Data: 23 de Novembro de 2010 12:43
Assunto: Cap Teixeira Pinto e as guerras de pacificação na Guiné (*)
Caro Luis Graça (*),
Assunto: Cap Teixeira Pinto e as guerras de pacificação na Guiné (*)
Caro Luis Graça (*),
Como deves saber, nós africanos, pelo grande respeito que dá-mos a idade e aquele que nos é mais velho, nunca nos podemos considerar iguais aos mais velhos, é uma questão cultural, sim senhora, mas também filosófica, metodológica, antropológica etc.
Nunca posso esquecer o facto de que, quando eu ainda deambulava quase nú no quartel, já alguns de vocês eram oficiais do exército. Sobre isto nada se pode sobrepor, nada, nem a idade entretanto adquirida, nem a experiência acumulada, nem a formação académica. O respeito e admiração que tive por vocês ficou gravado para sempre na minha memória.
Nunca posso esquecer o facto de que, quando eu ainda deambulava quase nú no quartel, já alguns de vocês eram oficiais do exército. Sobre isto nada se pode sobrepor, nada, nem a idade entretanto adquirida, nem a experiência acumulada, nem a formação académica. O respeito e admiração que tive por vocês ficou gravado para sempre na minha memória.
Lembro-me que nós reproduziamos nas nossas brincadeiras o comportamento das hierarquias militares tal qual observávamos no quartel:
(i) O Capitão era o mais sério, o mais corajoso, o primeiro que seguia para a frente do combate no seu pequeno Jipe, em pé, ao lado do condutor (esta era a reprodução da figura do Cap Carvalho); quando passeava punha sempre uma das mãos, normalmente a esquerda, atrás das costas ou copiando o General Spínola, tinha uma bengala ou chicote na mão direita;
(ii) O Alferes era o que sempre estava muito perto do Capitão, pronto para o substituir em caso de...
(iii) Os furriéis eram os mais aprumados, impecáveis, bem parecidos, mulherengos...
(iv) Os Sargentos eram identificados com a figura do Vagomestre, um pouco mais velhos, maus por norma e barrigudos, era raro encontrar um Sargento que fosse também bom atleta; eram mais ou menos solitários, mais ou menos melancólicos, cara de poucos amigos, até os soldados fugiam deles, nem oficiais nem subalternos, uma posição complicada, eram bons na aplicação de castigos.
Perdíamos horas a fio nessas brincadeiras de figurinos teatrais do comportamento da tropa metropolitana. Por serem nossos, desvalorizávamos os milícias que não passavam de réplicas sem grande jeito, mas quando era preciso ir para a guerra, socorrer uma aldeia, sabíamos que eles é que iam a frente.
(i) O Capitão era o mais sério, o mais corajoso, o primeiro que seguia para a frente do combate no seu pequeno Jipe, em pé, ao lado do condutor (esta era a reprodução da figura do Cap Carvalho); quando passeava punha sempre uma das mãos, normalmente a esquerda, atrás das costas ou copiando o General Spínola, tinha uma bengala ou chicote na mão direita;
(ii) O Alferes era o que sempre estava muito perto do Capitão, pronto para o substituir em caso de...
(iii) Os furriéis eram os mais aprumados, impecáveis, bem parecidos, mulherengos...
(iv) Os Sargentos eram identificados com a figura do Vagomestre, um pouco mais velhos, maus por norma e barrigudos, era raro encontrar um Sargento que fosse também bom atleta; eram mais ou menos solitários, mais ou menos melancólicos, cara de poucos amigos, até os soldados fugiam deles, nem oficiais nem subalternos, uma posição complicada, eram bons na aplicação de castigos.
Perdíamos horas a fio nessas brincadeiras de figurinos teatrais do comportamento da tropa metropolitana. Por serem nossos, desvalorizávamos os milícias que não passavam de réplicas sem grande jeito, mas quando era preciso ir para a guerra, socorrer uma aldeia, sabíamos que eles é que iam a frente.
No intuito de seguir o teu conselho e ver alguns trabalhos sobre o Cap Teixeira Pinto, acabei por cair no poste P1615: Historiografia da presença Portuguesa(5): Capitão Diabo, herói do Oio, João teixeira Pinto (1876-1917).
[ Foto à esquerda: João Teixeira Pinto (1876-1917), com barbas compridas e os galões de alfres; foto com uma dedicatória manuscrita do oficial português "à sua querida mulher com um beijo do seu marido muito amigo. 27 de Maio de 19__(?). Oferece João Teixeira Pinto".]
[ Foto«: © A. Teixeira-Pinto (2007). Direitos reservados.]
