quarta-feira, 23 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2790: Quem pode ajudar a filha do nosso camarada Aliu Sada Candé? (José Teixeira)

José Teixeira
ex-1.º Cabo Enfermeiro
CCAÇ 2381
Buba, Quebo, Mampatá e Empada ,
(1968/70)



No dia 22 de Abril de 2008, recebemos esta mensagem do nosso camarada José Teixeira:

Caríssimo Luís Graça e companheiros co-editores.

Há dias enviei-vos este pedido/apelo, como ainda não recebi feedback, tomei a liberdade de insistir. Por favor informem se os outros textos que enviei vão ser publicados ou não.
Abraço Saúde paz e felicidade.

Já vos falei do Candé, de nome próprio Aliu Sada Candé, que conheci em Aldeia Formosa (Quebo) em 1968 e da sua formosa filha Cadidjatu Candé, que tive o prazer de conhecer recentemente em Guiledge como elemento da equipa do staff do Simpósio.

Acabo de receber fotocópias da Caderneta do Aliu Candé, em sequência do pedido que a Cadi me fez, para tentar obter a reforma do pai, o que não creio ser possível, mas não há como tentar.

Para melhor vos situar, junto o teor da correspondência trocada


1. Oi José!

Fiquei muita satisfeita por ter recebido a tua mensagem e por outro lado sinto muito feliz de encontrar um tio como senhor. Gostaria que o senhor mi ajuda-se a encontrar os documentos do meu pai para que eu posso fazer as papelada e a reforma? Tambem gostaria que o senhor mi arranjaste o numero telfone de Matos[ Cor Carlos Matos Gomes].

Gostei muito de ti conhecer espero que vamos continuar a corresponder, meu tio quirido.

Receba um forte abraço da tua sobrinha Cadi.


2. Cadi.

Fiquei feliz ao receber notícias tuas. Devo dizer-te que ao saber pelo Mudé Embaló já lá vão muitos anos, da forma como foi assassinado o teu pai, fiquei muito triste e revoltado.

Assim, quando te vi e soube que eras filha do Candé fiquei naturalmente feliz por te conhecer.

Eu pouco tempo convivi com ele. Estive cerca de um mês em Quebo e fiz duas colunas a Buba e uma a Gandembel. Depois fui colocado em Mampatá e nunca mais tive contacto com o Candé. Apenas retenho a imagem de um homem alto e magro, que no campo da guerra merecia o respeito dos camaradas e dos adversários pela sua coragem e determinação.

Gostava de te poder ajudar no que me pedes, mas creio bem que não vai ser fácil, até porque o teu pai já morreu há muito tempo. De qualquer modo pode-se tentar.

Para poder tentar conseguir responder-te, preciso de saber:

- O nome completo de teu pai;
- A sua história militar, isto é: em que ano se inscreveu na Milicia e em que Companhias/pelotões de milícia esteve e ou comandou;
- O posto ou função (Creio que em 1968 era Alferes de milicia e comandante de pelotão);
- Em que ano foi incorporado no exército português e que funções exerceu;
- Se possível o seu número mecanográfico do Exército Português.
- Em que quartéis esteve, durante a guerra. Sei que em 1972 estava em Quebo na CCAÇ 18
- A data da sua morte. Se possível a forma como foi assassinado.

Sei que não será fácil obter estes elementos identificativos do teu pai, mas são necessários para localizar a sua folha de serviços no Exército.
Beijo


3. Bom dia José Teixeira!
queria que o senhor mi manda-se o numero de fax porque eu tenho caderneta conpleto do meu pai ok.tchou beijssssssssssssssssssssssssssssssss



4. Minina bonito, como stá ?

Aqui tudo bem, mas muita saudade da Guiné e suas gentes.

Foi muito bom estar por aí uns dias, mas criam-se raízes, o que é bom, mas se torna doloroso logo de seguida, quando temos de vir embora para a nossa terra.

