segunda-feira, 22 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22741: Memória dos lugares (431): Tabatô, a tabanca da utopia, a 10 km, a nordeste de Bafatá - Parte II

 


Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Tabatô > Poilões > "A porta do meu coração", diz a Sílivia Margarida Mendes, a portuguea de Évora que conuistaouo coração do "super camarimba" Mamadu Baio (lê-se: Baiô), membro da nossa Tabanca Grande.  

Foto (e legenda): página do Facebook de Sílvia Margarida Mendes... Com a devida vénia...



Mamadu Baio, foto da sua página pessoal no Facebook... Com a devida vénia.  Foi o o fundador e líder dos Super Camarimba.  O João Graça conheceu-o em dezembro de 2009 em Bissau e a sua gente em Tabatô. Vive hoje em Portugal.


(Continuação)


3. O que é hoje Tabatô ?  


Escrevi no poste anterior (*): "Heureca!... A fim destes anos todos (!), descobri finalmemte a localização precisa da famosa tabanca de Tabatô. E mais: vi escrito o topónimo na carta de Bafatá... 

Nunca lá fui no tempo em que estive em Contuboel (de 2 de junho a 18 de julho de 1969)., embora devesse ter andado por lá perto (...).  De facto, nem sequer o nome me ficou no ouvido. A primeira vez que ouvi falar em Tabatô foi através do João Graça que lá passou uma noite, memorável, de 15 para 16 de dezembro de 2009.

Mas pergunta o leitor: porquê a visibilidade dada hoje a esta tabanca perdida no interior da Guiné ?

Tem alguma razão de ser... Na verdade: Tabatô tem beneficiado de bastante "mediatização" nos últimos anos (nomeadamente com o filme "A batalha de Tabatô", do realizador português João Viana) e tem já alguns filhos ilustres, nomeadamente músicos, Jimi Djabaté, Dj Buruntuma, Mamadu Baio, etc. Tabatô é conhecida sobretudo por ser a terra dos antigos "djidius" que percorriam o vasto território do império do Mali e, depois da decadência e fragmentação deste, de reinos locais como do Gabu.

Descobri, entretanto, que qualquer um de nós pode lá passar uns dias úteis e agradáveis, para não dizer umas "férias únicas", como "workawayer", hóspede que paga em trabalho (5 horas por dia / 5 dias por semana) a hospedagem, traduzida em "cama, mesa & roupa lavada"... Ou seja, Tabatô já  está no roteiro mundial do turismo alternativo...

É, de algum modo, uma "tabanca da utopia", no atual panorama da Guiné-Bissau, e oxalá o seu exemplo se multiplique. (Utopia do grego "οὐτόπος", não-lugar, lugar que não existe, mas també, lugar ideal ou idealiado...).

De facto, também  fiquei a saber que a tabanca de Tabatô não é apenas célebre pela sua escola de música, e por ser um grande viveiro da música, dos músicos e dos instrumentos musicais da tradição afro-mandinga. É também uma comunidade viva e aberta, tendencialmente igualitária, e que se tem empennhado na luta por causas nobres e avançadas como os direitos humanos, o desenvolvimento autossustentado, a igualdade de gênero, a mutilação genital feminina, a saúde pública, as alterações climáticas, o ecumenismo, etc.

No sítio Workaway.Info ("a comunidade líder em intercâmbio cultural, férias de trabalho e voluntariado em 170 países"), encontramos a seguinte informação atual, em inglês e em português ,  sobre Tabatõ, da responsabilidade do chefe da Tabanca, de nome Mutaro (, penso que a grafia correta é Mutar).

Workaway  (,do inglês, "trabalhar fora") é uma plataforma, que já existe desde 2002,  que permite aos membros (inscritos) o alojamento  em casa de famílias ou comunidades mediante  intercâmbio cultural. Espera-se que os voluntários ou "workawayers" contribuam com uma quantidade pré-acordada de tempo de trabalho por dia,  em troca de "cama & mesa", que é fornecida por seu anfitrião (Vd. aqui mais na Wipédia).. 

Neste caso, Mutar, o chefe da tabanca de Tabató (, que eu penso ser o Mutar   Djabaté, o velho patriarca do tempo em que lá passou o João Graça, em 2009, ou então um dos seus filhos), dá alojamento e alimentação a dois hóspedes, em troca de trabalho voluntário, de 5 horas por dia / 5 dias por semana, no âmbito das atividades (económicas, sociais, culturais e lúdicas da comunidade). Do género: ensino-te a tocar "balafon" e tu participas na colheita do caju...

