1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Mexia Alves*, ex-Alf Mil Op Esp/RANGER da CART 3492, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73, com data de 26 de Julho de 2010:
Caros camarigos editores
Com a força do calor aqui vai mais um escrito para a série.
Por acaso às vezes vem-me uma saudade da cerveja fresquinha que o Festas, (o encarregado do bar no Xitole), me trazia depois de uma "caminhada" pela mata.
Tinha um sabor que não mais encontrei!
Devia ser devido às circunstâncias, claro, e à arca frigorífica e petróleo!!!
Um abraço camarigo para todos do
Joaquim
DEPOIS DA GUINÉ, À PROCURA DE MIM
20 ANOS DEPOIS (9)
ESTAR LÁ, ESTANDO CÁ
O olhar fito no longe,
o pensamento vazio,
na procura de um momento,
um momento único,
e fugaz,
que me afaste da vida,
que todo ele seja paz,
que me traga pelo vento,
os ruídos e os cheiros,
que lá longe, bem longe
um dia deixei para trás.
Não quero sequer perceber,
o porquê desta saudade,
tão estranha,
e tão sentida,
de algo que eu não queria,
mas que morde o meu viver,
que me agarra àquela terra,
onde deixei a idade,
toda gasta numa guerra.
Onde estão agora,
o que fazem?
Será hora de sair,
ou será tempo de ficar?
Será tempo de suar,
o medo duma saída,
ou será tempo de repensar
num só momento,
uma vida?
Porque que é que sinto este desejo
de estar ali,
de onde me libertei,
ali com eles,
à volta de coisa nenhuma,
numa terra tão distante,
de gentes tão diferentes,
e no entanto tão perto,
tão perto do coração
que ali aprisionei!
Que coisa é esta tão estranha,
que me leva a querer estar,
num lugar que em cada dia,
ambicionava deixar!
Será verdade o que dizem,
que África é como um vírus,
que se agarra à nossa pele,
se faz todo sentimento,
se faz saudade e tormento,
que nos chama,
nos impele,
a querer lá viver,
sem lá estar,
e estando lá,
querer partir.
É curioso pensar,
que só os qu’ inda lá estão,
aqueles que por lá passaram,
e os que para lá partirão,
percebem tudo o que eu digo,
percebem até melhor,
o que eu guardo,
e nunca conto.
Ah, terrível ansiedade,
que se gera no meu peito,
se lá estou,
quero ir embora,
se parto,
quero voltar!
Será que não há modo,
nem jeito,
de estando aqui,
lá estar,
de estando lá,
regressar?
O olhar fito no longe,
o pensamento vazio,
na procura de um momento,
um momento único,
e fugaz,
que me afaste da guerra,
me traga de volta á terra,
à terra que me viu nascer,
e me envolva na paz.
07.01.1992
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 15 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6742: Depois da Guiné, à procura de mim (J. Mexia Alves) (8): Foi-se a Paz
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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2 comentários:
CARO MEXIA,
"QUE COISA É ESTA TÃO ESTRANHA,
QUE ME LEVA A QUERER ESTAR,
NUM LUGAR QUE EM CADA DIA,
AMBICIONAVA DEIXAR!
ÁFRICA INEBRIA,COMO CORPO DE MULHER...
DÁ PRAZER,EXTASIA,FAZ DO HOMEM
O QUE QUER...
DE FACTO DEVE SER O TAL VIRUS A QUE TE REFERES...
AI QUE SAUDADE TÃO GRANDE.
QUISERA EU LÁ VOLTAR.
MAIS UM TRABALHO COM MARCA NA OURELA.
PARABÉNS.
ABRAÇO
MANUELMAIA
ABRAÇO
Meu camarigo Manuel Maia
Isto quase parece uma troca de "galhardetes", mas agradeço sinceramente as tuas palavras.
Um abraço
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