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segunda-feira, 7 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P26991: Facebook...ando (86): João de Melo, ex-1º cabo op cripto, CCAV 8351 (1972/74): um "Tigre de Cumbijã", de corpo e alma - Parte IV: O mercado de Bambadinca, que se estende ao longo da antiga pista de aviação



Foto nº 1 e 1A  > Bambadinca, em dia de mercado




Foto nº 2, 2A e 2B > Bambadinca: mercado e ao fundo o antigo quartel, vendo.se a antena das telecomunicações




Foto nº 3, 3A  e 3B > Bambadinca; mais uma vista do mercado e do antigo quartel

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bambadinca > Maio de 2025 > Fotos do álbum do João Melo (com a devida autorização do autor e vénia do editor LG...)

Fotos (e legendas): © João de Melo (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


João Melo (ou João Reis de Melo), ex-1º cabo op cripto, CCAV 8351, "Os Tigres do Cumbijã" (Cumbijã, 1972/74):


(i) é profissional de seguros, vive em Alquerubim, Albergaria-a-Velha; (ii) viaja regularmente, desde 2017, para a Guiné-Bissau, em "turismo de saudade e de solidariedade" (em que distribui material pelas escolas de Cumbijã, e apoia também, mais recentemente, o clube de futebol local); (iii) regressou há pouco tempo da sua viagem deste ano de 2025; (iv) fez uma visita demorada à Amura e ao atual Museu Militar; (v) tem página no Facebook (João Reis Melo); (vi) tem 23 referências no nosso blogue para o qual entrou em 1 de março de 2009.


1.  Na sua viagem, em maio passado,  de Bissau a Cumbijã,  no sul, na região de Tombali, o nosso grão-tabanqueiro João Melo passou por Bambadinca e teve a gentileza de tirar 3 fotos, que agradecemos... 

Estivemos lá em 1969/71 e depois em 2008... Naturalmente, deixou saudades, não pela guerra, mas pelas gentes e paisagens. Recorde-se que era, com o Xime, a porta da zona leste, constituída por 5 setores, e abrangendo as regiões de Bafatá e Nova Lamego.



Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Bambadinca > Cresceu imenso em 50 anos, e nomeadamente ao longo da estrada que segue para o sul (Xitole, Saltinho, Quebo...), numa extensão de 3 quilómetros. À esquerda, ao alto, uma curva do rio Geba. No mapa vem assinalada a igreja católica de Bambadinca, no coração do antigo quartel (que ficava num pequeno planalto) (ao lado da igreja, ficava a secretaria da CCAÇ 12, 1969/71)... À direita, a grande bolanha de Bambadinca. À esquerda e a norte ficava o rio Geba Estreito. É visível também a central solar híbrida que deu vida a Bambadinca.

Fonte: Cortesia do  ©2025 Google Maps


2. Nota sobre a evolução da população de Bambadinca:

Segundo o assistente de IA que consultámos (ChatPGT), a população de Bambadinca (como sector na região de Bafatá, Guiné‑Bissau), e com base em  "dados mais recentes do censo de 2009", é de aproximadamente 31 800 habitantes. (Omitimos as fontes, para não maçar o leitor).

Mas há que distinguir entre o sector e a vila urbana propriamente dita. A informação disponível sugere os seguintes valores: sector de Bambadinca: cerca de 31,8 mil  / 33,2 mil  pessoas (variações conforme a fonte) em 2009;
  • Vila ou povoado urbano (centro principal): aproximadamente 6 400 / 7 620 habitantes. Fontes incluem dados ligados ao projeto de eletrificação (6 400) e tabelas geográficas (7 620) .

População estimada hoje (2025):

  • Sector de Bambadinca: o crescimento médio anual na região de Bafatá tem rondado os 2 % ao ano desde 2009;
  • Aplicando um crescimento composto moderado (~2 % ao ano) aos ~31 800 de 2009 até 2025 (16 anos), o sector terá hoje  à volta de  40/45 mil  pessoas.
  • Vila de Bambadinca: provavelmente cresceu a um ritmo semelhante, passando dos ~6 400 em 2015 para aproximadamente 8 /10 mil  habitantes em 2025, assumindo expansão urbana e crescimento populacional.
 (Revisão / fixação de texto: LG)
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domingo, 6 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P26990: In memoriam (554): Apolinário Pereira Teixeira (1950-2025): natural de Fermentões, Guimarães, antigo autarca, ex-fur mil, 2ª CART / BART 6520, "Os Mais de Nova Sintar" (1972/74) (Carlos Barros)



Apolinário Pereita Teixeira: natural de Fermentões, Guimarães, nasceu em 23 de julho de 1950 e morreu a 3 de julho de 2025, aos 74 anos. Foi presidente da Junta de Freguesia de Fermentões (1993-2001). 