 Reproduzimos alguns excertos (negritos e parênteses retos nossos). 



Eis uma primeira descrição de Tabatô:

(...) Tabatô é uma pequena e harmoniosa tabanca,  situada a 10 km de Bafatá, [, a nordeste de Bafatá, e a sul de Contuboel e Jubicunda,] no interior da Guiné-Bissau [, região de Bafatá].

 Nesta tabanca vivem em comunidade 274 habitantes, maioritariamente da etnia mandinga e fula [e uma minoria jacanca, que no passado veio do Mali].

Surpreendentemente, aqui ainda estão muito vincadas tradições que perduram há mais de 4 séculos, sem que estas tenham sido esquecidas ou menos praticadas ,tais como:

  • casamentos tradicionais;
  • danças e músicas afro-mandingas;
  • leituras do Alcorão;
  • "dimbasumo", uma celebração das mulheres;
  • "cambanicafó", uma celebração da união de jovens trabalhadores.

Estas [tradições] conquistam qualquer visitante que espalha a palavra sobre o que é Tabatô, atraindo comoisso muitos visitantes a virem conhecer a nossa comunidade.

O meu nome é Mutar  e sou o lider desta Tabanca. Toco e vivo a música de uma maneira muito intensa desde que me lembro e quero muito transmitir isso mas também aprender sobre (e com outros) estilos de música e de ritmos.

Em Tabatô nós produzimos instrumentos típicos da cultura Mandinga, tais como:

  • Balafon
  • Cora
  • Dumdumtama
  • Neguelin
  • Mirantelen
  • Djembé
  • Cutil
  • Nhanhero
  • Flauta, etc.

Em toda a nossa comunidade, desde os mais novos que ainda gatinham até aos mais anciões, corre a música pelas veias

Tanto usamos a música como uma forma de expressão da nossa cultura e  sentimentos como  também de diversão, e fazemos ações de sensibilização com várias ONG (Médicos Sem Fronteiras, PLAN internacional, TOSTAN Guiné-Bissau,etc) em temáticas de direitos humanos e de desenvolvimento de comunidades como a igualdade de gênero e a sensibilização para que se acabe com a mutilação genital feminina.

Depois de jantar, nós, líderes da comunidade, ensinamos as meninas a cantar e tocar para que lhes seja dada uma oportunidade que não teriam de outra forma. Da venda dos instrumentos musicais e da atuação musical em eventos, conseguimos garantir que todas as nossas crianças tenham acesso às escola.

Somos uma comunidade autossustentável , pelo que usufruímos todos de hortas comunitárias onde produzimos o necessário para nós
  • malaguetas, 
  • quiabo, 
  • "jacatu"
  • tomate 
  • e na época da chuva, amendoim, mandioca, e milho. 

A época da chuva decorre de maio a novembro.

De Março a Junho acontece a apanha do caju, a nossa maior fonte de rendimento.
Ainda na época das chuvas, com o apoio do centro médico de Bafatá, distribuímos na comunidade medicamentos destinados a prevenir a malária e a diarreia.

Se ficaste curioso acerca da nossa comunidade e o nosso modo de vida mas ainda estás com dúvida:
 [ Mutaro, ou mlehor,Mutar, parece ter esquecido aqui o papel, mesmo que modesto, do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné onde o descritor Tabatô tem já cerca de 3 de dezenas de referências; repare-se que esta povoação, qu fica na região de Bafatá,   não teve qualquer papel ou visibilidade, de sinal positivo ou negativo, durante a guerra colonial ou guerra de libertação nacional, conforme o lado da "barricada" em que o leitor se colocar. ] 


Fotogaleria de Tabatô





Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Tabatô > 2021 > Fotos do chefe da tabanca, Mutar Djabaté  / Workaway.Info. Com a devida vénia







Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Tabatô > 16 de Dezembro de 2009 > A tabanca, da etnia minoritária jacanca (leia-se, djacanca), da famíla de Kimi Djabaté (que aqui viveu até aos 21 anos), e onde se aprende a fabricar e  tocar os instrumentos tradicionais (balafón, cora, djembé...) da música afro-madinga... 

