as chapas de zinco, mas ao fim de 15 minutos começou a reduzir a força do vento, e não causou mais estragos.

Dia 24 - terça-feira:
De manhã andámos a estender os oleados na cobertura da arrecadação e a tentar segurá-los o melhor possível. De tarde, em virtude de haver informações de que o IN está a 4 quilómetros, ou seja, na fronteira, preparados com artilharia pesada. A nossa aviação, os Fiat e os T-6, andaram a patrulhar a zona para verem se encontravam algo. Nós redobrámos as precauções, apesar de estarmos sempre à espera de novas visitas.

Dia 25 - quarta-feira:
Veio a avioneta civil trazer alimentos, os chamados frescos: frango, peixe, etc. Mas não trouxe correio.

Dia 26 - quinta feira:
Às 7h estivemos a dar material ao pessoal que vai fazer uma coluna a Bambadinca, e levaram os petromaxes para Camajabá. Até ao final do dia tudo continuou normal.

Dia 27 - sexta-feira:
De manhã o nosso capitão avisou o pessoal do abrigo 7, ao qual eu pertenço, pelo facto de estarmos perto da arrecadação, para montarmos segurança à avioneta que vem cá fazer uma evacuação.

Dia 29 - domingo:
Como não há missa, fui ao abrigo 7 arrancar alguns tomateiros que temos lá em alfobre e, plantei-os aqui junto à arrecadação.

Dia 30 - segunda-feira:
Após o almoço chegou a avioneta com o comandante do sector, vindo de Bafatá e com ele o major de operações. A avioneta regressou e eles ficaram.
À noite, já estávamos no abrigo, quando chegou a informação de que o inimigo estava a caminho daqui para nos atacar. Os obuses fizeram fogo a bater a zona indicada e, o certo é que IN não deu sinal, se vinham retiraram-se.

Outubro 68
Dia 1 - terça-feira
Às 8h chegou a avioneta para levar o comandante e o major. Também nos trouxe correio.

Dia 3 - quinta-feira:
Após o meio-dia veio a avioneta trazer o 1.º sargento Bonito, que estava em Nova Lamego, e veio também o capitão do Batalhão que ficará cá alguns dias.

Dia 4 - sexta-feira:
O capelão rezou uma missa pelo falecido Bagaço, morto durante um ataque que sofremos a 28 de Julho. Como não há capela, a missa foi ao ar livre, e só foram à missa os que não estavam em serviço, como é óbvio.

Dia 5 - sábado:
Em virtude de ser feriado, às 7h foi um milícia chamar-me ao abrigo para ir à arrecadação dar-lhe a bandeira, nós, no abrigo ignorávamos que àquela hora havia missa. Assim eu ainda participei. Restante dia tudo normal.

Dia 6 - domingo:
E hoje sim, um domingo com possibilidade de assistir à missa, o que já não acontecia desde que saímos de Nova Lamego. A missa foi às 16h.

Dia 7 - segunda-feira:
Às 8h fui à missa, e de tarde o nosso capitão chamou-me para eu marcar o mês de férias o qual já lhe tinha pedido, e então marquei entre o dia 1 e o dia 5.

Dia 8 - terça-feira:
Como o capelão vai embora, às 8h rezou uma missa tendo antes confessado o pessoal todo ao mesmo tempo. Este foi um bom dia, porque além de nos termos confessado ainda tomámos o Senhor.

Dia 9 - quarta-feira:
Ao meio-dia chegou a coluna de Bambadinca com os géneros e algum cimento.

Dia 12 - sábado:
Nós, os do abrigo 7, passámos a manhã a esticar o arame farpado que pertence à zona do abrigo.
Após o meio-dia, veio a avioneta e trouxe correio.
Restante dia tudo normal.

Dia 16 - quarta-feira:
Das 7h às 9h eu e o Oliveira andámos a cavar terra no pequeno quintal para plantarmos mais crugidades (cultivos de horta).
De tarde veio a avioneta trazer frescos e o correio, que é o que nós aguardamos com mais ansiedade.

Dia 18 - sexta-feira:O meu turno de reforço foi das 3h às 5h, e a seguir estive a dar material – picas – ao pessoal que vai a Piche buscar um pelotão, que vem reforçar-nos enquanto a nossa companhia vai fazer uma operação às 10h.
Chegaram e estivemos a dar-lhes colchões e mantas para eles dormirem distribuídos pelos abrigos.
Também chegou o sargento Ribeiro com uma encomenda para o Oliveira, que os pais lhe mandaram.
De tarde distribuímos material ao nosso pessoal que vai fazer uma operação.
À noite o Oliveira ofereceu presunto, o Ribeiro também comeu, e até pagou umas cervejas.

