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sexta-feira, 23 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2875: Agenda Cultural (1): A Guerra Colonial na Pintura, Cinema e Literatura.

Artes Plásticas, Cinema e Literatura na Memória da Guerra (Colonial)


Debate (Lisboa, Museu da Electricidade, 24 de Maio)

Mesa-redonda; Museu Electricidade


Vai ter lugar pelas 17,30h de sábado, dia 24 de Maio, no Museu da Electricidade, em Lisboa, uma mesa-redonda em que José Luís Porfírio, Beja Santos e João Mário Grilo, num debate moderado por Alexandra Prado Coelho, discutirão a exposição de Manuel Botelho - ali presente, na Sala do Cinzeiro 8.



Confidencial/Desclassificado II: ração de combate, inaugurada a 23 de Abril e que estará patente ainda até 22 de Junho, trata a temática da guerra colonial em que Portugal esteve envolvido e o que ela teve de influência sobre a expressão de alguns artistas portugueses.

Um debate que promete e para o qual vos convidamos.

Lembra-se que José Luís Porfírio é um profundo conhecedor da obra de Manuel Botelho; João Mário Grilo domina o cinema documental que fala da guerra colonial e Beja Santos editou, já este ano, o livro "Diário da Guiné 1968-1969: na terra dos Soncó".

Para esclarecimentos: Salvador Peres: 939 541 601

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Adaptação do texto da responsabilidade de vb

sábado, 22 de dezembro de 2007

Guiné 63/74 - P2374: O meu Natal no mato (10): Bissau, 1968: Nosso Cabo, não, meu alferes, sou o Marco Paulo (Hugo Guerra)

1. Mensagem do Hugo Guerra (ex-Alf Mil, hoje Coronel DFA, Pel Caç Nat 55 e Pel Caç Nat 50, Gandembel, Ponte Balana, Chamarra e S. Domingos, 1968/70) (1):

Camaradas Tertulianos:

Não queria deixar passar esta oportunidade sem vos contar uma estória que se passou comigo em Bissau, aí por volta do Natal.

Ao longo dos anos que já passaram recordo-a com graça e só tenho pena de não ter sido filmada porque era capaz de ser publicada no Youtube ou outra coisa parecida.

Dezembro 1968 . Tinha vindo a Bissau ao hospital fazer uma desintoxicação de Gandembel.

Com mais dois camaradas descíamos a Avenida que vinha do Palácio do Governo em direcção à baixa ,mais concretamente aos Correios. Eis senão quando, qual emboscada do IN, aparece a Polícia Militar, que no cumprimento da sua espinhosa missão me ataca com todas as armas de que dispunha e me passa um raspanete por eu ter mais botões desabotoados do que os permitidos no RDM. Logo a mim que me considerava um dos poucos da tropa-macaca que tinha experiência in loco do famoso corredor de Guileje...

Fiquei urso, mas os rapazes até tinham razão e lá abotoámos os botões. Chegados aos Correios, no meio da barafunda total estava um esganiçado e aperaltado 1º cabo, com a camisa desabotoada até ao umbigo.

Depois do que me acontecera pouco antes, aquela situação caía como sopa no mel... Afiando as garras tivemos este diálogo:

- Ó nosso cabo, ouça lá.

- Ó nosso cabo não, meu Alferes, sou o Marco Paulo... (Desconhecia em absoluto quem era semelhante personalidade) (2).

- Marco Paulo uma merda, ou abotoa esses botões todos ou temos chatice! - respondi eu.

Claro que o obriguei a estar em sentido até acabar o castigo e comecei a aperceber-me duns sorrisos à socapa dos camaradas que estavam por ali….

Satisfeito com a minha façanha do dia, viemos para fora e só então fiquei a saber que tive muita sorte por ele não ter dito nada…..senão ainda levava uma porrada e era enviado pra Gandembel, aliás para onde regressei passados 2 ou 3 dias depois.

Ao longo dos anos ainda sorrio quando me lembro desta estória …de Natal.

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Notas de L.G:

(1) Vd. post de 29 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2312: Tabanca Grande (43): Hugo Guerra, ex-Alf Mil, Pel Caç Nat 55 e 50 (Gandembel, Ponte Balana, Chamarra e S. Domingos, 1968/70)

(2) Extactos de uma recente entrevista do cantor Parco Paulo (nascido em Mourão, há 62 anos de idade, e com 41 anos de carreira...), ao Correio da Manhã, em 9 de Junho de 2007:

Fez tropa na Guiné durante dois anos. Do que se recorda?