Era uma figura estimada em Fermentões, sua terra natal, e no concelho de Guimarães. "Participou activamente como membro da Cooperativa Farramundanes, deixando um legado de dedicação e serviço público.

Em comunicado, o Presidente da Câmara Municipal de Guimarães, Domingos Bragança, realçou "o serviço público que Apolinário Teixeira prestou a Fermentões e a Guimarães", e manifestou pesar pelo seu falecimento, "apresentando à sua família e amigos as mais sentidas condolências".

 (com a devida vénia)



1. Mensagem de Carlos Barros (ex-fur nil, 2ª CART / BART 6520/72, Nova Sintra, 1972/74):

Data - 6 julho 2025 16:54 e 17:52

Lamentamos. Faleceu o ex furriel mil Apolinário Teixeira. 2ª CART / BART 6520, "Os Mais de Nova Sintra" (Nova Sintra, 1972/ 74). Estive com este grande amigo em Bolama, Tite, Nova Sintra. Gampara, um inferno...

Estávamos em Gampará.  3º Grupo de Combate da 2ª CART / Bart-6520.

Gampará era uma zona de intensos combates, com constantes flagelações do PAIGC e o saudoso ex- Furriel Apolinário (Guimarães) dizia-me: "Barros, dizem que não há inferno mas Gampará é mesmo um inferno!"...

Constantes emboscadas, flagelações ao destacamento, saídas permanentes para o mato, reforço do arame farpado, em duplicado, mortes, feridos e num desses ataques foram atingidos 3 furriéris milicianos entre outros militares que "agonizaram" durante toda a noite , dos terríveis ferimentos,
porque os "hélis" à noite, não faziam evacuações.

O Apolinário saiu desse inferno, sendo deslocado para uma companhia de africanos, tendo-se despedido dos seus amigos, com um semblante tristonho.

Regressãmos à "Metrópole" e o nosso amigo Apolinário manteve a sua amizade para com a 2ª Cart- "Os Mais de Nova Sintra", e era figura presente nos nossos convívios anuais.

No 50º Encontro, em 2025, realizado na Penha, Guimarães, terra natal do Apolinário (Fermentões), este companheiro não apareceu e aconteceu o tragicamente inesperado: motivado por doença, "faleceu" este maravilhoso amigo que deixa saudades imensas no nosso Grupo.

Paz à sua Alma
Ex furriel Barros, Esposende. Um abraço

Carlos Manuel de Lima Barros
Conhecido por Barros, "O Lateiro de Nova Sintra"
Esposende, 5 de julho de 2025

2. Comentário do editort LG:

À família do  nosso camarada Apolinário Teixeira  e aos camaradas da 2ª CART / BART 6520/72, apresento em nome da Tabanca Grande, os nossos votos de pesar. Não o deixemos ficar inumadfo na vala comum do esquecimento. Carlos Barros, manda-nos alhuma foto que tenhamos dele ou com ele, nas terras da Guiné. Obrigado.
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Nota do editor:

Último poste da série > 27 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26960: In Memoriam (553): O Fernando Calado (1945 - 2025) que eu conheci e com quem convivi na Casa do Alentejo (José Saúde, Beja)

Guiné 61/74 - P26989: Memórias da tropa e da guerra (Joaquim Caldeira, ex-fur mil at inf, CCAÇ 2314 / BCAÇ 2834, Tite e Fulacunda, 1968/60) (3): O levantamento de rancho em Nova Sintra, por causa do meu "prato", uma lata de Coca-cola, meia de água, com quatro feijões a nadar...


