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segunda-feira, 13 de junho de 2022

Guiné 61/74 - P23347: (In)citações (209): As virtudes do Ensino em tempos remotos (Hélder Sousa, ex-Fur Mil TRMS TSF)

Em mensagem do dia 11 de Junho de 2022, o nosso camarada Hélder Valério de Sousa, ex-Fur Mil de TRMS TSF (Piche e Bissau, 1970/72), vem falar-nos das condicionantes impostas pelo sistema nos nossos tempos de jovens estudantes que determinavam o nosso futuro como militares e até depois como civis:


AS VIRTUDES DO ENSINO EM TEMPOS REMOTOS

Há sempre uma necessidade reclamada por amigos para que se possa contribuir com textos tendo em vista alimentar as suas publicações.
Nem sempre ocorre inspiração para recorrer à memória a fim de materializar recordações. Desta vez, depois de algum vazio mental, lembrei-me, já nem sei porquê, de um episódio, melhor dizendo, de uma sequência de episódios, que originaram situações que potenciaram consequências.
E por isso atrevo-me a pedir que depois de lerem, se lerem, me ajudem com as vossas opiniões, sobre que lições se podem tirar (se é que se podem tirar algumas) do conjunto das situações.

1. - Vamos aos factos

Depois de ter feito o Curso de Montador-Electricista (era assim que se designava) na Escola Industrial e Comercial de Vila Franca de Xira, terminado em 1964, fui para Lisboa, cidade grande, fazer as chamadas Secções Preparatórias para o possível ingresso no Instituto Industrial. Essa fase intermédia ocorreu na Escola Industrial Machado de Castro, nos anos letivos de 1964/65 e 1965/66. Os exames de admissão decorreram com aproveitamento e deste modo entrei no Instituto Industrial de Lisboa para o Curso de Eletrotecnia e Máquinas em Outubro de 1966.

2. – Enquadramento social

Dois pequenos apontamentos para ajudar a complementar as situações e a focalizar as “cenas” na época.

Um desses apontamentos é para lembrar que o Ensino estava elitizado. Havia a via liceal e a via do chamado “ensino técnico”. Aos “liceais” estava aberta a via para a Universidade, nas suas várias vertentes, com os seus “cursos superiores”, enquanto que para os do “ensino técnico” era privilegiada a “via profissional”, ou seja, a entrada no mercado de trabalho para exercer uma profissão ou então, através dos “Institutos”, para almejar alcançar uma situação que seria sempre reconhecida como “cursos médios”.

Ao nível do ensino da engenharia isso traduzia-se a que as duas vertentes, a “universitária” e a “média” se materializavam no Instituto Superior Técnico (e Faculdades de Engenharia) e nos Institutos Industriais, sendo que essa separação elitizada projetava-se na Instituição Militar com os primeiros a integrar os Cursos de Oficiais Milicianos (o COM) e os outros os Cursos de Sargentos Milicianos (o CSM).

Outro pequeno apontamento é que pelos anos acima indicados, talvez ainda se lembrem, pois já são anos “do século passado”, havia um esforço de guerra governamental em terras africanas para defender da cobiça internacional aquelas terras e aquelas gentes que nos tinham sido legadas pelas gestas dos descobrimentos e que os nossos “antanhos” tinham desbravado e defendido para nós, “numa mão a Cruz, noutra a Espada”.

Para esse esforço foram mobilizados milhares de jovens. Aos que na época eram estudantes, era facultada a possibilidade de adiamento da incorporação nas Forças Armadas através de pedidos nesse sentido, com base no desenvolvimento dos estudos.

Aos jovens que frequentavam o Instituto Industrial, que para lá chegarem tinham tido, para além da 4.ª Classe de escolaridade, 5 anos de Ensino Técnico e depois 2 anos das Secções Preparatórias, num total de 7 anos, mas que não tinham “equivalência funcional” aos 7 anos do Ensino Liceal, era também concedida a possibilidade de “pedido de adiamento” mas, para tal, o “aproveitamento escolar” deveria ser irrepreensível. 

 Havia umas quantas “cadeiras” que davam precedência a outras do ano seguinte e cuja falta implicava não se poder avançar e, consequentemente, ao nível do “aproveitamento” era considerado insuficiente para o fim pretendido.