Bem, quanto ao assunto do teu pai, fico contente por teres os elementos da caderneta. Assim, torna-se mais fácil tentar alguma coisa. Podes enviar para o fax 0035122088835. Deves colocar uma folha com a seguite indicação: - Peço o favor de entregar ao José Teixeira.

Como te disse soube pelo Mudé, teu primo, algumas coisas sobre a morte do teu pai. Precisava de saber mais coisas para eventualmente se fazer uma exposição ao Ministro.

Sei que logo após a Independência foi preso, levado para a sua terra natal que suponho é Bambadinca, julgado num tribunal popular e condenado à morte por prego espetado na cabeça.

Disse-me ele também que houve uma forte mobilização da população local, com o argumento que o homem grande de Bissau ia lá passar, o que se demonstrou era falso. A população juntou-se toda, a juventude do PAIGC instrumentalizou-a (fez agitação) e deu-se um julgamento fora de todas as regras de justiça.

Apesar de tu na altura da morte ainda seres pequenina, possivelmente tens dados em teu poder que ajudarão.

Precisava de saber:
- Onde estava quando foi preso;
- Quanto tempo esteve preso;
- Se durante a prisão foi violentado;
- Onde foi julgado, se houve julgamento;
- Quem foi que o julgou, militares ou civis;
- Quais foram as acusações;
- Qual a condenação ou sentença;
- Como se processou a sentença, isto é, como morreu, onde e o que se passou a seguir.

Por favor responde ao que puderes ou souberes.
Ficando à espera da tua resposta.


5. Oi meu tio querido?

Vou dando tudo que eu sei sobre a morte do meu pai:
- Ele estava no Aldeia Furmosa (Quebo) ele tava no campo a fazer agricultura,
- Ele tava preso em Banbadinca depois foi transfirido para tchim [Xime];
- Depois da ultima visita da minha avô numca mais sabemos dele;
- Claro que foi maltratado porque não vimos o corpo dele e nen sabemos onde Foi sepoltado;
- Foi acuzado de que ele foi dos elementos a não aceitar a entrada do PAIGC;

E tudo o que eu soube sobre a morte do meu pai. Vou ti enviar a copia da cadermeta e outros documentos. Vou contando com a tua ajuda
Cadidjatu


6. Caros amigos.

Parece que eu sei mais sobre a morte do Candé do que a própria filha, ou então ela não quiz dizer tudo. Infelizmente já não posso consultar a minha fonte de origem, pois faleceu há cerca de dois anos. Sei que na altura do acontecimento, estava em Bissau a estudar. Talvez por isso tenha conseguido obter mais elementos.

Outras questões sobre a actividade do Candé se põe eu gostava de aferir:
Quando o conheci em Quebo - Julho de 1968 - usava galões de alferes, dizia-se "alfero de 2ª linha" (milicia) e comandava um temível pelotão de milícias - Grupo de Caçadores Nativos "Relâmpago"

Sobre esse grupo escrevi no "Meu Diário"

Aldeia Formosa, 9 de Agosto de 1968

...Um pelotão de milícia de Aldeia Formosa foi bater a zona de Mampatá (estrada de Colibuia/Bolola), para confundir o IN (enquanto a coluna de Buba, na qual eu me incluia, fazia o trajecto pela estrada de Nhala, sem incidentes) e sofreu dois mortos e três feridos.

Trouxe orelhas de vários IN, mortos durante o combate. É horrível, Senhor... dois mortos e três feridos e... orelhas de vários IN mortos.

Alguns, foi a sangue frio, segundo dizem, depois de serem descobertos com ferimentos que os impediam de fugir. Tudo isto é guerra, enquanto uns estavam na rectaguarda feridos, outros, autênticas feras, procuravam IN, irmãos de raça, para os assassinarem.

