Por razões de agenda, ficou por publicar uma sua mensagem, datada de domingo, 3/12/2023, 20:44. Fazèmo-lo agora, com o nosso pedido de desculpas pelo atraso. Mas o seu interesse e atualiddae mantêm-se.
Caro Luís Graca,
Desculpa o meu longo silêncio. Às vezes não dá para melhor! Mas aqui estou.
Por razões várias , umas que de longa data têm esperado concretização e outras inesperadas que não aceitam adiamentos, estou em Portugal. E também por razões que não dependem de nós, eu e a Vilma viemos e vamos voltar para Nova Iorque em datas diferentes. Ela só chega no dia 6 e volta a 18. Eu já estou aqui desde o dia 27 de Novembro e vou voltar a Nova Iorque em 20 de Dezembro. Ainda vamos a tempo de fazer algo para celebrar o Natal com os nossos queridos, mas as decorações e luzes na frente da nossa casa que costumam ser parte desta época natalícia vão ficar esperando para o próximo ano.
O muito que tencionava fazer obrigava-me a vir mais cedo, mas desta vez os ventos estavam a favor e inesperadamente acabei por resolver vários assuntos muito mais depressa do que antevia. Como resultado reorganizei a minha agenda de modo a poder ver familiares e amigos que, pensava eu, não ia ter tempo de ver. Dentre destes alguns camaradas da Guiné.
E assim:
a 29 de Novembro: tive a oportunidade de ver um camarada que esteve na Guiné na mesma altura que eu, o Germano Estêvão, da CCAÇ 1549, BCAÇ 1888, ainda meu primo. Recorda-se bem que nos encontrámos uma vez em Tite, facto que eu tinha esquecido mas de que depois me lembrei. Estava festejando o seu aniversário de casamento com a sua esposa Etelvina. Eu sabia disso e já tinha telefonado e convidado a aparecer um outro camarada nosso, o furriel Peixeira que na Guiné foi comandante do Germano e que tu conheces bem por muitos motivos.
Como não podia deixar de ser as Guinés, de antes e de agora, estiveram presentes pois o Peixeira logo apresentou um calhamaço de fotos e outros documentos , incluindo uma
Petição à Presidência da Assembleia da República para a qual ele está angariando assinaturas.
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Na 1ª foto do lado direito: eu, o Germano e a senhora Etelvina, sua esposa. No lado esquerdo o Peixeira e sua esposa. Na 2ª foto, um excerto da recolha de assinaturas de antigos combatentes, que está a efectuar o Joaquim Peixeira, para efeitos de petição à Assembleia da República.
No dia seguinte, 30 de Novembro, fui a Leiria com o fim de ver o meu muito querido António Rodrigues, de quem também te deves lembrar pois estivemos juntos em vários "encontros das famílias Crisóstomo e Crispim”, encontros em que eu incluia os meus amigos e camaradas da Guiné.
A sete de Maio passado o António ao sair de casa caiu e bateu com a cabeça num muro. E tem estado desde então num estado de coma quase total, primeiro em hospitais e agora numa casa “Lar para idosos “, a ADESBA , na Barreira de Leiria.
Fui-o ver, acompanhado de dois familiares que o visitam todos os dias mas não sabemos sequer ao certo se ele dá pela presença de alguém. É de partir o coração, mas a idade e a vida por vezes obriga-nos a ter de aceitar tanta coisa que nem dá para compreender.~
O tempo permitiu-me ainda uma outra visita, esta muito diferente da primeira: cumprindo a minha promessa que faço a muita gente por telefone. especialmente pela época de Natal de, "se um dia ocasião propícia aparecer vou-te visitar”, eu fui ver um camarada, condutor, que pertencia à minha companhia CCAÇ 1439. É o António Agostinho (comigo na foto a seguir) a quem chamávamos "o Marrazes” , nome da terra onde vive e onde eu o fui agora visitar.
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Eu e o António Agostinho (o "Marrazes")
Apesar das minhas repetidas “promessas", parece que ele nunca acreditou que alguém aparecesse mesmo para o ver. . Assim me pareceu pelo abraço que me deu. "Não podes imaginar, repetia ele, a alegria que me deste.” Se assim foi, valeu a pena, pois por minha parte o rever e em boa saúde um camarada que não via há muitos anos foi satisfação grande também.
