quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 – P7366: FAP (56): MIGs, MIRAGEs e miragens (António Martins de Matos)



1. O nosso Camarada António Martins de Matos (ex-Ten Pilav, BA12, Bissalanca, 1972/74, hoje Ten Gen Pilav Res), enviou-nos hoje, dia 1 de Dezembro, a seguinte mensagem:



MIGs, MIRAGEs e miragens

Quando o pessoal da Tabanca se encontra à volta de uma mesa. logo as histórias e recordações brotam de imediato... a emboscada, a mina, os periquitos, as bajudas, as noites de confraternização, a G-3, a Kalash... e por aí fora.
E volta não volta vem à baila o tema dos MIGs.

Que tinham sido vistos aqui e acolá, certamente pilotados por cubanos, por pilotos da Guiné Conacri ou mesmo do PAIGC, treinados na Rússia, na Líbia ou em Paio Pires, blá, blá, blá...

Falou-se muito de hipotéticos voos sobre o nosso território e até houve quem os tivesse visto a sobrevoar Bissau.

A nós, pilotos, o assunto não nos podia deixar indiferentes. Não podíamos ser apanhados de surpresa, tínhamos que estudar as características do inimigo, ver onde eventualmente poderíamos ser mais fortes e colmatar os pontos mais fracos.

Lá concluímos que, a existirem, os aviões adversários deveriam ser uma das inúmeras variantes do MIG-17, de fabrico russo, de características semelhantes aos nossos F-86 e utilizados por praticamente todos os países sob influência da então URSS.

Na Base de Monte Real já tínhamos ensaiado combates ar-ar entre o F-86 (simulando o MIG) e o G-91, e rapidamente chegámos à conclusão que, a baixa altitude, um F-86 (de melhor manobrabilidade) facilmente abateria um G-91. A única maneira do G-91 sobreviver era furtar-se ao confronto.

Verificámos igualmente que os MIGs-17 ainda estavam a ser utilizados no Vietname e que tinham obtido algumas vitórias sobre caças americanos F-105, aeronaves muito mais modernas e sofisticadas.

O assunto era de tal modo sério que acabou por ser levado às instâncias superiores.

Como solução, a FAP propunha a compra imediata de novos aviões que substituíssem os G-91, a escolha recaía numa aeronave de fabrico francês, os MIRAGE, não por serem superiores aos aviões americanos da altura, mas porque a França era um dos poucos países que ainda nos vendia armamento (no caso dos AL-III até já não se comprava à unidade, era mais ao quilo).

Cabe aqui um parêntesis para esclarecer que uma “compra imediata de aviões” levaria no mínimo uns dois a três anos a ser concretizada. Como estávamos em 1970, teríamos MIRAGEs lá para o início de 1973.

No meio deste desconforto de nos podermos encontrar cara a cara com um MIG-17, o que nos tranquilizava era não haver qualquer confirmação fidedigna de que o país vizinho dispusesse de aviões daquele tipo.

Cá pela minha parte várias vezes fui incumbido de ir voar junto à fronteira, a ver se via algum, nunca os enxerguei.

E deixem-me dizer-vos “ainda bem”, porque tendo o péssimo hábito de fazer perguntas, uma vez calhei a perguntar aos meus superiores, o que deveria fazer caso os avistasse: abatê-los, assustá-los, pirar-me, assobiar para o lado, eventualmente cumprimentá-los ?

Resposta do meu superior, “depois logo se vê”, como se tal fosse possível, num minuto tudo estaria iniciado e concluído.

Se, por um lado, nunca tinha encontrado nenhum MIG, nem por isso as minhas buscas tinham sido sempre em vão, uma das vezes encontrei um avião grande à vertical de Bissorã, um DC-7, seguia de sul para norte, lá fiz a fatídica pergunta aos meus superiores “que fazer?”, quando a resposta chegou já o tipo tinha deixado a Guiné e entrado pelo Senegal adentro.