Os homens não ouvem a voz de Deus, abafam a tua voz com o matraquear das armas. Matar pessoas, porquê? ... E aquele corte de orelhas, vitorioso!?... Como se fosse um animal! E se fosse, quem deu ao homem tal direito?!...


Note-se que tanto quanto me foi dito pelo enfermeiro da CCAÇ 1792 - Os Lenços Azuís - o "alfero" Candé e seus homens arrancaram de peito aberto para o Inimigo, para forçar o cerco em que estavam a ser submetidos.

Verifico pela Caderneta que o Candé era soldado do Exército Português desde Maio de 1966, chegando a alferes graduado do Exército Português.

Que caminhada! Talvez o Mário Dias o conheça e possa desmistificar um pouco.

Uma dúvida se me põe e para a qual queria a vossa ajuda ou dos bloguistas mais conhecedores. Tal situação era possível? Ou seja, Nativo, Soldado do Exército em serviço na milicia local com o posto de Alferes?

O seu curriculum militar demonstra uma carreira militar bem cheia, pelo que possivelmente é conhecido por alguns dos bloguistas. Talvez se consiga mais alguma luz sobre este homem que segundo consta morreu da forma mais inglória, "ai dos vencidos".

A razão que me leva a voltar ao Candé, é o seguinte:

A Cadi pretende obter os direitos de reforma do pai. Será que algum dos bloguistas tem conhecimentos que possam ajudar a pequena?

Eu, francamente, não sei por onde possa pegar, no sentido de a ajudar, no mínimo a esclarecê-la.

Aqui fica o apelo.

Junto cópias da caderneta.

Fraternal abraço.
Zé Teixeira





Foto 1> Registo de Apresentações e Disponibilidade




Foto 2> Registo Criminal e Disciplinar




Foto 3> Promoções e Colocações




Foto 4> Prémios, Condecorações e Louvores




Foto 5> Habilitações




Foto 6> Foto de família com Castro Neves




Foto 7> Foto de Aliu Sada Candé




Foto 8> Candé com amigos em Lisboa - Prémio Governador



Foto 9> Avó com Castro Neves




Foto 10> Aliu Sada Candé com Castro Neves



7. Comentário de C.V.

Face ao apresentado, o nosso bom camarada José Teixeira está perante um problema de difícil resolução, tanto mais que a maioria dos elementos necessários para tratamento do processo se encontram em Lisboa.

Tendo o camarada Aliu sido assassinado há já muito tempo, pelos vistos com todos os requintes de malvadez e selvajaria, reconstruir todo o processo é tarefa gigante.

Deixamos no entanto no ar o pedido de ajuda a quem por localização geográfica mais favorável, por se mexer melhor nos meandros da burocracia, por disponibilidade de tempo e por último, mas não menos importante, por ser solidário, possa dar uma ajuda ao Zé Teixeira que tem um coração enorme e um amor aos nossos irmãos guineenses como raramente se vê.

Adivinha-se a quantidade de ex-combatentes guineenses, angolanos e moçambicanos, nossos camaradas, que foram assassinados a sangue frio por represália a atitudes menos correctas tidas em campanha.

Mas... Quem nunca pecou que atire a primeira pedra.
_________________

Nota de C.V.:

(1) Vd. poste de 1 de Abril de 2008> Guiné 63/74 - P2710: Os filhos dos que lutaram ao nosso lado (José Teixeira)

2 comentários:

Anónimo disse...

Em Angola, tanto os comandos, flexas, e militares do exercito normal, foram disputados pelos diversos movimentos para continuar a guerra de libertação, que durou mais quase 30 anos.
Em Moçambique, não seria muito diferente, porque a guerra continuou por mais quase 20 anos.
Talvez só agora passados trinta e tal anos, com a divulgação de blogs e noticiários sobre a guerra da Guiné, quem passou só por Angola, venha a compreender melhor o que foi a guerra do Ultramar.

Antº Rosinha

Anónimo disse...

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