Dia 19 - sábado:
De manhã, nós e o sargento Ribeiro, estivemos a receber os lençóis velhos e fronhas, e a entregar novos ao pessoal que não foi para a operação.
Às 10h30 chegou a avioneta com armas G3 novas e os respectivos carregadores, mas não trouxe correio.
De seguida conferimos todo o material, e de tarde metemos-lhes as bandoleiras para entregarmos o mais rápido possível aos homens a quem foram destinadas.
Às 17h30 chegou o pessoal da operação que correu bem.

Dia 20 - domingo:
De manhã continuámos a trocar os lençóis e fronhas aos que ontem chegaram da operação. A seguir, estivemos a encartar os lençóis velhos para os mandar para Bissau, quando os pedissem.
À noite houve informações de que tinha passado a fronteira, um grupo de 200 homens para atacarem um destacamento desta zona, e daqui transmitiram a mesma informação para Nova Lamego, Piche Camajabá e Ponte Caium. Nós preparámo-nos para receber esses amigos.
Às 21h os obuses bateram toda a fronteira que lhe estava ao alcance e à meia-noite voltaram a fazer o mesmo, mas retaliação não houve.

Dia 21 - segunda-feira:
Às 4h, os obuses voltaram a fazer fogo batendo novamente a zona, e só pararam às 7h, mas não houve notícias os amigos tivessem aparecido em qualquer destacamento.

Dia 22 - terça-feira:
Fazemos 15 meses de comissão e, cá vamos andando dentro do possível.

Dia 23 - quarta-feira:
A avioneta civil veio trazer frescos, mas não trouxe correio.

Dia 24 - quinta-feira:
Nós e o sargento Ribeiro andámos a conferir armas entre outras coisas, que já não funcionam bem, para serem enviadas para Bissau. Eu entretanto fui à cozinha buscar as sardinhas a que tínhamos direito e assámo-las, tendo também almoçado connosco o sargento Ribeiro.
Restante dia normal.

Dia 26 - sábado:
Esteve cá o Lima, carpinteiro, a preparar uns caixotes para mandar com armamento velho para Bissau.

Dia 28 - segunda-feira:
Ao meio-dia veio a avioneta trazer algumas armas G3 novas, veio também o furriel mecânico de armas e também o correio.

Dia 29 - terça-feira:
De manhã o furriel mecânico de armamento experimentou as bazucas que tinha reparado, e dos lados de Kandicá responderam também com armas pesadas, das quais duas granadas rebentaram muito perto do nosso destacamento, o que nos levou a reforçar de cautelas para esperarmos pelas visitas pela noite, mas tal não aconteceu.

Dia 30 - quarta-feira:
De manhã o mecânico esteve cá na arrecadação a reparar as avarias de algumas G3 de colegas nossos e continuou de tarde.
Às 23h estava eu a sair de reforço e os obuses fizeram fogo a bater a zona, para o IN não tentar qualquer aproximação.

Dia 31 - quinta-feira:
Às 6h os obuses voltaram a fazer fogo com o mesmo sentido, e repetiram a dose às 11h, enquanto nós, e o furriel mecânico de armamento continuámos a reparar algumas armas, e assim findou mais um mês.

Novembro 68
Dia 2 - sábado:
Às 6h foram-me chamar ao abrigo para dar picas, pois a companhia vai a Piche buscar dois pelotões para se concluir uma operação.
Também veio um pelotão de Nova Lamego para reforço, chegaram às 11h e trouxeram correio.
Resto do dia tudo normal.

Dia 3 - domingo:
Às 14h30 vim eu e o Oliveira à arrecadação dar material à malta que ia fazer a operação. Foi o pessoal da nossa companhia e dois pelotões que vieram para esse efeito.
Às 16h30 chegaram os bombardeiros e o helicóptero para apoio do pessoal.

Dia 4 - segunda-feira:
De manhã chegou o pessoal da operação que correu bem.
De tarde estivemos a receber o material (mantas, etc.) que tínhamos distribuído aos três pelotões que vieram reforçar-nos, e que amanhã vão para as suas companhias, em Piche e Nova Lamego.

Dia 5 - terça-feira:
Ao meio-dia veio a avioneta com o comandante de Nova Lamego que veio despedir-se da companhia, pois vamos passar a pertencer a um Batalhão que vem para Piche, aquartelamento em que só existia uma companhia. Também nos trouxeram correio.

Dia 7 - quinta-feira:
Após o meio-dia, chegou a avioneta com um capitão que já cá tinha estado em 64, a população fez-lhe uma festa formidável, em agradecimento ao tempo em que ele cá esteve, e que pelos vistos deixou saudades.