– Recordo-me de ter pedido a todos os santos para não ir, acima de tudo porque eu sabia que se fosse para a Guiné possivelmente quando regressasse já não podia dar seguimento à minha carreira. A minha sorte foi que o meu produtor, Mário Martins, fazia sempre questão que eu viesse de férias. Durante esse período eu gravava, e quando voltava para a Guiné a editora lançava o disco. Por isso nunca caí no esquecimento.

Chegou a sentir medo?

– Quando cheguei à Guiné não foi fácil. Pensei: “Olha, vou para o mato. Levo lá um tiro na cabeça e pronto!” Só que fui para o quartel da Amura, para a secção de Justiça, como escriturário. Ouvia os bombardeamentos, mas não deu propriamente para sentir medo. Depois, como a rádio lá passava muitos discos meus, eu era aproveitado para abrilhantar as festas militares.

Compreendeu, à época, as motivações daquela guerra?

– Eu não estava por dentro dos assuntos da política. Disseram-me que Guiné era Portugal e eu acreditei. Hoje, olhando para trás, vejo que foram dois anos perdidos.


Também nas Selecções do Reader's Digest - Portugal - Revista, pode ler-se uma entrevita com o Marco Paulo, a propósito dos 35 anos de carreira e dos 3 milhões de discos vendidos. Alguns excertos relativos ao tempo que o MP esteve na Guiné:

(...) LO: Voltando um pouco atrás. Onde cumpriu o serviço militar?
MP: Na Guiné. Quando fui para a guerra, já tinha gravado dois ou três discos, discos sem grandes sucesso mas que passavam na rádio e que já vendiam alguma coisa. Ao regressar da guerra, não fazia ideia do que seria a minha vida no futuro, não era líquido que o meu futuro passasse pelas cantigas.


LO: Recorda o dia em que partiu para a guerra?

MP: Muito bem. No fundo, não sabia para onde ia. Foram dias muito inquietantes, mas por sorte acabei por ir parar a Bissau. Os meus pais choraram quando se despediram de mim, choraram tanto como eu. Aliás, lembro-me de ter chorado duas vezes na minha vida: nessa ocasião e quando me deram a notícia de que tinha um cancro. Não é nada fácil alguém me ver chorar, nada fácil mesmo.

LO: O estatuto de cantor beneficiou-o de alguma forma durante a Guerra Colonial?

MP: De forma nenhuma. Por sorte, não estive nos sítios onde se vivia a guerra, limitei-me a estar numa zona mais resguardada. Fui obrigado a ir. Estava numa secção de escritório a fazer cartas, para mim foram quase umas férias. Só me apercebia de que existia guerra quando me convidavam para ir cantar a algum hospital ou à Força Aérea; no sítio onde estava não percebia nada. Deu-me muito prazer cantar na Guiné, os meus camaradas pediam-me e eu nunca recusava. (...)


Também no blogue do Luís de Matos (ex-Fur Mil, da CCAÇ 1590, Os Gazelas, 1966/68), há uma referência ao Marco Paulo, aquando da chegada a Bissau, a 11 de Agosto de 1966:

(...) Findo este trabalho, o capitão deu folga a todo o pessoal para conhecer a cidade. Logo na primeira noite, juntei-me a um pequeno grupo para irmos dar uma volta, para conhecermos um pouco da noite guineense. O furriel miliciano Charneca, que é natural de Beja, ou arredores, não sei bem, pertence à CCS do meu batalhão, o 1894, disse-me que há um nosso camarada, já “velho”, o que equivale a dizer que não é “periquito”, que está no rádio do Quartel-General com o Marco Paulo, um artista da rádio e da TV e também alentejano, de Mourão. Vamos lá ter com eles, para nos mostrarem como é isto. Ou pelo menos, aquele meu amigo vai connosco. Estava uma noite escura como breu. Não me recordo de mais nada. O que sei é que me vi dentro dum táxi, com o Charneca e o tal amigo do QG, por um trilho, em que o capim era bem mais alto que o nosso transporte e fomos parar a uma vivenda onde havia música. Muita música cabo verdiana e dança, frangos no churrasco, cerveja e whisky. Não conseguia deixar de pensar que me podiam cortar a cabeça com uma catana. É que a gente ouvia contar cada estória!. Mas ao mesmo tempo, tinha uma certa confiança no tal camarada mais velho. Se ele estava ali e continuava vivo, é porque o local e as pessoas eram de confiança. Há-de ser o que Deus quiser. Coração ao largo, pensei cá prós meus botões" (...)