sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16652: Agenda cultural (510): Apresentação do livro “Guiné-Bissau, das Contradições Políticas aos Desafios do Futuro”, da autoria de Luís Barbosa Vicente, a levar a efeito no próximo sábado, dia 29 de Outubro, no Clube Fenianos Portuenses, no Porto

1. Por sugestão do nosso camarada Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec Inf, Bafatá, 1968/70), damos conhecimento da apresentação do livro “Guiné-Bissau, das Contradições Políticas aos Desafios do Futuro”, da autoria de Luís Barbosa Vicente, a levar a efeito no próximo sábado, dia 29 de Outubro, no Clube Fenianos Portuenses, no Porto.


C O N V I T E



Sinopse

“Guiné-Bissau, das (Con)tradições Políticas aos Desafios do Futuro” 
Não se trata de um trabalho científico ou de pesquisa empírica, posiciona-se no campo do conhecimento e da reflexão crítica e as perspetivas que o autor tem sobre determinadas matérias de desenvolvimento socioeconómico da Guiné-Bissau. Esta obra surge num momento muito oportuno, atendendo aos recentes acontecimentos políticos na Guiné-Bissau, apresentando reflexões pertinentes e recentes sobre aspetos relevantes da esfera política, social e económica. Ao longo de mais de 190 páginas, este livro reúne um conjunto de artigos de opinião publicados entre 2014 e 2016, divididos em três partes: Estado, Cidadania e Política; Reforma doEstado e Modernização da Administração Pública; Novo Paradigma de Desenvolvimento. A obra “Guiné-Bissau, das [con]tradições políticas aos desafios do futuro” não é uma obra fechada; pelo contrário, é uma obra aberta, que aguarda por um debate permanente para a construção de uma sociedade mais estável e próspera.

"Guiné-Bissau, Das Contradições Políticas aos DESAFIOS DO FUTURO"
de Luís Barbosa Vicente
ISBN: 9789895186723
Edição ou reimpressão: 10-2016
Editor: Chiado Editora
Idioma: Português
Dimensões: 150 x 230 x 25 mm
Encadernação: Capa mole
Páginas: 174


Luís Barbosa Vicente - Breve biografia

É licenciado em Gestão de Empresas pelo Instituto Superior de Línguas e Administração;
Pós graduado em Finanças Públicas e Gestão Orçamental – ISEG – Instituto Superior de Economia e Gestão de Lisboa e em Administração e Políticas Públicas – ISCTE IUL – Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa – Instituto Universitário de Lisboa;
Técnico Superior de Economia, Gestão e Finanças
Coordenador do Gabinete de Projetos Especiais.
Gestor dos projetos financiados União Europeia, QREN, FSE, FEDER, FP 7, PT 2020.
Auditor, Monitorização do Plano de Atividades e Orçamento.
Avaliação e Controlo de custos.
Consultor da Câmaras Municipais de Cartaxo, Azambuja e Alpiarça.
Consultor e formador da UE-PAANE (União Europeia – Programa de Apoio a Atores Não Estatais) na área de Capacitação da Administração Pública – Guiné-Bissau
Professor Universitário em Gestão e Economia.
Gestor de projetos de investimento e desenvolvimento, financiamento público e privado da União Europeia e Programas Nacionais.
Dirigente de várias associações de desenvolvimento local e regional, sector público e privado.
Formador e consultor de várias empresas portuguesas.
Analista e colaborador Jornal Português “Diário de Notícias” e da RDP África
Autor dos livros:
“Por uma reinvenção da governabilidade e do equilíbrio de Poder na Guiné-Bissau: diálogos e olhares cruzados a partir da Diáspora”, Nov. 2014.
“Guiné-Bissau, das contradições políticas aos desafios do futuro”, Set. 2016.
Tem artigos publicados em vários blogs, jornais e revistas. 

OBS: - Elementos recolhidos, com a devida vénia, do site do Clube Fenianos Portuenses
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Nota do editor

Último poste da série de 26 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16642: Agenda cultural (503): No dia14 de Outubro às 15 horas, acompanhado de muitos amigos, procedemos ao lançamento de "Sussurros Meus" (Fernando de Jesus Sousa)

Guiné 63/74 - P16651: Brunhoso há 50 anos (10): As casas (Francisco Baptista, ex-Alf Mil da CCAÇ 2616 e CART 2732)

Brunhoso - Com a devida vénia


1. Em mensagem do dia 18 de Outubro de 2016, o nosso camarada Francisco Baptista (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2616/BCAÇ 2892 (Buba, 1970/71) e CART 2732 (Mansabá, 1971/72), volta a falar-nos da sua terra natal, Brunhoso, há 50 anos.


Brunhoso há 50 anos

10 - As casas

As primeiras fotografias procuram retratar parte dos muros que formam um círculo, dentro dos quais havia uma casa antiga e grande e outros edifícios anexos, que ainda conheci em ruínas há já mais de cinquenta anos, na rua do Fundão. Hoje da casa e das dependências agrícolas nada resta e o terreno onde os edifícios estavam implantados está invadido por silvas e fenanco (feno alto).

O homem que está junto do prédio é o seu actual proprietário, o meu amigo Joaquim Cordeiro, mais conhecido por Joaquim Passarinho, que a comprou aos seus últimos herdeiros há cerca de trinta anos.



O Joaquim Passarinho é um monumento vivo da aldeia pela sua energia e pelo trabalho incansável que tem desenvolvido ao longo de mais de sete décadas, em todas as áreas da agricultura ao serviço das casa grandes e das mais modestas e como emigrante em Espanha e em França. Lá fora em trabalhos duros, como muitos dos seus conterrâneos, ganhou muito dinheiro que aplicou totalmente na compra de prédios urbanos e rústicos da aldeia, passando a trabalhar na casa agrícola que formou tendo melhorado muitos terrenos com plantações e outros benefícios. Herdou a altura, a energia e a alcunha do seu pai o Ti João Passarinho que trabalhou quase até à hora da morte, já depois dos 80 anos.


O meu amigo Joaquim, também conhecido por Jacob, sendo um efabulador com uma imaginação sempre activa ao comprar as ruínas desta casa grande, ele que viveu na infância e na juventude, quase paredes-meias com ela, numa casa pequena e pobre, terá talvez pensado construir nelas um grande castelo que assombrasse as gentes das redondezas, tal como Luís da Baviera, esse rei sonhador que construiu aquele enorme Castelo de Neuschwanstein, castelo de duendes e fadas, num penhasco dos Alpes Bávaros.
Há homens que têm sonhos tão loucos e grandiloquentes, que podem nunca os ver realizados, mas são felizes enquanto convivem com eles.

A minha imaginação tinha dificuldade em preencher aquele espaço de casario em ruínas enorme e murado. Tal como eu, as gentes da aldeia, que também não conheciam a sua história, nem os seus moradores que se adivinhavam ricos, teriam a mesma dificuldade em compreender aquelas paredes mortas e abandonadas ao vento, ao sol e à chuva, e talvez por isso deram-lhe o nome de “Casa das Feiticeiras”. Naqueles verdes anos, ainda a navegar entre o sonho e a realidade, embora descrente de fadas, feiticeiras e zângãos, sentia que havia uma magia fantasmagórica naquele espaço abandonado, formado por esses muros altos e por essas construções em ruínas, onde as almas dos seus mortos esquecidos pareciam querer falar connosco. Constava-se que as feiticeiras saíam algumas noites, a desoras e gostavam de fazer bailes nessa casa grande, decrépita e abandonada ao luar ou na escuridão da noite.

Sendo conhecida como "Casa das Feiticeiras", era uma denominação que as pessoas aceitavam, sem procurarem outra, já que pelo mistério que infundia, se coadunava bem com o seu aspecto.

