1. Mensagem do nosso camarada Vítor Junqueira (ex-alferes miliciano da CCAÇ 2753 - Os Barões (Madina Fula, Bironque, Saliquinhedim/K3, Mansabá , 1970/72), com data de 29 de Dezembro de 2010:
Votos de feliz Ano Novo… e mais umas coisitas.
E a páginas tantas, neste quase final de ano, um vago imperativo de consciência impôs-se. No mínimo teria que dirigir um olá, simples e fraterno, aos amigos que possuo nesta Tabanca. Em especial, aos camaradas ex-combatentes que envolvo num caloroso abraço virtual. E a todos quantos quiseram sublinhar a sua consideração e amizade enviando-me os seus votos de Boas Festas.
Acabámos de celebrar mais um Natal. Para a maioria de nós, civilizacionalmente cristãos, esta é uma quadra festiva, a mais aguardada do ano dizem alguns. Muito “complexa” direi eu, dada a amálgama de sentimentos que em nós desperta. Por isso, as pessoas da minha geração chegam a achá-la pesada. Foram-se a excitação incontida da meninice e as alegrias da juventude. Agora a saudade aguilhoa. Como num filme, recordo outros Natais bem mais felizes; diante dos meus olhos passa uma multidão de rostos de pessoas que fizeram parte da minha vida ou de simples conhecidos. À frente vem o do meu pai que não voltarei a ver, a lembrar-me a efemeridade da vida.
Em compensação, estamos mais serenos e felizes pelo simples facto de nos ter sido concedida a graça de passarmos estes dias com a família e amigos, longe da cadeira de rodas ou de uma cama de hospital. Para aqueles que nesta época foram traídos por periclitante saúde, particularmente os nossos camaradas de guerras passadas, elevo o meu pensamento numa súplica sincera, fazendo votos de um de um breve regresso ao activo.
Por mim, que me iludo pensando que ainda estou para as curvas, este foi mais um Bom Natal. Acredito que ninguém foge às suas origens e as minhas estão no mundo rural. A bicharada e as plantas são a minha paixão, a minha família é a aldeia que viu nascer os meus antepassados e onde vivo. Por isso, Natal também é tradição, convivialidade, festa. E a lembrar-mo não faltou o reboliço causado pela criançada (filhos e netos) aqui em casa!
Mas, camaradas, algo de muito estranho se passa comigo. Parece-me que estou a metamorfosear e já estranho o animal prestes a escapulir-se da minha casca. Aquela serenidade dos mais antigos a que me referi, por mim desconhecida há apenas uns anitos, parece estar a dar lugar a uma espécie de amolecimento. Amoleci e prontos, tenho que me conformar! Por exemplo, dou comigo a apreciar a minha solitude (e não solidão!), talvez mais preocupado com as coisas da alma, comovo-me até à lagrimita com certa passagem do livro ou cena de filme, coisa que me faria sentir embaraçado quando era mais novo. A tragédia alheia traz-me desconforto, passei a contribuir para campanhas de recolha de alimentos (e outras) quando no passado respondia irritado às meninas que me estendiam o saco “… e os meus impostos, para que servem?”. Mas, por outro lado, sinto-me um traste por achar que não sou suficientemente solidário.
Também estou cada vez mais inclinado a concordar que na gestão de conflitos a arte da punhada está em desuso. Contudo, não fico feliz quando constato que na nossa comunidade (Blog) há palavras que são atiradas como se fossem zarabatanas. É mau, só pode dar cu de boi. Estas beliscadelas não raramente desencadeiam vetos, invocação de direitos de resposta, acusações de censura, mal-estar mais ou menos contagioso. É verdade que quando entrei para o “Luís Graça e Camaradas” pela mão do Sousa de Castro - nunca me canso de referi-lo -, blogar era muito mais simples e despretensioso, um pouco naif, atrevo-me a dizê-lo. Com o tempo ocorreu uma espécie de profissionalização e o Blog atingiu um nível demasiado elevado (sem ironia!) para muitos de nós, número de que eu próprio não me excluo. Apareceu gente de altíssima craveira, tanto do ponto de vista académico como das fontes a que tem acesso. Munida com documentação inquestionável e vasta bibliografia, dixit e… fez-se luz! Porém, todo o êxito tem o seu preço.
