Tira da banda desenhada “Operação Mar Verde”, da autoria de A. Vassalo [ex-fur mil comando Vassalo Miranda, nosso camarada da Guiné], uma edição da Caminhos Romanos, 2012.
[José Matos, nosso grã-tabanqueiro, investigador independente em história militarm, autor do artigo "A ameaça dos MiG na guerra da Guiné", originalmente publicado na Revista Militar, nº 2559, abril de 2015, pp. 327-352, e no nosso blogue em quatro postes recentes]
Olá, amigos
Agradeço os comentários. Sobre o Mar Verde dedico uma pequena parte do artigo a isso e gostava de esclarecer alguns pontos.
1- Os guineanos tinham alguns MiG e por pura sorte (para eles) estavam em Labé no dia da [Op] Mar Verde, senão tinham sido destruídos no aeroporto de Conakry pelo pessoal do [cap para] Lopes Morais [, a equipa Sierra].
Isso foi apurado no terreno na altura e temos o testemunho do Alpha Abdoulaye Diallo [, membro do governo de Sékou Touré, secretário de estado da juventude e desportos, mais conhecidos por "Portos", ] , que telefona para Labé nessa noite a pedir os MiG. Do outro lado da linha, o [cap] Sylla Ibrahima [, responsável da aviação militar,] responde-lhe dizendo que está tudo inoperacional ou melhor dizendo que naquele momento não estavam em condições de voar, pois tinham voado para Labé uns dias antes e não deviam ter nenhum avião preparado. Portanto, temos várias fontes a dizer que estavam em Labé.
2- Mas os guineanos lá conseguiram meter um a voar e apurei através de fonte cubana que era pilotado pelo tenente Hady Canté, que sobrevoa Conakry, a baixa altitude, por volta das nove da manhã, quando as forças portuguesas já tinham embarcado, e detecta na baía de Conakry um barco que julga ser inimigo, mas que era na verdade o Conrado Benitez cubano e abre fogo de canhão contra este barco por engano.
3- Portanto, o Canté vem de Labé com o MiG-17, sinal que os MiG estavam lá.
4- O que falhou na Mar Verde foram as informações… se a malta tivesse sabido que os MiG não estavam em Conakry, teria adiado a operação e podia esperar que voltassem à capital para dar o golpe.
5-Já agora foram para Labé (se não me falha a memória) porque o Sekou Touré, que era um tipo paranóico, teve por essa altura um receio qualquer de um golpe militar dentro do seu próprio exército e mandou retirar os MiG da capital por uns tempos… sendo Labé a única opção que tinha. Em Labé, as condições para os MiG também não seriam grande coisa até porque a base teve obras em 1973, como eu digo no artigo, mas, em 1970, era a única opção que havia em relação a Conakry.
Um outro aspecto que eu gostava ainda de salientar nesta discussão é de facto a baixa operacionalidade dos MiG e a aselhice dos pilotos guineanos. Podem facilmente imaginar o que era, naquele tempo, em Conakry manter operacional uma pequena esquadra de MiG, quando o pessoal da manutenção era uma desgraça, quando por vezes (ou muitas vezes?) não havia dinheiro para sobressalentes, nem para combustível, quando os pilotos voavam poucas horas por ano, quando a malta da manutenção desviava combustível e peças e por aí fora…portanto imaginem o que era manter uma pequena esquadra operacional, nestas condições!
Os cubanos quando chegaram em 1973 até meteram as mãos à cabeça com o que viram e tiveram logo que chamar o pessoal deles para meter ordem na casa e conseguir ter dois aviões a voar. Acho que o artigo dá uma boa panorâmica sobre isso.
Obviamente que os poucos pilotos guineanos que existiam qualificados para voar MiG, tinham pouco experiência de voo e não admira que depois da chegada dos cubanos voassem sempre com eles e nunca sozinhos.
Não vem no artigo, mas posso contar-vos que uma vez um vai voar com o Trujillo e, se não me falha a memória, o guineano perdeu-se do líder da parelha e o Trujillo nunca mais o viu, só no regresso a Conakry. Portanto, estamos a falar de malta com este tipo de experiência. O caso do Canté em 1970, na Mar Verde, também é engraçado. Então o tipo chega a Conakry e confunde um navio de carga com um navio de guerra?? Então o tipo não vê que já não há barcos de guerra no porto?? Isto mostra bem a falta de experiência.