Era assim a guerra da altura, sem radar que nos indicasse os intrusos, qualquer avião, avioneta, helicóptero ou similar podia atravessar o espaço aéreo da Guiné sem que dele tivéssemos conhecimento, só um olhar ocasional poderia dar algum alerta…

E com a época seca então era um descanso, ninguém via nada, à excepção do pessoal de Aldeia Formosa, esses estavam sempre a ver OVNIs. Ao princípio ainda os tivemos em conta mas depois foi como a história do “Pedro e o Lobo”, fartos de lá ir e nada encontrar, deixámos de os ouvir.

Em conclusão, 500 missões pelos céus da Guiné, para cima e para baixo, para a esquerda e para a direita e nunca vi nenhum MIG!!!

Passados todos estes anos e ao recordar o tema, penso que a história da ameaça dos MIGs foi demasiado empolada e resultou de um erro de julgamento por parte do Estado Maior (EM), erro iniciado a quando do caso do sobrevoo de Bissau, mal interpretado pelos analistas da altura. Senão vejamos:

Para situar o assunto, diz o Carlos Matos Gomes e Aniceto Afonso que o sobrevoo a Bissau dos MIG-17 se deu a 13 Fevereiro 1970, e que estes sobrevoaram igualmente a Base de Bissalanca. De acordo com os nossos estrategas, o significado da aparição deste avião era claro: “A FAP estava em inferioridade, pelo que foi decidido comprar em França uma bateria de mísseis Crotale e que um dos objectivos da missão Mar Verde fosse a destruição dos MIG-17”.

Dito e feito.

Interessante o raciocínio do EM de então, a FAP em inferioridade, em vez de se ir comprar o tal novo avião que a FAP já tinha pedido, que pudesse enfrentar os MIG, e/ou um radar que cobrisse o espaço aéreo da Guiné, resolverem antes comprar um brinquedo para o Exército.

Até porque, sem o dito radar, a identificação dos alvos continuava a ter que ser feita “a olho”, a ameaça com que os pilotos se debatiam, em vez de diminuir, aumentava...

Não só tínhamos que nos haver com as antiaéreas do IN como ainda passávamos a estar sujeitos a uma CROTALADA amiga, o nosso slogan de guerra estava cada vez mais actual: “Deus nos livre da antiaérea amiga, que da inimiga livramo-nos nós”! ... O meu amigo Pereira da Costa, artilheiro convicto, que me perdoe a “boca”.

Os Crotale foram efectivamente comprados mas só chegaram a Portugal já depois do fim da guerra.

Quanto aos MIRAGE, com um raio de acção capaz de facilmente atingir Conacri, ficámos a vê-los tipo miragem, lindos que eles eram, já me estava a ver no meio das aventuras do “Michel Tanguy e do Laverdure”.

No que respeita à busca e destruição dos MIGs, essas aeronaves necessitavam de uma pista com um comprimento relativamente grande (2,5 km), asfaltada, coisa que na vizinha Guiné apenas existia na capital, tudo o resto era curto e em terra batida.

A existirem eles teriam que estar estacionados em Conacri. No entanto, a quando da Operação Mar Verde, a busca pelo aeroporto acabou por se revelar um fracasso, nem rasto deles.

Constatava-se assim “in loco” que, ao contrário do que tinha sido assegurado pelo EM, na Guiné Conacri não havia MIGs.

Como explicar então o facto de terem sido vistos em Bissau?

No meu entender o caso tinha sido mal analisado pelos estrategas de serviço, antes de tirarem tão importantes conclusões deviam ter ido mais fundo, fazer mais perguntas: Eram MIGs os aviões que sobrevoaram Bissau? Quem os identificou como MIGs? A Guiné do Sekou Touré dispunha de aviões MIG-17?
Para perguntas simples, respostas simples... não... não dispunham!

Então a quem pertenciam aqueles 2 belos e gordos MIGs que, vindos do nada, tinham sobrevoado Bissau e desaparecido igualmente no meio do nada?

