domingo, 6 de setembro de 2015

Guiné 63/74 - P15078: Libertando-me (Tony Borié) (33): O Sonho Americano (3)

Trigésimo terceiro episódio da série "Libertando-me" do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGR 16, Mansoa, 1964/66, enviado ao nosso blogue em mensagem do dia 1 de Setembro de 2015.




“American Dream”

Capítulo III

Companheiros, lembram-se do último episódio, a habilidade do “Capitão Gancho” para lidar com os seus homens era lendária, na idade de vinte e nove anos foi nomeado para o posto de capitão, sobrevive quase vinte anos como um corsário, vulgo “pirata”, comandando homens em batalhas ferozes, principalmente contra Espanhóis e Portugueses.

Em 1592, o navio do “Capitão Gancho”, no mar das Índias, abordou uma grande nau portuguesa, ele, sabendo como os marinheiros portugueses eram bons guerreiros, talvez os maiores rivais, pelo menos no mar das Índias, fez um discurso aos seus homens, que mais tarde ficou famoso. Disse:
- Marinheiros, chegou o momento que tanto desejávamos, podemos aqui terminar os nossos dias, vai ser vida ou morte, vamos com coragem tomar esta “Carraca” e destruir estes nossos rivais Portugueses.
Toda a tripulação que se encontrava a bordo, motivada pelas palavras do seu comandante, lutaram com sucesso e capturaram o navio Português, durante uma longa e sangrenta batalha naval. Para quem não sabe, as “Carracas” eram umas famosas naus Portuguesas, que por altura do século XV, faziam o “roteiro de Malaca”, eram consideradas umas naus muito avançadas para a época, pois os marinheiros portugueses andavam encostados à praia, ao longo do Atlântico, nas costas de África e, com estas naus de três mastros, aventuraram-se ao largo do oceano. Assim inventaram as “Carracas”, que era uma fusão com algumas modificações das naus que navegavam encostadas a terra no Atlântico e no Mediterrâneo. As mais famosas eram a São Gabriel e a Flor do Mar. Mais tarde vieram umas naus maiores, os “Galeões”.

Dizem que saíam do Porto de Lisboa todos os anos de 3 a 4 “Carracas” com destino a Goa, na então Índia Portuguesa, com alguma prata, (a Europa não produzia prata, cremos que a proveniência desse produto devia ser o Brasil ou qualquer colónia na América do Sul, dos aliados Espanhóis), para trocar por algodão e especiarias e, também iam até à ao reino de Ming China, à procura de seda e, mais tarde, com a aquisição de Macau, a coroa Portuguesa começou a enviar “Carracas” regularmente ao Reino de Ming China e até ao Japão. Assim sendo, usavam as “Carracas”, que era um tipo de navio utilizado no transporte de mercadorias, referenciadas em documentos dos séculos XV e XVI, criadas pelos Portugueses especificamente para as viagens oceânicas, até então só usadas no Mediterrâneo.
As “Carracas” eram navios de velas redondas e borda alta que possuíam três mastros. Os primeiros exemplares tinham uma capacidade de 200 a 600 toneladas, mas na época em que os portugueses as utilizaram na carreira da Índia, atingiu valores de 2000 toneladas.


Mas continuando com a história do “Capitão Gancho”, uma das principais responsabilidades, já como almirante das viagens a Virgínia, foi disciplinar os homens no seu comando, por meio de eloquência e, claro, pelo exemplo, em vez de punição física, numa época em que as chicotadas e enforcamentos no mar eram coisa comum, usados por outros capitães de mar para fazer cumprir suas ordens.

Também tratava os índios com respeito, tentando ganhar a sua cooperação através do comércio, ao invés de usar a força física para subjugá-los, como nos fazia o nosso professor Silvério, lá na velha escola do Adro, na então vila de Águeda, ou por exemplo, ao contrário de John Smith, e outros líderes militares da colónia de Virgínia, ele não atacava os índios para roubar o abastecimento de alimentos a partir deles, nem os escravizava como os Espanhóis e Portugueses haviam feito rotineiramente na América do Sul e Central.

Os colonos ingleses, na altura, estavam constantemente preocupados com a possibilidade de que os Espanhóis, ou Portugueses, iriam atacar as suas vulneráveis colónias. Esta preocupação, em grande parte era baseada no massacre atroz de colonos “huguenotes franceses”, principalmente por soldados espanhóis, ocorrida em 1565, em Fort Caroline, Florida, perto do lugar onde vivemos. O massacre foi ordenado por Dom Pedro Menéndez de Avilés, o governador espanhol da Flórida, que fundou a colónia de St. Augustine, que foi o primeiro assentamento europeu permanente na América do Norte. Soldados espanhóis surpreenderam os facilmente submetidos colonos “huguenotes”, em grande parte desarmados. Colonos, homens, mulheres e crianças, foram levados em pequenos grupos para trás das dunas de areia, onde cada colono foi atravessado com a espada e deixado para ali até morrer.