 Depois de uma noite memoráve (,a recordar em próximo poste, aqui ficam algumas fotos da despedida do João Graça, médico e músico, membro da nossa Tabanca Grande, em viagem pela Guiné-Bissau, realizada em Dezembro de 2009. Nas fotos, alguns familiares do Kimi Djabaté, filho de Mutar Djabaté.

Fotos (e legenda): © João Graça (2009). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem complemenetar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
]



Sobre as oportundiades de intercâmbio cultural 
e de aprendizagem, diz a "info":


(...) Vais ter a oportunidade de experimentar a vida numa aldeia que funciona como uma comunidade, onde todos trabalham de forma igual para contribuir para o bem e o progresso comuns, mas também para a preservação da sua cultura e presença no mundo.

Por um lado, vais aprender  como cultivamos e consumimos o que produzimos. Por outro, sendo a nossa tabanca tão ligada à música, vais poder emergir na nossa comunidade dançando diariamente. Podemos ensinar
-te a tocar como nós e a fabricar instrumentos e talvez também possas tu ensinar-nos algo de novo! 

Vais poder envolver-te por completo numa atmosfera de energia, música, dança e ritmo

Vais poder perceber e aprender sobre toda uma cultura que perdurou até aos nossos dias, passando pelos tempos da colonização e que, mesmo agora com a globalização, insiste em deixar a sua marca naqueles que nos visitam.


Sobre o perfil dos visitantes/hóspedes ("workawayer") 
mais desejados:

(...) Procuramos pessoas curiosas e flexíveis que queiram contibuir,  com as suas qualificações e competências, para o desenvolvimento sustentável da nossa comunidade de modo a podermos  trabalhar para nos tornarmos totalmente autossuficientes.

Precisamos de ajuda nas nossas hortas e na apanha do caju e também estamos abertos para ouvir sobre técnicas e práticas  agrícolas que não conhecemos

Também queremos pessoas que possam contribuir para o melhor funcionamento e organização de nossa escola primária. Estamos sempre abertos a ideias inovadoras e criativas para que possamos continuar aprendendo.

Em termos de preservação da nossa cultura e tradições, encorajamos a vinda de pessoas com experiência ou interesse em:

  • música e dança, 
  • marketing digital
  • vídeo
  • fotografia
  • gestão de eventos culturais, etc.

Alguns de nós já gravaram algumas músicas e pretendemos continuar produzindo e compartilhando os nossos talentos. 

Atualmente estamos a  construir uma escola de música e também pretendemos construir um mercado para vender os nossos instrumentos para o exterior. Por isso, também damos prioridade a quem possa de alguma forma contribuir com esses projetos. 

Se tu te identificas com algum desses projetos, não hesites em nos contatar! (...)


Como chegar a Tabatô 
e o que fazer lá ?


(...) Temos várias opções, incluindo espaço para instalares a tua caravana, tenda ou carrinha. Se desejares, temos um quarto para hóspedes com um colchão e uma casa de banho onde poderás ficar alojado. 

Alertamos que na época das chuvas haverá muitos mosquitos por isso deverás trazer a tua rede mosquiteira. Temos água corrente e fechadura para a porta para que tenhas a tua privacidade.

Comerás o mesmo que nós, comida típica da Guiné Bissau: muito arroz, acompanhado dos mais variados caldos de peixe e carne. Prepara-te para muita manga, e frutas saborosas com nomes estranhos que te darão saúde instantânea e força. (...)

Embora esta falhe por vezes, temos eletricidade por vía de painéis solares

Falamos  [, além do crioulo, do fula  e do mandinga]:

  • português, fluentemente;
  • francês, razoavalmente;
  • um bocado, o inglês.

Como chegar cá ?

 Vindo do aeroporto de Osvaldo Vieira, em Bissau,  tens duas opções:

(i)  a primeira, apanhando um autocarro às 14h para Bafatá no bairro Internacional, ao lado da mesquita central Atadamu, no bairro da Ajuda; com um custo de 2000 CFA  
 [,3,05 euros,] é a opção mais confortável mas também o mais difícil dos acessos pelo calor e quantidade de pessoas que se deslocam para Bafatá;

(ii) a segunda, apanhando o carro 7plus, a qualquer hora na parada central em Bissau, no bairro do Enterramento, perto do hospital militar; esta viagem custa 2800 CFA 
[,4,27  euros,] mas é mais cofortável.