Penso que há um erro de localização do Sancorlá na frase que diz: "Fulas Forros de Sancorla (No Cuor, a nordeste de Missirá". Aqui, com toda a certeza, faz-se referência ao regulado que mencionei nas minhas memórias, da casa real de Canhámina, cujas ligações com a minha familia também falei.
O Boram Jame do texto é o Patriarca e régulo de Sancorlá, nosso avó comum (Buran Djame ou Braima Djame) dos tempos do Administrador de Geba, Calvet de Magalhães. Durante o seu reinado, o regulado de Sancorla foi um aliado fiel da administração colonial e amigo do Governador Muzanty, tendo combatido ao lado desta entre os rios Geba e Cacheu, com Sousa Lage (1891-1892) contra Mussa Molo, Graça Falcão (1897) no Oio/Morés e João Teixeira Pinto (1913-1915) em toda a Guiné.
Tudo o que sei de concreto sobre o Cap Teixeira Pinto, encontrei em livros, com destaque para o livro, história da Guiné, de René Pelissier. As nossas fontes tradicionais, além de escassas (os griots são os fieis depositários), normalmente, são mitológicas e algo deformadas com o passar dos tempos.
Contam-se muitas histórias sobre estas guerras e há referências a certos locais e pessoas que se destacaram numa ou outra batalha, em especial a última repressão aos Canhabaques (Bijagós) mas sem muito rigor nem datas e locais precisos. Seria preciso fazer uma vasta colecta e depois comparar as narrativas de diferentes fontes orais.
[ Foto à esquerda: João Teixeira Pinto (1876-1917), com barbas compridas e os galões de alfres; foto com uma dedicatória manuscrita do oficial português "à sua querida mulher com um beijo do seu marido muito amigo. 27 de Maio de 19__(?). Oferece João Teixeira Pinto".]
[ Foto«: © A. Teixeira-Pinto (2007). Direitos reservados.]
Penso que há um erro de localização do Sancorlá na frase que diz: "Fulas Forros de Sancorla (No Cuor, a nordeste de Missirá". Aqui, com toda a certeza, faz-se referência ao regulado que mencionei nas minhas memórias, da casa real de Canhámina, cujas ligações com a minha familia também falei.
O Boram Jame do texto é o Patriarca e régulo de Sancorlá, nosso avó comum (Buran Djame ou Braima Djame) dos tempos do Administrador de Geba, Calvet de Magalhães. Durante o seu reinado, o regulado de Sancorla foi um aliado fiel da administração colonial e amigo do Governador Muzanty, tendo combatido ao lado desta entre os rios Geba e Cacheu, com Sousa Lage (1891-1892) contra Mussa Molo, Graça Falcão (1897) no Oio/Morés e João Teixeira Pinto (1913-1915) em toda a Guiné.
Tudo o que sei de concreto sobre o Cap Teixeira Pinto, encontrei em livros, com destaque para o livro, história da Guiné, de René Pelissier. As nossas fontes tradicionais, além de escassas (os griots são os fieis depositários), normalmente, são mitológicas e algo deformadas com o passar dos tempos.
Contam-se muitas histórias sobre estas guerras e há referências a certos locais e pessoas que se destacaram numa ou outra batalha, em especial a última repressão aos Canhabaques (Bijagós) mas sem muito rigor nem datas e locais precisos. Seria preciso fazer uma vasta colecta e depois comparar as narrativas de diferentes fontes orais.
Com um grande abraço,
Cherno Baldé
____________
Nota de L.G.:
(*) Na sequência de comentários ao poste de 21 de Novembro de 2010
____________
Nota de L.G.:
(*) Na sequência de comentários ao poste de 21 de Novembro de 2010
Caros amigos,
Desculpem a intromissão em assuntos de mais velhos mas, na minha opinião, Portugal, cometeu erros estratégicos na Guiné por não ter dado a devida atenção as lições do Capitão Teixeira Pinto.
Eu sei que o contexto não era o mesmo mas ele teve o mérito de, em pouco tempo, fazer uma avaliação correcta da situação e decidir que, para o caso da Guiné não precisava de batalhões de tropas metropolitanas nem de muitos Grumetes a mistura. Claro que esta decisão teve suas consequencias boas e más, todavia ele foi eficaz e os efeitos foram, de certo modo, duradouros.
De resto, todos estamos de acordo que a solução final só podia ser política. Cherno Baldé.
(ii) Comentário de L.G.:
Cherno:
A Tabanca Grande é uma "sociedade de iguais"... onde não há a classe dos "mais velhos" (com excepção do Rosinha, mas só por graça...) nem dos "djubis" (com excepção de ti, por que para nós serás sempre o Chico de Fajonquito, "menino e moço"...).
Humor à parte, conta-nos lá a "tua" história sobre o Capitão-Diabo (como ficou conhecido entre os guineenses) (...).
Último poste da série > 18 de Setembro de 2010