sábado, 24 de abril de 2010

Guiné 63/74 - P6244: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (14): Cap Figueiredo: Capiton Lelö dahdè ou capitão cabeça inclinada

1. Mensagem do Cherno Baldé

Data: 17 de Abril de 2010 01:36
Assunto: O Capitão Figueiredo em Fajonquito

Caro amigo Luis Graça,

A resposta a tua pergunta [, se conheço o Pepito,] é sim. A Guiné é um pais muito pequeno e, quase, tudo gira a volta da capital Bissau, uma cidade de menos de 500 mil almas. Eu devo ter conhecido o Sr. Eng. Pepito (*) desde finais dos anos 70, pois, para além de pertencer ao grupo dos primeiros quadros regressados a Guiné apos a independência, ele dirigiu o DEPA (departamento experiemental de produção de arroz) de Contuboel durante muito tempo. E, sendo eu de Fajonquito, fica tudo dito.

Mas, não é só isso, de 1999 a 2000, ele foi Ministro das obras públicas no Governo da unidade nacional (GUN), liderado por Francisco José Fadul. Nessa altura eu exercia a função de Director Executivo do fundo rodoviário nesse mesmo Ministério de modo que, como poderás deduzir, fazia parte do seu staff. Mas se fizeres esta mesma pergunta ao Eng. Pepito, certamente que a resposta sera NÃO. Nada mais lógico.Eu ainda tenho a sorte de pertencer ao grupo dos anónimos que, no contexto da Guiné, é um grande privilégio. Posso andar a pé na rua e saborear um sorvete sem escandalizar ninguém. 

No mês de Janeiro do corrente ano, estive em missão na região de Tombali, tendo passado por Guiledje a caminho de Bedanda. Vi e apreciei o trabalho que foi feito no antigo aquartelamento. Aconteceu alguns dias antes da sua inauguração pelo Presidente e o Primeiro Ministro, que acompanhei via rádio. Facto curioso, houve muitos discursos (as vezes contraditórios) mas do Eng. Pepito não ouvi nada.

Relativamente ao meu comentário sobre a tragédia de Fajonquito (**), como que para redimir-se do meu erro por ter chamado o Almeida de "nosso amigo" como se os outros o não fossem, o que não corresponde à verdade, quero hoje falar do saudoso Cap Figueiredo e dizer que foi para todos nós uma perda inestimável. 

O que vou dizer pode parecer paradoxal se não incongruente. O Sr. Carlos Borges de Figueiredo, ao contrário de muitos outros, foi um Capitão pacifista pois ele tinha-se distinguido, sobretudo, pela promoção da educação entre as criancas nativas (o número de alunos na escola local tinha aumentado significativamente facto que poderia estar ligado ao ambiente de paz criado e uma grande sensibilidade pelos problemas sociais da população) e organização de eventos sócio-culturais que, não só afastavam, por algumas horas,  o espectro da guerra e da morte entre a tropa mas eram também muito úteis e importantes na construção de relações de aproximação e de confiança com a populaçã local, tão prezada por General Spínola.

Foi nessa altura que, pela primeira vez, recebemos a visita de grupos musicais vindos da metrópole. Numa dessas visitas, lembro-me da presença de uma ou mais mulheres  cantavam o Fado. A música era muito morna, lenta demais para o nosso gosto temperado na ritmada, quase violenta dança de tambor mandinga. No meio de tudo isso, não nos escapou um detalhe importante. Notamos a deferençaa e o extremo respeito com que todos a(s) tratavam. O respeito dado àquela(s) mulher(res) contrastava de forma flagrante com a maneira como habitualmente lidavam com as nossas mulheres, fossem elas grandes ou pequenas. E não estou a referir-me, claro esta, à esposa do Capitão que, também, deve ter visitado Fajonquito.

Ele ficou conhecido no meio da populacao local com o nome de Capiton Lelö dahdè o que na lingua fula significa o Capitão cabeça inclinada. Talvez aqueles que o conheceram de perto me possam corrigir, parece que ele tinha o hábito de inclinar ligeiramente a cabeça para um dos lados, daí o nome com que o baptizaram e que fica para a historia.

Com muita amizade e saudades,

Cherno (Chico de fajonquito)

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Notas de L.G.:


Guiné 63/74 - P6243: O 6º aniversário do nosso blogue (29): Aqui vamos adquirindo conhecimentos sobre outras culturas e tradições (Filomena Sampaio)

1. Mensagem da nossa amiga tertuliana Filomena Sampaio com data de 22 de Abril de 2010 com a sua contribuição para a comemoração do 6.º aniversário do nosso Blogue:

Amigo Carlos,
Motivos não me faltam para deixar uma mensagem de parabéns pelo 6º aniversário do Blogue.

Como leitora do Blogue “Luís Graça & Camaradas da Guiné”, que leio quase diariamente, quero dar os parabéns ao comandante Luís Graça e aos seus co-editores, pelo sucesso deste distinto espaço de leitura e informação. Para além de ficarmos com uma ideia do que foi a vida dos Nossos Militares em Guerra no Ultramar, também vamos adquirindo conhecimento sobre outras culturas e tradições, algumas que nos levam a reflectir e a querer saber mais.

Frequento o Clube de “Cidadania é Cultura” e decidi levar para discussão do grupo o tema “Mutilação Genital Feminina”. Foi através deste Blogue que tomei conhecimento desta tradição, e com base no que li e pesquisei escrevi um texto e fiz uma apresentação em Power Point.
Foi interessante, levantou muitas questões.
Obrigada a todos.

O livro que li – “Pami Na Dondo, A Guerrilheira” que me foi oferecido pelo autor Mário Fitas, (ex-Furriel Miliciano Operações Especiais, Guiné 1965/1966), um homem de palavra sentida, com uma vivência fortemente marcada pela guerra geradora de brutalidade e simultaneamente de forte amizade entre camaradas.

Esta obra varia entre a ficção e a realidade, somos transportados desde a vivência dos militantes do P.A.I.G.C. (Partido Africano para a Independência da Guiné e de Cabo Verde) até à acção e forma de viver dos soldados que compõem a companhia, uma Unidade do Exército Português, onde o autor esteve integrado, numa comissão de serviço militar na Guiné.
Nesta obra, o autor retrata a vida duma jovem guerreira que luta pela Independência do seu país, a Guiné.

É uma história interessante, pois relata a vida de Pami em várias fases, fazendo referência entre muitos outros aspectos, ao facto de Pami não ter sido sujeita à mutilação genital feminina, o que na comunidade guineense muçulmana à qual pertencia, era prática tradicional.
Conta a maneira como Pami se transformou numa guerrilheira do P.A.I.G.C. que para ela seguia a prossecução dos objectivos que ela também visava.

Alistada nas hostes da guerrilha, sofre um acidente que lhe incapacita um dos braços e acaba professora do P.A.I.G.C., devido à sua formação escolar, (quarta classe de alfabetização) e pelo facto de falar correctamente o português.
Muito do que sabe, aprendeu sozinha lendo e interpretando um dicionário que um padre lhe ofereceu.

É na escola que ela mentaliza e doutrina os futuros guerrilheiros.
Numa emboscada das N.T. (Nossas Tropas), à tabanca (povoação) Pami e outros guerrilheiros são feitos prisioneiros, são interrogados pelas N.T., uns são mortos outros são libertados, mas Pami, continua prisioneira das N.T. pois não conta a verdade sobre a sua condição, afirma que só responde em balanta, (dialecto da tribo com o mesmo nome, uma etnia muçulmana existentes na Guiné), fazendo-se ignorante a qualquer outra língua.

Pami fica retida no Interior do Aquartelamento, é vigiada e interrogada várias vezes, mas não confessa a sua condição de guerrilheira.
Quando é descoberta, pensa que o comandante das N.T., a vai matar da mesma forma que matou os seus companheiros de luta, mas contrariamente ao que aconteceu com os seus companheiros, foi libertada e deixada livre para seguir o seu caminho.