O mal dos nossos analistas era estarem sempre a olhar para o umbigo, leia-se Bula, Binar, Biambe... sem levantarem os olhos e verem o que se passava no mundo.

A guerra entre a Nigéria e o Biafra terminara há apenas uns dias, a Nigéria vencedora, mais de 1 milhão de mortos (não, não me enganei, 1.000.000).

Nas forças que apoiavam a Nigéria existiam cerca de 24 MIGs-17, de dono indefinido, pilotados por mercenários de vários países, Alemanha de Leste, Rússia, Reino Unido...

Duas hipóteses eram possíveis:

Como primeira hipótese a Nigéria poderia estar a querer oferecer os seus serviços, pouco provável naquele momento, o próprio Sekou Touré não se sentia muito seguro com os seus vizinhos.
Como segunda hipótese, a guerra terminada e pagamentos recebidos, os mercenários tinham de regressar aos seus locais de origem, o sobrevoo da nossa Guiné ficava nas suas rotas, porque em África e dado que os GPSs ainda não tinham sido inventados, uma maneira fácil de navegar era ao longo da costa.

Combustível a escassear, a vontade de aterrar em Bissalanca deve ter sido enorme, só que Portugal tinha apoiado o Biafra, se aterrassem ficavam com os aviões apreendidos, era preferível continuar até Dakar onde, por um punhado de dólares, podiam reabastecer e seguir viagem, eventualmente para Marrocos ou Argélia, países com aviões semelhantes.

Acham estranho? Eu não acho, ainda que me possam acusar de especulação.

Durante a guerra os aviões para a Nigéria passavam em Dakar, os que se destinavam ao Biafra aterravam em Bissau.

Até tínhamos na Base uma prova deste intercâmbio de aviões, um Gloster Meteor que um piloto a caminho do Biafra e por razões desconhecidas resolveu abandonar na BA-12.

E quantos T-6 tinham passado pela Bissalanca? 5? 10? 50? Não foi Portugal um dos principais apoiantes do Biafra?

Não posso terminar esta história sem voltar a falar dos MIRAGE.

E dar o braço a torcer, sempre a dizer mal dos nossos estrategas e afinal eles sempre acabaram por dizer que nós, os Aéreos, precisávamos dos tais aviões.

Aconteceu quando a Guiné ficou infestada de STRELAs. Só que aqui as coisas passaram-se de um modo um pouco diferente.

Para os MIGs, que acabaram por não aparecer, andámo-nos a preparar ao longo de inúmeros meses, sabíamos como enfrentá-los!! Para os STRELAs... nem sabíamos o que aquilo era... ninguém nos avisou!!!

E foi assim que, de surpresa em surpresa, em poucos dias perdemos cinco aeronaves e quatro pilotos!!!

Passado o choque inicial e identificado finalmente o tipo de arma que nos atacava, o nosso pedido era simples, só queríamos que substituíssem as 4 obsoletas metralhadoras do G-91 por 2 canhões de tipo semelhante ao do AL-III, bastava mudar os painéis laterais do armamento.

E até havia um modelo de G-91, o R-3 (o nosso era modelo R-4), que tinha os ditos
painéis.

Que não senhor, MIRAGEs é que era!!!

Imaginem só, nós a pedirmos um pãozito e eles a quererem dar-nos lagosta e caviar.
No final ficámos sem comer nada.

OK, sem nada também não é verdade, lá estou eu a ser torcido, no final lá conseguimos receber os tais G-91 R-3 com os painéis e os canhões em vez das metralhadoras...
Só que entretanto já estávamos em 1976!!!

Hoje em dia tudo é diferente. Na área operacional a tecnologia actual permite que um avião à vertical de Bissau possa facilmente abater um outro que esteja a passar por Bafatá, nem precisa de o ver, o radar faz todo o trabalho.

No que refere a ataques ao solo, lá dos seus 7.000 metros de altitude um piloto consegue ver o “mau da fita” a fazer pipi atrás de uma árvore, uma bomba largada da aeronave irá cair exactamente aos seus pés, ainda o apanha de calças na mão.