Dia 8 - sexta-feira:
Dia do meu aniversário.
De manhã começaram a preparar a coluna para ir a Bambadinca aos géneros e eu, ao saber disso, fui à secretaria para ver se podia ir com eles, gozando assim a minha licença. Então disseram-me que só podia ir no regresso da coluna, com as viaturas militares e civis de Nova Lamego, e como era para gozar a licença, ainda não sabiam a certeza dos que iam.
De tarde o nosso capitão chamou-nos e disse que eu podia preparar a mala juntamente com mais 7 colegas.

Dia 9 - sábado:
Preparei a mala para estar pronto para partir no dia seguinte rumo a Bissau.

Dia 10 - domingo:
Às 11h chegou a coluna e, como estava previsto parti para Nova Lamego, onde chegamos às 16h30 e lá pernoitei.

Dia 11 - segunda-feira:
Logo de manhã entreguei a arma na arrecadação do Batalhão, e de seguida fomos tentar arranjar viagem no avião Dacota para Bissau, mas já estava completo, mas havia uma coluna para Bambadinca, nós aproveitamos a boleia, onde chegamos às 14h.
Às 15h abriu a secretaria, fomos fazer a apresentação, e disseram-nos para ir ver se os barcos que estavam na doca nos podiam levar, encontrámos um que saía às 2h30 e lá fomos. Até lá demos um passeio por Bambadinca, e às 21h assistimos a um magusto que o batalhão ofereceu por ser dia de S. Martinho.
Também estava lá algum pessoal de uma escolta, a qual tinha sido atacada nas proximidades do Xitole, entretanto chegaram alguns feridos, e um soldado nativo morto.

Dia 12 - terça-feira:
Às 2h30 partimos no barco chamado Girassol rumo a Bissau.
Às 8h30 o barco ficou preso na areia, devido a maré ter baixado e não ter tido tomado a rota mais aconselhável.
Assim, só às 13h a maré começou a encher, e então recomeçámos a viagem, tendo chegado a Bissau às 19h30. Logo fomos a uma pensão comer, e a seguir tratámos de arranjar transporte para os Adidos, como a secretaria estava fechada ficámos lá a pernoitar.

Dia 13 - quarta-feira:
Às 8h fomos entregar as guias à secretaria, de seguida fomos arranjar pensão para passar o mês, que ficou por 1700 pesos, comer e dormir, fora as bebidas.
Às 14h fui à escola de condução para tirar a carta de condução de ligeiros e pesados.

Dia 14 - quinta-feira:
Comecei as aulas e assim continuei todos os dias, excepto aos domingos.
Só o dia 27, quarta-feira, é que foi diferente, porque recebi cá em Bissau o 1.º correio e dinheiro dos meus pais.
Até ao fim do mês tudo normal.

DEZEMBRO 68
Dia 1 - domingo:
Um dia mais próprio para dar um passeio pela cidade, de resto tudo normal até sexta-feira, dia em que meti o pedido na escola para ir a exame, dia 10 ou 11.

Dia 7 - sábado:
O Sr. Ramos, dirigente da escola de condução, chamou-me para me dizer que o meu registo criminal estava caducado, e por tal não podia pedir o exame, mas consegui que ele mo pedisse com urgência para Portugal, a ver se ainda era possível ir a exame, mesmo atrasando a minha ida para a companhia.

Dia 9 - segunda-feira:
Fui ao médico dos Adidos devido à fístula da agulha vertebral, e então ele marcou-me uma consulta para o hospital, e logo me alertou que tinha que ser operado.

Dia 10 - terça-feira:
Além da escola, fui à secretaria dos Adidos entregar a guia da consulta para o comandante assinar.

Dia 11 - quarta-feira:
Em virtude de me terminar a licença fui aos Adidos fazer a apresentação, e levantei a guia para ir à consulta externa, e agora fico a pertencer aos Adidos até que tudo esteja resolvido.

Dia 13 - sexta-feira:
Fui à consulta e fizeram-me algumas análises.

Dia 14 - sábado:
Voltei ao hospital para fazer mais análises, e fui avisado para marcar a passagem na segunda-feira para regressar à companhia.

Dia 16 - segunda-feira:
Às 7h30 fui à secção de transportes expor o meu caso, tinha consulta marcada para hoje no hospital, e então cancelaram a minha viagem, mas no hospital mudaram a consulta para amanhã.

Dia 17 - terça-feira:
Às 15h fui ao hospital e foram-me entregue os resultados das análises para entregar ao médico, mas hoje não o encontrei.

Dia 18 - quarta-feira:
Também não foi possível encontrá-lo, e só fui possível ter consulta dia 20, sexta-feira às 9h, e aí o médico mandou-me fazer mais análises, e nova consulta para o dia 27.

Dia 22 - domingo:
Faz 17 meses que saímos de Lisboa a caminho desta pobre Guiné.
Restante dia tudo como dantes e assim até ao dia 23, segunda-feira.