3. - Continuando então com os factos

Este jovem que vos escreve, que até então tinha sido um aluno de razoável mérito, “distraiu-se” um pouco no meio da “cidade grande” e das suas solicitações, embora diariamente fizesse as viagens de comboio entre a casa familiar e a Escola. 

Como resultado disso, as notas da maior parte das disciplinas da 1.ª Frequência desse ano letivo de 1966/67 foram o que se pode chamar “um desastre”. Após isso, e reganhando vontade, atirou-se a tentar recuperar o possível e aconselhado por um Professor de uma das cadeiras fulcrais, a Física, deixou-a “cair” para ter possibilidade e capacidade para outras. Assim fiz.

Não passei de ano na totalidade, pois algumas cadeiras ficaram para trás, mas como ainda não tinha chegado a idade da incorporação militar não houve consequências imediatas. Entrei então no meu segundo ano de presença no Instituto, ano letivo de 1967/68, embora a frequentar novamente cadeiras do 1.º ano e, salvo erro, apenas duas já do 2.º ano, as que não necessitavam de precedência e tinha tido aproveitamento.

Esse ano correu bem.

4. – A situação “estranha”

No ano seguinte, ano letivo de 1968/69, em que já tinha ido “às sortes” em Agosto e aprovado para todo o serviço), as coisas “complicaram-se” a partir de um acontecimento insólito. A cadeira de Matemática II tinha um professor na “teórica”, de nome “Vítor qualquer coisa”, mas por lá conhecido na gíria por “papá”,  já que tínhamos a “mamã”, esposa dele, a dar a “prática”. Diga-se então, em abono da verdade, que funcionava assim como uma “disciplina familiar”…

A “mamã” era uma pessoa de baixa estatura que contrastava fortemente com a altura física do “papá”, o que por vezes era motivo de piadinhas, mas o mais agravante era o facto de a senhora dar aulas a crianças do preparatório e algumas vezes não se dava conta de estar a leccionar no Instituto a “pessoas crescidas” e com recorrência, para chamar a atenção a qualquer coisa, recorria à expressão “então, meninos, tomem lá atenção a isto”, coisa que criava animosidades.

Num dia de prova prática, ocorrida num dos pavilhões onde se davam aulas por falta de instalações apropriadas (um espaço retangular com o quadro ao fundo, a secretária da docente também, carteiras distribuídas em filas e porta de entrada num canto oposto ao quadro), a “mamã” começa a escrever no quadro o enunciado da prova, obviamente estando de costas para os alunos.

Acontece que aí na terceira ou quarta questão, enquanto a escrevia, a porta do fundo foi aberta e um aluno mais velho começou a dar em voz alta a solução para uma daquelas questões. Claro que houve algum “bruá” com o insólito da situação e eu também, entre outros, voltei a cabeça para trás para ver quem e donde vinha o “atrevimento”. Nesse instante a “mamã” também se virou e disse
- Arrume os seus papéis e saia!.

Com o pressentimento que aquilo podia ser para mim,  perguntei ao colega que estava ao lado, que me disse que lhe parecia que sim. Olhei para a “mamã” que nesse momento estava com a cabeça voltada para baixo e continuei a procurar responder às questões. Voltei a ouvir:
- Já lhe disse, arrume os papéis e saia!.

Incomodado com a injustiça e com o “sangue na guelra” dos 19/20 anos, levantei-me e interpelei pouco amistosamente:
- Isso é comigo?
- Sim, sim, saia!
- Mas, professora, eu não fiz nada, não era eu que falava, além disso já tenho estas questões resolvidas, porque é que tenho que sair?
- Porque eu mando!

Revoltado com a situação, levantei-me e incorretamente (do ponto de vista “civilizacional”) cheguei perto da “mamã” e, literalmente, atirei, à bruta, com o papel onde estavam algumas respostas resolvidas, para cima da secretária e saí. 

É preciso que se diga, também em prol da verdade, que 4 ou 5 dos colegas presentes falaram em meu abono e fizeram também menção de abandonar a sala, mas consegui demovê-los a tal.

5. – Consequências “quase” imediatas

Um pouco mais tarde, aquando da colocação das pautas com as classificações, verifiquei que no que me dizia respeito estava lá um provocador “8”, escrito por cima de número rasurado que, notava-se bem por o verniz corretor nem sequer disfarçar bem, que tinha dois dígitos. 