1. Mais um excerto do livro "Guiné: Memórias da Guerra Colonia", do Joaquim Caldeira, grão-tabanqueiro nº 905,  ex-fur mil at inf CCAÇ 2314 / BCAÇ 2834 (Tite e Fulacunda, 1968/69) (*)


Mensagem do Joaquim Caldeira
Data - sexta, 4/07/205  19:41  
Assunto - Levnatamento de rancho
 
Caro Luis. O post de hoje tem a ver com as dificuldades passadas em Nova Sintra, local de má memória, até pelo texto anexo (*).Um abraço e feliz fim de semana.

J.Caldeira.

Imagem à direita: Capa do livro de Joaquim Caldeira, "Guiné - Memórias da Guerra Colonial", publicado pela Amazona espanhola (2021) 



O LEVANTAMENTO DE RANCHO

 por Joaquim Caldeira (**)



Nova Sintra. Já aqui referida muitas vezes e sempre pelas piores razões. Chegámos a passar fome. E o trabalho era incessante. Andávamos todos mal nutridos e esgotados, além de cheios de medo de que aquele fosse o nosso último dia. 

A comida era uma desgraça em qualidade – já nem nos preocupava a qualidade – e em quantidade. 

Certo dia, hora de almoçar, peguei na minha lata de Coca-Cola, à qual tinha sido retirada a tampa, e me dirigi para a improvisada cozinha onde o cabo cozinheiro fazia o melhor que podia e tinha e, nesse dia, perdi a razão. 

A minha lata vinha meia de água e tinha quatro feijões a nadar. E era o meu almoço, igual ao de todos, capitão incluído. Talvez para ele houvesse cinco ou seis feijões dentro do caldo. A taça era também a lata de Coca-Cola. Danei-me. Fiz uma chinfrineira danada – por isso é que digo que me danei – e aconselhei os soldados a recusar comer.

Aí, entra em ação o segundo comandante, alferes Barros, engenheiro de profissão, homem muito sensato e que eu admirava pela sua cortesia e fair-play. Pegou-me no braço e tentou arrastar-me para longe dos soldados. Eu não aceitei e continuei a reclamar e a aconselhar o levantamento de rancho. Estava cheio de fome e aquilo não era comida suficiente para o resto do dia que se adivinhava muito trabalhoso e difícil.

Com uma calma que só o bom do alferes Barros, lá me fez acalmar e sugeriu-me
que repetisse a dose, se ainda desse para repetir.

A custo, aceitei a sugestão dele mas entendia que era injusto eu poder repetir só porque tinha reclamado e, os restantes terem que ficar só pela dose de água e quatro feijões. E não repeti.

Interveio o capitão que me disse que podia acontecer eu ser preso pelo delito que estava a cometer e que devia dar bons exemplos, dada a minha posição de comandante de secção, etc. etc.

Para mais, se fosse para a prisão, deixaria de correr riscos e teria três refeições diárias.

E assim ficou a minha rebelião que, afinal, não chegou a servir para nada.

Coitados dos que tiveram que passar fome, nesse e nos dias que se seguiram. Coisas que só podiam ser compreendidas pelo estado de graça ou de guerra em que vivíamos.

Hoje, passados tantos anos, penso que fiz bem em ter-me revoltado e fiz bem por ter acatado as sugestões do senhor Barros, a quem endereço um forte abraço e peço que, se um dia vier a ler estas linhas, se recorde deste episódio. 

(Revisão / fixação de  texto: LG)

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Notas do editor LG:

(*) Originalmente publicado no blogue do autor, que foi descontinuado e não consgeruimos recuperar nem Arquivo.pt nem no Archive Net

http://ccac2314.blogspot.com/2010/07/levantamento-de-rancho.html

Guiné 61/74 - P26988: Facebook...ando (85): João de Melo, ex-1º cabo op cripto, CCAV 8351 (1972/74): um "Tigre de Cumbijã", de corpo e alma - Parte IV: Buba e o rio Grande de Buba no seu esplendor




Foto nº 1, 1A, 1B





Foto nº 2, 2A, 2B, 2C




Foto nº 3, 3A, 3B



Foto nº 4, 4A


Foto nº 5

Guiné-Bissau > Re3gião de Quínara > Buba e rio Grande de Biuba > Maio de 2025 > Fotos do álbum do João Melo (com a devida autorização do autor e vénia do editor LG...)

