1. Mensagem do nosso camarada José Brás* (ex-Fur Mil, CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68), com data de 11 de Maio de 2011: 
Carlos
Como sempre estás à vontade para editar, guardar ou deitar fora
Um abraço
José Brás
Foto: © Benjamim Durães (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados
AINDA AS FOTOS...
José Brás
Tenho andado afastado da intervenção regular no Blogue e nem saberia explicar-me bem porquê, se o perguntasse a mim próprio, a não ser que pudesse dar um mergulho no subconsciente para buscar essa necessidade de reciclagem, de que fala o tal "Jomar" que não sei quem seja, porque tanto pode ser João como José ou Joaquim, Marques ou Martins ou Marcolino; ou pescador, de peixe mesmo, ou de polémicas, ou de imagens mal definidas, de conceitos, de preconceitos, de complexos edipianos ou outros.
Continuando, uma visita de vez em quando, ver os poster de cada um, as informações dos editores e ala milhano para outras margens que me chamam daqui e dali... ou de mim próprio.
Claro que vi as belas fotos postadas pelo António Teixeira e, ainda que não as postasse eu, questão apenas de diferenças de feitio em cada qual, mesmo sem qualificação de virtudes, não deixei de as admirar sem medos seja do que for, nem desse velhíssimo espírito de restrição e de pecado que nos habita a todos e habitará por muito tempo, transformando o corpo numa tentação demoníaca, só quebrada pelo divino dever de procriar, coitando de vestes espessas e de luz apagada.
Não tenho muitas fotos da guerra e apenas uma ou duas de braço pelos ombros de bajuda de "mama firmada". Mas não esquecerei nunca umas tantas que encontrei, sobretudo em Aldeia Formosa, Colibuia e Cumbijã porque em Medjo não havia, que me lembre, não me esquecerei do espanto que era a descoberta desses belíssimos corpos nem do apelo de macho espiritual e biológico que sentia, olhando-as.
Se pudéssemos perguntar a essas mulheres africanas que conheci se alguma vez as molestei ou se tentei usar de poderes para as ter, ou se, sequer, as mal-tratei de palavra ou acto, poderíamos ouvir dizer sem qualquer dúvida que não. Se perguntássemos a uma ou duas se me acostei, poderíamos ouvir que sim. E que culpa será essa que me condenaria às penas do inferno de Jomar?
Já tenho sido severamente comentado por dizer que a mulher reúne em si a imagem do que de mais belo e perfeito tem o mundo, sendo no meu pensar, inclusive, um ser e quase tudo superior ao homem que tem dominado as sociedades e ocultado nisso as suas debilidades.
Ainda agora, a um camarada que me enviou uma mensagem alegadamente irónica com um grosso book que seria o primeiro volume de um tratado para entender a mulher, respondi que não careço de a compreender se posso amá-la... simplesmente, mesmo nos seus mistérios.
Dizem que África foi o princípio de tudo e também, logicamente dessa mulher que nasceu autónoma da famosa costela de macho. Não será isso alheio à minha admiração pelos seus traços teluricamente firmes, sobretudo enquanto a dureza da vida lhes permite.
Jomar lê muito mal, talvez à luz das suas próprias contradições e traumas, o que diz José Belo: "
Ah! "Bajudas de todas as tropas; de todas as guarnições militares; de todas as histórias e de todos os impérios do mundo! Lavar roupa era função "oficial". Quantas mais? Substituem todas as necessidades "práticas", e não só, pois as sentimentais "sublimadas" também por lá andariam. Alguns diziam-nas exploradas e utilizadas. Outros, mais cínicos, diziam ser elas que exploravam e utilizavam. Mas, as vantagens seriam mútuas. E, na maioria dos casos, também (e principalmente) para as famílias que, na sombra, lá estavam. Onde acabava o "patacão" e começava o "amor"? (Ou seria vice-versa?). Com o passar das muitas décadas as tonalidades tornam-se cada vez mais... "cor-de-rosa"... e ainda bem!"
Acaso não é verdade que desde a longa história que conhecemos, mulheres acompanhavam os exércitos em movimento, ou eles se juntavam nos "altos" para lhes prestarem serviços práticos de vários tipos, incluindo a venda de sexo?
E será que alguém tem dúvidas que também assim continuará a ser na desgraçada sina humana das guerras que aí virão?
E não é verdade que, mesmo nessas condições extremas de sobrevivência e comércio, muitas vezes "os sentimentos sublimados" não explodiam e mesmo o amor em formas sublimes?
