quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Guiné 63/74 - P8774: Histórias em tempos de guerra (Hélder Sousa) (10): A primeira missão

1. Mensagem do nosso camarada Hélder Sousa (ex-Fur Mil de TRMS TSF, Piche e Bissau, 1970/72), com data de 13 de Setembro de 2011:

Caros camaradas Editor e Co-Editores
Já faz algum tempo que não contribuo com algum texto, embora procure acompanhar o Blogue e intervir ao nível do 'comentários'.
Há que dar lugar aos novos, para que também eles assumam este colectivo.

Caso vejam interesse, envio então este texto que podem inserir numa série que eu teria de ir completando e que se chegou a intitular "Histórias em tempo de guerra", com uma história verídica e que se passou ainda não tinha uma semana de Guiné, ou seja, de Bissau. Ainda era tudo novo, tudo misterioso. Depois ganha-se calo.

Peço desculpa por não poder rechear o texto com fotos a propósito, por exemplo do aparelho de rádio referido, mas é que não encontrei, nem na net. Apenas junto essa que o Vítor Raposeira me facultou e que pode servir para avaliar o formato e dimensão do aparelho em questão.

Depois acho que também devo pedir desculpa aos camaradas para quem a sua "primeira missão" não foi como a minha, mas trata-se de contar aqui a verdade. A minha foi assim.

Abraço
Hélder Sousa



HISTÓRIAS EM TEMPOS DE GUERRA (10)

A PRIMEIRA MISSÃO

Caros camaradas, amigos e outros…
Impulsionado por algumas coisas que recentemente apareceram no nosso Blogue, lembrei-me desta experiência que passo a relatar.

Ela assenta em factos reais, verdadeiros, com algumas certezas e algumas dúvidas, a saber:

Certeza: ocorreu logo depois de ter chegado à Guiné, aí à volta do dia 15 de Novembro de 1970 (cerca de uma semana antes da ‘Operação Mar Verde’).
Dúvida: não sei dizer o dia certo, mas espero que isso não seja impeditivo para o relato do desenvolvimento da acção.

Certeza: participaram dois estrangeiros, um deles Engenheiro (não sei se civil se militar) e o outro, um militar com patente de Oficial. Um era rodesiano e o outro sul-africano.
Dúvida: não sei dizer qual era o rodesiano, acho que era o Engenheiro, da Racal, mas sem certeza, nem qual o sul-africano, acho que era o Oficial, salvo erro Coronel de Engenharia ou Transmissões, mas também sem certeza.

Certeza: a operação destinava-se à realização de testes de eficácia, de prova da capacidade, de bom desempenho, de uns rádios que se pretendiam vir a equipar em breve algumas unidades do STM. Tratavam-se de versões do Racal TR-15. Não, meus camaradas, não era o TR-28, o que foi colocado à experiência era de muito maiores dimensões, cerca de 60cm de frente e para ficar assente em mesa, de que podem observar, embora só um pouco, na foto que me foi cedida pelo Vítor Raposeiro em que está em frente a um, já em Bissau.
Dúvida: tenho a ideia que a seguir à identificação TR-15 havia uma letra, não sei se um “A” se um “L”, nem me lembro agora para onde foram alguns exemplares, para além de Catió.

Fur Mil Vítor Raposeiro no seu posto de trabalho

Para a realização dos referidos testes montou-se um ‘posto director’ numa espécie de pátio que havia lá nas Transmissões, com uma tenda para evitar que o aparelho em apreciação fosse alvo da curiosidade e para o proteger das acções climatéricas (nessa altura ainda apanhei chuva nesse dia), e com a execução de uma antena dedicada ao aparelho pelo Alferes Pereira da Silva, que era um especialista nesse tipo de equipamentos.
Um outro aparelho foi montado numa das viaturas típicas das transmissões e servido apenas por uma antena ‘vertical’.