Não sendo a mutilação genital feminina o tema de maior relevo na história contada neste livro, despertou-me uma certa curiosidade e talvez pelo facto de ser mulher me tenha levado a pesquisar sobre o assunto.

O que li não é de forma alguma agradável, muito pelo contrário.

A mutilação genital feminina praticada em certas partes da África, na Península Arábica e em zonas da Ásia, tem uma origem de ordem cultural.

É rejeitada pela civilização ocidental, considerada um dos grandes horrores do continente africano que pensa que a forma de mudar esta mentalidade é educar as mulheres mais velhas que perpetuam este costume, bem como os homens mostrando os danos físicos e psicológicos causados nas meninas que têm de se sujeitar a esta prática.

Não fundamentada religiosamente, acredita-se que esta prática seja muçulmana e que a mutilação genital feminina está certa. Os pais, mais propriamente a mãe e a avó têm voto na matéria, eles acreditam que se a jovem não for "cortada" nunca irá arranjar um marido, isso é a pior coisa que pode acontecer a uma jovem. Se a jovem se sujeitar à MGF (Mutilação Genital Feminina) é uma condição prévia do casamento. Se uma mulher não for mutilada pensa-se que ela não é pura sendo vista como prostituta e excluída da sua própria sociedade.

Algumas razões apontadas para a realização da MGF são assegurar a castidade da mulher, a preservação da virgindade até ao casamento e a fertilidade da mulher. Por razões de higiene, estéticas ou de saúde, também se pensa que uma mulher não circuncidada não será capaz de dar à luz, ou que o contacto com o clítoris é fatal ao bebe.

A mutilação genital feminina elimina o prazer sexual. A sua prática está cercada de silêncios e é vivida em segredo, acarreta sérios riscos de saúde para a mulher, é muito dolorosa, por vezes de forma permanente, causa danos físicos e psicológicos irreversíveis sendo responsável pela morte de muitas meninas.

A remoção do órgão genital pode ser feito com instrumentos de corte impróprios (faca, caco de vidro ou navalha) não esterilizados e raramente com anestesia.

Um dos motivos para a continuidade deste ritual é a fonte de rendimento para os que a realizam. Mesmo para os médicos que a realizam em algumas clínicas, na tentativa de evitar que as meninas sofram os riscos e traumas resultantes de ablações anti-higiénicas e sem anestesia.

Normalmente é o pai que paga a “cirurgia”, para poder casar as filhas com homens que não aceitam mulheres não circuncidadas.

Têm-se promulgado leis para ilegalizar e criminalizar este costume. Embora muitos códigos penais não mencionem directamente os termos Circuncisão Feminina ou Mutilação Genital Feminina, é perfeitamente enquadrado como uma forma de "abuso grave de criança e de lesão corporal qualificada".

Vários organismos internacionais, como a Organização Mundial da Saúde (OMS), tem envidado esforços para desencorajar a prática da mutilação genital feminina. A ''Convenção sobre os Direitos da Criança'', assinada em Setembro de 1990, considera-a um acto de tortura e abuso sexual.

Em 2003 o Comité Inter-Africano de Práticas Tradicionais que Afectam Mulheres e Crianças, uma rede não-governamental, já levou à adopção de legislação contra as excisões em alguns países, iniciativa patrocinada pela ONU.


Reflexão:

Reconheço que em algumas situações devem ser mantidos os usos, costumes e tradições. Não se deve pôr em causa os valores nem as tradições dos povos. São símbolos de identidade, dentro ou fora do país. No entanto, considero que manter a tradição duma prática que causa um enorme sofrimento, é um atentado à saúde das mulheres e jovens, que as leva frequentemente à morte. É um desrespeito inaceitável pelos direitos humano.

Todos os países deviam adoptar uma legislação contra a mutilação genital.

Bibliografia:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Mutilação
http://www.acidi.gov.pt
Blogue de: Luís Graça & Camaradas da Guiné (marcadores: Mutilação Genital)

Filomena







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Nota de CV:

Vd. poste de 24 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6242: O 6º aniversário do nosso blogue (28): O meu bem haja com o vozeirão maior que se possa conceber (Manuel Maia)

Guiné 63/74 - P6242: O 6º aniversário do nosso blogue (28): O meu bem haja com o vozeirão maior que se possa conceber (Manuel Maia)

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Maia* (ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74), enviada hoje mesmo ao nosso Blogue:

Camaradas
Sendo impossível deixar de cair em lugares comuns quando se pretende expressar o nosso regozijo e especialmente agradecimento, ao comandante e seus "cabos d`ordens", limitar-me-ei a dar o meu bem haja com o vozeirão maior que se possa conceber .

Hoje é também dia de aniversário de um irmão meu e por isso mesmo tenho estado noutras guerras...

Se a capacidade criativa do Luís é por demais conhecida e merecedora dos maiores encómios, a quem saúdo daqui com um abraço forte de parabéns pela ideia e pela máquina tão bem oleada que gerou, os mosqueteiros de que se fez acompanhar, têm, eles também, uma enorme responsabilidade, nesta coisa fantástica de falarmos, tu cá tu lá, evidenciando um espírito de abertura extremamente saudável e sobretudo prenhe de amizade, pese embora o surgimento aqui ou ali de pequenos atritos motivados pela poeira que uma vez por outra se cola à engrenagem...

Esta vivência que já vai no sexto ano de existência, ( "malheureusement" só a descobri o ano passado...) será provavelmente, um "caso sério" a este nível, quer pela quantidade de "atabancados" quer ainda pelos posts e comentários em número verdadeiramente estrondoso...

Estou certo que cimentado que está, já só tem um caminho a seguir... crescer, crescer exponencialmente por forma a transformar as quatro centenas de "escribas" que somos em meio milhar já neste 2010, e ir por aí fora...

Amigo, avisa amigo, amigo traz outro amigo...

Parabéns, uma vez mais, ao Luís, e "sus muchachos", mas também a todos os que com as suas histórias vão enriquecendo e solidificando esta amizade que tem como base de sustentação, a vivência naquela terra que amamos mau grado os sacrificios lá passados...

Abraço a todos os tabanqueiros
Manuel Maia
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 10 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5798: Agenda cultural (57): Apresentação da História de Portugal Em Sextilhas, dia 26 de Fevereiro em Moreira da Maia (Manuel Maia)

Vd. último poste da série de 24 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6240: O 6º aniversário do nosso blogue (27): Parabéns

Guiné 63/74 - P6241: Tabanca Grande (215): Luís F. Camolas, Sold Mec Auto da CCS do BART 733 - Bissau/Farim -, 1964/66

1. No poste P6186 havíamos publicado um apelo do nosso Camarada Luis F. Camolas, Sold Mec Auto da CCS do BART 733 - Bissau/Farim, 1964/66, à procura de notícias dos seus Camaradas da Companhia.

Convidamos então o Camolas a aderir à tertúlia tabanquense, solicitando-lhe as fotos e o texto da praxe. Recebemos de imediato a sua resposta afirmativa, em 19 de Abril de 2010, e assim passamos apresentá-lo:




Camaradas,
Sou o Luís F. Camolas, fui Soldado Mecânico Auto da CCS do Batalhão de Artilharia 733 - Bissau/Farim, 1964/66.

Vivo em Setúbal, trabalhei como engenheiro nos EUA, 43 anos, e encontro-me actualmente na situação de reforma.

Terão de desculpar o meu Português, pois estive ausente muito tempo e esqueci muito o nosso vocabulário.
No entanto farei o possível para reaprender a comunicar na nossa língua, em especial com a boa causa, a de tentar reencontrar os amigos e camaradas dos tempos antigos, quando nas Forcas Armadas, particularmente os da Guiné.
Saudades, muitas!
Fiquei feliz de saber que existe esta organização, para assim poder reviver os momentos, bons e maus, com os amigos e camaradas, dos quais não mais soube mais nada deles.

