A alegria no meu coração não tem tamanho
Foi desta forma que uma mulher grande em Amindara começou o seu “discurso” de agradecimento, na recente visita que uma delegação da Associação Tabanca Pequena fez a esta Tabanca em plena mata do Cantanhez - Guiné-Bissau.
Apesar da nossa chegada coincidir com a hora do grande calor, que convida à sesta debaixo do mais frondoso poilão, Amindara esperava-nos em festa. O batuque já se fazia ouvir ainda não se avistava a tabanca.
A festa
De um lado da picada, a juventude. Tocadores e dançarinas, vestidas com a vestimenta de ir à missa, como se diz na minha aldeia, aprimoravam-se a espelhar a sua alegria e gratidão pelo poço de água aberto ali mesmo ao lado. Do outro lado, homens e mulheres mais velhos, as pessoas importantes da terra, também elas vestidas a rigor com o melhor traje, esperavam-nos com a mesa posta.
A mesa posta à nossa espera
O Pitéu
Algumas cadeiras vagas à volta da mesa indiciavam que se destinavam aos “ilustres” visitantes. Cumprimentos afetuosos e prolongados. Olhos nos olhos que teimavam em deixar escapar lágrimas de comoção. Abraços de quem nunca se conhecera antes, mas que se irmanara num sonho – ter água potável ali, mesmo no centro da tabanca.
A palavra “obrigado” era repetida continuamente, enquanto do outro lado da picada o batuque subia de tom para prazer dos nossos olhos e ouvidos enquanto as máquinas fotográficas não se cansavam de fazer clic.
Quão belo é todo este ambiente. Novos e velhos, africanos e brancos em animada festa, passados que são quarenta e tantos anos!
Tempo em que os olhos e ouvidos eram desviados para outros fins que não explorar a beleza do ser humano. Era preciso estar a atento a ruídos ou movimentos estranhos que nos podiam roubar a vida num segundo, e… as máquinas também eram outras.
Somos convidados a saborear um excelente petisco cozinhado para nós com todo o esmero e carinho. Esparguete salteado com ostras. Que saboroso petisco!
Infelizmente não nos avisaram, pois queriam fazer-nos uma surpresa. Para azar nosso tínhamos acabado de almoçar em Faro Sadjuma, ali mesmo ao lado um petisco não menos saboroso. O apetite era pouco, mas deu-se um jeito e lá e se fez o sacrifício. Estive tentado a pedir um taparwere e levar as sobras para Iemberém. eh! eh!
Eu bebi água fresca e potável em Amindara
As crianças de Amindara saboreiam o momento
Ainda há muito a fazer em termos de educação para uma vida saudável
Seguiram-se pequenos discursos em Nalu traduzidos pelo nosso anfitrião, o Abubakar, delegado da AD- Acção para o Desenvolvimento na Região. O Pepito andava atarefado na organização de um acampamento para 100 jovens em Varela e também porque queria que a festa fosse só nossa, pois foi a Tabanca Pequena que investiu em Amindara. Devo dizer que tive oportunidade de por duas vezes visitar tabancas juntamente com o Pepito. Ele é sempre recebido em festa, tal como fomos nós em Amindara, em Medjo e em Farim.
Discursou o jovem chefe de tabanca, que nos contou um pouco da história de Amindara e das dificuldades que têm tido em conseguir água. Até há um ano atrás ela era transportada de uma fonte no interior da mata e quando essa secava iam buscá-la à Tabanca de S. Francisco. Continuam a não ter escola.
Seguiu-se no discurso uma mulher. Começou com uma frase que dá que pensar.
A alegria no meu coração não tem tamanho, porque eu queria água dar de beber às crianças e não tinha; queria água para cozinhar e não tinha, queria água para lavar a roupa e não tinha…
Quando Pepito ouviu o nosso pedido e disse que iam construir um poço fiquei muito contente. Hoje sou uma mulher feliz.
Seguiu-se outra mulher no discurso. O tema foi o mesmo. Os benefícios para a população por ter água na tabanca. A higiene e limpeza, a pureza da água que reduz as doenças tantas delas fatais, sobretudo nas crianças, as hortinhas de legumes...
A mindjer garandi botou discurso pra partir mantenhas gradecer
Uma plateia atenta...
Para a posteridade
Agora só falta a escola, dizia-me um homem de cabelo branco.
Depois… as palavras parece que se recusavam a sair da minha boca, talvez um pouco aturdido com tanta alegria. Eu estava encantado e feliz, mas não conseguia expressar por palavras este estado de espírito.
Amindara foi o inicio de um projecto. Temos de seguir em frente. contrariamente ao que alguns afirmam, a Guiné-Bissau precisa de abrir muitos poços de água para poder atender às necessidades de uma população em crescimento, cuja idade média de vida é 47 anos.
[Texto e fotos de José Teixeira, membro da Direcção da Tabanca Pequena, Grupo de Amigos da Guiné-Bissau (ONGD), enviado em mensagem do dia 9 de Maio de 2011]
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 18 de Abril de 2011 > Guiné 63/74 - P8126: Ser solidário (105): 10 poços de água potável para o Cantanhez ... No dia Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, dedicado à "Agua, cultura e património"... e 3 dias depois do Zé Teixeira realizar um sonho...
3 comentários:
Terá valido a pena a nossa passagem pela guerra da Guiné?Tanta dor,tantos sacrifícios,tanto sofrimento,tanta destruicäo,tantas tragédias pessoais?Depois de ler este poste colocado no blog por um Amigo,Camarada,e näo menos,Companheiro na Tabanca de Mampatá,"respondo-me" (talvez pela primeira vez)..........Valeu! Um grande abraco.
Caro camarigo José Teixeira
Tenho acompanhado com bastante interesse as notícias que costumam chegar sobre essas acções de solidariedade activa e com profundo significado para o desenvolvimento.
De facto a via escolhida de promover a abertura de furos, com depósitos, e a campanha das sementes, terá que dar frutos pois irá certamente 'provar' como se pode melhorar substancialmente o nível de vida daquelas populações.
Falam da falta de escola. É importante terem colocado essa prioridade, pois revela a preocupação com a vontade de saber mais.
Como opinião pessoal acho que há também um outro aspecto a considerar e que é o da construção de 'fornos ecológicos'. Será também necessário avançar por aí até como forma de tentar travar a desflorestação.
Secundando a afirmação do JBelo, acho também que sim, que valeu a pena, pois estes passos que hoje se dão certamente não seriam possíveis sem os laços que antes se teceram.
Um abraço
Hélder S.
Camarigos Irmãos "Maiorais" de Empada, claro que valeu a pena, o que foi feito de bom e continua a ser oferecido ao amigo Povo da Guiné.
As minhas ofertas pecuniárias foram bem aplicadas, por esta forma outras mais virão e sendo só um pequeno grão para germinar.
Com um Abraço
Arménio Estorninho
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