Dia 24 - terça-feira:
Dia de consoada. Fui passar o Natal com o amigo Libânio ao quartel da Amura. Foi uma ceia muito bem festejada.

Dia 25 - quarta-feira, dia de Natal:
Almocei cá nos adidos, e também foi um almoço natalício muito bom para o lugar que é.
À noite fui jantar à Amura com o amigo Libânio.

Dia 26 - quinta-feira:
Fui ao hospital tirar sangue para análise.

Dia 27 - sexta-feira:
Fui à consulta, mas esta foi mudada para dia 3 do próximo mês, e próximo ano.
E assim até ao dia 31 terça-feira e fim do ano.
Na passagem de ano também ofereceram um jantar melhorado, e assim terminou o ano 68.

ANO 1969
JANEIRO
Dia 2 - quinta-feira:
Chegou o registo criminal e fui à escola para marcarem o exame, o qual ficou marcado para o dia 7.

Dia 3 - sexta-feira:
De manhã fui ao hospital à consulta, e deram-me alta até ao dia 17, dia em que vou ser internado para me operarem.

Dia 5 - domingo:
Fui à secretaria falar com o primeiro-sargento, e ele chamou o delegado do batalhão a que pertence a minha companhia, para lhe entregar a guia de consulta externa para a mandar ao nosso capitão para a assinar. Só assim podia ser operado.

Dia 7 - terça-feira:
Dia do meu exame de condução de ligeiros e pesados profissional.
Às 16h começou o de código, e a seguir a mecânica, e finalmente a condução. Correu tudo bem, felizmente.
A partir daí foi festejar.
Tudo se passou normalmente até ao dia 12, domingo.

Dia 13 - segunda-feira:
Chegaram quatro colegas da minha companhia, que vêm gozar licença, e trouxeram-me boas notícias da companhia, o correio, e o dinheiro do mês de Novembro e Dezembro.

Dia 14 - terça-feira:
Tudo normal e assim até ao dia 24 em que faz três anos que assentei praça em Vila Real, e assim continuou até ao dia 28, terça-feira.

Dia 29 - quarta-feira:
À noite encontrei-me com um cabo da companhia que tinha chegado ferido com mais dois, um dos quais chamado Adão que é da Amarante, este ficou sem a perna direita numa armadilha, que rebentou a uma pequena distância de Buruntuma, durante a patrulha que hoje de manhã andaram a fazer.

(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 26 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13437: Diário da CART 1742 (Mário Alves, 1.º Cabo Corneteiro) (2): Período entre Fevereiro e Julho de 1968 (Abel Santos)

sábado, 26 de julho de 2014

Guiné 63/74 - P13437: Diário da CART 1742 (Mário Alves, 1.º Cabo Corneteiro) (2): Período entre Fevereiro e Julho de 1968 (Abel Santos)

1. Continuação do "Diário da CART 1742" de autoria de Mário dos Anjos Teixeira Alves, 1.º Cabo Corneteiro, enviado ao Blogue pelo nosso camarada Abel Santos (ex-Soldado Atirador da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69).




Diário da CART 1742

Autoria de Mário dos Anjos Teixeira Alves
1.º Cabo Corneteiro
Guiné, 1967/1969

Este diário foi oferecido aos camaradas presentes no 9.º convívio da Companhia de Artilharia 1742, em Campeã - Vila Real de Trás-os-Montes em 25 de Maio de 2013.

Eis a razão
Dos momentos
Da nossa indisposição,
Mandaram-nos para a guerra
Sem a nossa opinião.
Por isso o Salazar
Não terá o nosso perdão.


FEVEREIRO 68
Dia 1 - quinta-feira, às 16h:
Ouvi um alarido e saí para ver o que se passava. Era a arrecadação de géneros e a enfermaria a arder. Vieram os carros de água do Batalhão, mas não conseguiram apagá-lo, pois a cobertura era de capim.

Dia 2 - sexta-feira:
O pessoal na limpeza ao espaço que ardeu.

Dia 3 - sábado:
De manhã estivemos a preparar o material, e à tarde foi entregue aos pelotões que vão montar segurança em redor de Nova Lamego ao presidente Américo Tomás, mas houve camaradas que passaram a noite todos encharcados, já que na travessia de um riacho desequilibraram-se do tronco de uma árvore que fazia de ponte, e um deles foi o Abel Santos. Até as ruas estão todas enfeitadas para ele pensar que isto é um paraíso.

Dia 4 - domingo, às 8h
Chegou o tal presidente da República Américo Tomás, mas nós não podíamos sair, para estarmos preparados para algo de estranho, mas correu tudo bem.
Às 13h3o chegaram os pelotões que tinham ido montar segurança.

Dia 6 - terça-feira:
Chegaram os furriéis com o armamento do Batalhão para o prepararmos, a companhia ia sair no dia seguinte, e nós tivemos de fazer serão a introduzir munições nos carregadores e a pôr o material todo em ordem.

