segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7545: (Ex)citações (123): Poderá um velho soldado como tu algum dia regressar a casa ? (José Belo)



1. Do nosso camarigo J. Belo, régulo da Tabanca da Lapónia:


Depois de ler algumas das reflexöes dos Camaradas Militares
ao longo do ano de 2010 
no Blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné,
verifico continuarem, alguns, 
com mais dificuldades que outros 
em... regressarem.

Não sei se, 
mesmo com a fantástica terapia de grupo 
que aquele blogue a todos tem proporcionado, 
as difíceis experiências de uma guerra como a da Guiné 
algum dia permitirão um regresso completo... 

O que poderíamos ter sido SE... 
E as décadas vão passando. 
Lutas de vida e morte apodrecem 
em páginas amarelecidas de velhos jornais guardados... 
Memórias sem sentido 
por já não se intercalarem...
Gerações novas ignorando raízes de tanta dor...
Os ideais morrem em círculos cada vez mais rápidos... 
São outros os tempos,
tempos de aceitação. 

Para ti? Para ti é tarde...
E poderá um velho soldado como tu  algum dia regressar a casa?

[Revisão / fixação de texto / adaptação e reprodução com a vénia possível que a ciática da perna esquerda e a temperatura ambiente mo permitem... L.G.]

2. Contra-comentário de L.G.:

Esta foi, meu caro José (Joseph, para os lapões)
 a pergunta mais angustiante que me puseram hoje.
Porra (com a tua licença e a dos lapões),
e logo no início do ano de 2011...

Mentiria se dissesse que sabia qual a resposta a dar-te,
a ti e aos demais camaradas, amigos e camarigos...
Não, não sei dar-te a resposta...
Pessoalmente não tenho a resposta.
Algum de nós a terá ?
Acredito que sim...
Há gente que tem respostas (e certezas)
para tudo (ou quase tudo)...
Que  bom para eles (e elas)!...

Se calhar, somos nós que tornamos complexo o que é simples...
Ou simplificamos o complexo...

E depois, José, há a casa do soldado, a nossa casa...
Qual ? Quais ?...
Conhecemos tantas cas(ern)as...
Nenhum de nós regressou o mesmo,
nem muito menos à mesma casa...
Não era o nosso General [Spínola] que dizia:
 Chegastes meninos, partistes homens !?...
(O nosso Luís Dias é que a ouviu e registou,
a famosa frase,
eu não me lembro de nunca a ter ouvido,
da boca do nosso General
nas duas únicas vezes que o vi,
uma de longe, em Bissau,
outra face a face,
no destacamento da ponte do Rio Udunduma,
faz agora 40 anos...)....

E tu, camarigo, velho soldado e viajante:
onde é a tua casa ?...
A minha, gostaria que fosse tão grande como o mundo
(que é cada vez mais pequeno, acanhado e claustrofóbico)...
Tão grande ao menos como a morança da tua tabanca,
from Lappland to Keyt-West....
Não é muito importante onde fica o marco geodésico do mundo
(Lourinhã,
Candoz,
Bambadinca,
Belmonte,
Buba,
Empada,
Kalmar,
Lamego,
Gandembel,
Guidage,
Guileje,
Tavira,
Matosinhos,
Ponta do Inglês,
Mafra,
Cu de Judas,
Fundão,
Milho Rei,
Quelelé,
Mindelo,
Freixo de Espada à Cinta,
Farim do Cantanhez,
Vila de Rei,
Ponta de Sagres,
Monte Real,
Ilha de Luanda,
Bissalanca,
Metangula,
Abisco,
Kiruna,
Buarcos,
Missirá,
Macau,
Cussilinta,
Ouro Preto,
Moscovo,
Brasília,
Wall Street,
Pequim ?...)

Que importa se o marco geodésico do mundo
fica no norte ou no sul,
no leste ou no oeste ?
Afinal, o  Mundo é Pequeno
e a nossa Tabanca... é Grande!