Antes de prosseguir quero aqui deixar a minha homenagem ao Alferes Pereira da Silva, que nunca mais vi nem sei o que é feito dele, mas que era “Aspirante” no BT aquando da minha passagem por lá a fazer o 2.º Ciclo do CSM, pelo que já nos conhecíamos desse tempo, um ano atrás. O Pereira da Silva era de facto uma figura típica, um bom homem, um grande especialista em antenas e muito bom em tudo o que dizia respeito a rádios e transmissões, parecendo contudo que estava sempre ’pendurado’ num cigarro que lhe saía da boca. Havia até quem apostasse que ele só acendia um cigarro por dia, os restantes acendiam-se sucessivamente, chegando a haver ocasiões que não era raro haver dois cigarros em simultâneo.

Nesta operação calhou-me a mim e ao Furriel Nelson Batalha fazer o trabalho na viatura, onde havia um condutor, os dois Furriéis recém-chegados, o ‘Oficial’ estrangeiro e creio que também um ‘operador’ de grafia. No ‘posto director’, para além do Alferes Pereira da Silva no apoio técnico, ficaram vários ‘quadros’ das Transmissões entre os quais os Capitães Cordeiro e Oliveira Pinto, bem como outro pessoal relacionado com o STM, nomeadamente o Sargento Taveira.

A seguir ao almoço (a montagem dos equipamentos ocupou a manhã) lá seguimos com a nossa viatura por vários e diversos caminhos e locais, que para mim na altura pouco ou nada diziam. Fomos para Antula, depois para o lado oposto, para a zona do aeroporto, também seguimos para o caminho de Quinhamel, embora não chegando lá.

As comunicações entre os dois rádios, quer em fonia, quer em grafia, foram satisfatórias, pelo menos assim foi dito. Mérito do rádio? Mérito da antena? Há um comentário do nosso camarada Carlos Filipe que refere uma máxima “é preferível um mau emissor com uma boa antena, que o inverso.” Estou convencido que foi de todo o conjunto: o rádio era bom, a antena também e as condições de ensaio foram favoráveis.

Contudo a experiência não ficou por aqui. Era necessário saber como era o comportamento em situação nocturna, com condições atmosféricas desfavoráveis. Vai daí, havia que repetir a experiência da tarde mas agora com ida a Prabis e depois Quinhamel.

Foi aqui que a ‘coisa’ se tornou caricata. O condutor e o operador, já com a viatura a circular por Bissau, disseram que não era nada aconselhável nem ‘saudável’ aventurarmo-nos pelos referidos caminhos, de noite, sem protecção, que o Comandante não tinha a noção do perigo, ainda para mais com um equipamento novo, que não estavam para se arriscar por causa ‘deles’, pelo que inquiridos sobre qual era a sugestão que faziam, sem se falhar o ensaio nem se entrar em desobediência, ficou entendido avançar-se um bocado na estrada de Prabis e depois recuar, avançar novamente e depois voltar a recuar: faziam-se os testes, faziam-se os quilómetros, e tudo correria bem. Ainda de noite fomos depois também para junto de um local que me lembro de terem dito ser a Missão Católica e tornear várias vezes o edifício e voltar a haver os avanços e recuos.

No meio destas cenas o Oficial estrangeiro que nos acompanhava ‘percebeu’ a situação, piscou o olho numa prova de entendimento e meneou afirmativamente a cabeça pois também não se tinha revelado muito confortável com a situação. Afinal, tudo aquilo ‘corria a favor’ dos testes….

Como conclusão posso adiantar que os testes foram positivos, o rádio agradou em pleno, a encomenda seria feita seguidamente, os ‘vendedores’ do produto saíram satisfeitos e nem percebi porque na despedida o Oficial completou a saudação com um cumprimento e novo piscar de olho. Os homens da viatura ficaram também contentes e eu e o Batalha confortados pelo êxito da nossa primeira missão.

Um abraço para toda a Tabanca!
Hélder Sousa
Fur Mil Transmissões TSF
____________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 22 de Julho de 2011 > Guiné 63/74 - P8587: O Mundo é Pequeno e o nosso Blogue... é Grande (44): Aqui e ali, prossegue a recuperação da memória.... (Hélder Sousa)

Vd. último poste da série de 15 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5821: Histórias em tempos de guerra (Hélder Sousa) (9): A Presse Lusitana

12 comentários:

Luis Faria disse...