Dia 7 - quarta-feira de manhã:
Estivemos a entregar o material aos pelotões que vão fazer escolta a Béli

Dia 12 - segunda-feira, às 16h:
Chegou a companhia da escolta a Béli que fica na zona de Madina.
No regresso hoje de manhã, entre o Che-Che e Canjadude, uma mina rebentou debaixo de uma das Daimler. Morreu o condutor, e o apontador ficou gravemente ferido, eram do pelotão Daimler, que estavam prestes a ir embora.
O IN não ataca a escolta, porque a aviação faz segurança voando sobre o trajecto que era percorrido pela companhia, por isso só com minas os cobardes faziam asneiras.

Foto da Daimler

Dia 21 - quarta-feira:
Chegou o furriel Nogueira para darmos material ao pelotão dele porque ia sair, mas depois houve novas ordens: já não era preciso e voltaram a entregar o material.

Dia 22 - quinta-feira, das 20h às 23h:
Estivemos a ver cinema cá no destacamento, veio cá o furriel Foto-Cine a pedido dos nossos furriéis e oficiais.

Dia 23 - sexta-feira:
Houve correio e voltámos a ver cinema à mesma hora de ontem.

Dia 25 - domingo:
Carnaval em Portugal, mas aqui contínua tudo mais ou menos o mesmo continuando assim segunda e terça-feira de carnaval.

Dia 28 - quarta-feira:
Parte do dia estive a preparar material, porque a companhia vai sair.

Dia 29 - quinta-feira de manhã:
Entregámos o material à companhia que saiu às 7h30 para fazer mais uma escolta a Madina do Boé.

MARÇO 68
Dia 1- sexta-feira:
Dia de correio e, como sempre quando a companhia sai nós temos que fazer de cabos de dia, da guarda e reforços etc.

Dia 2 - sábado:
Recebi uma encomenda que os meus pais me mandaram. O restante tudo normal.

Dia 4 - segunda-feira, às 15h:
Chegou o pessoal da escolta a Madina, em que houve grande azar, além de terem levantado quatro minas, uma rebentou numa viatura que ficou danificada, mas só o alferes Cruz é que ficou com uns ligeiros ferimentos com as areias felizmente.
Tudo normal.

Dia 6 - quarta-feira:
Na formatura do almoço esteve cá o comandante do Batalhão a dar um elogio ao bom comportamento da nossa companhia.

Dia 7 - quinta-feira de manhã:
Entregámos material a um pelotão que saiu de tarde, esteve cá o sargento Ribeiro e estivemos a conferir material.

Dia 8 - sexta de manhã:
Demos material a dois pelotões que saíram, e a seguir continuámos a conferir material com o sargento Ribeiro.

Dia 10 - domingo de tarde:
Os fulas fizeram uma festa com o batuque deles em frente ao destacamento, tirando isso tudo normal, e assim continuou até ao dia 15, dia em que chegou o correio.
À tarde pelas 18h fui á missa em honra do furriel que morreu em Buruntuma.

Dia 19 - terça-feira de manhã: 
Estivemos eu e o Oliveira como sempre, a preparar o armamento a municiar os carregadores da Drayse e fitas da MG42 etc.
De tarde fizemos a entrega do material à companhia que amanhã vai fazer mais uma escolta a Béli, e depois do jantar distribuímos mantas ao pelotão de Canquelifá, que vem para nos ajudar a fazer a segurança cá no destacamento, como sempre.

Dia 20 - quarta-feira, às 5h da manhã:
Chegou o nosso capitão e um condutor para carregar as munições, e continuámos a dar o restante material, o que ainda era necessário, e lá partiram às 6h.
À tarde estivemos a arrecadar o material da companhia de Fá, que ficam cá hoje, para irem amanhã fazer uma operação.

Dia 21- quinta-feira, às 3h da manhã:
Veio a companhia de Fá levantar o material que nós guardámos ontem.
Às 7h30 chegou uma GMC com material da mesma companhia, pois quando caminharam a pé, não o puderam levar todo e deixaram-no aqui guardado.
Também foi dia de correio.

Dia 22 - sexta-feira: 
Faz oito meses que embarcámos em Lisboa.
De dia tudo normal, mas à noite não havia pessoal para fazer reforço. Depois resolveram que seria o pelotão de Canquelifá a fazê-lo, os quais normalmente só estão de prevenção.

Dia 23 - sábado, às 21h45:
Chegou a companhia de Fá e estivemos a arrecadar o material deles. Eles disseram-nos que tinha corrido tudo bem.

Dia 24 - domingo, às 17h30:
Chegou a nossa companhia da escolta a Béli. Correu tudo bem felizmente, e assim estivemos a receber o material, e depois distribuir mantas ao pelotão de Fá que esteve de serviço.