Estava ainda a tentar perceber/digerir o que se passava e as consequências do mesmo, quando vindo do corredor da secretaria aparece o “papá”. Na minha santa ingenuidade pergunto-lhe se não teria havido algum engano pois estava convicto de que no exame final ter tido um desempenho que esperava ser da ordem dos 14 ou 15 e afinal estava na pauta um 8.

Com a maior desfaçatez perguntou sibilinamente
- Qual é o seu número? - ao que eu disse:
- 8606. -  ele replicou (mostrando assim conhecer bem a “estória”):
- Ah, isso, é para ver se ganhas juízo para o ano!

Com esta situação, não foi possível mostrar que o aproveitamento era bom e como consequência fui chamado a incorporar o Exército, a meio de Julho de 1969 na EPC (Escola Prática de Cavalaria), em Santarém, para o 1.º Ciclo do CSM.

6. - Considerações

É aqui que peço o vosso auxílio para tentar extrair conclusões deste emaranhado de acontecimentos e seus enquadramentos.

Valorizar o sistema de Ensino então vigente? O seu elitismo? A sua forma de aplicar pedagogia?

Por outro lado, é bem verdade que, por via dos acontecimentos, tive a oportunidade de contactar e conhecer tantas pessoas com as quais agora desenvolvo relações de amizade e respeito.

Então qual deverá ser o sentimento que devo privilegiar nestas recordações?

Hélder Sousa
Fur. Mil. Transmissões TSF

____________

Nota do editor

Último poste da série de 30 DE MAIO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23312: (In)citações (208): Uma tarde maravilhosa, na cidadela de Cascais, vendo com pessoas amigas a exposição "Portugal e Luxembugo: países de esperança em tempos difíceis" e recordando o nosso Aristides Sousa Mendes (João Crisóstomo, Nova Iorque)

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7454: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (11): O PAIGC que nos saiu na rifa, a Portugal e à Guiné: Cumbe di Baguera / Ninho de abelhas

1. Texto do nosso camarigo António Rosinha


Data: 15 de Dezembro de 2010 23:20


Assunto: O PAIGC que saiu a Portugal e à Guiné - Cumbe di Baguera


Quando se fala que Portugal não preparou elites africanas a quem entregar a governação das suas colónias, partimos do princípio que franceses, ingleses e belgas criaram essas elites.


Não pretendo contrariar ou desmentir quem assim pensa, porque tudo é relativo, conforme quisermos ver esta questão, até podemos dizer que os movimentos MPLA, FRELIMO e PAIGC tinham muita gente bem preparada para governar, tanto nos seus quadros efectivos, como no seio dos seus muitos simpatizantes.

Simplesmente Salazar jamais entregava as colónias fosse a quem fosse, e duvido que outros políticos portugueses que estivessem no governo o fizessem. Pelo menos naqueles anos 50/60 do século passado.

Se atentarmos em Amílcar Cabral, Vasco Cabral etc., e toda a burguesia guineense, (auto-intitulada), e toda unida e acreditando, tipo Yes, We Can, à volta do PAIGC, porque haveremos de afirmar que não havia uma elite para governar a Guiné? 


Se olharmos para Cabo Verde vemos que era viável tal governação, e o Luís Cabral chegou a dar mostras de ser possível governar a Guiné.


Em Angola, essa burguesia era descomunalmente superior em número à da Guiné. Qualquer cidade angolana tinha angolanos na chefia de todos os organismos públicos, exceptuando os governadores gerais, e de distrito, e mesmo assim muitos já eram descendentes de africanos.


Tal como na Guiné, também havia em Angola muitos funcionários oriundos de Cabo Verde, que se viam nos Notários, Câmaras, Caminhos de Ferro, Portos, Obras Públicas, etc.


Sobre Moçambique não me pronuncio, mas penso que a FRELIMO tinha também nos seus quadros gente muito capaz.  


Mas, apesar de haver muita gente nas colónias que almejava libertar-se de Portugal, pouca gente em Portugal, e alguma em Angola, mesmo os anti-salazaristas, achavam normal uma independência porque já havia muita confusão na anglofonia e francofonia.


Nos outros movimentos pouco se sabe, porque de uma maneira geral ficaram muito ofuscados, quando não mesmo desaparecidos, caso da Guiné. Embora parecessem desactivados aos olhos de Spínola e de Amílcar, talvez existissem devidamente camuflados, e é de supor quem devia saber falar sobre esses hipotéticos movimentos camuflados, são os juizes que julgaram os assassinos de Amílcar.