Na “troça” de pedra que encima o portão da entrada, sustentada por “ombreiras” de grandes pedras de xisto, consta uma data que só se consegue ler se subirmos próximos da inscrição já que está muito enegrecida pela passagem dos anos. Na inscrição, bem nítida, para quem se aproxima, utilizando uma escada, está a data de 1698 (MDCXCVIII) em algarismos arábes. Com a maior parte do muro exterior ainda em pé, penso que é a edificação mais antiga da aldeia. Desconhece-se quem a terá construído ou quem habitou esse enorme casarão que mais parecia uma fortaleza com muralhas tão altas, sabe-se apenas que o seu último proprietário terá sido o Sr. João "Lagoa" Ribeiro, viúvo de uma senhora de apelido Neves Ferreira, que o teria herdado dos seus pais. É muito duvidoso que essa família o tenha construído pois é voz corrente na terra que era originária doutra aldeia que dista 20 quilómetros de Brunhoso. Dessa família ainda há descendentes na aldeia embora não haja ninguém que tenha herdado esse apelido porque o último dos seus antepassados varões morreu há mais de 60 anos, solteiro e sem filhos.

A casa grande retratada na foto que se segue, foi mandada construir na década de 40 do século passado pela Dona Adelaide das Neves Ferreira, a última descendente conhecida dessa família que conservava ainda esse apelido. Era irmã do último Neves Ferreira que ainda terá vivido com ela ocasionalmente alguns anos.


Recordo-me desta senhora como de uma castelã nos seus domínios pois ela, que era solteira, vivia sozinha com as criadas, nessa casa imensa um pouco semelhante às casas solarengas que os nossos “brasileiros” ricos mandaram construir no início do século vinte. A casa foi construída por um lendário pedreiro de Brunhoso, de apelido Moredo, depois de ter regressado ainda novo do Brasil, para onde voltaria novamente alguns anos após a sua construção para garantir o sustento e o futuro dos seus onze filhos. Com muito trabalho, génio, conhecimentos adquiridos e com a ajuda dos filhos, esse pedreiro, quase analfabeto, fundou em S. Paulo uma firma de construção e importadora e exportadora de pedras, sobretudo mármores e granitos, de projecção internacional.

A Dona Adelaide era uma mulher afável, elegante e tão alta que os conterrâneos se referiam a ela com a alcunha de “A Longa”. Alguns mais antigos ouviram aos seus pais que na juventude se terá perdido de amores por um moço de lavoura da casa e quando a família lhe proibiu esse devaneio amoroso, jurou que nunca casaria com outro homem.

Nesses tempos antigos, apesar de muitas leis, muitos tabus e proibições, a atracção entre os sexos, sempre levou alguns enamorados/as mais fogosos e aventureiros a não respeitar essas barreiras e a entregaram-se a esse sentimento, por vezes transformado numa paixão tão violenta que apelava à comunhão de corpos e almas. A literatura fala-nos de muitas dessas paixões impossíveis por vezes trágicas, sendo a mais emblemática a de Romeu e Julieta.

Essa sociedade antiga, quase medieval de terratenentes, tinha regras próprias, muito rígidas sobre o amor, as paixões e o casamento. O amor era um bem somente transacionável e permitido entre os membros da mesma classe, com o mesmo poder económico e social. Quando eram homens ricos ou filhos de ricos atraídos pelas “criadas” (empregadas domésticas) , ou outras mulheres “pobres”, solteiros ou já casados muitas vezes conseguiam estabelecer ligações com essas mulheres, à revelia dos bons costumes e da família, muitas vezes ilegais, outras vezes adúlteras, segundo as leis da igreja e segundo a lei civil, que o tempo e o sentido prático das gentes, se encarregaria de "legalizar".

Quando eram mulheres ricas atraídas por criados de lavoura ou de uma classe económica mais baixa, raramente originavam relações esporádicas ou duradouras, dado o estatuto de inferioridade de que a mulher gozava que lhe dava pouca liberdade e autonomia.

Não casou, teve uma vida longa a ministrar conhecimentos de costura, tear, bordados e outros conhecimentos práticos às raparigas da aldeia.
Tratava também do arranjo da igreja, das capelas e dos santos, nesse tempo ocupações próprias para sublimar as frustrações das mulheres solteiras da sua condição social, privadas das alegrias próprias de quem constitui família. Ainda garoto entrei algumas vezes nessa casa grande, que me despertava bastante curiosidade, na companhia de um sobrinho neto da proprietária que por ironia do destino, continua ainda solteiro, tal como a tia-avó e vive sozinho nela, já restaurada e com algumas alterações no seu interior.

Há outras casas na aldeia que merecem um passeio, uma reflexão sobre o seu passado, as transformações que sofreram, o seu estado de conservação e os seus moradores mais antigos ou actuais.
Percorro as suas ruas que são também ruas do meu passado, as pedras que piso e as que se erguem em altura, com tanta história para contar, estão cada vez mais caladas porque as vozes do povo são pouco audíveis, o chiar dos carros de bois são um som que se perde no tempo e na distância e o chilrear dos pássaros cada vez mais monótono parece uma sinfonia triste.
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16297: Brunhoso há 50 anos (9): O Ciclo do Pão (2) (Francisco Baptista, ex-Alf Mil da CCAÇ 2616 e CART 2732)

Guiné 63/74 - P16650: Notas de leitura (896): “A Guerra da Guiné”, por António Trabulo com a colaboração de Leston Bandeira, Editorial Cristo Negro, 2014 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Outubro de 2016:

Queridos amigos,
Temos aqui um trabalho surpreendente de um neurocirurgião que está reformado desde 2009 e não pára de escrever. Como ele esclarece, cumpriu o serviço militar obrigatório como médico da Reserva Naval, a bordo do navio hospital Gil Eanes, nos mares da Terra Nova.
O seu conhecimento da Guiné é puramente livresco. E este seu livro, primoroso para quem pretende iniciar-se nos principais factos desta guerra, cumpre satisfatoriamente as boas regras da divulgação imparcial.
Não hesito em sugerir a sua leitura por todos.

Um abraço do
Mário


A Guerra da Guiné, por António Trabulo

Beja Santos

Confesso ter sido uma grande e agradável surpresa a leitura de “A Guerra da Guiné”, por António Trabulo com a colaboração de Leston Bandeira, Editorial Cristo Negro, 2014. António Trabulo é neurocirurgião reformado e tem os seus trabalhos publicados na Europress, Parceria A. M. Pereira, Esfera do Caos, Editorial Cristo Negro e Fronteira do Caos. Trata-se de um livro organizado por eventos ou marcos cronológicos, tudo num considerável esforço de síntese pautado pelo rigor informativo e uma boa capacidade de divulgação. Tanto quanto sei, é depois do livro do Coronel Fernando Policarpo a grande angular sobre a guerra da Guiné.

Estando estruturado em pequenos e curtos capítulos, o autor não ilude que o seu conhecimento é livresco mas que recolheu testemunhos escritos na primeira pessoa e declara a sua independência: “Não me prendem à Guiné com os laços de amor que chegam a turvar a vista quando olho para Angola. Existem realidades que se apreciam melhor à distância". Vejamos com algum detalhe a organização de um livro cuja leitura se recomenda a todos.

Primeiro, o assassinato de Amílcar Cabral, os dados estão corretíssimos. A propósito da prisão, a mando de Sékou Touré dos conjurados que lhe vieram anunciar o assassinato, ele observa a entrada dos revoltosos na prisão: “Eram três dezenas de pessoas descalças e vestidas com camuflados, com a cabeça erguida, parecendo muito orgulhosos do que tinham feito”. E recorda a acusação do jornalista Fernando Baginha, anos mais tarde: “O golpe de 14 de Novembro de 1980 não é mais do que a continuação do golpe de 20 de Janeiro de 1973. Quer um quer outro destinava-se a levar ao poder um homem: Nino”.