Dia 2 de Dezembro. Depois dum almoço no "Restaurante Braga”, no Vimeiro, Lourinhã, com a São, esposa do nosso saudoso Eduardo Jorge Ferreira, o Rui Chamusco e alguns seus familiares que o vieram visitar, sobrou-me tempo para o que bem entendesse.
Depois de ver um sobrinho meu lembrei-me dum outro camarada da Guiné com quem andei na escola primária e que esteve na Guiné ao mesmo tempo que eu. Vi-o a última vez há mais de sete anos, em Abril de 2016, mas não me lembrava já onde ele morava, pelo que perguntei ao Germano, o meu primo de quem falei atrás se ele sabia e me podia ajudar. E lá fomos para o encontramos, muito cabisbaixo, sentado num banco ouvindo rádio. Estranhei que não nos ligasse muito, para logo nos dizer que estava só e muito triste pois que sua esposa estava num lar, sem grandes esperanças de a poder ver de novo na sua casa.
A Guiné e suas recordações foram o auxílio que ele precisava para se reanimar. Chama-se Jaime Moreira. Quando éramos garotos ele era o “Jaime dos aeroplanos”, mas eu nunca soube a razão de “aeroplanos”. Pertencia à CCAÇ 1417, BCAÇ 1856. Para logo me perguntar se eu conhecia o Alferes Ceril (?) e o capitão Aranha Gonçalves. Respondi que não, mas isso não foi razão para ele parar de lembrar bons e maus bocados, que lá passou.
Lembrava bem Bafatá e Nova Lamego onde ia e passou muito tempo, graças, explicava ele , à situação de alguma maneira privilegiada da sua companhia , mercê dos conhecimentos e protecção de alguém bem relacionado junto do General Schultz.
Mas lembrava também Madina do Boé e os maus bocados e aflições que aí passou; assim como uma grande operação em que tomou parte e em que o transporte/ passagem do Corubal de todo o material de todas as categorias levou quase três dias, durante os quais passou as ruas da amargura, enquanto o oficial que comandava/dirigia essa operação de passagem do Corubal o fazia sempre duma avioneta... .
O meu primo Germano, à esquerda
A esta altura o nosso camarada Jaime, que foi também meu colega de escola primária, já não era o mesmo homem que nos tinha recebido. Falava pelos cotovelos e queria e insistia em contar mais coisas que lembrava bem. E quando estávamos a partir ele disse ao Germano que o queria ver mais vezes para não se sentir tão sozinho. O Germano disse-me então que apesar de saber notícias dele e onde ele morava etc, realmente desde há muitos anos nunca mais o tinha visto talvez desde que saiu da tropa .
Oxalá este encontro e possivelmente outros, que fazem renascer velhos conhecimentos e amizades continuem ajudando a quem de companhia e contactos mais frequentes necessitam.
3 de Dezembro. É dia de aniversário do Manuel Leitão , o nosso querido “Mafra”. Também a ele eu tinha prometido fazer o possível para lhe ir dar um abraço. Aniversário de nascimento é só uma vez ao ano… Mas desta vez havia razão especial : a sua esposa Felismina já se encontrava em casa depois de longa e preocupante estadia no hospital.
Se o 80º aniversário do Mafra já era motivo de muita alegria , o facto de terem de volta a esposa e mãe multiplicou mil vezes essa satisfação. Mesmo sem grandes manifestações, eu imaginava o que o Mafra e os filhos estavam sentindo. Senti-me muito muito feliz por me terem deixado ser parte desta celebração e de momentos de tanta felicidade para todos eles.
Eu, o Manuel Calhandra Leitão (o "Mafra") e a esposa, em dia de aniversário
Fotos (e legendas); © João Crisóstomo (2023). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Já regressei a casa. Ainda queria ir visitar a Aranha Antunes, em Santa Cruz, mas senti-me cansado e a idade começa a ser mais forte toque as intenções.
Com muita antecipação de vos poder ver em breve, para ti e para a tua querida Alice um abraço grande.
E como costumas publicar os E mails que te envio em que falo dos nossos camaradas da Guiné, aproveito para, de coração desejar a todos os meus amigos/camaradas da Guiné, especialmente aos extraordinários voluntários teus ajudantes editores Carlos Vinhal, Eduardo Magalhães Ribeiro e Jorge Araújo que contigo conservam e alimentam a chama do nosso blog, uma época festiva tão boa como cada um possa desejar para si mesmo e os seus queridos.
João Crisóstomo