(iii) chegando a Bafatá, terás que apanhar um táxi para Tabatô mas,  contactando-nos com a devida antecedência, alguém da tabanca irá lá buscar-te.

Nos tempos livres:

Poderás usufruir de passeios de burro pela mata circundante,   ou pelas tabancas mais próximas,  em  passeios de bicicleta. 

Poderás seguir as cantigas alegres que acompanham os trabalhadores no campo, hortas e mato. 

Podes participar de nossos rituais e costumes muito marcantes na nossa cultura. 

No fim de semana, podes ainda ir a Bafatá e Gabú, as cidades mais próximas de nós.

Costumamos passar os tempos livres juntos, ora a cozinhar, ou a conversar, a brincar mas sempre acompanhados de ritmo e música, sempre a cantarolar e a inventar novos sons! (...)

Mais informações que podem interessar o nosso leitor, potencial beneficiário da hospitalidade de Tabató: há acesso à Internet;  há acesso à Internet limitada; o anfitrião, Mutaro, não é  fumador: aceita  animais de estimação; pode alojar uma família e tem parque  para caravanas.


Para saber mais 
sobre este síto "Workaway.Info":

Workawayer, o que é ? 

É um viajante que deseja retribuir às comunidades e aos lugares que visita.  Está disponível para ajudar os anfitriões e usar a experiência para aprender e mergulhar na cultura local.

Workaway-Info é uma plataforma que permite aos membros organizar acomodação em casa de família e intercâmbio cultural. Espera-se que os voluntários ou "workawayers" contribuam com uma quantidade pré-acordada de tempo por dia em troca de hospedagem e alimentação, que é fornecida por seu anfitrião.


 [Adaptação, revisão e fixação de texto para efeitos de publicação deste poste: LG] 
 
(Continua)
____________

Nota do editor:

Último poste da série > 21 de novembro de  2021 > Guiné 61/74 - P22738: Memória dos lugares (430): Tabatô, a tabanca da utopia, a 10 km, a nordeste de Bafatá - Parte I

17 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Destes instrumentos, conheço:

Balafon
Cora
Nhanhero
Flauta
Djimbé...

Mas não estes:

Dumdumtama
Neguelin
Mirantelen
Cutil

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Tal como nunca ouvido falar destes rituais ou festas:

(i) "dimbasumo", uma celebração das mulheres;

(ii) "cambanicafó", uma celebração da união de jovens trabalhadores.

Talvez o Cherno Baldé nos possa dizer algo mais...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

E o que é o "jacatu" ? Fruta ou legume tropical...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Talvez o Mamadu Baio me possa um dia destes explicar:

(i) em Tabatô a principal fonte de rendimento é a venda do caju...

(ii) a base da alimentação é o arroz...

Donde vem o arroz ? Deve ser importado: Vietname ? China ?

Valdemar Silva disse...

Tabató, não conhecia esta tabanca que fica perto da estrada Bafatá-Gabu (Nova Lamego).
Não conhecia e devia conhecer por o meu pelotão e os outros, da nossa CART11 de soldados fulas, fazermos várias vezes a segurança a colunas naquela estrada.
Até Bafatá, a segurança às colunas era feita acompanhando a coluna por não haver necessidade de segurança fixa em determinados posições mais perigosas no percurso.
A estrada era alcatroada e nunca houve nenhum problema com minas ou emboscadas, e também não me lembro de haver tabancas próximo da estrada ao longo de mais de 50 kms entre Nova Lamego-Bafatá.
Pelas imagens reparo, e não é caso único, nas casas com aspecto ruinoso pensando por que não são arranjadas/pintadas dando a ideia de esperarem por cair de maduras, de resto deve ser interessante passar lá umas férias para quem goste aprender a tocar aqueles instrumentos africanos e fazer umas férias num ambiente "selvagem".
Espero pelas habituais e avalizadas explicações do nosso amigo Cherno Baldé sobre os instrumentos musicais e o modo de viver em Tabató.

Abraços e saúde
Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Sei que Tabatô também tem bolanha, e deve por isso haver cultura do arroz...

Curiosa é esta mistura, não habitual, entre fulas, mandingas e jacancas... Ser "artista" e "agricultor" não deve ser fácil... Mas vê-se, pelas fotos mais recentes, que há moranças com cobertura de colmo, novo!...