Parti para a Guiné em 08OUT1964, com o posto militar mais baixo possível - soldado raso Nº 625, mas como dizia o nosso Comandante Glória Alves: "Um bom Soldado é o que tem castigos e louvores, etc."
Foi assim, não quis ter responsabilidades e fui sempre feliz como Soldado Raso.
A minha Companhia, a CCS, foi destacada para Farim, e sempre ficamos lá, até ao fim da comissão.
A minha especialidade era mecânico de manutenção de viaturas e do que fosse preciso.
Também tive algumas saídas nas colunas e outras rotinas habituais numa CCS.

Seria um grande prazer poder reencontrar alguns camaradas e muito amigos, dos quais somente lembro alguns nomes, como os 1º Cabos 689 - José Fernando Moço, 597 Fernando Rodrigues Duarte, 596 Aníbal Pereira Santos, 518 Carlos Araújo (Setúbal), Fur Mil Fernando Gonçalves Carvalho de Oliveira, José Jorge Macedo e… enfim uma lista imensa.

Estou deveras ansioso por participar no almoço do batalhão, dia 15 de Maio, juntamente com a minha esposa.

Vou encontrar alguns camaradas e já sei que vai ser super emocionante.

Já recebi por correio o convite enviado pelo António José, com quem vou entrar em contacto no próximo domingo.

Aproveito para repetir o meu apelo de desejo de encontrar Camaradas e Amigos da minha CCS, que podem contactar-me para:
Telemóvel: 912641039
Telefone: 265 404 143

Além das fotos que agora envio, tenho outras, que enviarei oportunamente.

Um abraco,
Luís Camolas
Sold Mec Auto da CCS do BART 733
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Nota de MR:

Vd. último poste da série em:

19 de Abril de 2010 >
Guiné 63/74 - P6189: Tabanca Grande (214): Sílvio Fagundes de Abrantes, de alcunha o Hoss, CCP 121 / BCP 12, 1970

Guiné 63/74 - P6240: O 6º aniversário do nosso blogue (27): Parabéns

Neste poste vamos publicar algumas curtas mensagens enviadas por Camaradas nossos, a propósito do 6º Aniversário do blogue:

1. Mensagem do Carlos Coutinho:

Então 6 anos - Bué de mata-bicho!

6 anos é mesmo bué de mata-bicho.
De alguém das sanzalas p’rá malta das tabancas um grande MOIO, MUATAS.
Que o ZAMBI vos continue a dar saúde e inspiração para continuar até ao Zaire.
A votre santé.
CC

2. Mensagem do Mário Fitas:

Guião da CCAÇ 763

Que o 6º aniversário seja apenas uma etapa de uma longa caminhada desejada como o tamanho do Cumbijã!
Guião CCAÇ 763
"OS LASSAS" de CUFAR

3. Mensagem do Pedro Neves:

6º Aniversário da Tabanca Grande

Caros Editores da Tabanca Grande, Luís Graça, Carlos Vinhal, Virgínio Briote e Magalhães Ribeiro;

Bom dia, Caros Camaradas e Amigos (Camarigos).

Passa um dia do aniversário do Blogue, mas mesmo assim (e vale mais tarde que nunca), gostaria de vos agradecer, as horas que me proporcionam, com a leitura dos postes e comentários aos mesmos, só possível graças à iniciativa do Luís Graça e "sus muchachos", (com a devida vénia) e sem esquecer o "mecenas" Humberto Reis, que deram origem a este fenómeno de adesão, desde o Soldado ao General (ao tempo, porque no Blogue não existem patentes) e que dá pelo nome de "blogueforanadaevaotres".

Em meu nome e estou convencido que dos restantes Tertulianos, os meus Parabéns pelo Aniversário do Blogue e que para o ano possamos todos, estar a festejar o 7º aniversário.

Com um GRANDE a todos e até ao dia 26-06-10, em Monte Real, sou:

Pedro Neves
Ex-Furriel Mil. Op. Especiais
C.Caç. 4745 - Águias de Binta
Guiné 73/74

4. Mensagem do Amílcar Ventura:
PARABÉNS,
Quero dar os parabéns ao blogue e em especial ao Luís Graça, por ter criado este ponto de encontro.
Claro que também apresento os meus parabéns aos Editores que nos aturam com os nossos e-mails.
Quero dizer que tenho pena de não ter descoberto este espaço de amizade mais cedo, pois permitiu que a minha vida desse uma volta de cento e oitenta graus.
Desde que entrei em contacto com o blogue:
- Fui obrigado a aprender a mexer num computador (foi fácil porque tenho um especialista em casa);
- E me apresentei à tabanca tenho feito grandes amigos e, engraçado, não conheço nenhum pessoalmente, a não ser alguns pelas fotos e por vários e-mails que tenho trocado todos os dias com eles.
Vejo nas suas palavras que são de grande sinceridade e pura amizade.
Quero aqui, pessoalmente, agradecer a todos eles.
Alguns houve em que a minha primeira avaliação foi negativa, talvez pela minha ajuda, em tempos, ao PAIGC e a diversos comentários proferidos por outros.
Logo percebi que as opiniões dos outros, mesmo não nos agradando, têm que ser respeitadas, para que as minhas o possam ser também.
Tudo passou e hoje nutro uma grande amizade por todos eles, pois trocamos e-mails quase todos os dias, alguns com pps que até servem para me levantar o moral quando estou em baixo.
E é tudo!
Mais uma vez quero agradecer ao Luís Graça pela criação deste blogue, e aos seus co-Editores.
Parabéns para todos vocês.
Um abraço do tamanho da Guiné para toda a Tabanca Grande!

5. Mensagem do Carlos Marques Santos:

6º Aniversário
Vinhal:
Não queria deixar de parte esta data de 23 de Abril, por isso através de ti, insuspeito amigo, um ABRAÇO para toda a TERTÚLIA.
Tenho andado às voltas com o convívio da minha CART.
Já falta menos de um mês!!!!!!!!!
Até breve,
CMSantos
Fá Mandinga/ Mansambo 68-69
CART 2339
6. Mensagem do Rogério Cardoso
6º ANIVERSÁRIO DA TABANCA GRANDE
Amigos,
Só há 5 meses conheci o blogue e que pena eu andar de cabeça no ar estes anos passados.
Não tenho desculpa, por ser dos mais velhos camaradas de armas, mas nunca é tarde para receber ou transmitir a amizade que nos une, mesmo sem haver conhecimento directo em alguns casos.
Estou feliz, neste curto espaço de tempo voltei à Guiné.
Obrigado Luis Graça, Carlos Vinhal e restante companhia, desejo muitos e muitos anos de vida para todos.
Rogério Cardoso
Fur Mil
CART 643 / BART 645 "Aguias Negras"
Mansoa, Bissorã, Mansabá
1964/1965
7. Mensagem José Nunes:

Comandante Graça,
A Engenharia apresenta os parabéns pelo Aniversário da Tabanca, e já sabem sempre disponíveis prás engenhocas e dar-vos luz onde e sempre que seja necessário.
Foi bom ter encontrado por acaso este espaço de fraterna e sã camaradagem,
Todos os dias por aqui dou as minhas voltas, lendo e relendo os textos dos camaradas operacionais que verteram sangue, suor e lágrimas pelas bolanhas e picadas da Guiné. Apesar de estar grande parte da Comissão em Bissau, no tempo em que fiz assistências ao mato, aprendi a respeitar e a ter admiração por aquela "malta". Eu tive mais sorte.
Grato para sempre.
Aos Camaradas Editores vai também o meu agradecimento.
José Nunes
1º Cabo Mec Elect Centrais do BENG 447
Brá-68/70

8. Mensagem do Torcato Mendonça:

Caros Editores e Camaradas,

Dizem-me ser o sexto aniversário do Blogue, Luís Graça e Camaradas da Guiné, e eu folgo com isso. Mas questiono-me o que é o blogue? Quem faz anos?
O blogue de sexto aniversário é o do Luís.
Então faz ele anos e mando-lhe um abraço e uns eteceteras; se o blogue é este espaço, espaço com quatro centenas de pessoas, milhares de escritos onde, porque fica gravado, vêm ler e saber de assuntos ou novas centenas de milhar de visitantes.
Ainda por este espaço ser global e as gentes, quer as que a ele pertencem quer as que o visitam, espalham-se mundo fora. Espaço de afectos, espaço de discussão plural, espaço de controvérsia ou só espaço de terapia colectiva de uns quantos.
Ou todos?
Penso que é isso tudo. Mais, penso ser um espaço a contribuir para o tratamento futuro da nossa memória colectiva. Da memória de outros Povos que connosco conviveram por séculos.
Os de bilege? Também porque só prova a necessidade de nos conhecermos melhor como Povo.
Trabalho para historiadores, não para cronistas do reino...