Calculo que não seria muito diferente com os futuros pilotos do PAIGC. Seriam como os guineanos.
Finalmente sobre a Mar Verde, a decisão do [cmdt Alpoim] Calvão em retirar foi a mais acertada a partir do momento que percebe que não conseguiu eliminar a componente aérea. Fez bem em sair, agora vamos imaginar que a malta tinha apanhado os MiG em Conakry, aí o resultado tinha sido outro…
Se não fosse a incerteza dos MiG nós tínhamos dominado a capital, a cidade já estava de pantanas ao fim da madrugada e o golpe teria tido outra evolução. Foi mesmo falha nas informações… A PIDE devia ter mandado alguém para capital uns dias antes para ver o que se passava, para ver se os MiG estavam lá ou não e recolher informações…não fizeram nada disso e deu no que deu…
Ab, José
B. Sugestão de leitura adicional para os nossos editores:
MARINHO, António Luís - Operação Mar Verde: um documento para a história. S/l: Círculo de Leitores, 2005, 301 pp. [Com introdução de Guilherme Alpoim Calvão, escrita em Bolama, julho de 2005, pp. 8-11].
Há mais de meia centena de referências no nosso blogue sobre a Op Mar Verde.
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 10 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15100: FAP (88): A propósito da Op Mar Verde, dos MiG e do artigo do José Matos: Labé ainda hoje não tem uma pista capaz de receber MiG, se eles existiam mesmo só podiam estar em Conacri...Será que a malta foi mesmo ao aeroporto ? (António Martins de Matos, ex-ten pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)
7 comentários:
Luis
desculpa o nº de telefone do Armando Teixeira
é
259470209
S.João- Cerva
Ribeira de Pena
José: Tomei a liberdade de juntar as "3 peças" e fazer um texto único, acaba de saír na série FAP, às 12h45.
Que será feito do ex-cap paraquedista Lopes Morais ?
Conheci pessoalmente, em Bambadinca e Fá Mandinga, em 1970, ao tempo da formação da 1ª CCmds Africanos, o ten Januário que. no decurso da Op Mar Verde, se recusou a ir ao areoporto e acabou por se entregar às autoridades locais, sendo depois usado para denunciar o "golpe", condenado e executado umas semanas depois, mais os 20 homens, fulas... Pertencia à equipa Sierra, do Lopes Morais. Ouvi, na rádio, com angústia e pena, os seus interrogatórios, em francês, propagandísticos e desmoralizadores...
Ab. Luís
Caro Luis Graca,
Esta tua conclusao carece de contraditorio e foi usada pelo regime ou pelo generalato do CTIG, na altura, para justificar o falhanco da operaca na sua generalidade. O Ten. Januario e os seus homens eram COMANDOS AFRICANOS...COMANDOS AFRICANOS...que podiam nao concordar com certas ordens superiores, mas nunca poderiam pactuar com o inimigo.
Ja se discutiu sobre o tema aqui no blogue e existe a versao de que foram abandonados na precipitacao da retirada. No caso vertente, convem esgotar todas as hipoteses antes de proferir afirmacoes que podem ser erroneas e nao dignificam a prestacao de homens que sempre foram leais ao seu juramento de honra.
Com um abraco amigo,
Cherno Balde
... everybody knows: "What If", apenas em filmes!
... resposta a Luís Graça: veja o que consta aqui >
ultramar.terraweb.biz/LuisBettencourt_2012_03_06.htm
... Cherno Baldé, está equivocado: a equipa comandada pelo Ten CMD Januário, desertou, de facto (seja, passou-se para o outro lado... mas apenas por poucos meses, pois todos vieram a ser fuzilados em Conackry, a mando de Sekou Touré). Pf não construa "teorias de conspiração", para justificar a sua ideia sobre o que qualifica como «falhanço da operação na sua generalidade».
Na realidade, houve um grupo que não logrou chegar à zona do cais a tempo de reembarcar nos zebros e foi abatido pelos perseguidores: os nomes de 20 militares da 1ªCCmdsAfr, constam a pp.22/3 de um pdf online no portal UTW (Mortos na Guerra do Ultramar, nascidos na Guiné).
... (rectificação: onde se lê 20, leia-se 18; 2 'comandos' tinham falecido em combate, aquando do assalto ao quartel da guarda republicana; são os militares cujas naturalidades se encontram referidas no citado documento)
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