Valdemar Silva disse...

Voltando à localização de Tabató.
No mapa de Bafatá 1955 vê-se nitidamente Tabató, na bolanha, bem afastada da estrada Bafatá-Gabú, mas no mapa de 1961 (P19510) vê-se, com mais pormenor, as tabancas no triangulo
estrada para Gabú-estrada para Contuboel-estrada para Sonaco, mas neste mapa com várias tabancas não descobri Tabató.
Qual seria a razão de não ter sido cartografada neste mapa?

Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Valdemar:

É apenas,creio, um problema de escala... A Carta da Porvíncia da Guiné (1961) está na escala de 1:500.000


https://www.ensp.unl.pt/luis.graca/guine_guerracolonial10_mapageral.html

A carta de Bafatá (1955) pode constar mais pormenores (e portanto tabancas...) porque a escala é outra: 1: 50.000

https://www.ensp.unl.pt/luis.graca/guine_guerracolonial18_mapa_Bafata.html

Tabatô, na época (anos 50/60) era uma insignificante tabanca com "30 a 50 casas" casas (ou moranças), embora fosse antiga...

É um mistério: como é que aquelas sobreviveram durante este temnpo ? Dedicavam-se à música, viviam da música ?... Não deviam ser grandes agricultores, penso eu, e mesmo hoje dedicam-se sobretudo ao caju, que não dá grande trabalho, desde que haja mão de obra para o apanhar (mulheres e crianças...).

Apesar do filme "A batalha de Tabatô", do João Viana, esta tabanca nunca conheceu a guerra (colonial)... Nem sei se alguns dos seus jovens foram chamados para cumprir o serviço militar... Pelo menos, no nosso tenpo (CART 11, CCAÇ 12)...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Meu caro chefe Mutaro: o vosso texto em português pode ser melhorado... Todos ganhamos com isso... Afinal, em bom português nos entendemos... Já fiaz algumas melhorias sunstanciais no texto, mas memso escaparam alguns erros (incluindo de ortografia)...

Por exemplo, não se diz "disfrutar do filme"..."Disfrutar não existe, muito embroa seja usado, com frequência, pelos nossos craques da bola, quando vão à televisão...O Mutaro queria dizer "desfrutar o filme"... Mantenhas. Um abraço do Luís Graça,pai de um jovem médico (e músico) que esteve aí em 15/16 de dezembro de 2009...Há 12 anos!... Doze anos é muito tempo nas nossas vidas...

________________


desfrutar
desfrutar | v. tr.

des·fru·tar - Conjugar
(des- + fruto + -ar)
verbo transitivo
1. Ter os frutos ou rendimentos de.

2. Ter o gozo de. = USUFRUIR

3. Lograr.

4. Viver à custa de.

5. Fazer troça de (alguém, parecendo estar de boa-fé). = ZOMBAR

6. [Portugal: Beira, Trás-os-Montes] Desflorar mulher.


"desfrutar", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/desfrutar [consultado em 23-11-2021].

Valdemar Silva disse...

Luís, mesmo sendo por uma questão de escalas, se aparece a tabanca de Dando e de Brincasse nas duas cartas e a de Tabató apenas na de 1955, provavelmente teria havido alguma razão, p.ex.: as pessoas terem abandonado/ocupado por motivo de sazonalidade de colheitas, e mais tarde fixando-se. A dedicação à música e à construção de instrumentos musicais não sei como dar opinião.
Sabemos que aquela zona Contuboel-Sonaco, com as tabancas daquele triângulo com a estrada para Nova Lamego, nunca foi atacada, por, julgo, haver tabancas com tropa em toda a volta, não haver local de acampamento IN e ser longe a fronteira podendo ser intercetados.
Como sabes em Contuboel apareceram mancebos, uns nem tanto, fulas e alguns mandingas que a estes foi criado um pelotão separados, não sei se haveria alguém de Tabató ali tem perto.

Abraço e saúde com melhoras no ministro
Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Valdemar, vou-te mandar cópia desta tese de doutoramento,em antropologia social, e em que grande parte do "trabalho de campo" (observante participante, entrevistas, eyc.) foi feito em Lisboa e na Guiné-Bissau (com destaque para Tabatô, em 2010/2011. A autora é brasileira.