E é por causa de toda esta tecnologia que nenhum piloto vai para o ar sem conhecer as suas ROEs (Rules of Engagement), saber exactamente o que pode e não pode fazer.

Já na área do planeamento estratégico os problemas complexos continuam, como antigamente, a ter quatro tipos de soluções: A boa, a má, a que não lembra ao... e a de Estado Maior.

Um abraço,
António Martins de Matos
Ten Pilav da BA12
__________

Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:

7 de Outubro de 2010 >
Guiné 63/74 – P7097: FAP (55): Fuzileiro por um dia (António Martins de Matos)

16 comentários:

Eduardo J.M. Ribeiro disse...

Amigo AMM,

Testemunhos como este teu é que fazem falta para a leal, verdadeira e credível catarse da Guerra do Ultramar.

A narração de FACTOS! Indiscutíveis! Incontestáveis!

É claro que agora fiquei ainda com mais dúvidas sobre os MIGs, porque um camarada nosso, de que já não me lembro minimamente, garantiu-me que viu para as bandas de Mansoa um MIG ENORME perfeitamente disfarçado de nuvem…

Um outro camarada nosso que combateu em Conacri, na operação Mar Verde, de quem também não me lembro nada, mais me garantiu que viu vários MIGs disfarçados de árvores, ou de plantas, ou de algas, ou lá o que era.

Que chatice… porra!

Um abraço Amigo,
Magalhães Ribeiro

Hélder Valério disse...

Caro amigo AMMatos

Após uma ausência ainda assim prolongada destes comentários por causa de problemas informáticos, recomeço com este teu post.

Muito interessante e no que diz respeito àquela parte em que manifestas preocupação (relativa...) de que te possam acusar de especulação deixa-me que diga que está muito bem 'esgalhado'. É caso para aplicar a velha frase de que 'si non ne vero, é benne trovato'.

Todo o artigo é útil para a compreensão de muitas coisas, contém em si mesmo a ironia habitual e, por mim, dispenso bem alguma introduzida no comentário do Magalhães pois poderá fazer resvalar a atenção para outras coisas para além do conteúdo do post.


Um abraço
Hélder S.

Torcato Mendonca disse...

Caro António Martins de Matos

Comento breve:
- porque gostei da forma objectiva e directa dos assuntos focados;
- porque finalmente alguém, de forma clara e correcta, embora ao de leve, fala de uma guerra pouco ou nada aqui falada;
Acrescento só que haviam portugueses lá. O homem de Artilharia deve saber - (pode até nem nisso ter ouvido falar)- que os 8,8 parecem ter ido para lá.

Que não se abra mais uma frente de "combate" Abraço do Torcato

Carlos Silva disse...

Sr Ten General António Matos

Gostei desta sua lição esclarecedora e pedagógica
Já em tempos ouvi semelhante argumentação da boca de um seu camarada também ex-piloto da FA e que também sobrevoou os céus da Guiné.
Espero, assim e se necessário com mais intervenções do género que os “treinadores de bancada” sempre opinativos, neste caso “os controladores terrestres” que estavam em Cuntima e viam os MIGs ou outros a sobrevoarem o território guineense na zona de Aldeia Formosa, Cabedu, Cacine ou no leste ou vice-versa, para abaterem e esmagarem a nossa FA, pois os nossos pilotos nada faziam nada e medrosos, ficavam de braços cruzados a verem aqueles famosos pássaros voadores a voarem por cima das vossa cabeças, dizia eu, para uma vez por todas, tais “controladores terrestres” excelentes técnicos, se convençam das capacidades dos nossos pilotos e não só e acabem por dar razão aos nossos camaradas da FA.
Mais comentários para quê?
Um abraço amigo
Carlos Silva
Ex-Fur Armas Pesadas CCaç 2548/BCaç 2879

Luís Graça disse...