Cerca de 350 marinheiros e soldados “huguenotes”, espalhados por uma tempestade prolongada no mar, foram capturados por soldados de Menendez nas praias da Flórida, por aqui, mesmo perto de onde vivemos, onde nós muitas vezes andamos à pesca e, também foram mortos, atravessados pela espada, pois os espanhóis consideravam os “huguenotes franceses” de ser infiéis, porque não eram católicos, mas politicamente, este massacre tinha a intenção de alertar os outros europeus, não os Portugueses, porque estes eram quase aliados, que o Novo Mundo pertenciam à coroa Espanhola.

A história conta-nos que um grupo de “huguenotes”, que praticavam a religião “protestante”, sob a liderança de Jean Ribault em 1562, estabeleceu uma pequena colónia em Fort Caroline, no ano de 1564, às margens do rio St. Johns, no que é hoje a cidade de Jacksonville, no estado da Florida. A colónia foi a primeira tentativa de assentamento europeu permanente, até aos dias de hoje, na parte continental dos Estados Unidos, mas o grupo sobreviveu apenas um curto período de tempo, pois em Setembro de 1565, num ataque contra a nova colónia espanhola em St. Augustine, também no estado da Florida, foi um “tiro que saiu pela culatra”, quando os navios franceses foram atingidos por um grande furacão, quando se preparavam para atacar o acampamento espanhol em Forte Matanzas, onde nós todos os fins de semana, logo que esteja bom tempo, costumamos caminhar, por um período de aproximadamente duas horas, na areia, pois faz massagens nos pés, onde centenas de soldados franceses eram presos, consoante davam à praia, rendendo-se às forças espanholas numericamente inferiores, lideradas por Pedro Menendez, que sem qualquer contemplação procedeu ao massacre dos “huguenotes” indefesos, tendo os espanhóis dizimado a guarnição de Fort Caroline.

Voltando à colónia de Jamestown, lá no norte, localizada no que hoje é o estado de Virgínia, foi esta a razão que, para evitar um massacre semelhante, os colonos ingleses, por volta do ano de 1607, foram aconselhados por ordens seladas da Companhia da Virgínia, para construir a sua colónia mais para o interior, ao longo de um rio, em vez de ser um posto avançado e foi assim que nasceu a colónia de Jamestown, na costa da Baía de Chesapeake. As ordens especificavam que um posto avançado devia ser estabelecido na foz do rio, ocupado por olheiros, “para que, quando qualquer frota fosse vista, eles poderem vir dar o aviso".

O “Capitão Gancho”, sendo um audaz corsário, sabendo da estratégia de ataques, saques e abalroamentos, seguindo ou não as ordens da Companhia da Virgínia, escolheu um local para a colónia, 40 milhas a montante da Chesapeake Bay, às margens do rio James. Além disso, ele manteve um posto de vigia localizado no que é actualmente o Forte de Old Point Confort, pois os vigias poderiam aconselhar a colónia de Jamestown da chegada de navios, viajando a pé para Jamestown, mais rápido do que um navio à vela pode navegar rio acima.

Ao contrário de alguns líderes da colónia de Virgínia, ou das Companhias Mercantis de Londres, que estavam principalmente interessados em adquirir a riqueza rapidamente, o “Capitão Gancho” tornou-se comprometido com o desenvolvimento a longo prazo da colónia de Virgínia. Para atingir esse objetivo, deixou a sua esposa e quatro filhos, durante cinco viagens perigosas através do Atlântico, cada uma com duração de mais de seis meses. Ele, um corsário, vulgo “pirata”, cresceu sobre o mar e continuou no mar a maior parte de sua vida, morrendo quase no final de uma viagem longa para o Extremo Oriente, na ilha de Java e, tal como tinha perdido parte do seu braço numa luta de abalroamento a um navio Português ao largo de Cuba, aqui, dizem que foi ferido mortalmente, já com a idade de cinquenta e cinco anos, numa luta travada num ataque a uma “Carraca Portuguesa” que tentava regressar à Europa, carregada com especiarias, sedas, pedras preciosas e outros tesouros.

Numa época onde um homem era identificado pela sua carreira, como carpinteiro, ferreiro ou sacerdote, o capitão Christopher Newport, corsário, vulgo “pirata”, mais conhecido por “Capitão Gancho”, foi reconhecido como um marinheiro, um homem do mar, cuja história de vida nos fala da sua contribuição para o tal “American Dream”, que quer dizer mais ou menos, “Sonho Americano”.

(Fim)

Tony Borie, Agosto de 2015
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Nota do editor

Postes anteriores de:

23 de agosto de 2015 > Guiné 63/74 - P15030: Libertando-me (Tony Borié) (31): O Sonho Americano (1)
e
30 de agosto de 2015 > Guiné 63/74 - P15055: Libertando-me (Tony Borié) (32): O Sonho Americano (2)

1 comentário:

Antº Rosinha disse...

Se assim é amigo Tony, temos que ao contrário do que a nossa geração pensava, depois de vermos tantos filmes de cow boys, o sonho americano não era ser um John Wayne mas um Pirata dos Mares.

Mas pelo que nos contas. dá a ideia que a grande preocupação dos piratas ingleses era fazer o bem.

Isto é atacar os malfeitores e malandros portugueses e espanhóis.

Vamos ver como é que os ingleses vão contar esta de fechar o Túnel da Mancha, sem sairem manchados.

É que são eles que vencem sempre a última batalha.

E ccomo a história é sempre escrita em inglês...!