Mas então para quem são os parabéns? Eu escrevi uma ou outra vez, comentei aqui e acolá... e vou dar parabéns a mim? Eu, além disso só para aqui vim em Maio de 2006 e fiquei.

Penso que os parabéns são para o fundador, para os editores, para todos os que pertencem e se identificam e acreditam na validade deste projecto.

Mas, se me o permitem envio os meus PARABÉNS e os meus agradecimentos aos Editores pelo excelente trabalho. São muitas horas roubadas sabe-se lá a quê e a quem...

Meus Camaradas Amigos para vocês o meu bem haja e, através de vós felicito toda esta Tertúlia de homens e mulheres de cá, do nosso País, ou da Guiné e os da Diáspora mundo fora como é sina nossa... partilhando o Mundo... não dando novos... já lá estava...
Abraços
TM
9. Mensagem do José Martins:
Camaradas,
Não foi há 6 anos, porque ainda não conhecia o blogue.
Mas há cerca de 5 anos, descobri-o por acaso, e tratando do tema que me é mais caro da Guiné: o desastre do Cheche.
Nessa altura trabalhava já na história dos GATOS PRETOS, tentando fazer a catarse. Inflecti um pouco o rumo e aderi à tertúlia, hoje Tabanca Grande. Não me dei mal.
Criaram-se novos laços (é preciso criar laços - Saint Exupéry) e foi possível manter dois caminhos, concorrentes mas não incompatíveis: manter a busca sobre a companhia e aumentar os conhecimentos sobre a Guiné e, sobretudo partilhá-los.
Afinal, parece, que a prenda do aniversário foi para mim: já aconteceu o encontro dos Gatos Pretos e, como já referi noutro local, todos "miavam de saudades".
Foi uma festa bonita! A nossa, a da Tabanca, também vai ser bonita. Onde há amizade, há beleza.
Bem hajam aqueles que começaram e os outros que se lhe juntaram.
José Martins
___________
Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
23 de Abril de 2010 >
Guiné 63/74 - P6231: O 6º aniversário do nosso blogue (26): Parabéns Luís Graça por este Espaço de Memória Futura (Luís Faria)

Guiné 63/74 - P6239: Banco do Afecto contra a Solidão (8): Victor Tavares internado nos HUC, Coimbra, para uma delicada operação à coluna (Sílvio Abrantes / Paulo Santiago)

1.  Do nosso camarada Sílvio Fagundes de Abrantes (noutra, incarnação,o Hoss, Sold Enf Pára, CCP 121 / BCÇP 12, BA 12, Bissalanca, 1969/71), recebemos a seguinte mensagem (cujo teor também me foi confirmado pelo Paulo Santiago):


Data: 23 de Abril de 2010 20:29
Assunto: Vitor Tavares


Acabei de receber uma mensagem por telemóvel do nosso amigo Victor Tavares quer diz o seguinte:

Dei hoje entrada nos Hospitais da Universidade de Coimbra, serviço de neurocirurgia, para uma operação à coluna. Cama 32. Já estou a fazer os exames necessários. Se tudo correr bem vou ser operado na segunda-feira
dia 26.

Vamos todos torcer para que corra tudo bem ao nosso amigo Victor. Que Deus esteja contigo, amigo Victor neste momento tão difícil e que recuperes rapidamente.

Um abraço, Hoss

2. Comentário de L.G.:

Grande Victor: Fiquei triste por saber que estás a passar um mau bocado, nomeadamente na sequência dos teus problemas de coluna que muito provavelmente já vêm da Guiné...  Já pagaste a tua dívida à Pátria, é altura de, no Serviço Nacional de Saúde, nos Hospitais da Universidade de Coimbra, te tratarem à altura, como cidadão e  grande português que foste e continuas a ser. Ficamos todos a torcer por ti. Acreditamos nas tuas rápidas melhoras. 410 Alfas Bravos para ti (com muito jeitinho, que é para não dar cabo do resto da tua pobre coluna). Luís Graça & Camaradas da Guiné.

Guiné 63/74 – P6238: Efemérides (44): Dia do Combatente. Comemorações do 9 de Abril em Lagoa (Arménio Estorninho)

1. O nosso Camarada Arménio Estorninho* (ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, CCAÇ 2381, Ingoré, Aldeia Formosa, Buba e Empada, 1968/70), enviou-nos a seguinte mensagem, com data de 15 de Abril de 2010:

Dia do Combatente
Comemorações do 9 de Abril em Lagoa
Camaradas,

Desta feita trata-se de vos dar notícias do Núcleo de Lagoa/Portimão, da Liga do Combatentes, que assinalou mais uma passagem do 9 de Abril.
As cerimónias foram levadas a efeito frente ao Memorial erigido à Memória dos Camaradas falecidos na Guerra do Ultramar e oriundos do Concelho de Lagoa.

Por conseguinte foi dada uma imagem, tanto quanto possível, das comemorações do dia do Combatente e concretizado pelo Núcleo de Lagoa/Portimão:

Lagoa > Algarve > 09ABR2010 > Memorial aos Combatentes falecidos na Guerra do Ultramar

A comemoração teve a presença das entidades Civis e Militares, a seguir indicadas:

- Em representação do Presidente da Câmara Municipal de Lagoa esteve o Vereador Senhor Jaime Botelho;

- O Chefe de Gabinete do Presidente da Câmara, Dr. Joaquim José Cabrita;

- Capitão da GNR, (Aposentado) Domingos Garcia;

- Capitão da Força Aérea – TOCC, (Aposentado) Domingos Ramos;

- Capitão do Exército, (Aposentado) Paulo Neto.

Lagoa > Algarve > 09ABR2010 > As Entidades Oficiais nas Comemorações do dia do Combatente.

O Presidente do Núcleo, Cap. Paulo Neto, e perante a assistência dirigiu uma palestra dedicada ao combatente português.

Agradecendo e saudando a presença de todos, lembrando que a origem da data de 9 de Abril, refere-se a La Lys, na Flandres, a Norte de França e que houve a participação portuguesa na Primeira Guerra Mundial.

Lagoa > Algarve > 09ABR2010 > Chefe de Gabinete do Presidente da C.M. Lagoa, Dr. Joaquim José Cabrita, Vereador da AML, Senhor Francisco Ramos, Senhores Reis e Luís Tito, Soldados prisioneiros na Índia e Capitão da FA – TOCC Aposentado, Domingos Ramos.

Tendo o exército Alemão com oito divisões, pelas primeiras horas do dia efectuado forte bombardeamento centrado contra as N/T e bem como o lançamento de gases.

Que ao fim de cerca de seis horas lançaram vagas de assalto sobre as tropas aliadas, que não conseguiram resistir e num só dia levando as Tropas Portuguesas a mais de sete mil homens mortos, feridos, desaparecidos e prisioneiros.

Contudo salientou a história do Soldado “O Milhões,”quando apercebeu-se que estava sozinho nas trincheiras, porque os seus Camaradas tinham-se retirado para posições mais recuadas, descarregou por várias vezes a sua metralhadora e enfrentando heroicamente o inimigo.

Sendo a maior Batalha que os Portugueses tiveram envolvidos.