"E deixem-me dizer-vos 'ainda bem', porque, tendo o péssimo hábito de fazer perguntas, uma vez calhei a perguntar aos meus superiores, o que deveria fazer caso os avistasse [, aos MIG: abatê-los, assustá-los, pirar-me, assobiar para o lado, eventualmente cumprimentá-los ? Resposta do meu superior, 'depois logo se vê', como se tal fosse possível, num minuto tudo estaria iniciado e concluído" (...).

António, espantosa essa resposta do teu superior hierárquica, "depois logo se vê", tão tipicamente "nossa", tão desgraçadamente "portuguesa"... Só a possa interpretar como um sintoma de desnorte... E de modo nenhum como um elogio ao nosso tão famigerado (e até elogiado pelos estrangeiros) "desenrascanço"...

Parabéns, mais uma vez, pelo tyeu texto, com as ideias bem concatenadas, especulativo mas sem atropelos à lógica... E, claro, com o humor que lhe dá um toque "British"...

Quem tem o Strela, não tem necessariamente os MIG... Mas as guerras também se ganham com a propaganda e a desmoralização do inimigo...

Anónimo disse...

Tal rumor ou boato, em volta dos Migs deve ter extravasado o circulo militar, para chegar aos ouvidos da populacao civil..que ao seu jeito..(auto)incumbiu-se de o colorir !

E nao e que na minha infancia todo e qualquer aviao que cruzasse os ceus da Guine..deixando aquele caracteristico rasto branco la nas nuvens...para o povo e a meninada..era sempre o aviao ou Mig do Sekou Ture-(nome entretanto cochichado a socapa)

Nelson Herbert

Anónimo disse...

Os Strela vieram, como os tertulianos vítimas dos ditos comprovam, pouco depois do assassinato de Amilcar Cabral.

Não só os Strela como tambem a intensidade da guerra nas fronteiras (Guilege, Guidage...)

Nunca se pergunta porque este esforço de guerra da parte do IN, só após o desaparecimento de Amilcar.

É que eu assisti um novo esforço de guerra na Guiné Bissau, logo a seguir ao desaparecimento da cena política de Bissau, do irmão de Amilcar, Luis Cabral.

(Eu ligo muito a estes dois factos).

Chegaram a levantar vôo diariamente do aeroporto Osvaldo Vieira, 1 e às vezes dois MIG (21?) em 1983 e depois, de manhã e de tarde durante meses.

Semanalmente chegavam e partiam soviéticos num Tupolev durante anos, que se disseminavam pelos quarteis de Bissalanca.

E talvez o último grande fornecimento de material de guerra soviético a Bisau, ao PAIGC? ao Governo? ao Povo?, foram uns visíveis carros de combate, uns camiões, a fuselagem de unm MIG e umas tantas caixas e caixotes enormes, isto fins de 1986, perto da perestroika.

Todo esse material foi transportado por um enorme Navio qual Vera Cruz ou Principe Perfeito que conseguiu subir o canal do Geba o que não era muito fácil para uma bizarma daquelas.

Este enorme paquete deu um grande prejuizo com a manobra de zarpar,embatendo nos trabalhos da nova ponte cais em construção em Bissau.

O destino final deste paquete, foi no fundo da Baia de Moçâmedes, em Angola, onde ia descarregar mais alguma carga especial.

Foi um submarino sulafricano que lhe deu as boas vindas.

Quando se fala se perdemos a guerra do ultramar, deve-se perguntar se aguentavamos até à perestroika.

Evidentemente que tenho uma ideia porque os Mig levantavam muitas vezes do Osvaldo Vieira, e não era só para gastar gasolina, nem para proteger a Guiné nem os guineenses.

Abraço

Antº Rosinha

Anónimo disse...

"Nunca se pergunta porque este esforço de guerra da parte do IN, só após o desaparecimento de Amilcar."