Fotos (e legendas): © João de Melo (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


João Melo (ou João Reis de Melo), ex-1º cabo op cripto, CCAV 8351, "Os Tigres do Cumbijã" (Cumbijã, 1972/74): 

(i)  é profissional de seguros, vive em Alquerubim, Albergaria-a-Velha; 

(ii) viaja regularmente, desde 2017,  para a Guiné-Bissau, em "turismo de saudade e de solidariedade" (em que distribui material pelas escolas de Cumbijã, e apoia também, mais recentemente,  o clube de futebol local); 

(iii) regressou há pouco tempo da sua viagem deste ano de 2025; 

(iv) fez uma visita demorada à Amura e ao atual Museu Militar;

 (v) tem página no Facebook (João Reis Melo);

 (vi) tem 22 referências no nosso blogue para o qual entrou em 1 de março de 2009.

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Nota do editor LG:

Último poste da série > 10 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26905: Facebook...ando (84): os acontecimentos de Bissássema, em 3 de fevereiro de 1968, visto pelo oficial de dia em Tite, alf mil Augusto Antunes, cmdt do Pel Rec Daimler 1131 (Tite, 1966/68) (Joaquim Caldeira, grão-tabanqueiro nº 905) 

Vd. postes recentes do João Melo:

7 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26895: Facebook...ando (83): João de Melo, ex-1º cabo op cripto, CCAV 8351 (1972/74): um "Tigre de Cumbijã", de corpo e alma - Parte III: A Bissau Velho a renascer das ruinas dos últimos 50 anos...

5 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26886: Facebook...ando (82): João de Melo, ex-1º cabo op cripto, CCAV 8351 (1972/74): um "Tigre de Cumbijã", de corpo e alma - Parte II: Bissau Velho, a ponte-cais

4 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26879: Facebook...ando (81): João de Melo, ex-1º cabo op cripto, CCAV 8351 (1972/74): um "Tigre de Cumbijã", de corpo e alma - Parte I: De volta a Bissau Velho, agora de cara lavada

sábado, 5 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P26987: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (8): Luís de Sttau Monteiro (1926-1993), enviado especial do "Diário de Lisboa", à cerimónia da independência em 5 de julho de 1975: "Daqui a três horas, sou estrangeiro"



As duas bandeiras de Cabo Verde: a das ilusões da "unidade" com a Guiné-Bissau (1975-1992) e a atual (desde 1992)...  A mudança de bandeiras não foi consensual...

O último dia duma colónia

por Luís de Sttau Monteiro 

(1926-1993) 










Fonte: Diário de Lisboa, sábado, 5 de julho de 1975, ano 56,. nº 18807, pág, 10 (Inserido no caderno especial "Cabo Verde Ano Um" (com a colaboração de uma equipa de luxo: Fernando Assis Pacheco, Alexandre Oliveira, Eugénio Alves, Luís Stau Monteiro e José A. Salvador). 

Fonte: (1975), "Diário de Lisboa", nº 18807, Ano 55, Sábado, 5 de Julho de 1975, Fundação Mário Soares / DRR - Documentos Ruella Ramos, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_4405 (2025-7-5)

Instituição: Fundação Mário Soares e Maria Barroso | Pasta: 06823.173.27275 | Título: Diário de Lisboa | Número: 18807 | Ano: 55 | Data: Sábado, 5 de Julho de 1975 | Directores: Director: António Ruella Ramos; Director Adjunto: José Cardoso Pires | Observações: Inclui supl. "Cabo Verde ano um". | Fundo: DRR - Documentos Ruella Ramos | Tipo Documental: Imprensa (com a devida vénia...)

(Seleção de excertos, e fixação do texto: LG)



Luís de Sttau Monteiro
(1926-1993)

1. O jornal "Diário de Lisboa" tinha então como diretor o A. Ruella Ramos e diretor-adjunto o escritor José Cardoso Pires. O Sttau Monteiro foi a Cabo Verde, como "enviado especial",  fazer a cobertura noticiosa da independência do país. 