Segundo, o autor descreve a utopia de Cabral à luz da formação das novas nacionalidades africanas, do pan-africanismo, das tentativas federalistas. Terceiro, dá-nos um pouco da história da Guiné-Bissau e de Cabo Verde, enunciando a multiplicidade de lutas étnicas e de resistência à ocupação, destacando a figura mais singular da Guiné-Bissau antes de Amílcar Cabral, Honório Pereira Barreto. Terceiro, dá-nos a trajetória ideológica de Amílcar Cabral e a importância do período que passou na Guiné, entre finais de 1952 e inícios de 1954. Ficamos igualmente com um quadro sinótico dos movimentos nacionalistas, das etnias, do significado do massacre do Pidjiquiti. Já temos o cenário das opções da guerrilha em meio rural, começa-se a preparar a luta armada e desencadeia-se a guerrilha. O autor escolhe como acontecimentos dominantes nesses primeiros anos a “Operação Tridente” e o Congresso de Cassacá.

Quarto, a luta armada é um facto, espalha-se pelo território, desarticula-se a economia, nos anos subsequentes Arnaldo Schulz garante um enorme esforço militar, recorre a bombardeamentos e a operações por tropas helitransportadas. Há posições defensivas onde se vive no maior sofrimento. E cita Carlos Fabião: “Tite começou por ser uma desgraça. Depois ocupámos Jabadá, em frente a Tite, mas tivemos mais de 100 ataques fortes a Jabadá”. Entra em cena a guerra psicológica, os aldeamentos estratégicos, a africanização da guerra com a distribuição de armamento pelos civis das tabancas e a instrução de milícias, pelotões de caçadores nativos e a formação de companhias de caçadores africanos. Se Schulz não consegue parar a guerrilha, Spínola traz novas promessas: concentra meios, faz crescer o número das aldeias estratégicas, promove Congressos do Povo, faz escolas, estradas, inúmeras infraestruturas.

Quinto, nos seus textos sinóticos o autor refere lutas internas do PAIGC, o massacre de três majores e um alferes num período que se julgava de mudança radical da guerra no chão Manjaco, apresenta Marcelino da Mata, o aprisionamento do capitão cubano Peralta, descreve as operações “Gata Brava” e “Mar Verde”, deixa uma água-forte de Rafael Barbosa e da sua personalidade enigmática. É neste contexto que vem à baila informações sobre os prisioneiros portugueses, como se alimentavam as tropas portuguesas, quem eram os comandantes do PAIGC, os seus dirigentes políticos, do mesmo modo ficamos a saber quem eram os colaboradores diretos de Spínola. Ficamos igualmente a saber o que Amílcar Cabral pensava das mulheres bem como foram os seus dois casamentos.

Sexto, Amílcar Cabral não confinava a sua estratégia aos ataques a quartéis, a fazer emboscadas, a pôr minas e armadilhas nas picadas, foi um incansável diplomata, em 1972, o ano que precedeu a sua morte viajou 31 vezes, as Nações Unidas eram o seu objetivo maior, mas não descurava os fornecedores de armamento, alimentos e medicamentos, promovia todos os contactos necessários para arranjar bolsas de estudos para os futuros quadros. Do mesmo modo, o autor lhe dedica um texto de referência sobre o pensamento político. E assim chegamos à frustração de Spínola quando percebe que o Marcello Caetano lhe nega a abertura de negociações para uma solução política da guerra. Os textos aparecem no final da obra a um ritmo mais acelerado, fala-se dos acordos de Argel, da independência de facto, da execução de guineenses que tinham combatido do lado português, de uma nova república sempre entregue à violência, ao conflito e à instabilidade.

Na conclusão, o autor também não esconde o seu desalento: “A Guiné-Bissau não voltou a atingir o nível de cuidados primários de saúde e educação assegurados no tempo da guerra pelos militares portugueses. Os camponeses continuam a predominar no conjunto da população e a sustentar o país, mas pouco ou nenhuma influência tem na gestão da república, em que, apesar das realizações periódicas de eleições, mandam os antigos comandantes militares”. E o livro termina com a seguinte observação: “Uma das maiores vitórias de Amílcar Cabral acabou por se dar numa luta que ele sempre relegou para lugar secundário. As dificuldades impostas ao governo de Marcello Caetano pela guerrilha ajudaram a abrir os olhos de muitos oficiais portugueses para o futuro. O anquilosado regime a cair de podre. Incapaz de resolver, a tempo e com serenidade, a questão colonial, foi derrubado por uma revolta militar. Nascera de forma semelhante, a 28 de Maio de 1926”.
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Nota do editor

Último poste da série de 26 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16639: Notas de leitura (895): "Guiné: crónicas de guerra e amor", de Paulo Salgado: texto da apresentação do livro, pelo poeta e jornalista Rogério Rodrigues

Guiné 63/74 - P16649: Álbum fotográfico de Adelaide Barata Carrêlo, a filha do ten SGE Barata (CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego, 1969/71): um regresso emocionado - Parte XIII: Bolama, uma experiência agridoce (II)


Foto nº 1 > Bolama visat de São João



Foto nº 2 > Tarrafo




Foto nº 3 > Residencial Gá-Djau.


Foto nº 4 > Praia Ofir com vacas a apascentar (1)



Foto nº 4A > Praia Ofir com vacas a apascentar (2)


Foto nº 5 > A Adelaide na praia de Ofir


Foto nº 6 > Antigo palácio do Governador, em ruínas


Foto nº 7 > Antigos paços do concelho, em ruínas


Guiné-Bissau > Arquipélago de Bolama - Bijagós > Bolama  > Outubro de 2015


Fotos (e legendas): © Adelaide Barata Carrêlo (2016), Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico 
e das notas de viagem de Adelaide Barata Carrelo, à Guiné-Bissau, em outubro-novembro de 2015 (*). 

Com sete anos, a Adelaide passou uma larga temporada (1970/71) em Nova Lamego, com o pai, a mãe e os irmãos, tendo regressado no N/M Uíge, em 2 de março de 1971. Em 15/11/1970 teve o seu "bartismo de fogo".

O pai era o ten SGE José Maria Barata, CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego, 1969/71). Quarenta anos depois regressa à Guiné-Bissau...

É nossa grã-tabanqueira, nº 721 (membro da nossa Tabanca Grande desde 11/7/2016).



BOLAMA (II)

 Chegados a Bolama esperámos uma espécie de "tuk-tuk" que nos levou à Residencial Gá-Djau.
A primeira impressão... respira-se história por todas as esquinas, vidas que foram felizes aqui, memórias de ruas com nomes que nos pertencem (por exemplo,  "Rua de Cascais"). 

Soubemos que,  através de um protocolo com a cidade de Cascais,  foram oferecidas uma ambulância e uma viatura polivalente, bem como a doação de 55 mil livros para a biblioteca municipal da Guiné Bissau.

Casas de arquitectura puramente colonial ainda se mantém firmes como que um cartão de visita, embora desertas e desejosas para contar as suas infinitas histórias.

Almoçámos,,  no Bar "Sabor das Ilhas",  um peixe grelhado magnífico,  "ventana" (parecido com a nossa "dourada") e arroz, não faltando a magnífica banana como sobremesa.

Ainda visitámos o cemitério de Bolama onde se encontram sepulturas de alguns portugueses que lá viveram e lutaram.

Deambulámos pelas ruas da cidade, onde observámos o Palácio dos Paços do Concelho, a Igreja de S. José e os edifícios militares entregues ao passar dos anos. Espreitámos o interior do Cinema de Bolama pela bilheteira abandonada.

Nos campos de futebol adjacentes ao quartel, observámos adolescentes a treinar intensamente debaixo de um calor sufocante.