Mais Velho Rosinha

Os "Strelas" foram por assim dizer uma encomenda anterior ao assassinato de Amilcar Cabral, que numa das suas deslocacoes a Moscovo,fizera questao de solicitar o dito armamento aos russos... Cabral jogou na altura com um elemento a favor... uma guerrilha bem mais avancada e estruturada,comparativamente as demais frentes em Africa. Dai a anuencia de Moscovo, foi um curto compasso de espera...

Relativamente aos esforcos de guerra...no pos morte de Cabral a razao encontra-se por conseguinte no facto do PAIGC sentir-se na altura irremovivel da sua tese, de que o assassinato do seu lider teria sido orquestrada a partir de Bissau. A luz dessa percepcao seria previsivel e coincidente que Portugal intensificasse as accoes armadas contra os guerrilha..

Foi pois esta a logica a ditar..essa especie de postura antecipatoria da guerrilha...com cada comandante a assumir a iniciativa de levar a cabo as varias operacoes registadas no pos morte de Cabral..diga-se, algumas como as de grande envergadura (Guiledje, Gadamel e Guidage..etc...) previamente preparadas ainda com Amilcar Cabral em vida...

Esta e pelo menos o testemunho dos varios antigos camaradas de Cabral, ao longo dos anos indagados e a proposito por mim !

Quanto aos Migs e seus sobrevoos a Bissau, no ano 1983,tal como se refere ...diria tratar-se de algo que se inicia bem antes desse periodo.

A margem devo dizer que fui colega de turma/escola de uma boa parte dos jovens pilotos da Forca Aerea guineense...(so nao fui um deles, porque vocacao para tal nao tinha..sempre preferi os pes assentes aqui na terra)...mas diria, que a chegada dos Migs a Bissau coincidiu com a conclusao da formacao desses jovens pilotos..entre 1978/80...isto numa altura em que entre Bissau de um lado e Dacar e Conacry de outro, vivia-se e com intensidade os primordios de um conflito gerado pela delimitacao da fronteira maritima entre tais estados vizinhos ...com uma consequente e acentuada movimentacao militar de ambos os lados da fronteira comum....

Abro um parenteses a este proposito para sublinhar a forma aguerrida como o antigo presidente Luis Cabral,soube impor os direitos da Guine, sobre fronteiras coloniais, por conseguinte previamente definidas...E o que aconteceu depois nessa materia,no pos 14 de Novembro e o que se sabe..

Durante esse periodo...na Guine viveu-se em estado de prontidao para uma guerra em defesa das fronteiras nacionais...a que nao escaparia por certo, como calcula, toda a minha geracao !

Portanto,nao vejo outra razao para que os factos a que se refere no seu comentario nao estejam porventura estritamente relacionados com o entao momento vivido..no pos 80!

Quanto a entrada de cargas militares russas pelo Geba,..presenciei algumas vezes tais operacoes....ja que meu "Velho" como um dos responsaveis das operacoes do Cais de Bissau...tinha que acompanhar de perto e na calada da noite,diga-se...tais desembarques...

Ante aos sucessivos cortes de energia electrica a que se vivia Bissau,era habito meu usar as instalacoes do Porto de Bissau (ganinete do meu pai) para em dia por, os afazeres escolares e docentes na epoca !

Quantas vezes nao se amanheceu em Bissau, com o asfalto de algumas vias, completamente carcomidas pelos "lagartos" dos blindados ?

Se adqueri-los a Franca ou a Portugal na altura se impunha como algo impossivel, seria obviamente natural que as FARP fossem equipadas pelos seus aliados do leste europeu ...

Mantenhas

Nelson Herbert

Anónimo disse...