Lagoa > Algarve > 09ABR2010 > o Presidente do Núcleo e Palestrante, Capitão Aposentado, Paulo Neto. Da esq. ex – Fur. José Júlio Nascimento, da Cart. 2520, Xime e Quinhamel, ex- Fur. Silva Nunes, da C.cav 2539, São Domingos, Representante do Presidente da C.M.L, Porta-bandeira Sargento da GNR Deodato Pais (Combatente em Angola) e o Fuzileiro Jacinto Guerreiro (Combatente em Angola e Moçambique), Capitão da GNR Aposentado, Domingues Garcia e o último (não identificado).

Prosseguindo nos seus considerandos disse, que nós estamos na Liga dos Combatentes da Guerra do Ultramar de 61/74, e, aqui reunidos pela nossa memória colectiva, porque ao tempo defendemos o que era considerado nosso e cumprindo o que nos era exigido.

Lagoa > Algarve > 09ABR2010 > Luís Tito, Capitão Aposentado Domingos Ramos, eu tomando anotações, ex-Fur Silva Nunes e em zona posterior o Soldado Miguel Silva, da CCS do Bcaç 1894, Ingoré 69/71.


Pelo representante do Presidente da Câmara Municipal de Lagoa, o Vereador Sr. Jaime Botelho e o Presidente do Núcleo, Capitão Paulo Neto, foram colocadas duas coroas de flores no Memorial aos Combatentes.

Por um grupo da Fanfarra do Bombeiros de Portimão foi tocado a sentido, deu-se um minuto de silêncio em memória dos mortos e seguiu-se o toque a finados.

Lagoa > Algarve > 09ABR2010 > Colocação de coroas de flores no Memorial, pelo Representante do Presidente da C.M. de Lagoa e do Presidente do Núcleo.

Lagoa > Algarve > 09ABR2010 > Placa do Memorial e com nomes de militares falecidos na Guerra do Ultramar.

Lagoa > Algarve > 09ABR2010 > Placa do Memorial, com indicação de nomes dos militares falecidos no Ultramar.


Seguiu-se a romagem ao cemitério de Lagoa, com colocação de flores nas campas dos militares falecidos na Guerra do Ultramar e que eram oriundos desta Paróquia.

Por conseguinte foi dada uma imagem de tanto quanto possível, das comemorações do dia do Combatente e levado a efeito pelo Núcleo de Lagoa/Portimão.

Com os melhores cumprimentos deste Maioral,
Arménio Estorninho
1º Cabo Mec Auto Rodas da CCAÇ 2381

Fotos: © Arménio Estorninho (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

4 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5768: Efemérides (43): 4 de Fevereiro de 1961, O princípio da Guerra Colonial (José Marques Ferreira)

Guiné 63/74 - P6237: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (18): Estados de alma, aerograma de 20 de Abril de 1971

1. Mensagem de José Câmara (ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Guiné, 1971/73), com data de 15 de Abril de 2010:

Caro e amigo Carlos,
Junto encontrarás mais um pedacinho da minha história por terras da Guiné. Neste caso nem tive que rebuscar na memória; limitei-me a transcrever o aerograma que então mandei à minha madrinha de guerra.

Para este bate-estradas foi a sua última missão, e vai regressar ao baú das recordações de minha esposa.

Muita saúde para ti e para todos os nossos camaradas, com um abraço imenso do
José Câmara


Memórias e histórias minhas (18)

Estados de alma


Caros camaradas
Numa das trocas de correspondência que tive com o Carlos Vinhal, este ofereceu-me a possibilidade de abrir uma página para a correspondência que mantive com a minha madrinha de guerra. Declinei o convite, por me parecer que isso não traria nada de novo. Fui sempre muito comedido na minha correspondência, e nunca esqueci que me dirigia a uma jovem com apenas 16 anos de idade.

Estados de Alma é um exemplo do que escrevia e como escrevia. Caso raro, o aerograma que transcrevo é todo dedicado à Guiné. Para além disso, refiro um acontecimento da CCaç 3327 na Mata dos Madeiros. A primeira Missa que lá tivemos aconteceu no dia 17 de Abril de 1971. Para muitos de nós também era a primeira desde que deixáramos Santa Margarida em Janeiro desse ano. Para a religiosidade do soldado açoriano, e não só, esse acto de fé constituíu um dia de festa.


Aerograma de 20 de Abril de 1971

"Isabel,
Noite cálida e serena; convidativa ao devaneio do espírito e à conversa amena e sadia.

É, sem dúvida, uma excelente noite para escrever, e para me inteirar da tua saúde, o melhor dom que podemos ter, e que espero seja tua assídua companheira.

Isto por aqui vai óptimo, melhor mesmo do que aquilo que esperávamos. Para além do trabalho que é muito, diga-se de passagem, aqui sempre temos outra liberdade; claro que essa liberdade não é em todos os sentidos, mas estamos à vontade para comer, dormir, trabalhar e ainda temos tempo para pensar e sonhar. O que não há são notícias fresquinhas. E, sinceramente, é melhor não haver.

Nesta mata, vil e cruel assasssina, em que cada árvore pode esconder um turra e cada trilho mil e uma minas, quase tudo nos tem corrido da melhor forma. Não sabemos o que são as adversidades do tiroteio. Até já estamos admirados. Imploramos a Deus que possamos continuar admirados por muito tempo.




Por falar em Deus, não sei se algum dia te disse que os soldados da minha companhia tinham comprado uma imagem do Sagrado Coração de Maria... e, no último Sábado, tivemos a nossa primeira missa no mato.

Fizemos uma capelinha com folhas de palmeira; o altar, feito à pressa, era de caixas de cerveja. Os crentes vestiram a fatiota de gala: botas de lona, camuflado e espingarda às costas para o que desse e viesse.

Foi uma missa com um sabor especial... diferente... de muita fé, em todos os sentidos. Foi, por assim dizer, a inauguração da nossa Igreja... a Missa Nova do nosso muito amado Sagrado Coração de Maria

Foi um recordar de outros tempos, mas com a alegria própria de quem é jovem e sabe sê-lo.


Acampamento e localização da capela (seta amarela). Como nota a salientar, a cuidada vedação à volta da capela

E é tudo. Cumprimentos...".


A imagem do Sagrado Coração de Maria acompanhou sempre a CCaç 3327. Sem o poder confirmar, foi-me dito que a imagem está depositada na Igreja de São João Baptista, fazendo companhia a muitas outras imagens que acompanharam as companhias açorianas do BII17.

A majestosa Igreja de São João Baptista está ao centro do castelo que ostenta o mesmo nome, e que ao tempo era a sede do BII17, na cidade de Angra do Heroísmo, Ilha Terceira.

José Câmara
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 7 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6127: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (17): Quem marca o destino é Deus

Guiné 63/74 - P6236: História da CCAÇ 2679 (35): De estórias se faz a história de uma Companhia (José Manuel M. Dinis)

1. Mensagem de José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 3 de Abril de 2010:

Meu Caro Amigo,
Também de estórias se faz a história de uma Companhia. Por isso, hoje, vão duas narrativas, mais uma, que são duas aglutinadas. São só três, mas podiam ser quatro. Isto até parece táctica para confundir o IN, mas não é.

Outra coisa: até recentemente, a exposição dos "posts" era mais duradoura. Provavelmente haverá boas razões para a alteração que se regista. Parece-me, no entanto, que o blogue não fica a ganhar.

Carlos, para ti e para o Tabancal, vai um grande abraço.
JD


HISTÓRIA DA CCAÇ 2679 (35)

De estórias se faz a história de uma Companhia

Estória n.º 1 (incompleta)


Seriam duas da manhã, quando acordei, surpreso, com o grito do Tito a simular alguma aflição: "Zé, acorda!".

Havia luz, uma luz amarelada, sumida, garantida pelo ronronar do gerador que, naquela ocasião, providenciava a iluminação periférica ao arame farpado, limite da aldeia e aquartelamento, não fossem os turras cortar o arame na escuridão da noite, e surpreender-nos. Ora, havendo iluminação no exterior, também havia no interior.
A pálida luz revelou-me o Zé Tito, com o riso suspenso do bigode, à Eroll Flynn, com ar de velhaco, enquanto estendia na minha direcção uma garrafa de qualquer "mustela", argumento suficiente para que eu não me chateasse com o importuno, estremunhar e ordenava: "bebe um bocado, bate-te à hepatite!".