Encaminhámo-nos para o mercado municipal, e no caminho demos conta da existência de duas cabines telefónicas que hoje estão completamente mudas.

Ao regressar à Residencial esperava-nos um chá "wuarga" (espécie de chá preto muito forte com muito açúcar), servido em copos de vidro pequeninos.

Na primeira noite em Bolama, apanhámos uma trovoada depois de um anoitecer quente e pesado, debaixo de uma espécie de coreto pequeno na Residencial.

Dormir à noite... impensável, mas o cansaço era tanto que as melgas eram simples mosquinhas a bailar à volta dos nossos ouvidos.... E o calor...?

Ao nascer do dia não podíamos perder um mergulho na praia de "Ofir". Quando chegámos, a água estava mansa, como as vacas que comíam a erva junto á areia.

A água estava morna, o que nos permitiu nadar e mergulhar durante bastante tempo.

O que aconteceu depois...,  é que não esperávamos. Quando nos fomos secar nas toalhas e vestir as roupas que deixámos em cima de um muro junto à praia, fomos atacados por formigas grandes e rápidas que nos mordiam os pés e tudo o que podiam,  sem dó nem piedade. Por mais que sacudíssemos as roupas, mais elas surgiam, fugimos dali com uma sensação agridoce, mas valeu a pena!

Planeávamos ir a Cantanhez, mas,  com as chuvas e o estado das estradas, mudámos o rumo à nossa viagem.

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 27 de outubro de  2016 > Guiné 63/74 - P16646: Álbum fotográfico de Adelaide Barata Carrêlo, a filha do ten SGE Barata (CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego, 1969/71): um regresso emocionado - Parte XIII: Bolama, uma experiência agridoce (I)

Guiné 63/74 - P16648: Parabéns a você (1152): Jorge Fontinha, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2791 (Guiné, 1970/72) e Coronel Inf Ref Luís Marcelino, ex-Cap Mil Inf, CMDT da CART 6250/72 (Guiné, 1972/74)


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Nota do editor

Último poste da série de  20 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16619: Parabéns a você (1151): Fernando Súcio, ex-Soldado Condutor Auto do Pel Mort 4275 (Guiné, 1972/74) e Rogério Cardoso, ex-Fur Mil Art da CART 643 (Guiné, 1964/66)

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16647: Debates da nossa tertúlia (I): Nós e os desertores (15): Desertor era o militar que (i) foi incorporado, (ii) estava nas fileiras e (iii) as abandonava ao fim de algum tempo... Desconfio um bocado do número de desertores que foi avançado pelos historiadores Miguel Cardina e Susana Martins, se for aplicada a definição exacta dos regulamentos da época (António J. Pereira da Costa, cor art ref)


1961 > Chegada a um porto ultramarino (talvez Luanda), de um contingente militar oriundo da metrópole. [ Foto, alegadamente do porto de Bissau,  adquirida na Papelaria Benfica, junto ao estádio Sarmento Rodrigues... Em 1961, o porto de Bissau não tinha grandes condições para a atracagem de naivos de maior calado do que, por exemplo, os da classe Manuel Alfredo,  Alfredo da Silva ou Ana Mafada. Também parece que não havia carris nem grandes guindastes.].

A foto é do nosso camarada açoriano, ex-fur mil  Durval Faria,  um dos primeiros de nós,  a partir para a Guiné, logo em 1962... Pertenceu à CCAÇ 274 / BCAÇ 356 (1962/64)... O Durval Faria chama-lhe Companhia de Caçadores Especiais nº 274, constituída por militares das lhas de São Miguel e Santa Maria]

Foto do Mural do Facebook, do nosso camarada Durval Faria (Lagoa, S. Miguel, Açores) (Aqui reproduzidas com a devida vénia...). O Durval Faria é membro da nossa Tabanca Grande



1. Comentário de António J. Pereira da Costa ao poste P16628 (**)

[António José Pereira da Costa, cor art ref (ex-alf art , CART 1692/BART 1914, Cacine, 1968/69; ex-cap art e cmdt , CART 3494/BART 3873, Xime e Mansambo, e CART 3567, Mansabá, 1972/74; tem mais de 110 referências no nosso blogue]

Olá,  Camaradas

Desertor é o militar "que deserta". Isto é, o que foi incorporado, está nas fileiras e as abandona, ao fim de algum tempo.

Ponho à consideração do blog que "puxe pelas memórias" e tente lembrar-se de quantos militares desertaram nas unidades a que cada um pertenceu. Creio que o número de desertores "na frente de batalha", foi absolutamente residual, creio que por falta de confiança no "tratamento" que o inimigo lhes daria. 

Podemos lançar um inquérito "à Luís Graça" com a pergunta quantos camaradas desertaram na minha unidade no TO daquela PU? 

As cinco hipóteses: 

nenhum
um
dois
três
mais de três 

Não se aceitam respostas do tipo "não sei/não me lembro", uma vez que um caso de deserção numa companhia era um caso muito falado. 

Será de excluir a deserção dos naturais da PU? Ou deverão ter um tratamento estatístico à parte?

No fundo, estavam nas mesmas condições dos que desertavam nas unidades metropolitanas. Há também o caso dos que desertavam "para trabalhar". Tive vários casos de homens que desertavam - ausentavam-se por mais de 8 dias se eram prontos ou mais de 15 dias na recruta - para irem trabalhar nas colheitas e outros trabalhos agrícolas e depois, finda a tarefa, voltavam.

Este tipo de deserção levanta a questão do "patriotismo" do nosso povo. É um conceito escorregadio que se poderia medir pelo número de "voluntários". No fundo, "aquilo da tropa era uma chatice". Pagavam uma miséria, davam comida que até podia ser em quantidade mas, às vezes, não era assim tão boa e era muito diferente da de "lá de casa". (A questão da comida é/era importante.).

O ambiente do quartel (caserna e refeitório) tinha muito que se lhe dissesse...

Ensinavam(?) coisas que não interessavam para nada e até mandavam fazer ginástica que só servia para cansar e chatear. Ukék eutouakiafazer? Uké isso da pátria?

Este tipo de desertores era frequente e, quando punidos pelo crime, não entendiam o que tinha passado e alegavam que não tinham cometido crime nenhum e até diziam:
- Eu não fugi. Precisava de ir para sustentar a família.

A legislação sobre "amparos" era e tinha de ser muito restritiva. E tudo acabava no embarque para o TO de alguma PU.

Desertores "ideológicos", nas unidades territoriais,  era poucos. Poderemos lançar mais um inquérito, pois assistimos a casos de deserção sem regresso e, na minha opinião, são estes os verdadeiros desertores, os que se recusaram a fazer a guerra e preferiram deixar o país definitivamente e reiniciar a vida noutro país. Claro que a consulta às ordens de serviço das unidades não permite destrinças entre as diferentes situações.

Para ser sincero, desconfio um bocado do número de desertores, se for aplicada a definição exacta dos regulamentos.

Parece-me que estamos a referir como "desertor" qualquer homem que fugiu ao serviço militar, quer tenha fugido adolescente - antes de "dar o nome" [, faltoso] - quer o tenha dado e tenha fugido quando a incorporação se aproximava [refratário]. 

Estes números são muito consideráveis, mas creio que não sejam determináveis com grande exactidão. Julgo que os serviços não os controlavam, nem para efeito de estatística, o que poderia medir a impopularidade da guerra ou patriotismo do povo. Este resultado poderia ser decepcionante para os "guerristas".

Para se ser desertor - naquele tempo e hoje - é necessário ter-se sido incorporado. Era, nos termos da lei do tempo, um crime "essencialmente militar", ou seja, um crime que só os militares podiam cometer. Hoje a legislação mudou e não existe este tipo de crimes. 