A bateria de mísseis Crotale incluía radares de vigilância e localização.
Quanto à segurança das aeronaves portuguesas, face aos Crotale,, c'os diabos, há várias maneiras de tal assegurar mesmo sem sistema IFF.
Apesar de termos um EM de "nabos", foram capazes de projectar e manter 150000 homens, em África, com recursos escassos.
Apesar de tudo, 500 missões pelo ar, sem ver um Mig, foram bem melhores que os mais de 500 km que, á minha conta, meti nas pernas a levar na cabeça e sem A/C e outras mordomias à minha espera.
A guerra foi feita com o dinheiro que havia e com o que se conseguia comprar no mercado. Eu também pedia um simples radar contra-morteiro (bem mais barato que os mísseis e os jactos) para escavacar as armas pesadas do PAIGC e acabar de vez com as flagelações que suportava. A resposta foi sempre: "Onde adquirir? EUA, Alemanha, França, Suécia..., nem querem ouvir falar no negócio."
Mas não me atreverei a depreciar o EM.
Ricardo Cabral

Anónimo disse...

António Martins de Matos

Entendo que este artigo é suficientemente exaustivo para "arrumar" definitivamente essa hitória dos MIG's.
Assim outros aparececessem para esclarecer outros assuntos abordados aqui também de forma nebulosa.
Só quem não tenha um minimo de conhecimento do que era/foi a aviação não entende a tal necessidade de voar ao longo de uma referência/uma linha no solo para atingir um destino, como era o caso da linha de costa... assim a autonomia da aeronave o permitisse... em relação ao planeamento do voo.
Alberto Braquinho

Antº Rosinha disse...

Nelson, tudo o que dizes é o que ficou praticamente oficializado como explicação dos acontecimentos e suas causas, tanto em 1973 com Amilcar como o que aconteceu com o Luis.

Mas tanto a mim como aqueles que fomos continuando por lá, que viamos por fora o que se ia passando, sempre intrigou a aparente indiferença dos soviéticos com o que se passou com Luis Cabral.

Enquanto os jornalistas portugueses, franceses,e os embaixadores de Suécia e outros, demoraram em aceitar o golpe, e faziam perguntas para o Nino explicar, até que ao fim de dois ou três dias para se ver livre se sai com as culpas para cima de Luis, sobre as valas comuns dos combetentes, em que ele diz "Mi Ká sibi nada", mi Ká misti nada" etc., a tranquilidade do Nino, para muitos, residia no papel dos soviéticos.

Algo no Luis Cabral não "agradava" muito aos russos.

A história do petróleo em 1981/2/3 corria efectivamente emn Bissau, trabalhava eu no prolongamento do aeroporto e vi pilotos guineenses a pilotar mas tambem soviéticos.

Mas e aquele enorme barco carregado de material de guerra já perto fim de 1986? o tal que foi "naufragar no porto de Moçâmedes?

Aí já não se falava em petróleo, e coincidiu com a construção da grande embaixada soviética, e aproximava-se ou já estava em preparação a célebre batalha angolana "do Cuito Canavale", que a par do afeganistão foi muito mau para os russos.

Nelson a história tem que se escrever, mas tem que tambem ser explicada.

Bissau era o ponto de apoio mais apropriado para muitos fins, e será que o protagonismo e projecção internacional de Luis não estaria a complicar?

Mas estás a ver o meu ponto de vista e de mais outros que não querem falar.

Mudando de assunto, será que tu tambem foste estudante frequentador do jardim do Alto Crim (mãe dágua) em 1980? Onde hoje tem a Assembleia?

Se foste, peço-te desculpa, mas fui eu que à frente de uma buldozer o destruí com dois jardineiros a chorar e vários jovens e studantes a olhar para mim com raiva.

Até eu tive raiva de mim próprio.

Mas fica para outra vez.

Um abraço

Anónimo disse...

Ia falar curto, contra o meu costume, e dizer-te apenas "que bem esgalhado está este teu trabalho, camarada!".
Porém, o bichinho levou-me à leitura dos comentários já plantados pelos outros campónios e não é que chego ao Helder Valério e vejo com estes olhos que a terra há-de comer, a gaita do "esgalhado"?!
Porra, este gajo já me lixou, pensei, sem o tal "depois logo se vê" do teu superior à mão para resolver a enrascada.
A repetição, contudo não é coisa tão feia assim, senão não andaríamos todos na repetição uns ao outros enquanto cá andamos.
Que bem esgalhado está o teu texto, camarada
José Brás

Luís Dias disse...