Título: Griots cosmopolitas : mobilidade e performance de artistas mandingas entre Lisboa e Guiné-Bissau
Autor: Höfs, Carolina Carret
Orientador: Sobral, José Manuel; Sarró, Ramon
Palavras-chave: Teses de doutoramento - 2014
Data de Defesa: 2014
Repositório da Universidade de Lisboa
https://repositorio.ul.pt/handle/10451/12136


Eis alguns excertos sobre Tabatô e a sua população e a sua história, com a devida vénia:

(...) está localizada a 12 km de Bafatá, na zona leste do país, e (...) é conhecida pela sua população ser maioritariamente de griots ["djidius"] , apesar de ser dividida em duas metades.

(...) A segunda metade é habitada pelos descendentes do régulo fula. Há ainda em Tabato uma família que é tida como de cativos, sendo o patriarca destes o homem mais velho da tabanka, mas que não tem a autoridade do patriarca de apelido griot.

(...) Embora considerada uma tabanca mandinga, Tabatô está sob o regulado de um homem fula, que mantém uma certa autoridade sobre os mandingas que ali vivem, como podemos ver na maneira como exerce a sua autoridade nas reuniões na mesquita, em que se fala fula, e nas reuniões sobre assuntos da tabanca, como foi a dos preparativos para o Festival de Cultura Tradicional do Balafon, realizado em Março de 2010 [e que deu grande visibilidade nacional e até internacional a Taabtô].

Naquela altura, era imprescindível o aval do régulo fula como também de um guia de visitas, que foi preparado para receber a comitiva vinda de Bissau. A casa do régulo antigo estava
entre os outros pontos de interesse, como o polón (a grande árvore em que está enterrado o patriarca), o mato sagrado, a casa-museu. (pág. 63)

(...) Tabato é uma pequena aldeia formada por uma moransa de descendentes do régulo fula
responsável pela vinda da família de Bundunka Djabaté para aquela zona do país. Estas casas foram construídas na primeira metade da aldeia, ao passo que os descendentes do griot mandinga ocupam a segunda metade das terras.

Estava-se nos fins do século XIX, quando Bundunka Djabaté chegou a Tabatô com as
suas esposas e os seus dois filhos, partindo de Kankan na Guiné-Conakry, a chamado de um
régulo fula cuja família, pouco a pouco, se foi espalhando por outras tabancas que pudessem nomear em língua fula, ao contrário do que se passou em Tabatô, uma das poucas localidades com nome mandinga que restaram depois da Guerra de Kansalá, quando o Império do Futa- Djalon se instalou onde antes estava o Reino do Gabu, última fronteira do Império do Mande (...).

Tabatô é uma referência também para griots de outras famílias na Guiné-Bissau, que
foram até lá para estudar com Ba Djabaté, e outros “grandes”, a arte do balafon e da djaliá.

Até ao fim dos anos 1970, os griots que ali estavam viviam quase exclusivamente da sua arte, o que ao longo do tempo se tornou insustentável pela própria conjuntura do país, obrigando muitas famílias a voltarem-se para a agricultura de exportação (e não apenas de subsistência, como acontecia até então), e entrando também nos grandes circuitos do êxodo rural e da migração internacional.

Em Março de 2010, aconteceu o Festival de Cultura Tradicional do Balafon.(...) (pág. 214)

(...) Mutar Djabaté é hoje o homem grande de Tabatô, descendente do fundador da tabanca e, como chefe de família, ele é papesinho (pai pequeno) das gerações mais jovens, razão pela qual lhe devem respeito e sempre lhe apresentam, a ele e ao Conselho da família, as suas vontades, projectos e ideias. (...) (pág. 75)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Em português de Portugal diz-se "Império do Mali"...


(...) O Império do Mali (Mandinga: Nyeni ou Niani. Ou também Manden Kurufaba ou historicamente Manden) foi um império pré-colonial africano, da época da Idade Média, existente entre 1235 e 1670, na região de Manden, nos atuais Mali, Serra Leoa, Senegal, Gâmbia, Guiné e sul do Saara Ocidental.

Este Império foi um dos mais poderosos da historia da humanidade, sendo uma das maiores potências da Idade Média, além de um dos mais ricos em ouro e pedras preciosas. O Império é considerado o mais rico de toda a historia africana. Foi fundado por Sundiata Queita, sendo o império mais poderoso do Saara Ocidental durante muitos anos, expandindo a língua mandinga, as leis e costumes de seu povo. (...)

https://pt.wikipedia.org/wiki/Imp%C3%A9rio_do_Mali

Tabanca Grande Luís Graça disse...