Se se não era incorporado,  era-se civil e, quanto muito, deixava de se cumprir "um dever de cidadania", como se diz hoje.

Neste âmbito, considerando que os membros do blog são ex-militares, teremos de tomar como verdadeiros os elementos fornecidos pelos investigadores, relativos àquelas duas situações. Seria bom que eles indicassem o seu método de trabalho, técnica de interpretação de elementos disponíveis e fontes consultadas.

Aqui, era interessante consultarmos as histórias das unidades, onde as deserções em face do inimigo deverão vir assinaladas e, talvez, personificadas.

O tal inquérito sobre esta matéria seria interessante...

Para a maioria dos membros do blog, dada a curta permanência na "metrópole", será difícil fornecer números de desertores nas unidades do continente e ilhas. (***)

2. Comentário do editor:

Seguimos a sugestão do nosso amigo e camarada Tó Zé, abrindo um inquérito 'on line' no sítio do costume, o  canto superior da coluna da esquerda... 

Vamos considerar também as eventuais situações de deserção na metrópole, aquando da formação da companhia (ou equivalente). Pode haver um caso ou outro onde seja difícil obter elementos fiáveis: por exemplo, na minha CCAÇ 2590, futura CCAÇ 12, éramos cerca de 60 e tal graduados e especialistas que se juntaram no Campo Militar de Santa Margarida para "formar a companhia".  Não posso garantir que alguém não tenha comparecido (, sendo dado nesse caso como desertor). Mas penso que não. Era uma unidade "atípica" que se foi juntar aos seus praças, do recrutamento local, já recrutas (cerca de 1 centena).  Demos-lhes a instrução de especialidade e fizemos com eles a IAO. Não houve deserções  no tempo em que lá estive (maio de 1969/março de 1971). Fomos substituídos por outros graduados e especialistas, em rendição individual.

Já no caso da CCAÇ 2402 / BCAÇ 2851, (, Mansabá e Olossato, 1968/70), por exemplos, sabemos que houve, na véspera do embarque, a deserção de um oficial miliciano (ou aspirante a oficial miliciano).

O nosso inquérito desta semana contempla as duas situações: a hipótese de deserção ter ocorrido na metrópole e ou já no TO da Guiné. Podem e devem ser dadas duas respostas: por exemplo, 1. Nenhum [caso], na metrópole; e 2. Nenhum [caso], no TO da Guiné. Ou então: 3. Um [caso], na metrópole; e 2. Nenhum [caso], no TO da Guiné. 

INQUÉRITO 'ON LINE': "NA MINHA UNIDADE (COMPANHIA OU EQUIVALENTE) NÃO HÁ CASOS DE DESERÇÃO" 

1. Nenhum, na metrópole

2. Nenhum, no TO da Guiné

3. Um, na metrópole

4. Dois, na metrópole

5. Três ou mais, na metrópole

6. Um, no TO da Guiné

7. Dois, no TO da Guiné

8. Três ou mais, no TO da Guiné


A responder até 3/11/2016, 5ª feira, 15h34.
______________

(**) Vd. poste de 22 de outubro de  2016 > Guiné 63/74 - P16628: Recortes de imprensa (83): Guerra colonial: mais de 200 mil refratários, mais de 8 mil desertores... e faltosos, não se sabe..., segundo estudo em curso conduzido pelos historiadores Miguel Cardina e Susana Martins (Lusa / DN - Diário de Notícias / Expresso, de ontem

(...) Os historiadores do Centro de Estudos Sociais (CES), da Universidade de Coimbra, vão apresentar os dados finais do estudo no colóquio "O (as)salto da memória: histórias, narrativas e silenciamentos da deserção e do exílio", que se realiza na quinta-feira, no qual será também apresentada documentação inédita sobre desertores da Guerra Colonial.

De acordo com os investigadores, o número definitivo do novo estudo sobre militares que desertaram da Guerra Colonial "pode pecar por defeito" porque ainda não é possível contabilizar os dados referentes a todos os territórios e o estudo tem como base apenas fontes do Exército.

O Código de Justiça Militar definia como desertor aquele que não comparecia na instalação militar a que pertencia num prazo limite de oito dias.

Segundo Miguel Cardina, para compreender o fenómeno da recusa de ir à guerra, além dos militares que desertaram, é preciso também considerar os refratários - jovens que faziam a inspeção mas que fugiam antes da incorporação - e os faltosos, que nem sequer faziam a inspeção militar.

"Temos dados que indicam que entre 1967 e 1969 cerca de dois por cento dos jovens que são chamados à inspeção foram refratários. Este número é certamente superior ao número dos desertores. Os faltosos são aqueles que nem sequer se apresentam à inspeção. Dados de 1985 do Estado-Maior do Exército indicam que cerca de 200 mil terão abandonado o país. Na década de 1970, cerca de vinte por cento dos jovens que deveriam fazer a inspeção já não se encontravam no país", indicou o historiador do CES.

Para Miguel Cardina, o "processo de afastamento e fuga" da estrutura militar deve ser estudado com profundidade e, por isso, o estudo começa pelos desertores - porque não existiam números conhecidos até ao momento - mas frisou que é preciso considerar as outras categorias: os refratários e os faltosos.

"Temos de colocar estas três categorias na mesma equação, sabendo que elas são diferentes e têm uma ligação com o fenómeno da guerra, também ela diferente. É natural que, no quadro dos faltosos, a guerra possa estar presente mas não tem o mesmo peso que tem nos refratários e também nos desertores", explicou.

Segundo o historiador, o "fenómeno dos faltosos" cruza-se com o fenómeno da emigração, sendo que uma boa parte destes jovens não estavam a "fugir da guerra" mas também da falta de perspetivas de futuro, ou seja, "a guerra podia ser" uma das motivações para o ato de emigrar. (...)


(***) Último poste da série > 24 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16631: Debates da nossa tertúlia (I): Nós e os desertores (14): A maldição de Cancolim e a CCAÇ 3489 que teve dois casos (o capitão e um alferes) de "abandono" (no período de férias) e um de "deserção" para as fileiras do IN, o sold at inf José António Almeida Rodrigues (1950-2016)

Guiné 63/74 - P16646: Álbum fotográfico de Adelaide Barata Carrêlo, a filha do ten SGE Barata (CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego, 1969/71): um regresso emocionado - Parte XIII: Bolama, uma experiência agridoce (I)







Guiné-Bissau > Região de Quínara > Travessia do rio Grande de Buba (ou, melhor do "canal do porto"), de São João para Bolama, vindo de  Fulacunda > Outubro de 2015

Fotos (e legendas): © Adelaide Barata Carrêlo (2016), Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Quínara > Carta de São João (1955) > Escala 1/50 mil > Detalhe: posição relativa de São João, Bolam, canal do porto e rio Grande de Buba.

Infogravura: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2016)



1. Texto e fotos enviados em  12 do corrente. Continuação da publicação do álbum fotográfico e das notas de viagem de Adelaide Barata Carrelo, à Guiné-Bissau, em outubro-novembro de 2015 (*). 

Com sete anos, a Adelaide passou uma larga temporada (1970/71) em Nova Lamego, com o pai, a mãe e os irmãos, tendo regressado no N/M Uíge, em 2 de março de 1971.  Em 15/11/1970 teve o seu "bartismo de fogo".

 O pai era o ten SGE José Maria Barata, CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego, 1969/71). Quarenta anos depois regressa à Guiné-Bissau...

É nossa grã-tabanqueira, nº 721 (membro da nossa Tabanca Grande desde  11/7/2016).


BOLAMA (I)

A ilha de Bolama localiza-se no arquipélago dos Bijagós, na Guiné-Bissau. É a ilha mais próxima do território continental da Guiné-Bissau, e é o nome da principal cidade, capital da região de Bolama.