Interrogo-me se tanta erudição não poderá ter conduzido a uma certa retracção de alguns participantes de antanho que tanto aprecio e tenho visto menos por aqui. Eu gosto do formato actual embora tenha as minhas preferências. Os textos que mais me interessam são aqueles que suscitam resmas de comentários, por oposição aos que passam aparentemente despercebidos, pese o seu valor e extensão. Não tenho dúvidas de que em muitos casos, a cotação de um post depende tanto do seu valor intrínseco como da qualidade dos comentadores. Eis a razão da minha preferência.
No vertente caso de sucesso, a certa altura, o Boss não teve outro remédio senão arrear (parcialmente) a giga e pedir a colaboração de três excelentes oficiais às ordens, o MR, CV e VB que se tornaram seus co-editores. Desde então, pelo menos que eu o saiba, não tem havido reclamações quanto a extravio de material, atrasos na respectiva publicação ou acusações de atribuição de prioridade em função de favoritismo ideológico. Sábados, domingos, feriados, pontes e períodos de férias não significam folga para os editores e julgo que não se passou um único dia sem que material novo desse à estampa. Sempre acompanhado de elucidativas notas sobre o autor e respectiva produção no Blog. Foram milhares de páginas de texto e quase outras tantas de fotografias primorosamente revistas e editadas, muitas vezes com links para outros trabalhos. Sem esquecer o tratamento dos comentários suscitados, como é óbvio nem sempre do agrado dos respectivos autores! Ora tudo isto tem dado muito trabalho como está à vista. Para fruição de todos nós e remunerado a leite de pato. Devemos-lhes respeito e gratidão e torna-se necessário manifestá-lo claramente e não ficar pelas encolhas. Da minha parte segue uma referência bem simples, à minha moda: Obrigado, rapazes!
Na minha relação com “Luís Graça e Camaradas”, tenho privilegiado o canal CêVê. Por três ordens de razão, sendo a primeira a empatia, a segunda porque militou numa Companhia que se não era irmã da minha, era no mínimo sua prima e a terceira, porque essa unidade comandada por outro amigo, o Jorge Picado, connosco combateu a mesma guerra e pisou o mesmo terreno. Então para o Carlitos Vinhal (Carlos, perdoa-me a familiaridade!), aqui vai uma receita que poderá ajudá-lo a pôr na ordem os exaltados que lhe causam azia. Trata-se de um pó muito eficaz, como se segue.
Numa vibrante manhã de Primavera, dois amigos passeavam pelo campo. De repente um deles desata a espirrar que nem um bode. Perante a inquietação do parceiro, esclarece ranhoso e lacrimejante:
- Sabes, pá, isto é por causa do pó.
- ???
- Sim, meu. O pó dos fenos. Sou alérgico. Mas há outros, como o pó da casa, o pó de talco, o pó de arroz que também …
- Olha, e o pó caralho, conheces?
Eu não acho, tenho a certeza de que em certas ocasiões é o melhor remédio!
Para todos os amigos, ou camarigos como diz o Mexia Alves, aqui vai este lugar-comum carregado de afecto:
Abaixo a crise, abaixo as guerras e Feliz Ano Novo com muita saúde para todos.
VJ
__________
Notas do editor
(*) Vd. último poste de 25 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7498: O Mural do Pai Natal da Nossa Tabanca Grande (16): Um receita energética para os entrevados, by-passados, disrítmicos ou algo incapacitados tabanqueiros... (Vítor Junqueira)
Vd. último poste da série de 29 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7524: O Mural do Pai Natal da Nossa Tabanca Grande (26): Ano Velho, Ano Novo (Joaquim Mexia Alves)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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12 comentários:
Obrigado, caro Vítor Junqueiro, por mais este texto, que dá que pensar. Este amolecimento - que, geralmente, começa pelos "abdominais", de que tanto cuidámos na tropa e não só - vai-nos invadindo o corpo e passa, num ápice, ao espírito. É muito bom na maior parte das vezes - que o digam os netos de quem os tem. O que não se quer é o amolecimento de poltrona. Este não dá vida.