Helder

Eu que pensava que só nos "bandos do arame " se faziam brincadeiras dessas!!!

Um abraço
Luis Faria

Anónimo disse...

AH...ERA ASSIM QUE SE FAZIAM ESCOLHAS TÉCNICAS DE OBJECTOS TÃO IMPORTANTES PARA A GUERRA.
Desculpa camarada Hélder de Sousa, mas esta história é de uma irresponsabilidade confrangedora.
Fiquei a saber que ir a Prábis ou Quinhamel era perigoso.
Se tivessem que ir para o Cantanhez, iam para onde ? Para os Bijagós.
Por acaso o Racal nem era mau de todo.
Um alfa sem bravo

C.Martins

Anónimo disse...

Caros amigos,

Claro que ir a Prábis ou a Quinhamel podia ser muito perigoso. Sobretudo se tínhamos um condutor ressabiado na nossa primeira saída.

De acordo com a história, foi o "velhinho" condutor que chamou a atenção do pobre periquito, o nosso amigo Hélder Sousa, para os perigos daquelas jornada nocturna à volta de Bissau.

A velhice do tempo, quando séria, até era boa conselheira.

Por experiência própria sabemos como os rádios se comportavam durante as intempéries a que estávamos tantas vezes sujeitos.

O que o Hélder nos podia explicar é a diferença, se as há, de comportamento dos rádios durante o dia e a noite, com intempéries ou não.

Concordo com o C. Martins quando afirma que o Racal nem era mau de todo. Peso à parte, diria que era um excelene rádio.

Um abraço amigo,
José Câmara

Anónimo disse...

Pois é amigo Hélder, para evitar dúvidas era bom se conseguisses explicar se era um rádio destinado apenas a Fonia, Morse ou a ambas as coisas. Embora me pareça não haver na tua história essa necessidade, ajudava a distinguir e evitava confusões, como sabes havia diferenças.
Ao que me é dado saber, o TR28 B2 (Racal) equipava as unidades que saíam para o mato, tal como os havia nas unidades, além dos ANGRC9e eventualmente outros que desconheço, para comunicações entre estas e os operacionais fora do aquartelamento.
Nos locais onde havia o STM, dependendo do seu tamanho e interesse, era frequente o rádio ser um Marconi, destinado apenas à receção de Morse. Só no posto diretor em Bissau havia diferentes tipos de equipamentos, alguns com sintonia manual, que davam para ambas as formas de comunicação e até para sintonizarmos postos com emissão de música.
Em Mansoa o STM equipava com Marconi para os telegrafistas e tinha depois ainda para estes um Telex e um rádio para escuta das emissões de Conacry. Havia depois os telefonistas que além do telefone cujo equipamento desconheço, tinham um outro equipamento de fonia chamado Storno que comunicava com Bissau e era utilizado também para o pedido de apoio aéreo. Este equipamento ligava através já através de VHF e podia falar-se até para a Metrópole, através de Bissau.
Em Aldeia Formosa, posto do STM dotado com apenas três homens, só havia contacto com Bissau através de Morse, já em Bolama, só com dois homens, havia fora do STM telefonistas com ligação a Bissau, não me recordo quais os equipamentos do STM nestes locais, certo era que só funcionava e recebiam em Morse.
Um abraço,
BSardinha

Luís Graça disse...

Hélder:

Parabéns pela reconstituição da história... Que memória, meu!... Seria interessante, por outro lado, teres feito um esboço do percurso dos "ensaios"... Por onde é que andaste com os teus "amigos", o rodesiano e o sul-africano ?

Falas na estrada de Prábis, mas também na Missão Católica... (que geria e ainda gere, desde 1955, o hospital para leprosos de Cumura)...Não consigo localizar no mapa este sítio, Cumura ou Kumura...