A ilha é rodeada por manguezal, que é um ecossistema costeiro de transição entre os ambientes terrestre e marinho, zona húmida característica de regiões tropicais e subtropicais. Associado às margens de baías, enseadas, barras, desembocaduras de rios, lagunas e reentrâncias costeiras, onde haja encontro de águas de rios com a do mar, ou diretamente expostos à linha da costa, está sujeito ao regime das marés, sendo dominado por espécies vegetais típicas, às quais se relacionam outros componentes vegetais e animais.

Ao contrário do que acontece em praias arenosas e dunas, a cobertura vegetal do manguezal instala-se em substratos de vasa de formação recente, de pequena declividade, sob a ação diária das marés de água salgada ou, pelo menos, salobra.

Depois de passar por Fulacunda, seguimos a caminho de Bolama. À beira estrada surge-nos uns montes de argila vermelha compacta, que podem atingir os dez metros de altura e pesar toneladas, são erguidos pelas formigas térmitas ou salalé, que na Guiné se denominam por "Bagabaga".

Ao longo da estrada avistam-se braços do rio Geba onde corpos nus se banham dando conta da nossa passagem. Sempre a contornar as poças de água na estrada e em ziguezague chegámos ao fim da estrada, a S.João, onde iríamos atravessar as águas profundas para chegar a Bolama.

Alguns rapazes que se encontravam neste cais improvisado, prontificaram-se para chamar o dono da piroga para nos levar. Atravessámos as águas que se rasgavam no casco da piroga e vimos pequenos peixes saltavam brilhando ao sol.

Guné 63/74 - P16645: As nossas mulheres (14): Tive conhecimento, mas muito mais tarde, que boa gente vivia em Bissau ou tinha a mulher que vivia na cidade (Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, Minas e Armadilhas, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68; lapidador de diamantes, reformado)


Guiné > Bissau > 1968 > Despedida: foto do Mário Gaspar tirada junto á estátua do cap Teixeira Pinto (ou "capitão-diabo", para os guineenses)

Foto: © Mário Gaspar (2016). Todos os direitos reservados


1. Mensagem, do 20 do corrente,  de 

Assunto - Se tive, familiares ?... Poucos foram aqueles que usufruíram de tal


Se tive porventura contactos com familiares meus ou de camaradas, no mato ou Bissau?

Enquanto camaradas morriam – e esses meus heróis caíam por toda a Guiné, e em Moçambique e Angola? E nós éramos calcados, amassados e esmiolados nos bocados e nas poças de sangue desses mesmos camaradas. Bissau era cidade. Mulheres, comida e local onde se vivia, existia VIDA.

Senti o corpo a arder, queimado e chamuscado de morte. Nunca tive receio dela. Fácil de compreender: vivia e estava casado com ela. Senti-o quando tive conhecimento ao regressar a Bissau, após gozar férias em Lisboa. Privilégio que poucos usufruíram… Pois regressava e dizem que os camaradas Pestana e Costa tinham falecido. Escrevi, nesse mesmo dia para aquela com quem me casei:
– Estou farto de Bissau, aqui só se fala em guerra!

Fui para Gadamael Porto, de avioneta. Pouco tempo depois estava nessa Operação fantasma “Revistar”. Não se falava de outra coisa na esplanada do Hotel Portugal… Em toda a Bissau… Depois foi o que foi. E eu cheio de guerra, inundado. Escutei o meu grito

Vinte e quatro horas, com um horário de 8 horas e 100% de aumento de tempo para efeitos de reforma ou aposentação. No mato o dia ultrapassava matematicamente – no nosso interior essas 24 horas – e quantos como eu (nem o direito a esse período de tempo, para a reforma e/ou aposentação) tínhamos essas 24 horas, para existir justiça, seriam 400% de aumento de tempo, estávamos 24 horas de Serviço, sem descanso semanal.

Tive conhecimento, mas muito mais tarde, que boa gente vivia em Bissau ou tinha a mulher que vivia na cidade. Neste último caso, vivia o casal em Bissau ou no interior.

Curiosamente só muito posteriormente, vim a saber existirem militares que viviam com esposa, em determinadas zonas da Guiné.

Como muito boa gente – conheço e desconheço a razão – não diz qual a elite militar que possuía esse prazer, melhor ser no interior de Comandos, Fuzileiros e Paraquedistas. Também naqueles que estavam colocados em Bissau – aí era indiferente o Posto.

Pois em Bissau ouvi disparos. De quem? Tropas Especiais aos tiros após jogo de futebol. Não é deles a culpa, outros os denominaram como tal.  Estou à vontade para afirmá-lo, estive – fui obrigado (todos foram obrigados) a frequentar umas Provas para os Rangeres. Só tenho a dizer que bem me arrependi, bem pior era ser-se Atirador e especialista em minas e armadilhas.

Se tive familiares, também amigos, é bem verdade que sim… Por correspondência – carta ou aerograma – e com namoradas, com ejaculação. As palavras são mesmo escritas, em determinadas ocasiões tudo o que queremos e desejamos. Eram minhas as vaginas, suecas, brasileiras e portuguesas. Puxava-lhes pelos seios e íamos para a cama.

Mas a cama era dura. Depois aqueles mosquitos entravam por todos os buracos e mordiam. Os 4 paus que erguiam o mosquiteiro eram meus aios. Quando no “corredor da morte” – “corredor de Guilege” aguardávamos vindos da fronteira o PAIGC para abastecer a sua tropa, era de madrugada e dormia-se um sono com os pés dentro de um charco.

Os sonhos? Não sonhei mais. Cheiro de tiros, canhões e morteiros.

Tenho a impressão que teria passado razoavelmente de janeiro de 67 a outubro de 68 em Bissau. Apreciador de cerveja, camarão e ostras. Gostando de comer um pombo verde no Zé da Amura.

Até com piscina, tão apreciador de dar umas braçadas estilos livre, mariposa ou de bruços.

Talvez não tivesse ido a esse mundo do “Pilão”, perigoso demais para um habitante de Bissau. Mas estive lá e à noite… Decerto estava já mesmo “apanhado pelo clima”, não do de Bissau – doentio decerto – melhor que o mato.

Um abraço

Mário Vitorino Gaspar

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Nota do editor:

Último poste da série > 26 de outubro de  2015 > Guiné 63/74 - P15293: As nossas mulheres (13): Só se pode falar do passado porque o futuro começa amanhã (Juvenal Amado)

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Guiné 63/74 - P16644: Estórias mal contadas que fazem História: a mina anticarro soviética que eu (e não o capitão...) despoletei, na secretaria, em Cufar, em 11/7/1973 (Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil inf CCAÇ 4740, Cufar, 1972/73, e Pel Caç Nat 52, Bambadinca e Mato Cão, 1973/74; novo membro da nossa Tabanca Grande, com o nº 730)



Guiné  > Região de Tombali > Cufar >  CCAÇ 4740 (1972/74) > 1973 > Mina anticarro soviética, em caixa de madeira



Guiné  > Região de Tombali > Cufar >  CCAÇ 4740 (1972/74) > 1973 > Mina anticarro soviética, em caixa de madeira:  espoleta MUV 2


Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Mato Cão > Pel Caç Nat 52 (1973/74) > O alf mil inf Luís Mourato Oliveira, à direita, com o João Santos: "Neste dia que a ementa era leitão,  o João Santos, grande companheiro que figura na imagem, pode saborear o pitéu com apetite, ao contrário do que aconteceu quando o jantar foi macaco cão e o estômago dele não resistiu".



Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Mato Cão > Pel Caç Nat 52 (1973/74)  > "Véspera de Natal de 1973,  o PAIGC estava na mata e tomamos a iniciativa de os enfrentar para que a consoada fosse 'em paz'. Aqui está parte do Pel Caç Nat 52 que emboscou com sucesso o PAIGC nesse dia, sofrendo um ferido ligeiro".


Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Mato Cão > Pel Caç Nat 52 (1973/74)  > "Do planalto de Mato de Cão a vista magnífíca do rio Geba e da bolanha de Nhabijões"


Fotos (e legendas): © Luís Mourato Oliveira  (2016). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


​1. Mensagem de Luís Mourato Oliveira, com data de 24 do corrente;

 [foto à esquerda, Luís Mourato Oliveira, ex-alf mil inf CCAÇ 4740, Cufar, 1972/73, e Pel Caç Nat 52, Bambadinca e Mato Cão, 1973/74; novo membro da nossa Tabanca Grande, com o nº 730]


Caro Luis

Apesar de visitar o Blog com alguma regularidade, a minha colaboração tem sido muito limitada, diria até nula.

Aproveito para te informar que,  com muita pena minha,  já não vivo na Marteleir,. Lourinhã,  desde setembro de 2015 e talvez por isso nunca nos encontrámos este ano,  apesar de todas as sextas-feiras lá estar presente para o jantar habitual da nossa tertúlia "raiz de cana".

Como verás,  o motivo do "escrito" foi o encontro com um ex-camarada de Cufar [, da CCAÇ 4740]. Talvez mais encontros me levem a dar mais alguma colaboração.

Verifiquei que,  apesar de num texto sobre o sequestro em Bambadinca​ pela CAÇ 22 [ou 21 ?] (**), de que fui testemunha e prestei informação estar identificado como tabanqueiro nº 625, não consto na lista [alfabética] dos tabanqueiros, o que gostaria, pois permitia ter talvez contacto com outros camaradas visitantes do Blog e que me conhecessem.

Por hoje não te incomodo mais, apenas te envio o texto em anexo para tua análise e aprovação e também as melhores saudações com votos de saúde e alegria.

Luís Mourato ​Oliveira

​PS - Seguem em anexo imagens de mina anticarro soviética bem como espoleta MUV 2 que não enviei no primeiro correio​


2. Comentário do editor LG:

Luís:

Tens toda a  razão, foi uma notória falha minha, tinha-te prometido apresentar a tua pessoa,  ao pessoal da Tabanca Grande,  como o novo membro, com o lugar nº 625, de modo a poderes  passar a desfrutar melhor, face a face, da companhia dos amigos e camaradas da Guiné que se sentam á sombra do nosso mágico e protetor poilão... 

Isto passou-se em 23/7/2013, imagina (!), há mais de três anos atrás!... Eu tinha acabado de regressar de Luanda e vinha cansado (*). A verdade é que  o  que te prometi, não cumpri nesse fim de semana,,, Faço-o hoje, tardiamente, mas com todo o gosto,  por ter na nossa companhia não só um lourinhanense (ou descendente de lourinhanses) mas também um camarada que comandou (e foi o último comandante de) os bravos do Pel Caç Nat 52, e que andou por terras que eu também calcorreei, com o mítico Mato Cuor, no regulado do Cuor...

Já não te posso dar o lugar nº 625, entretanto ocupado, mas passas a ter um outro lugar, cativo, sob o nº 730. Depois do Henrique Matos, do  Joaquim Mexia Alves,  e do Mário Beja Santos (por ordem alfabética, não necessariamente histórica), passas a ser o quarto comandante do Pel Caç Nat 52 a integrar a nossa Tabanca Grande.

Um alfabravo, espero poder encontrar-te um dia destes, por terras da Lourinhã, entre a Praia da Areia Branca e a Marteleira. LG


3. Estórias mal contadas que fazem História
Capa do livro

por Luís Mourato Oliveira


Na passada semana tive a surpresa do camarada “cufariano” da CCAÇ 4740, Mário Oliveira,  ex-furriel mec auto daquela companhia e um dos administradores do site daquela unidade que ele próprio criou conjuntamente, com o ex-alferes Zêzere e com o ex-furriel Faria, me contactar através do Facebook.

Dizia-me ele que,  semanalmente e com rigor, todos os sábados se desloca à Ameixoeira, onde actualmente resido, para visitar a sogra e almoçarem em convívio familiar com esta,  bem como com os seus cunhados,  e que seria agradável encontrarmo-nos para um café e uma boa cavaqueira. 

Respondi imediatamente que teria todo o gosto neste encontro após quarenta e três anos em que apenas tivemos oportunidade de trocar recordações e notícias através do site por ele criado. Combinámos o encontro e à hora combinada lá estávamos nós sentados no café do Sr. Manuel,  nas galerias de Santa Clara. 

Para minha surpresa reconhecemo-nos imediatamente,  não graças à boa memória dos nossos rostos dos vinte anos nem porque não mudámos nada desde essa data, mas sim pelas fotografias e postes que vamos trocando no Facebook. As tecnologias têm algumas vantagens!

Foi uma manhã de convívio muito agradável, sobretudo porque rebuscámos as boas lembranças daquele tempo. Celebrámos o facto de termos tido uma vida sã e com alegrias durante a nossa vida na tropa bem como no tempo que se seguiu e não abordámos nem agruras nem tragédias antigas para que o encontro celebrasse apenas as coisas boas da vida.

Uma das boas lembranças que trocámos foi um dos milagres de Cufar, de certeza que aconteceram muitos mais, que ocorreu em julho de 1973 e que é relatado no livro “Diário da Guiné“,  da autoria do nosso camarada António Graça Abreu [,  pág,  que connosco conviveu esse período que a todos marcou e de quem tenho estima e consideração,  apesar de aqui vir corrigir a estória que,  segundo ele,  ocorreu no dia 11 daquele mês. 

Estou certo de que o que Graça Abreu escreveu e a que só não correspondem os actores do acontecido naquele dia, não se deve a uma voluntária alteração dos factos, mas sim à narrativa que lhe foi dada dos acontecimentos e que aceitou como boa e posteriormente a transcreveu,  ficando assim para a construção da História.

Nesse dia um popular de Matofarroba dirigiu-se ao aquartelamento e denunciou que uma mina anticarro tinha sido colocada à entrada do aldeamento, na altura uma aldeia restruturada através da acção de reordenamentos lavada a cabo na Guiné.

Um grupo dirigiu-se ao local, localizou e levantou a mina. Tratava-se de uma mina anticarro russa, uma arma de uma simplicidade letal que se resumia a um caixote de madeira com cerca de sete quilos de trotil e uma espoleta que cedia com a pressão da uma viatura provocando assim os estragos que todos nós conhecemos. O caixote foi assim simplesmente levantado, transportado para a unidade e “arrumado” na secretaria da companhia sobre a secretária do já falecido primeiro-sargento Xavier…e lá ficou.

O alferes do terceiro pelotão, Luís Oliveira, eu próprio [. e não o capitão, segundo a versão do António Graça de Abreu,  vd. ponto 4, a seguir],  entrou por acaso na secretaria, talvez para ver a mina “apreendida”,  porque não era local que frequentasse com regularidade, e movido por uma curiosidade perigosa sobre a arma do inimigo e para verificar se esta tinha sido desarmada antes de estar assim exposta, rodou a tampa de baquelite que ocultava e dava acesso à espoleta MUV que deveria fazer a mina explodir.

Para grande surpresa minha e ainda maior susto, verifiquei que,  após a tampa de baquelite estar completamente desenroscada, alguma coisa a prendia e a impedia de se soltar do caixote mortal. Com o máximo cuidado detectei que a na base da rosca da tampa tinha sido feito um pequeno orifício e que neste estava preso um cordel que impedia a tampa de se soltar. Também rapidamente concluí que o mesmo cordel estava lasso e que, se havia perigo, o pior já tinha passado. 