Mas um dia prometemos fazer-te uma visita...
 Espero não  ter insónias no 2º dia do Ano
(Novo, dizem)
que aí vem...
De Lisboa, outrora capital do império,
 com saudade(s)
 e com todos os meus quatro humores...
(para ti e para o Vasco do Cumbijã/Buarcos,
o único que te agora te mandou um comentário
porque se calhar é o único que fala o teu dialecto luso-lapão) ...

Luís

PS - O Vasco, Kadé dele ?
Sim, o nosso Vasco da Gama ?
Kadé o seu comentário nas paredes geladas da tua morança ?
Esta noite juro que o vi por Abisco ou arredores...
E até passei pela Figueira da Foz
que fica ali para os lados de Buarcos,
no meu regresso a casa, da Madalena para a a Alfragide... 

6 comentários:

Torcato Mendonca disse...

É pá logo de madrugada? Com neurónios e outros apetrechos cerebrais e não só a tentarem , género ave a sair do ovo, entrar no dia? Um tipo pode estar "afastado"...e estar bem mais perto do que tu JOSÉ BELO! Há mais josés na terra.
Que raio logo em abertura de blog de computador no dia? O Luís Graça diz, não com graça nem em desgraça, mas diz e razão em quase tudo lhe dou.
Olha eu fecho esta "moenga" já e, qual avestruz, vou tomar o pequeno almoço. Vai martelar o dia, vai martelar e enquanto não sair não deixa de martelar. AB T

Anónimo disse...

Caro José Belo

Dizes nesta tua reflexão:

“Gerações novas ignorando raízes de tanta dor...
Os ideais morrem em círculos cada vez mais rápidos...(eu acrescentaria ainda – e círculos mais restritos. )
São outros os tempos,
tempos de aceitação.”

Eu neste particular, só sei que nada sei, como disse o filósofo.

Ainda que julgo saber, que por vezes é frequente que quando cremos em determinadas causas, só porque elas nos são úteis e nos dão tranquilidade psíquica, podemos forçar a barra de maneira a que as opiniões em volta dessas causas se harmonizem num assunto coerente, quando esse assunto, efectivamente, é discordante!

Quem é que de nós, na vida, por vezes para sobrevalorizar a nossa opinião, não argumentou num determinado sentido, ainda que tenhamos o pensamento desunido, mas só para nos assistir a razão, desprezamos a solução da resolução do caso, esgrimindo incoerentemente?

Pela parte que me toca, com humildade e honestidade confesso, embora pese o esforço, sinto-me descontente com o conseguido:

Junto do meu agregado familiar, 3 filhos e a mulher, tudo adulto e licenciado, não consegui motivá-los, a ler mais de duas linhas, daquilo que escrevi para o Blogue…

Junto dos meus Gatos Pretos, já com mais de 150 contactáveis, e muitos com muita capacidade, se é que o termo é correcto, a mobilização que consegui para a causa do Blogue, não me é satisfatória…

Pese embora, que o meu empenho e contributo para o Blogue, continue inabalável e cheio de entusiasmo, como no primeiro momento, sou um optimista por natureza, e confio nas capacidades e crenças do nosso timoneiro, Luís Graça.

Um abraço para todos e um Bom Ano.

José Corceiro

Luís Graça disse...

1. Mail enviado hoje pelo J. Belo ao Vasco da Gama, o almirante, com conhecimeto ao L.G. (espero que um e outro não se zanguem comigo...):

"Caríssimo. Carreguei em botäo errado e...o teu comentário no blog da Lapónia desapareceu!!! Será possível uma segunda via? Eu sei que é pedir muito isto de se querer um repetido documento histórico para a posterioridade cibernética....mas....este Lapão seguindo sempre à letra as máximas Lusitanas do tipo :"Enquanto tiver língua e dedo a vida näo me mete medo"! (só que desta vez o dedinho...)

Um grande abraço cheio de gratitude ADIANTADA!


CARO LUÍS GRACA. FOI ESTE O E-MAIL QUE JÁ MANDEI AO MEU ALMIRANTE FAVORITO DEPOIS DA MINHA NABICE COM O BLOG E O COMENTÁRIO DELE.