Filho do embaixador em Londres, Armindo Monteiro, anglófilo e rival de  Salazar que o demitiu em 1943 (tinha sido ministro das colónias e dos negócios estrangeiros na fase inicial do Estado Novo),  Sttau Monteiro foi dos espíritos mais livres do Portugal dessa época. E um dos nossos grandes dramaturgos  do séc. XX, além de  "cronista social" ("As redações  
da  Guidinha", publicadas no "Diário de Lisboa",  nos anos de 1969 e 1970, e entretanto reunidas em livro, em 2003,  já depois da morte do autor, são um monumento, uma delícia, uma referência obrigatória para se compreender melhor o país onde nascemos.)

A crónica que escreveu, há 60 anos, para o jornal, "O último dia de uma colónia", é uma pequena obra-prima de bonomia, bom humor, empatia e ironia, onde não há a mínima concessão ao populismo revolucionários da época. Eis alguns nacos de prosa:
  • "(...) Sinto-me comovido porque isto de assistir ao parto de um país,  é uma epxeriência nova para mim"
  • " (...) Cor ? Que é isso ?"
  • "Há dois bêbados agora, na esplanada, o da água do mar, e um que canta o hino nacional!"
  • "(...) os cabo-verdianos descobriram Portugal"
  • "O que nós, portugueses, poderíamos ter feito nesta terra, por esta gente!"
  • "O que vale é que fazemos parte da festa"
  • "São três da tarde e a cachupa ainda me anda às voltas no estòmago"
  • "Daqui a três horas, sou estrangeiro. Mas... alguma vez serei estrangeiro nesta terra ?".
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Nota do editor:

Último poste da série > 5 de julho de 2025 > Guiné 61/74 - P26985: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (7): reportagem do 5 de julho de 1975 - III (e última) Parte (Carlos Filipe Gonçalves)

Guiné 61/74 - P26986: Os nossos seres, saberes e lazeres (688): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (211): Visita ao novo acervo permanente no Museu Nacional de Arte Contemporânea – 2 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Abril 2025:

Queridos amigos,
Cônscio de que há para aqui um certo percurso errático, entendi que devia vir um pouco atrás, ao século XIX, onde efetivamente começa o acervo permanente do museu e daí mostrar aquela bela parede onde se expõe o retrato, manifestação capital do século XIX para o século XX; sem perda de demora passei por dois modernismos para preparar o cenário que irá conduzir às alterações das décadas de 1960 a 1980. Vejo-me aflito quando chego às últimas salas do acervo permanente, desentendo-me com câmaras escuras e coisas parecidas, a minha fronteira é aquele João Tabarra, por ironia a fotografia foi vista, durante gerações, pelos estetas como uma arte bonitinha mas que devia ocupar um espaço à parte, os Eduardo Gageiro, Victor Palla ou Gérard Castello-Lopes que fiquem no arquivo fotográfico, não tem direito a competir com as artes plásticas, abre-se uma exceção para o Jorge Molder, escusam de me perguntar porquê. Tudo somado, é indispensável vir até este acervo permanente, tem uma leitura, um discurso pedagógico, que nos faz entender a palpitante viagem que começou em 1910. Portanto, uma visita obrigatória.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (211):
Visita ao novo acervo permanente no Museu Nacional de Arte Contemporânea – 2


Mário Beja Santos

Recapitulando, era diretora do Museu Nacional de Arte Contemporânea Emília Ferreira e procedeu-se à reformulação do chamado acervo permanente, que isto dizer que o visitante do museu tem sempre em exposição um histórico do seu património, independentemente de exposições que estejam a acontecer. Entra-se no museu e a partir da Sala dos Fornos tem-se uma mostra do que melhor do século XIX o museu conserva, não faltam os românticos, os naturalistas, e assim caminhamos para a transição que será trazida pelos chamados modernistas.