Informei imediatamente os presentes na secretaria para que saíssem porque a mina estava armadilhada, cortei o cordel que accionava a armadilha, retirei a espoleta MUV que armava originalmente o engenho e com ajuda de alguém foi retirada a tampa de madeira do “caixote” ainda mina.

Havia uma segunda espoleta MUV soldada no trotil e armada no dispositivo de tracção onde estava atada a outra ponta do cordel. Na tampa da mina estavam pregados grosseiramente alguns pregos que deveriam servir de guia ao cordel para que,  ao desenroscar a tampa de baquelite, a tração do mesmo fosse orientada para que a espoleta fosse accionada e o engenho explodisse. Felizmente isso não aconteceu e,  se assim fosse, como calculam, não poderia hoje estar a contar esta estória.

Posto isto, e para que as estórias contribuam para a História com o máximo de rigor, mais que a corrigir a narrativa do Graça Abreu em que só os autores não correspondem aos acontecimentos ocorridos, ficam-me na memória a série de condutas incorrectas na acção de levantamento da mina que são reveladores da impreparação dos nossos militares e da falta de liderança para algumas acções que, pela sua delicadeza e perigosidade.  exigiam profissionalismo e regras de procedimento rigorosas e aplicadas exclusivamente por especialistas.

Concluindo, após a identificação e  localização da uma mina, esta deveria ter sido detonada no local por especialista de minas e armadilhas,  evitando assim o risco desta estar armadilhada e infringir baixas desnecessárias quer às NT quer à população civil e evitaria também os erros subsequentes que se sucederam.

A mina deveria ter sido desarmada por um especialista que melhor do que eu teria gerido o desarme da armadilha lá colocada.

O mais caricato desta estória foi a mina ter sido depositada na secretaria sobre a secretária do primeiro Xavier que certamente não carecia daquele equipamento para as suas tarefas administrativas.

Por último, o meu próprio erro de manusear uma arma que não me dizia respeito, visto ser atirador de infantaria e não especialista de minas e armadilhas,  e ainda ter ignorado negligentemente que o desarme de uma mina não deveria ser efectuado numa secretaria e onde estavam mais militares que seriam vitimas da minha incúria,  caso a armadilha tivesse funcionado.

Por último as informações militares deveriam ter aprisionado, interrogado e posteriormente controlado quem prestou a informação sobre a localização da mina,  dado o objectivo primeiro da denúncia era para que a mina fosse accionada através da armadilha pois o efeito psicológico dessa acção teria muito maior impacto devido a não ser usual pelo IN.

Felizmente estão cá todos para contar e constatar que às vezes é possível aprender com o erro, noutras nem por isso!

Lisboa, 2016.10.24
Luís Mourato Oliveira



Sítio da CCAÇ 4740 (Cufar, 1972/74), criado por Mário, e donde consta entre outros elementos informativos a história da unidade. Um dos camaradas desta companhia que faz parte da nossa Tabanca Grande é o Armando Faria, ex-fur mil at inf, minas e armadilhas. o António Manuel Salvador, ex-1.º cabo aux enf. Pernso que há mais, cito de cor.



4. Excerto do Diário da Guiné: Lama, Sangue e Água Pura, do nosso camarada António Graça de Abreu  (Lisboa: Guerra & Paz Editores, 2007, 220 pp), com a devida vénia:


Cufar, 11 de Julho de 1973 [pp. 131/132]



Tudo calmo na zona, apenas uma mina anti-carro colocada aqui nas nossas barbas e um pontão que foi pelos ares.



Primeiro. Entre Cufar e o nosso porto grande, no rio Cumbijã, os guerrilheiros não costumavam cair na tentação de pôr minas nos cerca de dois quilómetros de estrada alcatroada. No caminho para o porto existe um desvio, mais um quilómetro em piso de terra que conduz a uma pequena povoação chamada Mato Farroba habitada por umas centenas de africanos e alguns elementos da milícia local, que estão do nosso lado. Pois na terra da estrada, a cinquenta metros da povoação, encontrava-se ontem uma mina anti-carro capaz de fazer voar um camião. Terá sido colocada durante a noite quando a população e os tipos da milícia estavam a dormir, ou talvez mesmo com a conivência da gente de Mato Farroba. Eles não têm viaturas, só ali passam as tropas portuguesas de Cufar que vão lá todos os dias levar materiais e ajudar na construção de novas tabancas. Mas foi a população de Mato Farroba quem descobriu a mina e avisou as NT. 

O capitão da companhia [, a CCAÇ 4740,] foi lá buscá-la, desactivou-a e depois trouxe-a para o seu gabinete. Aqui, ao desenroscar lentamente a tampa para tirar a espoleta, sentiu uma pequena pressão esquisita. Se tivesse continuado a desenroscar, hoje já não tínhamos capitão. A mina estava equipada com um sistema, um fio que conforme se desenroscava a tampa apertava esse mesmo fio que levava a um outro detonador. O capitão desconfiou, levantou cuidadosamente a tampa de madeira e cortou o fio. Salvou a vida. Estive a ver a mina, de fabrico russo, uma caixa de madeira com sete quilos de trotil, um feio instrumento de morte. (...)  
_______________

Notas do editor:



(...) Meu caro acamarada e conterrâneo Luís Oliveira:



Acabo de regressar de Luanda, depois de um dia cansativo: levantei-me às 5h30, cheguei ao ao aeroporto às 7h00 e... embarquei no Airbus 340, do TP 288, às 13h00 (...)

Faço questão de, mais uma vez, te pedir que aceites o meu convite para te juntares à grande fanília da Tabanca Grande, passando a seres o membro nº 625 do blogue. 


 Permito-me discordar da tua opinião segundo a qual as tuas memórias pessoais da Guiné seriam irrelevantes para a historiografia da guerra colonial... Não são, pelo menos não são para mim e para todos aqueles que passaram por Bambadinca e tiveram o privilégio de conhecer os bravos do Pel Caç Nat 52... Ora, tu foste muito simplesmente o último comandante desta subunidade, composta por camaradas guineenses... E do Pel Caç Nat 52 estão cá, na nossa Tabanca Grande, não só o seu primeiro comandante, o Henrique Matos, como também outros que se lhe seguiram, o Beja Santos e o Joaquim Mexia Alves...

Estou demasiado cansado para a esta hora fazer o teu poste de apresentadação. Mas estou seguro que nos vai honrar com a tua presença. De resto, já cumpriste as nossas regras básicas, que é o envio de 2 fotos + 1 texto ou história,

Um abraço. Espero poder encontar-te em agosto na Praia da Areia Branca, na Marteleira ou na Lourinhã. LG

PS1 - Vejo que também estás no Facebook. (...)




(...) Meu caro Fernando, muito obrigado pela coragem de vires, a público, revelar esse segredo, que possivelmente guardavas há muito na tua memória... De qualquer modo, o que nos contas - ao fim destes anos todos - e que deve ter isso um pesadelo para ti e para os demais camaradas que foram feitos reféns, já não era segredo para mim... Já aqui transcrevi, ao de leve, uma conversa que tive, em Monte Real, por ocasião do nosso VII Encontro Nacional, com o último comandante do Pel Caç Nat 52, o alf mil Luis Mourato Oliveira, filho de mãe lourinhanse (...).



Ele também estava em Bambadinca, sentado tranquilamente no bar de oficiais, quando ocorreram os graves incidentes a que te referes... Foi igualmente sequestrado como tu, e mantido como refém até à chegada do brigadeiro Carlos Fabião, que, vindo de Bissau, resolveu o problema com patacão... 


Isto ter-se-á passado não com o Batalhão de Comandos Africanos, como tu sugeres, mas com o pessoal da CCAÇ 21, que era comandada pelo tenente comando graduado Jamanca, e onde havia antigos militares da formação inicial da CCAÇ 12 do meu tempo (1969/71) (...)