1. O nosso Camarada José Eduardo Oliveira - JERO -, (ex-Fur Mil da CCAÇ 675, Binta, 1964/66), enviou-nos a seguinte mensagem:
Camaradas,
Guardei-me prás "últimas" para vos mandar um pequeno texto e votos de Boas Festas.
Para vós e todas as vossas famílias. E obviamente para toda a gente que colabora e gosta do nosso blogue.
Para vós e todas as vossas famílias. E obviamente para toda a gente que colabora e gosta do nosso blogue.
PS- O conto que envio é baseado em factos reais. Infelizmente não é ficção. Antes fosse.
De certo modo tem a ver com a "estória" do Alfero Cabral e do miúdo Sitafá, que não sabia onde morava o Natal.
Ainda há muita gente que sabe que há Natal mas que mora muito longe...
Ainda há muita gente que sabe que há Natal mas que mora muito longe...
A casa da Dª. Micas ficava ao fundo da rua apertada da sua terra de sempre. A aldeia da Boavista. Por ironia do destino ao fundo da rua não havia nem boa vista …nem nada…
Quando se abria a porta da velha casa os cheiros a mofo, a podridão, a miséria batiam-nos violentamente.
Passada a ombreira da velha porta entrava-se num mundo de odores, que se entranhavam rapidamente nas nossas roupas. Talvez até mais fundo. Na nossa pele, no nosso coração, na nossa alma…
Os 92 anos mirrados da Dª. Micas, que estava lá ao fundo, na sua cama obrigavam-nos – sem respirar fundo – a um esforço suplementar para sorrir e dizer “bom dia”.
Porque a Dª. Micas nas suas longas horas de solidão esperava pela chegada da senhora do “apoio domiciliário”…há que tempos.
Ia ter o seu tempo de companhia e de “higiene”, palavra quase absurda naquele espaço em adiantado estado de pobreza, de miséria, onde o mau cheiro se sobrepunha a tudo.
A antiga casa da velha aldeia tinha duas salas e um simulacro de cozinha, com uma pequena lareira e uma chaminé.
A Dª. Micas tinha 3 filhos que tenham decidido revestir o interior da chaminé com plásticos negros. Mas em relação às paredes da sala tinham sido mais imaginativos. As 4 paredes estavam “decoradas” com papel de embrulho…com palhaços! O aspecto final era difícil de classificar. Palhaços amarelecidos…a sorrir ali…naquele local.
A intenção até podia ter sido boa – e vamos acreditar que sim – mas que destoava um bocado…destoava!
Acabados os cuidados de “higiene” a Dª. Micas ficava sentada num velho cadeirão. Envolta por um velho lençol que parecia “amarrá-la” mas que servia para não se desequilibrar e cair. Um dos filhos, no final do seu dia de trabalho, arranjaria um bocadinho para passar por sua casa e deitá-la. Onde ficaria a dormitar e à espera da visita do dia seguinte da senhora do “apoio domiciliário”…
E o que a Dª. Micas dizia dos seus filhos? Defendia-as com “unhas e dentes” e dizia que eram “bons filhos”.
Fechada a porta quem saía trazia os cheiros. De uma casa velha, com palhaços a forrar paredes sem tempo. A rua estreita subia até se ver a Boavista. E os vales circundantes com o pinhal de Leiria lá muito ao fundo.
Será que era lá ao longe, para lá das alturas do Monte de São Bartolomeu, que morava o Natal?
Ali, na velha casa da Dª. Micas, não era com certeza. E não estávamos no fim do mundo.
Alcobaça, com o seu Mosteiro Património Mundial, e com as suas ruas com enfeites de Natal, estava a meia dúzia de minutos… De carro.
Amanhã é outro dia. Para se fazerem as últimas compras e para desejar um “Feliz Natal”.
Boas Festas.
JERO
Fur Mil da CCAÇ 675
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Nota de M.R.:
22 DE DEZEMBRO DE 2011 > Guiné 63/74 - P9251: O nosso sapatinho de Natal: Põe aqui o teu pezinho, devagar, devagarinho... (5): Mensagens de Albino Silva, José Mussá Biai e Tabanca de Matosinhos