Alguns desses juízes ainda estão vivos, podiam falar e escrever como foi, antes que desapareçam com a idade. Sem dúvida que havia muitos africanos, em que se podem abranger também lusodescendentes e caboverdeanos que possuiam o liceu ou tinham sido universitários ou estudaram em missões, estavam bastante preparados para governar as colónias portuguesas em 1960. O grande problema dessas elites é que, ao recorrerem a certos processos de luta, alguns desses processos nunca chegaram a ser compreendidos pelo povo, e afastaram a maioria dessas mesmas elites, que gostariam de se ligar activamente à luta de libertação, ou seja, lutar pela independência da sua terra. E, ao contrário, muitos até chegaram a lutar contra esses movimentos ao lado do exército português. 


E o que se seguiu à desistência da luta da parte do exército português com o 25 de Abril, aconteceu o que todos temiam, foi a guerra total, em Angola e Moçambique e, embora sem guerra declarada na Guiné, a mesma guerra esteve sempre latente até há poucos anos. 


Essa guerra latente, não seria perpetrada pelos tais movimentos camuflados a que me refiro atrás, que podiam existir bem disfarçados debaixo do emblema do PAIGC?


E, debruçando-nos apenas à Guiné e ao PAIGC, não teria Amílcar Cabral cometido um erro enorme, quando, com a sua reconhecida eficácia política e capacidade de persuasão, fez desaparecer todos os movimentos guineenses tipo FLING e outros? Em que estes movimentos, insidiosamente acabariam por se organizar sob a bandeira do PAIGC, e aí continuam até aos dias de hoje, dividindo em facções o partido e que teem provocado todos os acontecimentos nefastos, desde o assassinato de Amílcar, até ao fim de Nino Vieira?


Enquanto o MPLA tinha facções, em que até houve massacres que fazem esquecer o ques passou com PAIGC, toda a gente sabia quem era quem e de que lado estava, no PAIGC, mata-se e morre-se e tem sido tudo tão internamente que até hoje nem aparece nada escrito nem julgado, isto desde os tempos de Conacri.


O PAIGC criou uma constituição depois de 1981 (?), em que era vedado a cidadãos como Amílcar Cabral, com ascendentes estrangeiros, serem candidatos a presidentes da República. Este assunto era discutido publicamente em Bissau e não sei se ainda é assim.

 

Ao contrário do que se passa em Angola, os detratores de José Eduardo dos Santos [JES], (ou este próprio) fazem correr que ele é filho de sãotomenses. JES aproveita a embalagem para criar uma imagem de neutralidade tribal, o que é positivo; no caso de Amílcar é acusado que não é fidju di terra, e é criada uma imagem negativa.

E aqui entra o ninho de abelhas, Cumbe di Baguera, que em Canjadude, capital do mel, os apicultores colocam bem no alto de grandes árvores. Tal como o Cumbe de Baguera, o povo guineense viu sempre o PAIGC bem lá no alto, com as abelhas a picar os diversos apicultores, (Amilcar, Luís, Nino). E tal como o Cumbe di Baguera, impõe um certo afastamento a tudo o que o rodeia.

E o grande criador desse ninho de abelhas, foi Amílcar Cabral, (mesmo depois do multipartidarismo, continuou o ferrão pronto, ou seja, o dedo no gatilho). 

 

Houve muito entusiasmo nos primeiros anos de independência da parte dos jovens guineenses, mas prudentemente, uma faixa etária mais antiga, que assistiu à luta de libertação desde o início, ficou olhando sempre para o PAIGC com distanciamento, e o partido retribuia na mesma moeda.   Se o sonho de Amílcar Cabral era uma Bandeira e um país independente,  o sonho foi realizado. [Foto à esquerda, Domingos Ramos, empunhando a bandeira do PAIGC]


Se todos os meios para atingir os fins eram lícitos, também tinha razão, mas da parte do Estado português fosse qual fosse o governo, cairia muito mal perante a sociedade guineense se apadrinhasse uma independência a figuras como os fundadores do PAIGC, aliás, a outros quaisquer pois já estavam outros com apoios dos vizinhos.