Bons Anos (como por cá se saudava, e bem, pois há mais anos para além do próximo).
Um abraço,
Carlos Cordeiro
Boa noite meu Alferes Médico
Embora passados mais de 40 anos... os 4 anos da minha vida de militar nos S.Saúde não me "deixam" tratá-lo por "tu" como é norma no blog.
Posto isto quero manifestar-lhe o meu apreço por mais este magnífico texto.O que escreve é profundo e não sei se não passou na vida ao lado de uma grande carreira de...escritor.Como não o conheço como médico...terá que se aguentar com esta "boutade". Mas dáva-me jeito conhecê-lo como tal porque tenho um joelho com 70 anos que me está a dar problemas...
Só mais uma para "emoldurar" no seu consultório: tenho no meu "ambiente de trabalho" aquele seu extraordinário post sobre aquela dama ofendida com a declaração do seu namoro com uma bajuda...
A propósito de textos notáveis acho que era tempo dos nossos "desgraçados" editores(ou alguém por eles) seleccionar alguns textos para se editar um livro sobre os seis anos do nosso blog.
É que papel é papel e nem toda a gente domina as teclas co computador...
Como é de Pombal fica no "meu" distrito. Se passar por Alcobaça apite de véspera p.f.Está convidado para almoçar "frango na púcara".
E parabens por essas "coisitas" que escreve.
Um abraço do JERO(telem. 963147683)
Ah, grande Vitor,esse amolecimento
é passageiro,já por lá passei...
quando entrei nos 60,na categoria
dos sexagenários,senti-me retraído,
talvez amolecido,como dizes,era um
pouco traumático.Foi um ano na
retranca,apesar de continuar com
bastante actividade física...parei
com aquilo que alguns chamam as
"maluqueiras",exemplo,nesse ano não
fui à Descida do Sarrabulho em
Ponte de Lima,onde se apanha frio,
lama,de mistura com alguns"tralhos"
Cheguei aos 61,tudo se eclipsou...
voltei a rejuvenescer na...cabeça
( a de cima,a pensante)a outra já
não é o que era,mas ainda vai
funcionando...e lá voltei a Ponte
de Lima, e no mês passado,mais uma
vez,apareci a descer o monte,este
ano sem quedas, e já perto dos 63.
Eram 400 gaijos a deslizarem pelos
trilhos,e de habitual,sou o mais
velho...
Não te sintas traste...tu és
solidário
BOM ANO 2011
Grande Abraço
Vitor Junqueira ----- dixit...sem "pòzinhos de perlimpimpim" (e isento de mpostos).
Desejos de BONS ANOS Alberto Branquinho
Vitor Junqueira
Amigo José Eduardo (Jero),
Não é meu hábito replicar aos comentários na sua maioria benévolos e imerecidos suscitados pelos meus “escritos”. Porém, depois de ler o que escreveste a meu respeito (e já não é a primeira vez!), não pude evitar este impulso tão natural quanto a consideração que transparece das tuas palavras para te dizer, obrigado. E garantir-te que o sentimento de amizade é recíproco.
Como havemos de nos tratar? Lamento, mas não posso aceitar outra maneira que não seja o castrense “tu” para soldados da mesma patente, que é o que nós somos. Miliciano de Infantaria no meu caso e com muito orgulho!
Relativamente aos meus cozinhados literários vou contar-te um segredo: Limito-me a passar para o Word aquilo que dizem a minha consciência e coração, tentando ser coerente e verdadeiro, como na vida. Sem peneiras. Quanto à forma, sintaxe e pontuação incluídas, … os editores que se amanhem!
Frango na púcara? Gosto. No forno, de churrasco, jardineira, cabidela até numa canjinha … é o que vier.
Aqui na minha zona é costume dizer-se “ao rico não faltes e ao pobre não prometas”. Registei o teu número de telefone, um dia destes tens-me à porta.