Enfim, quem tem (como eu!) de" mugir renas de madrugada"... e,já agora,o que é madrugada quando se tem 24 horas de noite escura durante meses a fio???

Um grande abraço. José Belo

2. Comentário de L.G.:

Zé, vai difícil, se não mesmo impossível, ao nosso almirante recuperar o comentário que ele te escreveu ontem no poste em referência... Poderá tentar "reconstruir" a mensagem...

No teu caso e para evitar "barracas" futuras, eu se fosse a ti mudava de turno.... Por que é que não munges as renas a horas mais decentes ? Ou então automatizas o estábulo...

Bolas, afinal a tua Tabanca "fica" na sofisticadíssima e tecnologicamente avançada Suécia... memso que a Lapónia seja uma "colónia" sueca...

Um abração do tamanho do Tejo, o rio da nossa aldeia. Luís

Anónimo disse...

Zé Belo, viva!
Verificas em alguns, mais dificuldades em... regressarem.
Regressarem onde?
A este torrão de onde nos levaram rapazes, para inolvidáveis experiências, para terras quentes, húmidas e inóspitas, a que nos adaptàmos e ainda por lá levitamos?
Ou referes-te ao regresso às origens, à desadaptação desse convívio com familiares e amigos, sem percebermos a perplexidade que se apoderava de nós, tão fortemente marcados pelos dois anos de ausência, enquanto aqui se vivia na quase ignorância do que por lá se passava, das dificuldades sentidas, dos riscos corridos, das fomes suportadas, dos paludismos sofridos,que condicionavam o novo contacto com a paz, que nos deixavam atormentados, surpresos, incapazes de perceber porque fomos sem querer, e sentíamos algumas dificuldades no regresso?
Meu Caro, somos todos diferentes, e a maior capacidade do ser humano, a da adaptação, também varia de uns para outros.
Não consigo é perceber porque, ainda hoje, há camaradas com dificuldades adquiridas durante a mobilização, e o estado, essa magnifica entidade que devia ter por missão preocupar-se com os portugueses, não se preocupa, nem lhes dedica qualquer atenção.
Um abraço
JD

Anónimo disse...

Grande Lapão Joseph, O Belo

Com que então só te resta a língua, mas mesmo assim não tens medo da vida...é de Luso.

Brincadeira à parte, o comentário que no teu Blogue coloquei não tinha qualquer interesse.

Agora sim e de certa forma lerás que o meu texto responde de alguma maneira à tua questão sem o fazer:

O regresso, o nosso regresso da guerra faz-se a pouco e pouco, todos os dias, regressando sem chegar...

O regresso definitivo acontecerá quando o último de nós partir, pois aí quebrar-se-á em definitivo o que nós combatentes representamos, a magnífica ligação
que só nós somos capazes de estabelecer entre a Memória e a História.

Um abraço Camarigo

Vasco A.R. da Gama

Anónimo disse...

Caríssimo Luís Graca. Isto de se "mugir com as mäos" é muito diferente de se "mugir com máquinas".As minhas "Renas"(?!) que o digam! Agora,e mais a sério;quando escreves :"A Lapónia colónia Sueca" quem aí acreditará que até cerca de 1966(1966!!!) as escolas na lapónia sueca näo ensinavam os mesmos programas de estudos que todas as restantes escolas suecas para...suecos?E com este tipo de educacäo escolar as criancas da lapónia estavam completamente fora de ter qualquer possibilidade de integrarem o sofisticado mercado de trabalho sueco.A língua local era totalmente proibida nas escolas,desencorajada no dia a dia,e para além da língua,a Igreja proibia as músicas e folclore locais.A Finlândia foi colónia sueca mais de 700 anos;eles têm uma opiniäo muito "vernácula" sobre isto tudo.Para näo referir a Noruega;só independente da Suécia à pouco mais de 100(100!!!) anos,e também com opiniöes muito "vernáculas" quanto ao poder colonial sueco. MAS O PAIGC RECEBIA...SOLIDARIEDADE.Talvez o provérbio täo nosso do..."Mais vale tarde que nunca"!OU....? Um grande abraco.