O meu João esteve lá uma parte da tarde, no hospital e na missão (que é dos Franciscanos)... Era para leste ou nordeste de Bissau, a caminho de Nhacra/Mansoa ? Ou era no sentido oposto (Prábis) ?... Vê se me consegues esclarecer... Como não andei nos escuteiros, sou péssimo em matéria de orientação... LG

PS - E já agora, qual era o teu "raio de segurança" em Bissau, no teu tempo ? Até onde é que um militar da tropa podia andar, fardado, desarmado, nos arredores de Bissau ? Risco real e risco imaginário ? Claro que à noite todos os gatos eram pardos...

Anónimo disse...

No abrigo de comando e transmissões em gadamael , a malta de transmissões passava o dia e até a noite "..papa..india.. romio...alfa e tal..e nova linha..e tal e coiso..e nova linha...e tal"..num rádio muito pequeno.. penso que se chamava "storno"
PAFF..PAFF..PAFF...saídas de morteiro..BENGG...BENGG..saídas de canhão s/r...Jeuuuuiiiichh....misseis..UUUUIIII ..Praff...Praff..... rebentamentos...e o transmissões continuava com a lenga..lenga.."..paapa..bebbeta...ddeeelta...rroromio"..e nova linha.
Cala-te com essa merda..car..
Eu..eu..estou a transmitir a Bissau que estamos a embrulhar
AH..pois.. ouve lá.. e quem é que te mandou..
Bem..euu...eu..
A minha homenagem aos "transmissões"

C.Martins

Anónimo disse...

Caro Luís Graça

Segurança em Bissau !!!

Na minha chegada encontrei um furriel, meu conterrâneo, que fez de de guia turístico.
No final do dia fomos a um bairro, e entrou numa casa , tendo-me dito para esperar.. que não demorava.
Ali fiquei..feito parvo..entretanto passavam muitos civis e para espanto meu faziam a continência..passou mais de uma hora e começou a escurecer..comecei a ficar incomodado e preparava-me para entrar.. quando o dito saiu ..com um sorriso de orelha a orelha..
"Então pá..esperaste muito"
Quando me explicou que bairro era aquele e o que tinha ido fazer..estive quase para lhe bater.
"Pira sofria" na sua ingénua ignorância.
Eh..pá..eh..pá , então estiveste a fazer-me segurança.. o que é queres.

C.Martins

Hélder Valério disse...

Caros camarigos

Vou tentar adiantar mais alguns esclarecimentos, os que puder e souber, relativamente ao que me solicitaram.

Quanto às "irresponsabilidades confrangedoras", de acordo com a visão do nosso camarada C. Martins, a qual, sendo dele, a respeito, embora em total desacordo, abordarei em outro momento.

Vou começar pelo fim, ou seja, pelas questões do Luís Graça, sendo que alguns esclarecimentos podem também servir para outros amigos.

O percurso.
Sobre isso é bom que procurem colocar-se um pouco na minha pele, ou seja, na minha situação. Muitas vezes encontro aqui no Blogue, mas não só, isso é comum a muitas situações, em que as pessoas colocam objecções, questionam, opõem-se, etc., mas não fazem um esforço para enquadrar a situação de que estão a 'mandar bitaites' no tempo e no espaço.

Reparem, eu cheguei à Guiné a 9 de Novembro, a partir de 10 entrei em estágio no STM e o meu percurso era das instalações do alojamento dos sargentos para o STM, para a messe e uma ou outra noite para ir ao centro de Bissau conhecer a "Meta", o "Pelicano", o "Chez Toi", o "Solmar", a "5ª Rep.", etc.
Foram estes nomes que começaram a ser familiares, mais "Amura", "QG", "Palácio do Governador", "Cupilão", e alguns outros mais.

Também comecei a ouvir outros nomes: "Tite", "Morés", "Óio", "Cantanhez", "Pirada" "Aldeia Formosa", "Teixeira Pinto", "Buba", "Bula", "K3", "Mansoa", "Guileje", "Guidaje", e mais alguns outros sendo que nessa altura eram só 'nomes', não sabia graduar as dificuldades, as perigosidades, de cada um desses locais.

Haviam outros nomes que já conhecia, pelo estudo da geografia e das notícias dos jornais, tais como "Bolama", "Bafatá", "Madina do Boé", "Bijagós", "Como", etc.
Deste modo podem perceber que, para mim, "Prabis", "Quinhamel" e outras coisas semelhantes, não tinham nenhuma carga valorativa, quanto a ser favorável ou perigosa.