Durante a comissão nós dois fomos sempre clientes dos quartos, nunca dormimos em abrigos, debaixo da terra, lugares onde os odores sudoríferos combinavam com ventosidades expelidas pelos ânus, vulgarmente conhecidas por peidos e bufas, conforme se manifestavam ruidosamente, ou pela calada, e ainda outros cheiros, como restos de comida e o conhecido cheiro da terra, principalmente enquanto húmida, contribuindo no conjunto para ambientes de nausea. Por isso, quais pi-pis da linha, arranjámos sempre pretexto para dormir nos quartos, lugares muito mais arejados, e com um mínimo de densidade populacional.

Nunca fiz concorrência às toupeiras e, uma ocasião, quando o Trapinhos distribuiu os furriéis no comando dos abrigos, contestei e aleguei que não dormia naquelas condições, além de que tinha que garantir o manuseamento do "81" em caso de ataque do IN. O resto da furrielada só às tantas, ou de manhã, regressava aos aposentos.
Molhei o bico. Voltei a adormecer.

Não sei se por estas, se por outras, é que o Zé Tito, aquando do segundo período de férias na Metrópole, foi à consulta externa no Hospital Militar, onde foi diagnosticado como sofrendo de uma qualquer hepatite, porque, como é sabido, há várias espécies de hepatite que não sei como se distinguem entre si, mas, naquele tempo e circunstâncias, tal maleita, a ser confirmada, dava direito a passar à peluda. Os exames complementares de diagnóstico que lhe fizeram, não lhe propiciaram tanto bem, mas renderam-lhe o prolongamento das férias por mais dois ou três meses, quando já pouco faltava para o final da comissão.

Entre nós havia uma cumplicidade que resultava de sermos amigos da juventude, e termo-nos acompanhado sempre ao longo da tropa, desde o primeiro dia, quando nos apresentámos em conjunto. Para onde um era colocado, o outro seguia o mesmo caminho, e à mesma hora. Coisa do acaso!

Durante o Verão de 71, o Zé escreveu-me um aerograma, descrevendo a nova situação militar em que se encontrava, e dava conta das grandes farras em que andava metido com o Carlos Santa, um amigo comum, mais tarde mobilizado para Nova Lamego, gozo esse patrocinado por umas francesas, descritas como muito jeitosas, alegres e dedicadas, que o aliviavam da ausência da saudosa Guiné. Nessa missiva, ainda me pedia para embrulhar os livros e as camisas, e para lhe mandar para casa, pois, imaginava, já não voltaria ao seio dos camaradas em Bajocunda. Tudo descrito com muito bons modos e delicadeza, que o rapaz tinha uma educação refinada.
Por acaso, nem sequer respondi.

Alguns dias mais tarde recebi novo aerograma, letras largas e margens vazias de texto, onde ele considerava que eu não teria lido o anterior, dava uma breve notícia da actividade na Metrópole e, depois, tratando-me de sacana, verberava para que eu lhe enviasse as camisas e os livros, na medida em que, para a Guiné... jamais!

Por razões quaisquer, de que a mais relevante é a minha tendência para a sorna e o deixar-andar, voltei a não responder. Até que...

Recebi um terceiro aerograma, simples e ordinário, onde me dispensava um tratamento de filho da mãe, e ingrato para com o amigo, leal e dedicado, que voltava a pedir para lhe enviar a merda da encomenda, com as camisas e os livros, coisas que eram pessoais, não interessavam a mais ninguém, e não queria deixar na Guiné. Assinado com um miserável rabisco. Nem lembranças para os camaradas.
O resto da estória espero ter ocasião para contar, quando me reportar à época dos acontecimentos, cerca de um ano mais tarde, corria o mês de Outubro, com vinte meses de comissão.

Em tempo, uma intervenção do camarada Zé Tito

Caro Zé Dinis
Ainda bem que te restam algumas memórias dos tempos “trágico marítimos”, no entanto, após leitura atenta da estória n.º 1 (incompleta), apercebi-me de que te esqueceste de contar de que, no último aerograma te disse com letra alterada, de que se não me enviasses os livros e as camisas, os ia buscar pessoalmente a Bajocunda, o que de facto aconteceu.

Também te esqueceste de mencionar de que, quando fui verificar o estado das minhas camisas que tinham ficado à tua guarda, notei um cheiro nauseabundo a merda retardada que verifiquei na altura dever-se à falta de papel higiénico em Bajocunda e, de tu, teres estado na minha ausência a limpar a peida nelas depois de teres limpo o cu aos meus aerogramas, daí nâo mas teres enviado, porque te estavam a fazer geito.

Zé Tito
15ABR2010



Na companhia havia uma grande nódoa. No entanto, a furrielada era uma força considerável. Na imagem distinguem-se quatro feras: mim, Zé Tito, Morais e Marino


Estória n.º 2

Um belo dia vinha com o Marino na direcção da cantina, talvez proveniente do depósito de géneros, à passagem pela arrecadação do material de guerra, quando demos com o seguinte trabalho: dois militares, o Mário, primeiro cabo mecânico de armas ligeiras, e o Matias, soldado básico, esperto que nem um alho, desventravam a pá e pica a rija terra, consolidada por sóis terríveis, em frente à referida arrecadação, num vértice entre aquele ponto, o quarto do capitão e o gabinete, tudo mais ou menos equidistante, enquanto o Trapinhos, de braços cruzados, comandava a operação.

A torreira do sol, e o inesperado da situação, fizeram que desconfiássemos. O Marino atirou logo, interrogativamente, qual a finalidade do buraco que provocava tanto esforço.

O Trapinhos, praticamente sem se movimentar, os ombros amarrecados, e o peito para dentro, que naquele corpo franzino mais se assemelhava a um fugitivo do Caramulo, fez um ligeiro sorrizinho, e respondeu:

- Estamos a fazer um abrigo.

Rimo-nos. O capitão, especado ao sol, falava como se padejasse a terra ao lado dos outros.
Mas a situação era estranha, porquê ali um abrigo? Aquelas praças tinham lugares reservados em abrigos periféricos, embora, recordo, durante uma flagelação a meio do dia, o Matias atirou-se para uma vala junto do depósito de géneros, praticamente no meio da localidade, e dali, bravamente, disparou uma G3 em improvável direcção que atingisse o IN.

O Marino, no entanto, não era de modas, nem se fez rogado:

- Mas então, para que é que se faz aqui um abrigo?, perguntou.

Respondeu o Trapinhos, voltando a evidenciar outro confiante sorrizinho:

- Então? é para nós. Se houver ataque, fica mais perto - disse a gozar a superior capacidade para discernir sobre como defender o coiro em caso de uma investida dos turras. Ainda não se lhe tinha esgotado o ar de Monalisa, e atirou-nos, agora ele, com uma exclamação surpreendente:

- É aquele trio!!.

Interiorizando a intenção do capitão, de se refugiar ali em vez de comandar a tropa a partir das Transmissões, um pouco mais além, o Marino caracterizou em voz alta, divertida, e imediatamente:

- Um trio de merda!.

Voltámos as costas e rimo-nos da ideia extraordinária.


Estória n.º 3 - (compacto de duas)

3.1


O Virgílio Fernandes foi um Foxtrot de comportamento irregular e surpreendente, em conformidade com o nível de sobriedade que apresentava. Felizmente essas oscilações apresentam um saldo positivo, que acentuaram um camarada solidário, bem disposto, bem educado, e orgulhoso do grupo a que pertencia. No entanto, quando bebia excessivamente, tornava-se resingão e chato, inoportuno, provocador, como é norma desses estados comportamentais.

Tive com ele uma única situação dificil, que acabou por se resolver sem deixar marcas de frustração.