Quem concebeu a exposição teve a feliz ideia de pôr de alto a baixo a parede de mudança de piso o chamado encontro de gerações, ali pontifica o retrato. Como escreve uma das responsáveis pela exposição, Maria de Aires Silveira temos ali mestres académicos, registos de elegância mundana, a densidade do retrato camoniano, assim se chega a Columbano, ali podemos ver o retrato de Teixeira de Pascoais, também está presente mestre Malhoa. E refere esta conservadora que por 1910 o autor portuense António Carneiro introduz a modernidade através da pintura Noturno, que aqui mostrámos no texto anterior. É igualmente nesta época que irrompem as ruturas com o academismo no século XIX. Percorremos essa sequência histórica de autores que vão desde a primeira geração modernista até ao neorrealismo e surrealismo, não esquecendo, porém, que em plena década de 1940 Fernando Lanhas abre caminho ao abstracionismo. É dentro desta recapitulação que pretendo repescar artistas de mérito até à transição que vai ocorrer a partir dos anos 1960. Veja-se Júlio dos Reis Pereira que usou de um traço e de um contexto grotesco, deliberadamente ingénuo, e numa atmosfera estética singular, isto numa época em que as artes plásticas se modernizavam mas dentro de um figurativismo que mantinha as regras do equilíbrio do traço.

O pescador de sereias, por Júlio dos Reis Pereira, 1929
Sabat – Dança de roda, António Pedro, 1936

António Pedro trilhou o surrealismo, figura polifacetada, homem de teatro, escritor de relevo. Fez objetos, escultura, cerâmica, galerista. Num tempo em que Leal da Câmara fora grande desenhador de humor em Paris e Amadeo Souza-Cardoso ganhara notoriedade internacional, em 1935, em Paris, Pedro assinou um manifesto ao lado de alguns dos nomes mais sonantes do tempo como Marcel Duchamp, Delaunay, Kandinsky, Miró, Picabia, Arp e Calder. No tempo da Exposição do Mundo Português, de 1940, era inaugurada no Chiado uma exposição por ele organizada, exposição surrealizante, ele, António Dacosta e a escultora inglesa Pamela Boden. Temos aqui neste Sabat - Dança de roda quatro corpos ou troncos, cruzam-se num espaço, envolvendo braços e seios e as quatro cabeças calvas fixam-nos em espanto. Quadro de uma grande violência carnal, como observará José-Augusto França.
Cais 44, Fernando Lanhas, 1943-1944

Ainda não sabia, mas era uma revolução silenciosa, nada de figuras, linhas geometrizantes, mas, para desconforto do espírito académico e mesmo dos modernistas havia nesta conjugação de cores uma luminescência que era impossível refutar não se tratar de uma grande arte.
Sombra projetada de René Bertholo, Lourdes Castro, 1964

Estamos a entrar numa nova era, o neorrealismo deu sinais de esgotamento, o próprio surrealismo segue um caminho autónomo e algo de profundo iria acontecer com as bolsas da Fundação Calouste Gulbenkian, ir-se-ão impondo novos nomes, caso de Lourdes Castro, Helena Almeida, Bartolomeu Cid, Sá Nogueira, uns motivados pelos temas da sociedade de consumo, outros experimentando o uso da sua própria figura como modelo dentro da obra, será o caso de Helena Almeida como mais tarde Jorge Molder. O fundamental a reter é que a partir de agora a abertura a outras estéticas não será tão demorada como no princípio do século, isso ver-se-á nos trabalhos de Paula Rego ou de Menez. O museu pode orgulhar-se de ter obras de grande significado destas gerações, como abaixo se exemplifica.
A Noiva, por Paula Rego, 1972
Sem título, Menez, 1985
Sem título, João Vieira, 1972
Da série TV, Jorge Molder, 1995
This is not a drill (No Pain No Gain), João Tabarra, 1999

As artes plásticas, como é óbvio, não estavam nem ficaram insensíveis seja à erupção de novos meios de comunicação e ao aproveitamento de novas tecnologias. A fotografia voltou a ganhar estatuto de nobreza, as instalações, as performances entraram na ordem do dia, de algum modo já tinha sido assim com o Op, a arte cinética, mas a dimensão tecnológica foi tão avassaladora que trouxe uma alteração profunda aos conceitos estéticos. Isto para já não falar nos aparatos espetaculares como o uso de detritos humanos, materiais da construção civil, etc.
Não sei para onde caminhamos, a minha fronteira do gosto acaba aqui.

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Nota do editor

Último post da série de 28 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26966: Os nossos seres, saberes e lazeres (687): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (210): Visita ao novo acervo permanente no Museu Nacional de Arte Contemporânea – 1 (Mário Beja Santos)