 

E perante a política internacional daquela guerra fria daquele tempo, não seria um país como Portugal que teria hipóteses de proteger um governo apadrinhado, como faziam ingleses com uma Gâmbia, ou a França com um Senghor. Entregar à ONU? Sabemos o que se passava e passou onde essa entidade entrou. Aliás, na Guiné, desde a FAO, UNICEF, OMS, todos estes anos ajudaram àquilo que resta.

 

Como através do Blog e dos anos que vivi na Guiné, criei uma ideia do que se passou e podia ter passado neste país, e como vi em Angola, o papel de MPLA, da UNITA e da UPA (FNLA), e tambem criei ao fim destes anos uma ideia sobre Angola, transmito o que me pareceu ser o desempenho daqueles que aqui tratamos de IN.

 

Sobre o papel daqueles que por lá andámos, só espero que aquelas fronteiras nunca desapareçam, que será o mínimo dos mínimos que merece a memória daqueles que lá ficaram, porque se não fossem aqueles treze anos, nem as velas como as que arderam por Timor as salvavam.

Mas, como neste blog contamos a nossa história para que ninguém a conte por nós, é apenas e só o meu ponto de vista que aqui está. E ninguém me pergunte onde me documentei. Pode contestar e contradizer. Porque neste blog, cada um dá os tiros com a sua própria mauser.


Um abraço para a tertúlia, Antº Rosinha


[ Revisão / fixação de texto / título / fotos: L.G.]


__________


Nota de L.G.: 


Último poste da série > 23 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7321: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (10): As desilusões históricas ou Portugal não é para levar a série

sábado, 28 de novembro de 2009

Guiné 63/74 - P5367: Controvérsias (57): Os Oficiais do Quadro Permanente Não Fugiram à Guerra (Carlos Silva, CCAÇ 2548/BCAÇ 2879, Farim, 1969/71)


1. Comentário do nosso amigo e camarada Carlos Silva ao Poste P5303 - O Direito ao bom nome (*) O Carlos Silva foi Fur Mil Inf, e pertenceu ao CCaç 2548/BCaç 2879 (Jumbembem, 1969/71) É autor da melhor pãgina, na Net sobre o sector de Farim >  Guiné 63/74, por Carlos Silva.

Amigos:

1 - Como decorre da intervenção do Sr Coronel Vasco Lourenço (*), [apesar de termos uma relação pessoal desde há 40 anos, nunca o tratei por tu e não é agora no âmbito do blogue que o vou fazer], a mesma prende-se essencialmente com a questão do livro Elites Miitares e a Guerra de África, de Manuel Godinho Rebocho [ Roma Ed., Lisboa, 2009, Colecção Guerra Colonial, nº 8]  .

Bem como, presumo, com alguns comentários ao Post 5275 em relação à sua pessoa.

2 – Tal como diz o LG em comentário a este Poste: Outra das nossas regras básicas de convívio, nesta caserna virtual, é que nenhum de nós faz (ou deve fazer) juízos de valor (e muito menos de intenção) sobre o comportamento (operacional e pessoal) dos seus camaradas da Guiné. Este blogue não foi criado para fazer ajustes com ninguém, nem sequer com a História.

Assim, deveria ser, mas tal não aconteceu e atente-se nos ditos comentários, o que desvirtua os princípios básicos estabelecidos no Blogue, o que é de lamentar. Pois todo cidadão tem o direito de liberdade de expressão, mas tal direito não constitui um direito absoluto, ao ponto de lesar os direitos ao bom nome, à dignidade e honra de uma pessoa. Uma coisa foi os bocados menos bons que passámos naqueles anos idos anos de 60 e outra coisa é ofender os invocados direitos.

3 – E, quer se aceite ao não, sejam ou não abrilistas, porque também têm o direito de o não ser, o Sr Cor Vasco Lourenço, o qual não necessita de apresentações, foi um dos que lutou, como é público e notório, para que hoje se possa ter a garantia do direito de liberdade de expressão, consagrado constitucionalmente.

