1. Outra história do Zé Ferraz, português radicado nos EUA desde 1970 (vive atualmente em Austin, Texas), ex-Fur Mil Op Esp, CART 1746 (Xime, 1969; CCS/QG, Bissau, 1969/70)(*)
Durante os fins de semana trabalho dois turnos por dia, sábados e domingos, 16 horas respectivamente, num centro de reabilitação (para homens) a que clinicamente se chama aqui Men's Intensive Residential Treatment, com uma duração de 28/30 dias por paciente. Portanto tenho tempo para me entreter.
O Blogue ajuda-me psicologicamente a distanciar-me emocionalmente destes doentes e evitar as chamas Transfer and countertransfer issues... E é evidente que, à medida que me embrenho a ler os postes, a minha memória acorda e é um ver se te avias...
Lembrei-me hoje de outra anedota nos meus tempos do QG-CTIG...
Apareceu na messe de sargentos um Primeiro, periquito, recém chegado de Lisboa. Aparentemente ninguém conhecia; nem os outros Primeiros porquanto este pobre tipo tinha passado a maior para do seu serviço na Guarda Nacional Republicana que eu detestava por experiências passadas quando nós, como estudantes, nos anos 60, fazíamos manifestações contra a ditadura do Salas... Enfim essa e outra história...
Ora bem, o nosso Primeiro nunca tinha estado em África e muito menos com a nossa malta... Era como um camelo a olhar para um palácio...
Um dia, à conversa, ele pergunta-me, em tom de confidência:
- Ó nosso Furriel, eu tenho um problema e não sei o que fazer...
- Ó meu Primeiro - disse-lhe eu - conte-me lá o que se passa a ver se eu o posso ajudar...
Diz-me ele:
- É que nestes últimos dias me apareceu esta merda nos sovacos e nas virilhas que me dá muita comichão e cheira mal, há tres dias que não tomo banho...
- Ó meu Primeiro - respondi-lhe eu - o que o senhor apanhou é o que nos chamamos a Flor do Congo... É uma micose...
_ E, o nosso Furriel, isso é perigoso?...
- Muito! - disse eu...
E agora pergunta o Primeiro:
- O que é que eu faço ?...
- Bom - disse-lheu - a Flor do Congo é um fungo e o que o senhor precisa é de lavar o corpo todo com água pura... Por exemplo, o senhor compra o sabão encarnado e, como estamos na época da chuva, quando estiver chover bem, o primeiro ensaboa o seu corpo com o sabão e depois deixa que a chuva lave o corpo....
Passados uns dias aí estava o Primeiro, nu em pelota, fora do seu quarto, na rua que passava em frente da messe de sargentos e ia para a messe de oficiais, a lavar o corpo com o sabão encarnado e a malta na messe, todos a rir...
- Ó Furriel como é que eu lavo a rego do cu ?... - Dizia-lhe eu:
- Meu Primeiro, dobre-se prá frente, ponha-se de cu pró ar e deixe que chuva lhe lave o cu ...
Mais gargalhas e o Primeiro nem se quer se deu conta .... Nisto, era noite, aí vem um carro, dá a curva e os farois batem no cu branquinho do Primeiro, periquito ...
Mais gargalhas... O problema, ouvimos mais tarde, foi que a esposa de um oficial era passageira nessa viatura e aparentemente ficou mal impressionada com a brancura do cu do Primeiro e, possivelmente o resto que viu, porque o Primeiro não se perturbou com nada, o que ele queria era ver-se livre da comichão...Um forte abraço, Zé.
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Nota do editor:
(*) Último poste da série > 1 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9123: Se bem me lembro... O baú de memórias do José Ferraz (11): Uma cena do Júlio, em combate: Furriel, os meus t... ?!
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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4 comentários:
Periquito sofria.
Sendo "tótó"ainda mais e se encontrasse um "pintas" como o Zé Ferraz..aqui está o exemplo.
A "flor do congo" é só uma micose, provocada pela "tinea cruris" e de fácil tratamento,só que como tínhamos condições de higiene "excelentes" e um clima favorável e ainda a mania que a malta tinha em coçar os "tomates"..modas da época muito machas..estavam criadas as condições para não só ser uma flor mas um grande jardim florido..que alguns aproveitavam para andar de perna aberta..estilo cowboy..feitios.
A.B.
C.Martins
Era um grande suplício... Quem é que não apanhou esta e outras micoses ?... Depois de 2 dias de operações, um tipo chegava ao quartel com menos 3 ou 4 quilos, e o corpo, feito chouriço assado, todo cheio de "merda", às postas, que se arrancava com as unhas... E os pés, então, nem se fala... Uma lástima!... LG
C.Martins...
Hoje olhando para o passado sinto pena deste Primeiro porque nao era dos mais espertos e foi usado com alvo de muitas partidas. hoje tambem estou convencido que nao teria a mesma attitude de entao, sou incapaz de dehumanizar qualquer pessoa que nao tenha a capacidade para aguentar a partida o primeiro era inocente e eu aproveitei-me dessa inocenciae evidente que ja nao tenho a sangue na guelra que tinha nesse tempo...
Um abraco-Ze
Carissimo Camarada e Companheiro Luis:
Lembro-me bem do que tu descreves... durante a fase operacional com a 16 que se memoria nao me falha foi em Bula tive que sair muitas vezes pro mato com tais feridas nas verilhas e sovacos que quando regressava ao quartel escorria nao so soro mas sangue levou-me meses a sarar porque o comandante da companhia nao me deixava ir receber tratamento...
enfim o resto da minha opiniao sobre ele e o segundo comandante ficam comigo....
Um forte abraco-Ze.
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