E importante a observação da antropóloga:

(...) Até ao fim dos anos 1970 [, ou seja, desde a administração portuguesa até ao fim do regime de Luís Cabral ], os griots [ leia-se "djidius", em crioulo ] que ali estavam [ em Tabatô] viviam quase exclusivamente da sua arte [, atuando em festas, casamentos, choros...] o que ao longo do tempo se tornou insustentável pela própria conjuntura do país, obrigando muitas famílias a voltarem-se para a agricultura de exportação [ ,caso do caju, em particular], (e não apenas de subsistência, como acontecia até então), e entrando também nos grandes circuitos do êxodo rural [, estabelecendo-se em Bissau, por exemplo]e da migração internacional[, países vizinhos, Lisboa, Paris, Londres...] (...)

Fernando Gouveia disse...

Luís, "jacatu" tem todo o aspeto de um tomate mas o gosto é completamente diferente. Não se come cru como o tomate mas tem que se cozinhar. Quando lá estive em 2010 comprei-o várias vezes no mercado de Bula para cozinharmos eu e o Chico Álen no empreendimento, meio abandonado, de Anura, onde estávamos.
Abraço.
Fernando Gouveia

Cherno Baldé disse...

Caros amigos,

Acho que a melodiosa musica “Afro-Mandinga” tomou conta da cena, de toda a plateia de admiradores e embriagou alguns analistas da actualidade da Senegambia no geral e da pequena Guiné-Bissau em particular de forma que muitos estao a ver a arvore, ignorando a floresta.

Para compreender as origens e existencia deTabató, deve-se antes de mais compreender a historia da localidade de Dandum (Dando) ou melhor da trajectoria do Alfa Molo Baldé o rei de Firdu ou Fuladu cuja historia de vida ja aqui foi evocado varias vezes.

O túmulo de que a Antropologa brasileira se refere é precisamente o de Alfa Molo, pai de Mussa Molo, ambos régulos de um dos ultimos reinos da Africa Ocidental em substituiçao do Império de Gabu na segunda metade do séc. XIX.

Os griots (musicos) profissionais mandingas da linhagem dos Djabaté, como era seu habito ao longo de séculos, teriam vindo da Guiné-Conakri (Kankan) ou convidados, como diz a narrativa, para trabalhar a sombra da nova dinastia Fula vencedora da guerra que tinha oposto a coligaçao das forças muçulmanas contra os animistas Soninqués do império de Gabu (e nao fulas contra mandingas como os portugueses a apelidaram no intuito de tirar proveitos de dividir para reinar).

E, Dandum no periodo entre a queda de Cansala (1867), o desaparecimento fisico de Alfa Molo (1881) e a fuga de Mussa Molo para a Gâmbia, para tentar escapar da tutela da França (1903), foi o centro e capital de toda a regiao sul do reino de Fuladu e, como tal atraia todos os tipos de artistas e musicos que viviam a sombra do poder instalado no momento, da mesma forma que o faziam no passado, durante a epopeia mandinga de Gabu do séc. XIII ao séc. XIX. Era a continuaçao da tradiçao que nao conhecia fronteiras tribais, nao se limitava na simples nomenclatura dos grupos étnicos, o mais importante sempre era: Quem detinha o poder no momento e como era possivel conseguir a sua graça e tutela e que eram merecedores de todos os louvores e a gloria dos vencedores.

Foi Dandum que deu origem a Tabato (se é que nao é a mesma localidade?) que, etimologicamente significa a sombra do Tabá, uma árvore gigantesca, frondosa e que, provavelmente só existirá nessa região, detentora de uma longa lista de crenças magicas e de mistica tradicionais entre os africanos da costa ocidental e que, para os grupos hoje muçulmanos, ocupa o mesmo lugar que os Poiloes na tradiçao dos povos animistas do litoral guineense e não só.

(Continua)

Anónimo disse...