Mas trago o Virgílio à colação, para relatar dois episódios em que foram intervenientes, ele e o Trapinhos.

Quando pretendia beber e não tinha dinheiro, o que era frequente, o Virgílio insinuava-se, pedia que lhe oferecessem e, se não dava resultado, fazia trabalhos, "arranjava" géneros alimentares para o petisco, podia tratar de armas, o que fosse preciso.

Um dia, junto à cantina, virada para a parada e ao lado do edíficio do comando, apostou que apalparia o cú ao Trapinhos. Feita a aposta, e porque o "alvo" se encontrava sob o alpendre da secretaria, lá foi o Virgílio naquela direcção, improvisando uma dança a solo, com passos curtos para um lado e outro, até se aproximar o suficiente para lançar uma mão às nádegas que lhe valeriam a cervejinha.

Alcançado o objectivo, o Virgílio desatou numa risada em direcção ao parceiro da aposta, reclamando vitória e o prémio, enquanto à porta da cantina algum pessoal fazia comentários e ria sobre o que acabavam de ver. Nesse dia, ainda houve outra aposta de igual teor, que o Virgílio ganhou, e celebrou no meio de espalhafatosas manifestações.


3.2

O outro episódio aconteceu após a chegada do Trapinhos, que estivera na Matrópole em gozo de férias.

Ainda sob o mesmo alpendre, numa ocasião em que descontraidamente ali permanecia algum pessoal, o Virgílio terá perguntado se as férias tinham corrido bem, ao que o Trapinhos correspondeu a dizer que sim, claro, e ajuntou algumas razões para a sua satisfação. Até que levou a mão ao bolso da camisa, tirou uma fotografia, e mostrou-a ao Virgílio que especava os olhos no retrato.

- Quem é? - perguntou este.

- É a minha mulher! - respondeu o Trapinhos.

Seguiu-se um silêncio que o Trapinhos interrompeu com uma pergunta:

- É boa, não é?.

Isto foi o que se comentou durante alguns dias, e a que o Virgílio juntava algumas propostas de intenção, esclarecendo sobre as virtudes fotográficas evidenciadas, enquanto o pessoal ria despregadamente com as narrativas.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6118: História da CCAÇ 2679 (34): Situação geral em Novembro de 1970 (José Manuel M. Dinis)

Guiné 63/74 - P6235: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (11): Os dias da batalha de Guidaje, 31 de Maio e 1 a 12 de Junho de 1973

1. Chegamos assim ao fim do relato dos dias da batalha Guidaje que descreveu os acontecimentos de Maio de 1973, feito pelo nosso camarada Daniel Matos (ex-Fur Mil da CCaç 3518, Gadamael, 1972/74).


Os Marados de Gadamael

e os dias da Batalha de Guidaje


Parte XI

Daniel de Matos

Os Dias da Batalha


31 de Maio

Poucas vezes na vida o nascer do sol nos terá sabido tão bem. Desta vez, acho que todos conseguimos dormir profundamente umas quantas horas seguidas e todos acordámos cedo e nos pusemos de pé num único impulso. Falo sobretudo de Os Marados de Gadamael, pois há camaradas que terão como tarefa regressar a Guidaje e ficar mais uns tempos por estas paragens, designadamente as companhias que chegaram anteontem e sem as quais ainda estaríamos sitiados. A missão dos pelotões da CCaç 3518 acabou, “o sibe chegou ao seu destino”, há soldados que se dizem prontos a festejar a próxima noite no Pilão!...

Ainda não eram oito horas e já tínhamos atravessado o rio para a margem esquerda, o motor da jangada até parecia querer pregar-nos uma partida, mas lá se aguentou. Quando arrancamos grita-se “está na mala”, “prego ao fundo, ó condutor”, “putas vão-se lavando que Os Marados vão a caminho” e outros ditos próprios da época e do estado de espírito, que guerra e soldados são assim mesmo em qualquer tempo, em qualquer lugar!

Troços da estrada Farim/Bironque/Mansabá

Com essa mesma alegria abrandamos a velocidade na passagem pelo destacamento K3 (antiga tabanca de Saliquinhedim) e, recebida a ordem do comando de Farim, apagamos os sorrisos e aí vamos em direcção ao sul, andamento moderado. Agora vamos todos motorizados e é sempre pelo alcatrão, pelo menos não haverá minas sob os pneus (o que não significa que a estrada não possa estar armadilhada num sítio qualquer).

Seremos, porém, os campeões do infortúnio. A pouquíssimos quilómetros do K3, de súbito, estoira nova emboscada. As primeiras roquetadas despoletam-na e limpam as viaturas da frente: o primeiro Unimog é destruído e o seguinte incendiado. Há um homem que acciona uma mina com o peito. Para se abrigar das balas das Kalashnikov que entretanto começaram a cantar à nossa volta, lança-se para trás de um “baga-baga” (rijo, à prova de bala, construído por formigas térmitas, chama-se morro de salalé, em Angola), e os fragmentos do seu corpo são espalhados por um diâmetro incalculável. Durante largos minutos há tiroteio de armas ligeiras na frente da coluna. Os homens das viaturas não atingidas, entre os quais nos incluímos, saltam para as bermas e tentam também reagir com prontidão. Seguimos sensivelmente a meio e não avistamos os atacantes, embora algumas balas vão zunindo muito próximas. O IN retira-se e há pessoal das NT que tenta a perseguição, mas é mandado parar. A artilharia do destacamento K3 bate a zona do lado direito da estrada durante alguns minutos. Um Unimog passa a toda a velocidade em sentido contrário, na direcção de Farim. Leva feridos. Um deles, sentado no banco de espaldar e amparado por dois camaradas, leva o joelho garrotado, perdeu a perna daí para baixo.

Destacamento do K3

A coluna recua até ao destacamento para se reorganizar. A zona de onde os combatentes do PAIGC lançaram o ataque continua a ser bombardeada pela nossa artilharia. Ao longo da estrada, em frente ao K3, esperamos pelo Alouette que vem evacuar os feridos. Depois do helicóptero carregar as macas e levantar voo a coluna/auto põe-se de novo em andamento. Quando passamos pelas viaturas destruídas, ainda estão a fumegar. Atingimos Mansabá, vamos para Mansoa na expectativa de novos contactos com o IN, se nada se passou no enfiamento do Mores é porque talvez nos safemos… Safámo-nos!

Uma coluna na estrada Mansabá-Farim

Com a alegria estampada nos rostos chegamos ao COMBIS, em Brá (não longe do quartel dos comandos e a pouca distância da Base Aérea e Aeroporto de Bissalanca), por volta às 17 horas. Aqui sim, o nosso péssimo aspecto mete dó aos transeuntes, assusta as pessoas com quem nos cruzamos. Olham-nos com ar espantado, como se vissem lobisomem! As próprias caras dos camaradas da nossa companhia se dividem entre a alegria de nos ver e a perplexidade.

O pessoal marado vem ao nosso encontro, sai da caserna, da secretaria e vem-nos abraçar efusivamente, andamos de ombro em ombro, não menos eufóricos. O furriel Quaresma – o vagomestre a cujos manjares devíamos tamanha elegância! – fica admirado por me ver à sua frente:

– Estás vivo? – pergunta-me.

– O que te parece? Não sou nenhum fantasma!

Confessa que no jornal da caserna o meu nome integra o rol dos que tinham sucumbido, já quase me tinham cantado a missa do sétimo dia, quem morreu afinal?, no COMBIS ninguém sabia ao certo. Chica, como se as transmissões não funcionassem! Esclareço-o das baixas e pergunto pelo Alexandre Castro, o nosso mangas-de-alpaca, que afinal está de férias na sua Amadora. Ainda assim, vou direito à secretaria, ao primeiro-sargento António Fagundes Neves, para ver se tenho correio. Diz-me “lá se safaram de mais uma” e passa-me um braçado enorme de cartas, jornais e revistas.