"
Quem diria que mulheres pudessem suportar as fadigas daquela campanha, quando a virilidade do homem às vezes fraquejava? No entanto, cerca de cinquenta mulheres, representantes do belo sexo, compartilharam todas as peripécias da longa marcha, seguiam maridos ou amásios, rivalizando com eles até em bravura [...] Apesar da conformação física mais fraca e mesmo da inferioridade biológica, elas nunca demonstraram fraqueza. É que a alma simples da mulher brasileira é feita de sacrifícios e de martírios [...] é esse o sentimento que fez das vivandeiras umas abnegadas".
Esta "peça" pertence  ao Capitão Ítalo Landucci, integrante da Coluna Prestes que, entre 1924  e 1927 atravessou todo o Brasil na tentativa de uma revolução popular contra a oligarquia brasileira, é uma homenagem e a exaltação da mulher ou a condenação do homem que a desejava mesmo naquela condições terríveis?
E que dizer de Brecht e das "suas" prostitutas, dos "seus" bares de vinho e mulheres, dos "seus" juízes nivelados ao homem comum na comum ânsia do homem pelo corpo e pela alma da mulher?
Quanta poesia e que bela poesia tem saído da alma dos poetas na justa e libidinosa imagem da mulher?
Quantos feitos grandiosos se cometeram no mundo sob a asa inspiradora do amor carnal e espiritual de homens crápulas ou santos, mussulmanos ou cristãos, administradores ou guerreiros?
E que tem Jomar de tão preconceituoso contra o comércio do sexo? A venda do corpo? A venda da aparência de sentimentos que se têm como para serem partilhados apenas na gloriosa intimidade de dois serem que se encontram? Muito teríamos para falar sobre o assunto se o espaço e a sabedoria nos permitissem, mesmo sem pôr em questão esse ofício de dar filhos, muitas vezes a esposos que não se amam e que tratam esposas como coisa necessária e útil apenas.
Levemente abordei já esta questão aqui no Blogue no troco que dei a poste infeliz aqui editado há meses.
Também, quer no "Vindimas no Capim", quer (e em especial) no "Lugares de Passagem", através da figura de Mominato, tento um entendimento que desejo mais próximo da realidade, naquela perspectiva de José Alencar sobre o índio Guarani.
Na visão de Jomar deve ser tarado sexual todo o homem que entusiasma perante um corpo de mulher.
O soldado português, na sua grande maioria, saía de uma sociedade restritiva e castigadora do corpo e do sexo, sem nenhuma experiência sexual para além de uma ou outra oportunidade com prostituta de feira.
Algumas vezes se terá excedido na descoberta de uma mulher jovem, bonita e desnuda, na confusão que a sua pequena formação cultural e visão do mundo, em confronto com o seu desejo de guerreiro jovem lhe transmitia.
T
alvez se tenham cometido um ou outro crime nas relações de poder que se estabelecem nestas condições de poder.
Contudo, não é essa linha que marca a presença do soldado português na generalidade para além das brincadeira quase ingénuas, nem faz do exército ou do povo entidades abusadoras, como não me faz a mim ou País, entidades especuladoras apenas porque temos a nacionalidade em comum com Belmiro de Azevedo, nem incendiários apenas porque somos da mesma terra de Dias Loureiro, o homem do negócio do fogo.
Criminoso, na África ou aqui, em meu entender, é o uso do poder para forçar uma aquiescência, seja ela de que tipo for, e sexual, por maioria das razões espirituais que o acto envolve.
As fotos de António Teixeira no Blogue (já disse que eu não exporia), não enquadram, nem de perto nem de longe, tal abuso ou intenção e isso foi largamente defendido e fundamentado nos muitos comentários que se editaram.
Estou mesmo de acordo com José Belo quando diz "
diziam ser elas que exploravam e utilizavam.", quando me apercebo nas fotos, da gaiatice malandra do olhar dessas bajudas, como que gozando a confusão do branco. E nisso não vejo qualquer mal, nem da parte de um nem do outro, crendo que quem vê qualquer mal aí, é quem tem a alma ainda atada por um espírito feudal das relações homem/mulher, quem lá no fundo tem ainda as marcas da negação do prazer sexual à mulher, quer ela seja negra como nas fotos em questão, quer seja de pele branca, já que da mesma cor serão os espíritos de ambas, diferenciadas apenas pelas culturas de cada qual.
A reacção de Jomar a mim me parece muito mais denunciadora de desvios negativos sobre a mulher, sobre o respeito e a exaltação que a mulher, de corpo e alma, nos merece.
José Brás
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 21 de Março de 2011 > 
Guiné 63/74 - P7978: Blogpoesia (125): O cuco sabe que o Sol voltará ao Monfurado (José Brás) 
Vd. último poste da série de 13 de Abril de 2011 > 
Guiné 63/74 - P8263: Controvérsias (123): A guerra. As realidades locais e as bajudas de mama firmada (José Belo)