domingo, 30 de dezembro de 2012

Guiné 63/74 - P10877: Notas de leitura (444): Um reparo à descrição da Operação Nebulosa inserta no livro "Alpoim Calvão - Honra e Dever" (Jorge Félix)



1. Mensagem do nosso camarada Jorge Félix (ex-Alf Mil Pilav, AL III - BA 12 - ESQ 122, Guiné, 1968/70), com data de 28 de Dezembro de 2012:

Meu caro Luís,
Vou aproveitar o "nosso" espaço para fazer um reparo, a uma passagem do livro do Sr Comandante Alpoim Calvão, pessoa por quem tenho o maior respeito e admiração.

Na pág. 184 do livro, "Alpoim Galvão, Honra e Dever", acerca da operação "Nebulosa", na foz do rio Inxanche (Inxanxe no livro), limite sul da fronteira com a Guiné-Conakri, em determinado momento pode ler-se o seguinte: ... "as obrigações que ligavam o comandante Calvão à TG3 e às operações especiais do Comando-Chefe obrigavam-no a um regresso imediato a Bissau, não se podendo dar ao luxo de perder tempo no naturalmente moroso trajecto marítimo da LFG. Tinha ficado, por isso, acertado que no final da operação o deixariam na Marca Samba, de onde a Força Aérea o recolheria de helicóptero. (Marca Samba era um pequeno farolim que a Marinha instalara havia dois ou três anos numa restinga areenta e pedregosa, a umas milhas na foz do rio Cacine, assinalando um baixio que constituía um perigo para a navegação e afirmando-se como ponto de referência para quem, vindo por mar, demandava a barra daquele rio. (Nota nª 188).

É pois naquele ponto perdido no meio do mar que foi deixado o comandante Calvão, sem ter necessidade de qualquer armamento já que se encontrava muito longe de terra. Sucede porém, que aquela era uma posição recentemente cartografada, pelo que apenas se encontrava assinalada nas cartas naúticas. Nas da Força Aérea nada constava e para as aeronaves aquele ponto nada mais era do que o mar imenso.Assim os helicópteros andavam a sobrevoar toda a costa da foz do rio Cacine, não podendo supor que o seu objetivo se encontrava naquele baixio tão distante.Entretanto, como o resgate demorava, a maré que inicialmente se encontrava na baixa-mar começa a subir e a restinga a ficar submersa, pelo que o comandante se ia aproximando cada vez mais do farolim. A certa altura, e já com os pés molhados, nada mais lhe resta senão começar a subir pela estrutura, mas quando olha para cima, percebe que não está sozinho: uma enorme jibóia encontrara no farolim um refugio seguro e enroscada no seu topo observava atentamente o recém-chegado. A um e a outro resta apenas a partilha do espaço, cada vez mais exíguo devido à subida das águas. Uma espera que teria sido interminável não fosse a iniciativa do piloto de um dos helicópteros, que alargara o raio da busca."

Observações minhas:
Se tinham acertado que, no final da operação iriam deixar o Senhor Comandante AC na "Marca Samba", aqueles que o iriam buscar, deveriam saber onde o encontrar. Andar a "sobrevoar toda a costa da foz do rio Cacine, não podendo supor que o seu objetivo se encontrava naquele baixio tão distante", é algo que me surpreende. Já escrevi e apaguei "ENE" vezes o que me vai na alma... Estou crente que esta situação foi "romanceada" e escapou ao Senhor Comandante AC.

No dia 27 de Agosto de 1969, o meu saudoso Comandante Diogo Neto, abeirou-me e disse que eu iria fazer uma evacuação, de um oficial fuzileiro, que tinha torcido um pé. (Não se faziam evacuações sem levar levar o "mecânico" e a enfermeira, mas naquela, teria que ir só. E foi o que aconteceu). A Sul da Ilha Melo, no meio do mar, iria encontrar o "oficial dos fuzileiros".

Tive a honra de ser eu, a "procurar" o Senhor Cmt AC para lá da ilha Melo, facto que não foi difícil.

Num "deserto" de água, encontra-se facilmente uma Lancha de Fiscalização Grande (LFG "Sagitário"). Dei duas voltas, baixas sobre a LDG. Apontavam-me para onde se encontrava o Senhor Comandante.

Um areal a uns trezentos metros da LDG.

Vai encontrá-lo "numa ilhota", disse-me o meu Comandante Diogo Neto.

Lá estava, o Senhor Comandante Alpoim Calvão. Reconheci-o logo. Cumprimentamo-nos, perguntei pelo estado do seu pé, não deu importância ao caso. ...