Julgo que com esta explicação e se fizerem um esforço de acompanhamento do que poderia pensar na ocasião, poderão concordar comigo que, ao fim de talvez nem sequer uma semana, não tinha nenhuma noção sobre esses locais.

Porque isto já vai comprido vou 'cortar' aqui, enviar, e referir o resto em comentário seguinte.

Hélder S.

Hélder Valério disse...

Continuando....

Pergunta o Luís se não teria feito um esboço do percurso dos ensaios. Não, não fiz, nem estava preparado mentalmente para o fazer, não fazia ideia do que iria suceder.

Eu não era mau de todo na grafia e tinha jeito para 'afinar' as sintonias, 'tirar o bigode', como o pessoal que trabalhou com a ANGRC9 costumava dizer. Por isso, e por estar 'disponível', já que estava em estágio, tal como mais três dos outros Furrieis que chegaram comigo, fui indicado para a missão, mas não sabia muito bem o que é que era pretendido com a experiência.

E de facto quando saimos do edifício das Transmissões é que fomos recebendo as indicações para onde pretendiam que fossemos. Disseram "até Antula", que era onde situavam os emissores, mas para mim isso era apenas um nome, não sabia para onde ficava, só depois é que fiquei a saber que ficava a leste da Santa Luzia. Mas eu não saber era obviamente irrelevante, só tinha que receber a indicação, transmiti-la ao condutor que, naturalmente, sabia.

Depois disseram, "até Quinhamel". Outro nome sem significado geográfico, sem outro tipo de referências, mas do conhecimento do condutor.

Em abono da verdade devo dizer que nessa viagem, feita de dia, à tarde, não cheguei a ver o caminho, ia na parte de trás da viatura, que era fechada, junto ao rádio, do operador de grafia e do sul-africano. Não me apercebi da envolvência exterior, se era em descampado, se no meio de arvoredo, se no meio de casas.

Já no percurso de noite aconteceu o mesmo. Ia na parte operacional e o outro Furriel na cabina junto ao condutor. Por isso sei que fomos até Prábis (foi o que se falou) e aí andou-se um bocado para a frente e para trás. Na volta de regresso fomos até à "Missão Católica".

Acho que sim, que são as instalações de Cumura que ficam a cerca de 2,5 km de Prabis, no lado norte da estrada, já no sentido de Bissau, a cerca de 10 km desta. Julgo que com estas indicações será possível localizar aproximadamente. Sai-se de Bissau para oeste, para Prábis, e cerca de 10 km dolado direito da estrda, ou seja, lado norte, está a "Missão Católica" de Cumura.

Acho que vou 'cortar' novamente aqui. 'Segue dentro de momentos'.

Hélder Valério disse...

Nova continuação....

Perímetro de segurança.
Bem, quanto a isto, e mais uma vez, as coisas são relativas...

Posso dizer que em 1971, depois de vir de Piche para a "Escuta", em Agosto, Setembro, Outubro e talvez ainda Novembro (aqui já não me lembro bem), fui algumas vezes, de motorizada, conduzindo uma, ou como pendura, até Nhacra, visitar um Furriel meu amigo e antigo colega da escola em Vila Franca, numa Companhia de Cavalaria que estava lá colocada depois de ter estado antes na zona de Farim e que na altura era comandada pelo Cap. Cav. Mário Tomé que foi tomar conta dessa Companhia depois da morte do anterior e titular comandante.

Tenho ideia que das duas primeiras vezes não houve qualquer problema, impedimento ou condicionalismo.
Mas depois passou a haver controlo em Safim e só íamos quando houvesse viaturas militares em coluna.

Depois da partida (regresso a Portugal) desse meu amigo não voltei mais a Nhacra. No entanto posso dizer que já no ano de 72, não sei precisar o mês, o controlo passou a ser junto ao aeroporto. Nessa ocasião o destino da viagem passou a ser a estrada para Quinhamel, que se tomava a sul do aeroporto e depois virava para oeste.