Caro António Martins de Matos

Será desta que alguns deixam de nos impingir a estrondosa derrota militar, que nos estava preparada pelo PAIGC e os "seus pássaros voadores". Alguém que lá esteve, que viveu a guerra, que andava pelos céus da Guiné, não viu rasto dos tão propalados MIG17??? Um espanto!!!
Obrigado AMM pela sua realidade e, já agora, contada de uma FORMA BEM MILITAR, e claro muito à portuguesa e para bons entendedores ficámos esclarecidos. Muito bom o seu texto. Fiquei fã.
Um abraço
Luís Dias

Joaquim Mexia Alves disse...

Camarigo António

Perfeito!

Os mitos e as lendas!!!

Por acaso não ouviste falar em porta-aviões a serem entregues ao PAIGC para poderem ter os MIGs no Geba, não???

Um grande abraço

Luís Graça disse...

O que se passará com o nosso amigo Matthew Hurley, ten-cor da Força Aérea dos EUA, que estava a fazer a a sua tese de doutoramento ? Não sei se o Miguel Pessoa tem notícias dele...

Extracto de um texto, por nós publicado, com a estrutura do trabalho:

(...) "Para os portugueses, este foi principalmente um estudo das limitações, dadas as restrições impostas pelos E.U.A. e NATO quanto ao material que a FAP podia desviar para a luta na Guiné.

"Para o PAIGC, por outro lado, é essencialmente um avolumar de oportunidades à medida que Amílcar Cabral e os seus sucessores travavam uma cada vez mais bem sucedida campanha pela ajuda militar por parte do bloco comunista.

"Este capítulo analisará também o desenvolvimento de sistemas específicos de defesa aérea que foram mais tarde usados na Guiné-Bissau, incidindo sobre a sua adequação à guerra de guerrilha e o seu uso em conflitos anteriores, a fim de fornecer uma perspectiva para o seu posterior emprego pelo PAIGC.

"Esta utilização final é objecto do sexto capítulo, que vai analisar a guerra aérea na Guiné-Bissau de 1973 a 1974. Este foi o período em que o PAIGC usou pela primeira vez o míssil portátil soviético ZPRK Strela-2M (Código NATO SA-7 Grail), que inicialmente reduziu a eficácia da FAP; embora as tácticas usadas mais tarde limitassem a eficiência dos mísseis, as perdas sofridas inicialmente e o seu impacto na eficácia da FAP continuaram a limitar as operações aéreas dos portugueses até ao fim da guerra.

"Também durante este período, Portugal recebeu relatos de que a União Soviética estaria a treinar pilotos do PAIGC para pilotar MiGs baseados na vizinha Guiné-Conakri, um programa que teria neutralizado definitivamente a superioridade aérea dos portugueses se fosse implementada (a FAP não dispunha de aviões específicos para o combate ar-ar).

"O capítulo seguinte, que é o capítulo de fundo final, irá explorar o impacto desses acontecimentos no moral dos militares portugueses, na estabilidade política e no golpe de estado de Abril de 1974 que praticamente trouxe um fim à guerra.

"Um capítulo conclusivo tentará retirar lições relevantes para o actuais desafios de insurreição com que se defrontam hoje os Estados Unidos e os seus aliados!" (...)


Vd. poste de 27 de Maio de 2009
Guiné 63/74 - P4423: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (2): Parte II

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2009/05/guine-6374-p4423-o-poder-aereo-no-ctig.html

Jose Matos disse...

Vai sair na revista “Mais Alto” da Força Aérea no número de Novembro/Dezembro, um artigo esclarecedor sobre a questão dos Mirage, que revela toda a história por trás deste avião. A este respeito já foi publicado no actual número da revista inglesa Aviation Classics, um artigo sobre o mesmo tema, que aconselho a quem se interessa pelo assunto. Julgo que a revista se vende em Portugal, mas tem um site na net basta procurar..