Há um facto neste "transporte", uma ordem do Gen Diogo Neto, que só pode ser do conhecimento do Senhor Comt AC e meu .

Nada de grave, mas comprova aquilo que digo. Num futuro próximo poderemos "desvendar" este facto.

Só foi utilizado um heli e na procura não houve tempo perdido, nem podia haver. Na minha caderneta, pode ler-se: no dia 27 de Agosto 69, um TEVS para " Cassumba S" com o tempo de 1 hora e 50 minutos, duas aterragens, a "operação" que corresponde ao facto narrado em cima.

Numa próxima edição, este facto romanceado, deveria ser alterado, a fim de dar uma outra imagem da FAP.

As esperas intermináveis dos helis, aconteciam quando não havia meios para "acudir" a todos ao mesmo tempo.

******

Luís, envio isto para o teu/nosso Blog, a fim de dar cumprimento à verdade que aspiramos.

Se me permites, envio os meus cordiais cumprimentos com todo o respeito e admiração ao Senhor Comandante Alpoim Calvão.

Abraço do tamanho do Geba
Jorge Félix
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 28 de Dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10872: Notas de leitura (443): "Diário da Guerra Colonial - Guiné 1966-1968", por Luís de Matos (Mário Beja Santos)

8 comentários:

Unknown disse...

Caro Amigo Jorge Felix
Permita-me, com todo o respeito, discordar da sua última afirmação, cito:

"Numa próxima edição, este facto romanceado, deveria ser alterado, a fim de dar uma outra imagem da FAP.
As esperas intermináveis dos helis, aconteciam quando não havia meios para "acudir" a todos ao mesmo tempo."

Deixo-lhe um testemunho simples de que a FAP e o seu nome, NUNCA foram postos em causa, nem interpretei como tal no que está escrito no Livro de "Alpoim Calvão". Nem é romance sequer. Ao dar-se a conhecer como o autor daquela operação, dou-lhe os meus cumprimentos. Falar da FAP em geral, já é outra coisa.
Devo a minha vida a evacuação feita pelos Helis, após ferimentos graves em combate.
Compreende aqui a minha gratidão particular e geral pelo que a FAP fez no teatro da Guiné ou qualquer outro.
Compreendo o autor ao dar a entender que demorou tempo a chegada do Heli
É que "UM SEGUNDO" de espera era uma eternidade.
Todo o processo desde o pedido até este ser realizado, não é instantâneo e todos os que passaram por isso, o sabiam. Mas repito: É que "UM SEGUNDO" de espera era uma eternidade.
Sem responsabilizar a FAP, ou mesmo responsabilizando-a pelo bom comportamento, interpretei o autor, não como um romancista, mas como um tradutor EXACTO do que passa em tais circunstâncias. Ademais, para além da sua específica missão, e se foram ouvidos outros Hélis na zona, não estariam eles noutras missões, desconhecidas do próprio e de outros? Não seria uma realidade? Não seria legítima uma interpretação empírica?
Deixo um pergunta no ar: Alguma vez se colocou em causa ou se tentou criar uma imagem negativa da FAP?
Bem pelo contrário, caro Jorge, Muito pelo contrário
Com toda a minha amizade e compreensão
Um Fuzileiro
João Meneses

Luís Graça disse...

Caríssimo Jorge Félix:

Tomei boa nota do teu “reparo”, entendo o teu “desabafo” e apoio a tua sugestão crítica, “por mor da verdade”,como se diz aqui na tua terra"...

Dizes tu: “Já escrevi e apaguei ‘ENE’ vezes o que me vai na alma... Estou crente que esta situação foi ‘romanceada’ e escapou ao Senhor Comandante AC”….

Não se trata apenas de vir defender a “honra da tua dama”, a FAP. Trata-se de repor a verdade dos factos, para mais numa “cena” de que foi protagonista, juntamente como o comandante AC. São daquelas "pequenas histórias da história" que só podem ter duas versões, a dos dois (e únicos) protagonistas. Como nem sequer levavas mecânico a bordo, não há “testemunhas” neste caso…

Como sugeres e bem, numa próxima revisão do livro, “Alpoim Calvão – Honra e Dever”, da autoria de Rui Hortelão, Luís Sanches de Baêna, Abel Melo e Sousa (Porto, Caminhos Romanos, 2012), seria bom que fosse reposta a verdade… E estou seguro que assim vai ser.

Já agora, dou também a minha achega… Ainda não li o livro, mas pelo que vejo no excerto que tu citas, há referência a um “enorme jibóia [que} encontrara no farolim um refúgio seguro e [que] enroscada no seu topo observava atentamente o recém-chegado”….