Antes do banho, cubro a manta da cama com a correspondência acumulada, que inclui cassetes recebidas dos meus amigos Acácio, Cipriano e Fernando, que em Lisboa faziam o favor de me gravar as últimas novidades, incluindo os discos que eu recebia regularmente de Londres (através da Tandy’s Records) e cuja audição era uma ajuda preciosa para aguentar a difícil passagem do tempo. Leio em diagonal as cartas mais recentes e apercebo-me do que já esperava: uma grande preocupação familiar pelo meu inabitual silêncio e pelo meu estado de saúde.

À porta do quarto surge um ordenança que me vem convocar para ir ao segundo-comandante do COMBIS (o comandante está ausente, também de férias). Fui assim mesmo, botas sem meias nem atacadores, as pernas das calças transformadas em badanas, totalmente descosidas da braguilha para baixo. Apresento-me no gabinete do nosso Major que me mira de alto a baixo, me pede para lhe contar o que se passou nestes dias e qual o estado do pessoal em termos psicológicos. Faço o meu resumo, mais ou menos cronológico, digo o que penso com algum azedume e entrego-lhe o papelucho que havia rabiscado em Farim, supostamente o croquis dos mortos que tivemos de deixar em Guidaje. Diz-me que por agora posso ir descansar e que no dia seguinte voltará a chamar-me para me pedir um relatório escrito e mais detalhado (o que não virá a acontecer).

Dirijo-me ao banho. Mando as calças para o lixo. Dispo o dólmen. De tão esticado e teso, pego-o pelo colarinho e pouso-o no chão. Fica de pé, como se o enfiasse num cabide de alfaiate! Não há a água quente que me apetecia (como seria bom um longo banho quente, de imersão), porém, a água que escorre do duche é tépida e nem sei quanto tempo fico a desfrutá-la. Enquanto isso, lavo o quico com champô, até desaparecerem as principais manchas de suor e de todos os merdelins. Aproveito para não desfazer a barba e andar assim mais um tempo (desde que começou a crescer-me que a uso crescida, salvo agora, por impedimento do RDM).

Antes do sol se pôr, já eu, o Ângelo e o Cruz tínhamos apanhado boleia para a cidade e estávamos frente ao forte da Amura (perto do cais de Bissau) a tirar fotografias, aguardando pelo furriel famalicense José Lopes Silva, que ficou de se encontrar connosco na 5.ª REP (esplanada do Café Bento, conhecido pela abreviatura de “5.ª Repartição”) e depois irmos à Cervejaria Solmar petiscar uma valente mariscada! Seguiu-se um alguidar de ostras e uma travessa de camarões no Pelicano e, devido à quantidade de líquidos ingeridos, já não me lembro o que foi o resto!

Fatal como o destino, enquanto caminhamos pelas ruas da capital encontramos sempre alguém conhecido, ou por ter estado connosco na recruta ou na especialidade, por ser conterrâneo, etc., e enquanto esclarecemos perguntas sobre Guidaje recebemos péssimas notícias de uma Gadamael cercada e com inusitado número de baixas. De Guileje também se fala, mas pouco ou nada resta para contar, salvo alguém ter garantido que o major Coutinho e Lima, ex-comandante do COP 5 e que ordenou a retirada em tempo útil de Guileje, andaria agora em Brá a jardinar no quartel, por estar detido preventivamente pela cegueira do governador. Outro alguém contra-diz-que-disse que o major estaria mesmo preso por ordem de Spínola, – e não simplesmente com detenção num quartel, – e que tal gesto provocara uma onda de indignação entre unidades do exército, em particular, as de Gadamael, Guileje e Cacine.


1 a 12 de Junho

Para os que ficaram em Guidaje os dias não passaram a ficar fáceis. Depois da Ametista Real e da operação que nos permitiu romper o cerco e regressar às origens, foi notório o abrandamento das flagelações. Só que a ligação ao mundo exterior manteve-se muito arriscada. O pessoal de Binta e Nema/Farim não teve melhor sorte, alinhando em patrulhas a colunas para cima e para baixo. A CCav 3420 permaneceu em Guidaje mais alguns dias e depois ainda ficaria em Binta até final do mês. As operações de patrulhamento aumentaram bastante em toda a região. Binta passou mesmo a ser o núcleo centralizador das mesmas, recebendo bastantes reforços durante o mês de Junho, sobretudo a 3.ª Companhia do BCaç 4514 e, já em Julho, a CCaç 4745.

Agora o IN diversifica os alvos, reforça as linhas de penetração fronteiriças de Lamel e Satitó e flagela aquartelamentos e aldeamentos em redor, dando “água pela barba” às companhias do BCaç 4512. A tenebrosa picada de e para Binta continua problemática, contudo, já não é o que era. Percorrer aquele caminho é navegar num mar de estilhaços, de invólucros de munições de todos os calibres e de viaturas esventradas. E, claro está, de ossos, que em boa parte dos casos ninguém sabe já a quem pertenciam, serão de “soldados desconhecidos” para todo o sempre. A diversidade de percursos rasgados entre Binta e Guidaje para contornar campos de minas era tamanha, que a picada tinha extensões que mais parecia uma auto-estrada de várias faixas, construída, apesar de tudo, com alguma facilidade, graças à constante planície do terreno.

A partir de Janeiro de 1974, após longo trabalho de desminagem, pessoal diverso de Engenharia e o BCaç 4512, com um reforço do BCaç 4516, iniciariam a abertura da estrada (verdadeira) Binta/Guidaje, quase em linha recta. No 25 de Abril de 1974 a obra estava no Cufeu, ao lado da bolanha de más memórias...

Só a 12 de Junho a operação de rompimento ao cerco de Guidaje é dada por concluída. O Tenente-Coronel Correia de Campos, comandante do COP3, participa numa coluna e vem com a sua comitiva para Binta, onde durante este mês se concentram as atenções. Calcula-se que o IN, depois de obrigar ao deslocamento de tantos efectivos das NT para proteger Guidaje, e após ter forçado ao abandono de Guileje, concentra agora o seu potencial atacante à volta de Gadamael, tendo por objectivo tomar a aldeia.

Para nós, em Brá, seguem-se dias tranquilos. Quem mandava quis-nos dar “descanso”, – merecidíssimo, digo eu, embora igual merecimento devesse ser extensivo aos camaradas das outras unidades (sei bem que isso é impossível)! Brinda-nos com um punhado de semanas sem escala para fazer colunas, disso beneficiam também os dois pelotões da Companhia que não “alinharam” em Guidaje. Pessoalmente, creio que só voltei a Farim no início de Julho, antes da Companhia abalar para Bafatá. E recordo-me que pouco antes de alcançar o destacamento K3 ainda jaziam à beira da estrada, no local da emboscada de 31 de Maio, os Unimog completamente queimados. Foi nesses dias que aproveitei para conhecer Bissau mais em pormenor, visitando bairros a pé, o mercado de Bandim, etc..
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 22 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6211: In memoriam (40): Pequena Homenagem ao Piu, da CCaç 3520/Cacine (Daniel Matos)

Vd. postes da série já publicados:

16 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6000: Os Maradados de Gadamael (Daniel Matos) (1): Por onde andaram e com quem estiveram?

18 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6014: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (2): Levar a lenha e sair queimado

20 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6027: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (3): Os dias da batalha de Guidaje - Antecedentes à nossa chegada

24 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6041: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (4): Os dias da batalha de Guidaje, 15 a 18 de Maio de 1973

30 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6069: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (5): Os dias da batalha de Guidaje, 19 de Maio de 1973

2 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6090: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (6): Os dias da batalha de Guidaje, 20 e 21 de Maio de 1973

5 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6108: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (7): Os dias da batalha de Guidaje, 22 e 23 de Maio de 1973

14 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6154: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (8): Os dias da batalha de Guidaje, 24, 25 e 26 de Maio de 1973

18 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6178: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (9): Os dias da batalha de Guidaje, 27 e 28 de Maio de 1973

21 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6201: Os Marados de Gadamael (Daniel Matos) (10): Os dias da batalha de Guidaje, 29 e 30 de Maio de 1973