Ab,
VJ
Caríssimo Victor
Meu amigo tão perto e no entanto tão longe que nunca nos vemos!
No próximo almoço da Tabanca do Centro "intimo-te" a vires dar um abraço ao pessoal.
O teu texto encheu-me e fez-me lembrar uma particularidade de ontem.
Por estes dias de Natal em Monte Real sentia que qualquer coisa me faltava, mas não conseguia identificar.
Ontem quando saí das Termas senti um cheiro que de imediato me transportou ao Natal de Monte Real, com os meus pais e a minha enorme família.
Cheirava a fogueira de mata, madeira de pinheiro e eucalipto, pois era assim que antes se limpava aquela mata das termas no Inverno.
E eu ao chegar de Lisboa, ansioso por me livrar dos estudos, da cidade e voltar à minha terra, era a primeira coisa que sentia ao entrar na avenida das termas.
Por isso te percebo no que escreves e sabes, também me veio a lagrimita ao olho.
Um grande abraço e bom Ano Novo para ti, para os teus, para todos nós.
Meu caro Dr. Vítor!
Se as tuas palavras curarem um pouco o nosso amolecimento, pela minha parte agradeço.
Mas deixa-me dizer-te, julgo estarmos todos no mesmo estádium.
A idade torna o homem mole e é uma porra! É verdade, um gajo sensibiliza facilmente, e recordante, já chora por qualquer lamechice.
Gostei!
Um abraço,
Mário Fitas
Caro Vítor Junqueiro
Estou um pouco a passar por isso do que falas, este amolecimento de poltrona e também espero revigorar como diz o Paulo Santiago, para o próximo ano.
O que é inegável é este teu texto, de salientar, de saudar.
Um Bom Ano Novo
Um abraço
Luís Dias
Luís
Sexagenário recente...estás com os
sintomas,mas não esmoreças,isso
vai passar
Saluto et fuerza no canuto!
Abraço
Caro camarigo VJunqueira
Já mais que uma vez, em comentários, manifestei a minha vontade de ler escritos teus. Não posso esquecer-me que, em termos do "Luís Graça & Camaradas", foste o meu primeiro interlocutor, pois foi contigo que entrei em contacto por causa do Encontro em Pombal.
Acresce ainda o facto de recentemente ter estado numa formação com uma moça casada com um teu familiar e termos falado da Guiné e do blogue.
Quanto à substância do que escreveste quero aproveitar a boleia e referir que concordo com a tua análise ao desenvolvimento que o blogue tem tido e subscrevo a tua homenagem ao editores, que de facto têm um trabalho imenso 'a sopa de pato' para manter vivo, actual e diário, este fenómeno editorial.
Abraço
Hélder S.
Vitor Junqueira
Amigo José Eduardo (Jero),
Não é meu hábito replicar aos comentários na sua maioria extremamente benévolos e por isso imerecidos, suscitados pelos meus “escritos”. Porém, depois de ler o que escreveste a meu respeito (e já não é a primeira vez!), não pude evitar este impulso tão natural quanto a consideração que transparece das tuas palavras para te dizer, obrigado. E garantir-te que o sentimento de amizade é recíproco.
Como havemos de nos tratar? Lamento, mas não posso aceitar outra maneira que não seja o castrense “tu” para soldados da mesma patente, que é o que nós somos. Miliciano de Infantaria no meu caso e com muito orgulho!
Relativamente aos meus cozinhados literários vou contar-te um segredo: Limito-me a passar para o Word aquilo que dizem a minha consciência e coração, tentando ser coerente e verdadeiro, como na vida. Sem peneiras. Quanto à forma, sintaxe e pontuação incluídas, … os editores que se amanhem!
Frango na púcara? Gosto. No forno, de churrasco, jardineira, cabidela até numa canjinha … é o que vier.
Aqui na minha zona é costume dizer-se “ao rico não faltes e ao pobre não prometas”. Registei o teu número de telefone, um dia destes ter-me-ás à porta!
Ab,
VJ
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