Na realidade, quando muito poderia tratar-se de uma pitão africana, uma "Pyton sebae", popularmemte conhecida como "irã cego". na Guiné-Bissau... Pode atingir os 6 metros de comprimentos, não é venenosa e não constitui um perigo real para os seres humanos... Tanto quanto sei (e o assunto já foi aqui discutido, várias vezes, no nosso blogue), as "jiboias" (sem acentio grave, de acordo com a nova ortografia) só existem no Novo Mundo (América Central e do Sul). Usa-se (, talvez indevidamente,) o termo "jiboia" para sinónimo de cobras, dos países quentes, que podem atingir grandes dimensões...

A origem etimológica do vocábulo é de resto brasileira, vem do tupi "yi'mboya" (segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa).

De qualquer modo, foi um prazer "reencontrar-te" aqui no blogue, como "grã-tabanqueiro" que és e que continuarás a ser... Sei que agora estás mais "facebuqueiro" do que "blogueiro"... Mas esta continua a ser a mãe de todas as tabancas... O melhor ano possível para ti e demais família, com a benção do Senhor da Pedra (que eu sei que é um santo da tua devoção, talvez eu ainda hoje lá dê um salto, já que estou na tua terra...).

Um abração. Luis

Madalena, V.N. Gaia, 30/12/2012

Luís Graça disse...

Olha,Jorge, acabo de regressar da visita ao Senhor da Pedra, na freguesia (vizinha) de Gulpilhares. A capela estava aberta. O sítio é mágico...LG

Madalema, 13h, 30/12/2012

Carlos Vinhal disse...

Quando eu era pequenito, um casal, que me considerava como filho, levou-me numa excursão, muito longe... ao arraial do Senhor da Pedra.
Ainda tenho na memória a confusão que ia na minha cabeça, pela enormidade do autocarro e pela multidão que por lá se movia.
Hoje vai-se lá num pulo tomar café.
Carlos Vinhal
Leça da Palmeira

Torcato Mendonca disse...

E de uma "Ratada" (clique no rato)se apanham Três Amigos. O Jorge Felix, o Luís Graça e o Carlos Vinhal.

Depois do comentário do Carlos fiquei na dúvida se - O Senhor da Pedra (SP) - era exclusivo Território do Bloguista Jorge. Seja ou não "conheço" de n ângulos e formas o SP. Tenciono, se por perto passar, fazer-lhe uma visita. Espero a foto do Luís Graça.

A "Ratada" tripla: - Para os Três um Voto de Boa Entrada no Novo Ano e que Este 2013 seja Óptimo, extensível a V/ Famílias.
SAÚDE e PAZ,
Ab, T.

ps Luís Graça; o Jorge Félix esteve numa operação connosco em 18(?)Ag/69 e á noite jantou acompanhado do "apanhado" e nosso amigo...mundo pequenino!

João Carlos Abreu dos Santos disse...

...
Como é de público conhecimento, a autoria do citado livro cabe exclusivamente ao jornalista Rui Hortelão; com quem colaboraram, o CF FZE Luís Pereira Coutinho Sanches de Baêna (19º CFORN), e o 2TEN FZE RN Abel Ivo de Melo e Sousa (24º CFORN).
Se no conteúdo de tal obra existirá algum «romance», e se tal "romance" aparentemente feriu a sensibilidade de algum protagonista - designadamente quem tenha servido na Esquadra dos AL-III da BA12 -, crêem-se por adequadas qq diligências directas junto do conhecido jornalista - e não aqui, onde, em dois sucessivos "postais", parece estar a ser posta em causa a credibilidade do livro -, sendo certo que o contributo do biografado CMG FZE Guilherme Almor de Alpoim Calvão, para a sua «quase biografia», autorizada, consistiu em ter dado o seu aval e pouco mais; cf se infere do email que seguidamente reproduzo >
de: guilherme alpoim calvco
para: Abreu dos Santos (senior)
data: 29Set2012 15:24
assunto: Re: upd m/Re: convite
Caro Amigo, Agradeço as felicitações e o seu interesse na promoção do livro em que sou biografado, creio que com bastante fidelidade, e quero desde já salientar o esforço e diligência dos autores. Com um abraço, Alpoim Calvão.

--------
Com os melhores cumprimentos,
do
Abreu dos Santos
__________

João Carlos Abreu dos Santos disse...

...
errata: onde se lê (24º CFORN), deve ler-se (20º CFORN)
__

Anónimo disse...

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