Nessas viagens ia 'à civil' e, obviamente, desarmado, aliás, não tive arma atribuída. Na "Escuta" estava um 'armeiro' com várias G3 e se necessário eram essas as usadas.

Não te sei dizer se era 'seguro' ou 'inseguro', mas que se notou uma retracção do 'perímetro de segurança' isso foi para mim inquestionável. Também se era psicológico ou 'profilático' é coisa que não posso nem sei determinar.

Interiormente, nos bairros populares, nomeadamente no Cupilão, já na altura que lá cheguei corria o boato que 'cortavam cabeças' a quem por lá se aventura sozinho, à noite. Mas confesso que nunca tomei conhecimento de qualquer confirmação nesse sentido. Agora que era aventureirismo, isso sim.

Vou abordar a questão dos rádios e das boas ou más condições de transmissão em comentário seguinte.

Hélder Valério disse...

Agora, os rádios

O que o Belarmino diz, está correcto. O Racal TR28 B2 equipava as unidades móveis, quando substituiu gradualmente os ANGRC9.

No entanto, para os postos do STM, normalmente colocados nas sedes de Batalhão, que trabalhavam, ia a dizer "exclusivamente" em grafia (morse) eram usados os 'marconi'.

Eram para proceder à modernização destas comunicações, portanto do STM, que se procurou equipamento melhorado e os Racal TR15 vieram à experiência. Na altura dos teste eram 3 os aparelhos. Um estava no 'posto director', outro na viatura móvel e o outro de reserva.
No imediato sei que um ficou em Bissau, um foi para Catió (porque o Furriel Batalha que tinha estado comigo nos 'testes' trabalhou com um deles até ser ferido e evacuado) e não sei o destino do restante. Depois da encomenda vieram mais uns quantos mas não sei para onde foram, até porque depois ingressei na "Escuta" e fiquei aí dedicado, acabando por não acompanhar o que se passou noutras áreas.
Pergunta também o Belarmino se era para trabalhar em grafia, fonia ou ambas as vertentes.
Honestamente, agora, não sei afirmar de forma peremptória, mas achio que seriam então para trabalhar "preferencialmente" com 'chave de morse', embora tenha ideia que podiam sertambém utilizados em fonia. Digo isto porque a disposição do aparelho, tipo 'caixote' em cima da mesa de trabalho e a ideia que tenho de ter havido comunicação 'verbal' entre o posto director e a viatura durante os testes (podia ter sido para outro aparelho...) fazem agora ter essa opinião.

Interferências nas comunicações

A 'paisagem' da Guiné, com imensos espelhos de água, provocava como que uma espécie de reflecção das ondas rádio das comunicações. Mais do que os obstáculos 'florestais' eram esses, os cursos de água, rios e bolanhas, que mais prejudicavam as transmissões.
Por outro lado, durante a noite, haviam interferências de carácter magnético que também eram bastante prejudiciais, daí os tais 'estalidos', quase constantes, que se ouviam nos auscultadores e que deram cabo de bastantes aparelhos auditivos.

Caro amigo José Câmara, isto que acima escrevi serve, reconheço que com pouca profundidade de esclarecimentos, para dar uma aproximação de resposta à tua questão. Era mesmo assim, com trovoadas, alterações de condições climatéricas e das próprias alterações magnéticas, as interferências aumentavam e era necessário introduzir mais 'filtragens' e melhores antenas, o que no mato não era fácil.

Abraços
Hélder S.

Anónimo disse...

Caro camarada Hélder Sousa

O meu comentário não era dirigido especificamente à tua pessoa, e da forma que contaste a história inicial parecia que aquilo era apenas um acto formal e para "sul-africano ver", quando o que estava em causa era a escolha técnica de um rádio que, como sabes muito melhor do que eu, era e é um objecto fundamental para o TO.
Foi nesse sentido que escrevi "irresponsabilidade confrangedora". e não criticar-te e muito menos julgar-te.
Fiquei esclarecido com as tuas explicações técnicas e não só.

AFIRMATIVO E CORRECTO

C.Martins