Dia 26 - terça-feira, de manhã:
Demos material a diversos da companhia para irem fazer algumas demonstrações para filmar, e às 18h30 vieram entregar esse material.

Dia 27 - quarta-feira:
De manhã estivemos a fazer limpeza a algum material, de tarde tudo normal.

Dia 28 - quinta feira, às 13h:
Houve ordens para a companhia sair imediatamente e estivemos a entregar-lhe o material, às 17h30 chegaram novamente.
A operação que foram fazer foi em perseguição a um grupo IN, mas como não os encontraram, não demoraram muito.

Dia 29 - sexta-feira:
Dia de correio, e depois tudo normal tal como no dia 30 e 31, em que termina mais um mesito.

ABRIL 68
Dia 1 - segunda-feira de manhã:
Estivemos a descarregar os carregadores das Drayses, que são armas para entregar ao Batalhão.
Às 10h recebemos o pré que habitualmente se recebe no dia 1 de cada mês.
Às 16h estivemos a distribuir material a todos os pelotões da companhia, que amanhã vão fazer uma operação.

Dia 2 - terça-feira:
Sai a companhia para a dita operação.

Dia 3 - quarta-feira, às 17h30:
Chegou a companhia da operação que haviam feito e tudo correu bem felizmente.
E assim tudo continuou normal até ao dia 7 domingo, dia em que o Oliveira partiu no Dacota para Bissau, para ir passar férias em Portugal.

Dia 10 - quarta-feira, de manhã:
Estive a encaixotar material para levarmos a um novo destacamento que segundo dizem, será Buruntuma. E assim tudo normal até ao dia 12, em que às 16h formou a companhia, e dois pelotões receberam ordens para preparar tudo, para amanhã irem para o nosso novo destacamento: Buruntuma.

Dia 13 - sábado, às 5h da manhã:
Vieram os dois pelotões levantar as armas pesadas para levar, e entregar o resto do material que fica nesta arrecadação, também foi outro pelotão escoltá-los, o qual chegou às 13h30.
À noite chegou a companhia PIRIQUITA que nos vem substituir.

Dia 14 - domingo, dia de Páscoa na Metrópole:
Continuei a receber material que era para ficar e, distribui mantas ao nosso pessoal para dormir, porque a caserna foi entregue à nova companhia.

Dia 15 - segunda-feira:
Após o café estive a receber as mantas do nosso pessoal, as quais voltei a entregar à noite, visto que ainda cá continuámos, entreguei também material à companhia nova para amanhã irem fazer uma escolta a Madina.

Dia 17 - quarta-feira, das 5h30 às 7h30:
Estivemos a carregar material para o primeiro pelotão levar para Buruntuma. O sargento Ribeiro foi levantar à arrecadação de lá, e eu fiquei a entregar nesta.
Junto com o furriel Carrola, às 10h, começámos a conferir o material com o 1.º sargento da nova companhia mas de tarde interrompemos por termos recebido a notícia que na escolta a Madina rebentou uma mina, tendo morrido um alferes, e um cabo ficou sem uma perna, e o 1.º sargento deles teve de tratar desses assuntos, mau começo para esses rapazes.

Dia 18 - quinta-feira:
Eu e o quarteleiro da nova companhia continuámos a conferir o material e, no dia 19 prosseguimos com a ajuda do 1.º sargento e do furriel Carrola e assim continuámos no dia 20.

Dia 21 - domingo:
Continuámos no mesmo trabalho e, às17h chegou a companhia PIRA da escolta a Madina, que no regresso foram atacados ao atravessar na jangada o rio Corubal no Che-Che. Houve um soldado e um 1.º cabo, que eram da CCS, que ficaram afogados no rio e não mais apareceram.

Dia 22 - segunda-feira:
Continuámos a conferir o material, quando acabámos o 1º sargento abriu a cantina e pagou umas cervejas ao quarteleiro dele, a mim e ao furriel Carrola.

Dia 23-terça feira:
Depois das 6h andei a carregar o que me competia trazer, a própria bagagem, etc.
Às 7h30 iniciámos a viagem para Buruntuma onde chegámos às 11h30 e, assim tomei conta da nova arrecadação.

Dia 24 - quarta-feira:
Andei a arrumar o material que veio de Nova Lamego e à noite fiz uma hora de reforço, o que irá acontecer todos os dias, visto que as secções dos pelotões estão distribuídas cada uma em seu abrigo, e dá para todos fazerem uma hora por noite.

Dia 26 - sexta-feira, de manhã:
A companhia que vai embora, esteve a carregar o material para estarem prontos para irem manhã cedo.

