1. Mensagem de Joaquim Mexia Alves* (ex-Alf Mil Op Esp/RANGER da CART 3492, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73), com data de 29 de Dezembro de 2009:
Meus caros Camarigos
Passou um ano e já outro ano está a começar!
Penso neste ano que passou em relação à nossa Tabanca Grande e vou-me apercebendo de várias coisas, pelo menos para mim, pois que felizmente não pensamos todos da mesma maneira.
Mas em primeiríssimo lugar quero tirar o chapéu, ou mais do que isso, agradecer ao Luís Graça, ao Carlos Vinhal, ao Virgínio Briote e ao Eduardo Magalhães Ribeiro o trabalho, a dedicação, que dedicaram a todos nós, aos nossos escritos, frutos das nossas memórias e também imaginação, pois então, e também, ou tão mais importante ainda, a paciência para lidarem com incompreensões, com impaciências, com pequenas revoltas, com pequenas ou grandes quezílias, com eles, ou entre atabancados, mas que no fundo acabam sempre por sobrar para eles.
É que muitas vezes a sua intervenção nesses pequenos problemas, (gerados porque somos diferentes e por isso pensamos diferente), vão muito para além dos textos, e transformam-se em contactos pessoais, carregados de sentido e amizade, para que a harmonia prevaleça.
Pela minha parte, e apesar de ser pessoa que rapidamente esqueço irritações e zangas, (as quais muitas vezes também sou rápido em comprar), quero desde já pedir desculpa a qualquer um que se tenha sentido ofendido por algo que escrevi, ou sugeri, na certeza de que se o fiz, não foi com esse sentido, mas tentando mostrar o meu ponto de vista que, reconheço, nem sempre será o mais correcto e verdadeiro.
Dito isto, quero ainda dizer, ou melhor, dizer escrevendo, que haverá sempre alguns assuntos que levantarão sempre crispações, irritações, até talvez zangas mais ou menos longas, assumidas ou não.
É lógico que se falarmos de Guileje, da guerra perdida ou ganha, da política ligada à guerra, etc., etc., sempre encontraremos clivagens, sempre encontraremos razões para discutirmos mais ou menos acesamente e, como tal, pontos de rotura e confronto, o que nem sempre nos torna mais calmos e sensatos.
(Estou a falar para mim e de mim, obviamente).
Mas não será por isso, que fique bem claro, que deixaremos de focar e discutir tais assuntos, apenas, julgo eu, devemos tentar perceber se as nossas intervenções vão acrescentar algo mais ao que já foi dito, ou se apenas são achas para um "fogo que arde sem se ver”.
E ao discuti-los que saibamos partir para a discussão na certeza de que aquilo que nós damos como certo e correcto, nem sempre é o certo e correcto para os outros.
Todos nós, julgo eu, já passámos por essa experiência de, ao falarmos com ex-camaradas de armas que estiveram ao nosso lado em determinada situação, percebermos que, estando no mesmo sítio à mesma hora e perante os mesmos factos, temos noções diferentes do que se passou.
Temos sempre que perceber, (e isso todos nós sabemos), que aquilo que para mim, longe de determinada situação parece errado, para aquele ou aqueles que a viveram, é a decisão mais correcta e acertada, ou seja, temos de calçar as botas dos outros, para que eles também calcem as nossas.
Estou a pensar, obviamente, em voz alta para mim, que bem preciso por vezes de pensar melhor, de ser mais sensato nos meus juízos, nos meus pensamentos, nas minhas certezas.
Uma coisa é certa: quem passou pelo que nós passámos, tornou-se irmão de sangue, mesmo que o não tenha derramado, e isso é ligação para toda a vida.
Só nós sabemos falar esta linguagem de ex-combatentes, e se já havia poucos que a entendessem, cada vez haverá menos.
Não será nos nossos tempos, creio eu, que se fará a História verdadeira da guerra de África, (nem sei se alguma vez se fará), mas o que escrevemos aqui, o que contamos ali, as fotografias que vamos recordando e que ficam para recordação, ajudarão com certeza, a tornar essa História mais verdadeira e sentida.
Tanto paleio afinal, para desejar aos meus camarigos todos um Novo Ano bem melhor do que o que passou, e sobretudo que neste Novo Ano possamos encontrar todos a forma melhor de lutarmos pela nossa dignidade e pelos nossos direitos, sobretudo os daqueles que ainda vivem escorraçados e desprezados pela Pátria que tão bem serviram com as suas vidas.
Abraço forte e camarigo para todos
Joaquim Mexia Alves
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 17 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5484: Votos de Feliz Natal 2009 e Bom Novo Ano 2010 (6): Guerra à guerra... (Joaquim Mexia Alves)
Vd. último poste de 31 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5568: Votos de Feliz Natal 2009 e Bom Novo Ano 2010 (25): 'Ousemos lutar para ousar vencer' (Hélder Sousa)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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4 comentários:
Camarigo,
Tive o prazer de te conhecer pessoalmente há bem poucos dias. Uma certeza ficou. És mais um para a colecção das amizades que fiz atravez desta cena chamada Blogue noves fora e não sei quê. Que até para entrar nele foi preciso uma cunha, mas isso para o caso não interessa nada.
Interessa sim que nesta irmandade de apanhados, com mais ou menos discussão, controvérsias e dixotes, se vive uma vida onde as irrevencias só fazem (e unem)amigos. Que mais precisamos nós ?
Um bom ano. Para ti em duplicado pois ele (o ano) deve ter dificuldade em chegar todo de uma vez.
Um Bom Ano Novo para ti também!
Mário Fitas
Caro Joaquim
Para além de te desejar tudo de bom para o próximo ano, aproveito para te dizer que gostei bastante deste teu texto.
Está bem explicado o que é a 'vivência activa' no Blogue.
Ah, e também te quero dizer que foi dos textos com mais autocrítica que li por aqui!
É o que sempre tenho dito: um coração grande, muito perto da boca!
Um abraço
Hélder S.
AMIGO MEXIA ALVES,
O TEU PONTO DE VISTA TEM DE SER,ÓBVIAMENTE,O MAIS CORRECTO E MAIS VERDADEIRO,CASO CONTRÁRIO DEIXAVA DE SER O TEU PARA SER O DE OUTRO QUALQUER...
QUANDO ESCREVEMOS, COLOCAMOS ALI AS NOSSAS IDEIAS E A NOSSA VERDADE, PELO QUE NÃO HÁ RAZÃO PARA NOS PENITENCIARMOS DE DIZER A NOSSA VERDADE.
SE NÃO CONCORDAM CONNOSCO,PACIÊNCIA...
QUANDO NÃO ENTENDEM QUE A NOSSA VERDADE É A NOSSA VERDADE E QUE PODE PERFEITAMENTE DIFERIR DAS OUTRAS VERDADES,DAS DELES,QUE SE PODERÁ FAZER?
ENTENDER OS OUTROS,ESPERANDO QUE NOS ENTENDAM...
QUANTO AO CALÇAR AS BOTAS DOS OUTROS É QUE JÁ É MAIS DIFICIL,PORQUE QUANDO SE TRATA DE BOTAS COMO AS TUAS DE HOMEM DE QUASE DOIS METROS,QUALQUER CIDADÃO DE TAMANHO MEDIANO FICARÁ A NADAR DENTRO DELAS...
UM BOM ANO PARA TI,RECHEADO DE SAÚDE.
ÃBRAÇO
MANUEL MAIA
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