(Continuaçao)

É o facto que explica, o chefe da tabanca, nao sendo mandinga nem musico (griot), ser o chefe tradicional da tabanca, pois que é a herança da familia ao longo dos anos desde a épica caminhada de Alfa Molo na conquista desse feudo mandinga, pondo a regiao a ferro e fogo, mesmo nas barbas dos portugueses, acoitados no pequeno presidio de Geba. O griot (musico) nao é detentor do poder nem da terra e as regras da tradiçao mandam que, tudo o que os griots fazem carecem da autorizaçao dos donos da terra, no caso os fulas. Todavia a modernidade e a conjuntura socio-politica e economica, esta a alterar a situaçao e as proximas geraçoes viverao num ambiente completamente diferente e, provavelmente mais liberal e de maior responsabilizaçao pessoal e colectiva numa comunidade onde ja nao havera a distinçao etnico-tribal.

No quadro das grandes transformaçoes que sofreu o territorio que, entretanto, passou para a administraçao portuguesa, no ultimo quartel do séc. XIX e, diga-se em abono da verdade, graças aos régulos fulas que queriam fugir ao dictat de Mussa Molo, pese o facto de isso nunca ser referido na historiografia portuguesa, preferindo dar os louros ao seu sobrinho, o mestiço Honorio P. Barreto. Na verdade, so o sector de Boé é, territorialmente, muito superior a cidade de Cacheu e arredores que, pretensamente ele teria comprado como se fosse comprar terras indigenas nos territorios da antiga Senegambia.

Caro Luis Graça, também desconheço os instrumentos designados por Neguelin, Mirantelen e Cutil. Em contrapartida o Dumdumtama é um instrumento Fula, uma espécie de tambor (dumdum) e que se toca dos dois lados com a ponta arredonda de pau curvode formato curvo.
As expressoes "dimbasumo" e “cambanicafó" sao derivadas do substantivo feminino “Dimba” ou seja mulher em idade fértil e “Cambani” quer dizer rapazes. Os sufixos “sumo” e “Cafo” quererao dizer grupos de idades, socialmente organizados para certas finalidades julgadas uteis para a comunidade.

Sobre “Jacatu” o Gouveia ja respondeu e bem, falta acrescentar que é tao amargo como a famosa cola, mas que é considerado um afrodisiaco que as mulheres gostam de oferecer aos esposos, “soit disant” para dar força e caracter masculino. Alguns acreditam e outros nao tanto.

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

Anónimo disse...

Sobre o comentario do Luis graça:

"Sei que Tabatô também tem bolanha, e deve por isso haver cultura do arroz...
Curiosa é esta mistura, não habitual, entre fulas, mandingas e jacancas... Ser "artista" e "agricultor" não deve ser fácil... Mas vê-se, pelas fotos mais recentes, que há moranças com cobertura de colmo, novo!..."

Tenho a dizer que:

1_A pratica da agricultura de subsisténcia é generalizada em todo o territorio da Guiné. No caso de mandingas e fulas ha uma divisao do trabalho que ordena que os homens trabalhem nas terras altas para o cultivo de diferentes tipos de milhos (preto, bacil etc.) e de produtos de renda (algodao, amendoim, gergelim entre outros) e as mulheres se dedicam ao cultivo do arroz nas terras baixas e alagadas (bolanhas). Mesmo entre os artistas de diferentes profissoes as suas mulheres sempre trabalham nos arrozais para suprir as necessidades da familia e suas proprias economias pessoais.

2_Na zona Leste o normal é, precisamente, a mistura que o Luis considera de "nao habitual entre fulas, mandingas e jacancas...". E ao contrario do que afirma a Antropologa brasileira, quase todas as localidades dignas deste nome ainda continuaml a ostentar o nome que tinha na época do dominio mandinga, e os exemplos sao inumeraveis, porquanto todos os toponimos que nao tenham o "Sintcha" ou Saré, sao toponimos mandingas. Alguns exemplos: Bafata-Contuba-Contuboel (versao fula)-Cambaju-Fajonquito-Canjadude-Paunca-jabicunda-Farim-Canjambari-Can-sissé-Tabajan-Tabassai-Sonaco-Tubandin-Berecolon-etc...etc. E na maior parte destas localidades, mandingas e fulas e outros grupos mais pequenos coexistem de forma pacifica ha séculos. E, sempre que houve problemas no passado recente, os culpados foram ou administradores do entao regime colonial ou dos nossos pseudo-politicos da actualidade, na procura de beneficios politicos como acontece um pouco por todos os paises de Africa.

Cordialmente,

Cherno Baldé