Dia 27 - sábado:
Às 5h a companhia velha partiu para a Peluda e, foi um pelotão nosso montar segurança e, levou algum material para o destacamento de Camajabá e ponte do rio Caium, onde temos pessoal, instalado.

Dia 30 - terça-feira:
De tarde houve correio e pré, o nosso capitão mesmo aqui no cúmulo do mato e, na fronteira com a Guiné Conacri, exigiu que fossemos receber devidamente fardados.

MAIO 68
Dia 5 - domingo:
Após o meio-dia chegou a coluna com os géneros e o correio e, voltou novamente outro pelotão em outra coluna, para trazer mais géneros, para evitar que aconteça termos só bianda (arroz) para o pessoal comer, como andámos já há bastantes dias.
E assim continua tudo normal até ao dia 10.

Dia 10 - sexta-feira:
Dia em que houve correio, que é sempre um dia especial.
E assim tudo continuou bem até dia 14, em que o capitão me mandou chamar cedo para lhe entregar material, para a companhia sair para uma pequena operação.
Chegaram às 11h30, tendo corrido tudo bem.
Até ao dia 16 tudo normal.

Dia 17 - sexta-feira:
Às 5h estive a entregar material à companhia, pois iam fazer uma coluna para reabastecimento de géneros e não só.

Dia 18 -s ábado:
Chegou a coluna com toda a normalidade e, assim tudo normal até ao dia 21.

Dia 22 - quarta-feira:
Faz 10 meses que correspondem a 10 anos, que embarcámos em Lisboa.

Dia 23 - quinta-feira:
Começamos com o arranjo do nosso abrigo (7), que estava a abater. Os abrigos são cobertos por troncos de árvores grossas, colocadas lado a lado, e a seguir levam chapas de bidões abertos e, por cima algum cimento com areia. Por fim uma boa altura de terra para estarmos mais abrigados das granadas e morteiradas do IN.

Dia 24 - sexta-feira:
Fomos arrastar troncos até dia 26.

Dia 27 - segunda-feira:
Chegou o Oliveira (colega da arrecadação) de gozar a licença em Portugal, mas os trabalhos no abrigo continuam e assim até ao dia 30.

Dia 31- sexta-feira:
Término dos trabalhos no abrigo.

JUNHO 68
Dia 5 - quarta-feira:
Ao meio-dia chegaram os camaradas que foram ajudar a fazer a escolta a Madina e, trouxeram o correio.

Dia 8 - sábado de manhã:
Estivemos a dar material à companhia que foi a Bambadinca aos géneros, os quais chegaram dia 9 às 13h. Também trouxeram correio, tendo sido assim um bom domingo para todos.

Dia 10 - segunda-feira, de manhã: 
Recebemos o material de aquartelamento, da secção que vai para Béli juntar-se ao pelotão que já se encontra em Madina do Boé há alguns dias, mantendo-se a normalidade até ao dia 14.

Dia 15 - sábado de manhã:
Estivemos a dar material aos que vão fazer a coluna a Bambadinca.

Dia 16 - domingo de tarde:
Vieram cá os de Canquelifá e, trouxeram o correio, até ao dia 21 tudo normal.

Dia 22 - sábado:
Faz onze meses que deixámos Portugal.
Depois ao meio dia veio cá o nosso Governador e Comandante-Chefe, o que para nós foi muito agradável.

Dia 26 - quarta-feira:
Hoje saiu a companhia para fazer a operação mensal, tendo corrido tudo normalmente. Prolongando-se assim até ao dia 29.
Fim do mês.

JULHO 68
Dia 1-segunda feira:
É dia de pré e restante tudo normal até ao dia 6.

Dia 7 - domingo:
De manhã os oficiais e sargentos tiveram uma festa de anos, e o nosso capitão queria que eu fosse tocar o clarim para hastear a bandeira, mas os mesmos não estavam em condições, não podendo assim satisfazer-lhe a vontade.
Ao meio-dia chegou o pelotão que tinha ido para Madina, tendo estado ultimamente, no Che-Che.
O pelotão que estava cá que era de Piche regressou à companhia.
E por cá correu tudo dentro da normalidade até ao dia 10.

Dia 11 - quinta-feira:
Às 11h saiu uma coluna para a Bambadinca buscar géneros, e fui também com eles, para ir a Nova Lamego ao médico, derivado a uma fístula.
Ao chegar a Nova lamego, o Moura atropelou uma criança que acabou por morrer.
Quando chegámos o médico já não me consultou por ser tarde, e então ficamos lá.
No dia seguinte às 6h, fui com o meu pessoal a Bambadinca carregar as viaturas. No regresso avariaram algumas e só chegamos a Nova Lamego de noite, onde pernoitamos.

Dia 13 - sábado:
De manhã, a coluna não podia esperar que eu fosse ao médico, então eu regressei com eles mesmo sem ter sido consultado.
As coisas foram correndo bem até ao dia 16.

