Papa Paulo VI (1897-1978), 262º chefe supremo da Igreja Católia (1963-1978). Fonte: cortesia da Wikipédia
Recorte do Diário de Lisboa, nº 17075 Ano: 50 domingo, 5 de julho de 1970, 1ª edição (Director: Ruella Ramos)
Fonte; Portal Casa Comum / Fundação Mário Soares > Pasta: 06615.153.24906 > Fundo: DRR - Documentos Ruella Ramos
O Papa Paulo VI, o primeiro a vir a Portugal, em 1967, no 50º aniversário das aparições de Fátima, não era das simpatias de Salazar, nomeadamente desde a sua visita a Bombaím, em 1963. Recorde-que em em finais de 1961 forças da União Indiana tinham invadido e ocupado os territórios de Goa, Damão e Diu. A visita de Paulo VI a um congresso eucarístico a Bombaím foi vista pelo regime de Salazar, e o próprio Salazar, como uma grave ofensa a Portugal e ao catolicismo português. (****)
Para Amílcar Cabral, este terá sido um dos seus momentos de glória. Numa carta para Carmen Pereira, datada de Conacri, 13 de julho de 1970, comenta os sucessos da diplomacia do PAIGC nestes termos: "No plano internacional, acabamos de ter uma grande vitória contra o inimigo, com a conferência de Roma e com a entrevista com o Papa".
______________Fonte; Portal Casa Comum / Fundação Mário Soares > Pasta: 06615.153.24906 > Fundo: DRR - Documentos Ruella Ramos
Fonte; (1970), "Diário de Lisboa", nº 17075, Ano 50, Domingo, 5 de Julho de 1970, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_6990 (2017-5-11)
1. No dia 1 de julho de 1970, um dia de semana, quarta-feira, o então Papa Paulo VI recebeu Agostinho Neto, Marcelino dos Santos e Amílcar Cabral, na qualidade de dirigentes do MPLA, FRELIMO e PAIGC, respetivamente, reunidos em Roma por ocasião da "Conferência Internacional de Solidariedade com os Povos das Colónias Portuguesas".
No final da audiência, o Papa deu a cada um deles uma cópia em português da carta encíclica "Populorum Progressio" (1968) [Do esenvolvimento dos Povos], documento que continha o pensamento da Igreja sobre a descolonização, a autodeterminação e o desenvolvimento dos povos.
Este acontecimento foi um série revés para a diplomacia portuguesa, embora a Santa Sé tenha procurado depois minizar o significado político da audiência, face aos protestos diplomáticos de Portugal, alegando que os três dirigentes nacionalistas africanos teriam sido recebidos, a título privado e na sua qualidade de católicos...
O acontecimento desencadeou, na altura, uma crise nas relações entre o Governo português e o Vaticano. Anos mais tarde, a Rádio Vaticano vem falar de uma "histórica audiência" que tem que ser vista à luz do Concílio Vaticano II (concluído em 1965) e da Encíclica “Populorum Progressio”, publicada em 1967…
Submetidos à censura, os jornais portugueses da época, tais como o "Diário de Lisboa" ou o "Diário de Notícias" (**), só deram a notícia quatro dias depois.
A Rádio Vaticano recordaria, em 2012, 34 anos depois da morte de Paulo VI, as palavras do cardeal Achile Silvestrini, que em 1970 colaborava com o então Secretário de Estado, o cardeal Agostinho Casaroli, e que, nessa qualidade, acompanhou de perto o processo que levou ao referido encontro do Papa com os três líderes africanos de língua portuguesa. Essas palavras foram proferidas num congresso sobre a figura e obra de Amílcar Cabral, realizado em Roma, na Rádio Vaticano, em 31/12/1999. Nele participaram, além do Cardeal Achile Silvestrini, outras personalides, "nomeadamente, Luís Cabral, primeiro Presidente da Guiné-Bissau independente e irmão do herói guineense" (sic)... (O PAIGC, muito em particular, sempre teve na Itália fortes grupos de apoio à sua luta, incluindo comunidades e personalidades da Igreja Católica).
Achile Silvestrini ajuda-nos a perceber melhor o contexto em que se realizou o encontro do Papa com os 3 dirigentes nacionalitas lusófonos (***):
Achile Silvestrini ajuda-nos a perceber melhor o contexto em que se realizou o encontro do Papa com os 3 dirigentes nacionalitas lusófonos (***):
"Tinha terminado não há muito o Concílio Vaticano e esta Encíclica veio como uma espécie de grande mensagem do interesse e do apoio da Igreja à promoção de todos os povos da África, da Ásia, e também da América Latina, que de algum modo estavam em condições de sujeição: ou de colonialismo, ou de subdesenvolvimento, ou de uma coisa e outra. Uma grande Encíclica que ainda hoje se lê com enorme admiração, porque foi um passo enorme.
"Na minha experiência, que tive, se tivesse que dizer quais são os dois grandes acontecimentos da vida da Igreja nos últimos 50 anos, diria sem dúvida: o Concílio Vaticano II (sobre o qual estamos todos de acordo), mas o outro acontecimento paralelo é a descolonização.”
O Papa Paulo VI, o primeiro a vir a Portugal, em 1967, no 50º aniversário das aparições de Fátima, não era das simpatias de Salazar, nomeadamente desde a sua visita a Bombaím, em 1963. Recorde-que em em finais de 1961 forças da União Indiana tinham invadido e ocupado os territórios de Goa, Damão e Diu. A visita de Paulo VI a um congresso eucarístico a Bombaím foi vista pelo regime de Salazar, e o próprio Salazar, como uma grave ofensa a Portugal e ao catolicismo português. (****)
Para Amílcar Cabral, este terá sido um dos seus momentos de glória. Numa carta para Carmen Pereira, datada de Conacri, 13 de julho de 1970, comenta os sucessos da diplomacia do PAIGC nestes termos: "No plano internacional, acabamos de ter uma grande vitória contra o inimigo, com a conferência de Roma e com a entrevista com o Papa".
Notas do editor:
(*) Último poste da série > 7 de abril de 2017>
Guiné 61/74 - P17215: (De) Caras (70): A lavadeira Miriam e o furriel Mamadu... Comentários: da misogenia ao levirato, da tragédia da infertilidade feminina ao sexo em tempo de guerra...
(**) Vd. poste de 12 de maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6374: Recortes de imprensa (25): Há 40 anos o Papa Paulo VI recebia em audiência privada, em 1 de Julho de 1970, Amílcar Cabral, Agostinho Neto e Marcelino dos Santos (Luís Graça)
(***) Rádio Vaticano > 7/8/2012 > Histórica audiência de Paulo VI, em 1970, aos líderes africanos dos Movimentos de libertação. O testemunho do Cardeal Silvestrini. Ouça
(****) Rádio Renascença > Filipe d'Avillez > 8 de maio de 2017 > Os papas e Portugal: Paulo VI, o Papa que tratou Salazar por "sua eternidade"
(****) Rádio Renascença > Filipe d'Avillez > 8 de maio de 2017 > Os papas e Portugal: Paulo VI, o Papa que tratou Salazar por "sua eternidade"