4 - Dito isto, quanto ao outro aspecto que presumo esteja relacionado, não só, mas essencialmente com a polémica estabelecida com a tese de doutoramento sobre a A Formação das Elites Militares em Portugal de 1900 a 1975, em que "o autor sustenta que os oficiais do quadro permanente fugiram da guerra, a qual se aguentou devido aos oficiais milicianos e aos sargentos do quadro permanente”.]... (Vd. os dois micro-vídeos da apresentação do livro, pelo seu autor, em Lisboa, dia 17 do corrente](**)

Sobre isto já me pronunciei em comentário ao  Poste 5275 (***)

5 – Contudo, apesar de não ter ainda lido o livro [do Manuel Rebocho], e uma vez que sou referenciado na intervenção do Sr Cor Vasco Lourenço (*), sempre direi no que se refere à afirmação acima, com todo o devido respeito pelo Autor, mesmo que a citada afirmação esteja fora do contexto dum estudo global do livro/tese/livro, como o Autor mencionou no dia da sua apresentação, estou em total desarcordo com ele, porquanto,

6 – Tive a honra de ser comandado por um ilustre Capitão do QP, originário da Academia Militar, 1º classificado do seu curso. Cor Luís Fernando da Fonseca Sobral, um jovem, tal como nós, talvez mais 2 anos, que tinha a seu cargo o Comando da Companhia e que em termos operacionais era dos primeiros a encabeçar, quer a Companhia, quer a nível de grupo de combate por ele criado, atacar o IN na sua toca, ir ao encontro do IN. Daí, a nossa CCaç 2548 ser a única Unidade em toda a História da guerra da Guiné, que não sofreu durante a sua comissão qualquer ataque ao Aquartelamento do Subsector de Jumbembem.

7 - Assim aconteceu com a CCaç 2549, Comandada pelo Sr Cor Vasco Lourenço, então ex-Capitão, que sempre acompanhara os seus homens, aliás, as nossas Unidades chegaram a operar em conjunto.

8 – Também não posso deixar de recordar e invocar aqui o excelente Comandante de Batalhão, hoje Maj Gen Agostinho Ferreira, então Ten-Coronel, que connosco alinhava para o “mato”, e como se costuma dizer: era um homem com os T… no sítio.

9 – Donde, este meu testemunho pessoal, porque com eles calcorreei as terras “o mato” do Sector de Farim, é a prova, provada,  que estes Oficiais do QP originários da Escola do Exército e da Academia, não fugiram à guerra tal, como afirma o Autor,  Manuel Rebocho


10 – Aliás, os factos e feitos do nosso glorioso BCaç 2879, podem ser analisados em parte neste Bolgue, quer no meu site: http://www.carlosilva-guine.com/

11 – Quando o nosso Camarada Manuel Rebocho, pisou terras da Guiné, já nós tínhamos deixado lá bem marcada a nossa posição, além de várias baixas provocadas ao IN, fizeram-se capturas relevantes de material, incluindo na participação do maior “Ronco” da História da Guerra Colonial e das Guerras da África Ocidental, que foram só 24 toneladas de material, em que também participaram os nossos camaradas pára-quedistas.

12 – Face ao exposto e ao que tenho escrito no Blogue, no meu Site e ao que tenho lido sobre a guerra na Guiné, que serviu de base para o estudo do nosso Camarada Manuel Rebocho, com todo o devido respeito, estou em total desacordo nesta sua análise.

OS NOSSOS OFICIAIS NÃO FUGIRAM À GUERRA

13 – Também já li o Documento do Sr Cor Morais da Silva que corrobora de forma brilhante o que atrás é afirmado, apesar de ter de confrontar ainda com a Tese relativamente a outros aspectos.

14 – Poderá haver e haverá com certeza outras questões subjacentes de ordem política, militar, social etc, que conduziram à diminuição de frequência de alunos na Academia Militar e consequentemente à diminuição do número de oficiais do QP, mas isso é outra questão que merece com certeza um estudo profundo.

E esta a minha a opinião que aqui deixo com um abraço amigo

Carlos Silva

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Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 20 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5303: O direito ao bom nome (1): Vasco Lourenço, ex-Cap Inf da CCAÇ 2549/BCAÇ 2879 (Cuntima e Farim, 1969/71)

(**) Vd. vídeos em You TUBE > Nhabijoes >

Elites Militares e a Guerra de África, de Manuel Godinho Rebocho (Parte II) (9' 57'')

Elites Militares e a Guerra de África, de Manuel Godinho Rebocho (Parte III) (3' 46'')

(***) Vd. poste de 15 de Novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5275: Controvérsias (53): Polémica M. Rebocho / V.Lourenço: Por mor da verdade e respeito por TODOS os camaradas (A. Graça de Abreu)