Dia 17 - quarta-feira:
De tarde veio cá a avioneta e trouxe correio.

Dia 20 - sábado:
Às 10h o furriel enfermeiro veio avisar-me que vai uma escolta a Bambadinca perguntando-me se eu queria ir ao médico, e eu respondi-lhe que desta vez não vinha embora sem ser consultado, aproveitei e partimos ao meio-dia e trinta, chegando a Nova Lamego às 16h, onde fomos logo à consulta, passando cá a noite.

Dia 21 - domingo:
Às 6h30 continuámos a viagem para Bambadinca onde chegámos às 10h30, e ainda assistimos à missa que estava a ser celebrada na capela.
Às 14h30 já os carros estavam carregados e começámos a viagem de regresso.
Depois de Bafatá, o Matos que era o condutor da viatura em que eu seguia, deixou-a encostar demasiado à berma e eu, que trazia o joelho da perna esquerda um pouco saliente, ao chocar com o taipal com uma árvore pensei ter fracturado o mesmo, mas felizmente só ficou pisado.
Ao chegar a Nova Lamego fui à enfermaria, e fizeram-me o curativo.

Dia 22 - segunda:
Às 7h30 iniciamos a viagem a caminho de Buruntuma onde chegámos às 11h30.
De tarde fui à enfermaria fazer o curativo à perna.
A seguir os furriéis e o alferes Cruz - que é provisoriamente o comandante da companhia enquanto o capitão está um mês de férias em Portugal - junto com alguns soldados e levaram o bombo e alguns clarins mesmo danificados. Só não levaram as caixas porque não têm conserto. Então com o Pereiro, com o acordeão que mandou o Movimento Nacional Feminino, foram fazer ronco (festa) em volta dos abrigos, a festejar um ano de Guiné, ou que partimos de Lisboa.
Nos dois dias seguintes tudo normal.

Dia 25 - quinta-feira:
Já de noite, quando o Penafiel me chamou, comecei a ouvir rebentamentos que vinham de Camajabá, era o IN que fez uma visita à malta.

Dia 26 - sexta-feira:
Logo pela manhã foi-nos dado conhecimento que as nossas tropas de Camajabá não sofreram baixas nem feridos graves.

Dia 27 - sábado:
Saiu uma escolta para Nova Lamego. Restante dia tudo normal.

Dia 28 - domingo:
Às 19h15 fomos surpreendidos por uma grande descarga de fogo do IN, e eu, o Oliveira e o Lemos que estava connosco, corremos para o abrigo do primeiro socorro, onde já estava o 1.º sargento Bonito.
Era um estrondo ensurdecedor, pela quantidade de granadas e rajadas de armas ligeiras que caíam cá no destacamento. Só quando o nosso pessoal reagiu abrindo fogo, e umas morteiradas foram lançadas é que eles abrandaram, e foram corridos dali graças à nossa pronta intervenção.
Às 20h20 demos por terminado o ataque ao aquartelamento.
Foi então averiguado o que tinha acontecido ao nosso pessoal, e foi-nos dito que o apontador do morteiro 81, o Bagaço, nome pelo qual era conhecido, ficou gravemente ferido.
Eu e o Oliveira fomos dormir à tabanca dos mecânicos, por ser o abrigo mais próximo.

Dia 29 - segunda-feira:
Bem cedo, foi-nos dado a fraca notícia que o Bagaço acabou por morrer à meia-noite, a seguir andámos a ver os estragos que os morteiros e os roquetes fizeram.
Eu e o Oliveira tínhamos um cão que apesar de pequeno, ficou quase desfeito à porta da arrecadação.
Às 7h30 chegaram duas avionetas para levarem os feridos e o falecido mas, mas como não cabiam todos, e foram os de maior gravidade, e às 18h30 voltaram novamente para levar os restantes todos negros, e só aí foi o falecido.
Também faleceu um negro, mas esse foi enterrado pelos familiares.

Dia 30 - terça-feira: 
De manhã começamos a renovar o abrigo que fica entre a secretaria e a arrecadação, e foi-nos dito que na noite passada no abrigo 9 ia um indivíduo a rastejar em direcção à sentinela, o qual ao dar conta lhe deu um tiro mas não o atingiu e o tipo fugiu por entre as tabancas sem deixar rasto.
De agora em diante para prevenir, o reforço será dois a dois, evidentemente que faremos o dobro do tempo.

Dia 31 - quarta-feira:
Mais um final de mês, que só deixa más recordações.

(Continua)
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Nota do editor

Vd. primeiro poste da série de 24 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13434: Diário da CART 1742 (Mário Alves, 1.º Cabo Corneteiro) (1): Período entre Agosto de 1967 e Janeiro de 1968 (Abel Santos)