domingo, 22 de julho de 2007

Guiné 63/74 - P1981: Antologia (60): Assassinato de Amílcar Cabral: O PAIGC, os russos e a Guiné-Conacri (José Milhazes)


1. Texto enviado pelo nosso camarada Jorge Santos, com data de 11 de Julho último:


Envio em anexo um artigo de José Milhazes sobre a Operação do contra-torpedeiro soviético Experiente, na Costa da Guiné, onde atracou em Novembro de 1972.

Cumprimentos

Jorge Santos


2. Artigo do conhecido jornalista português, José Milhazes que vive na Rússia há mais de 30 anos (1) e que tem um blogue chamado Da Rússia:


Da Rússia, blogue de José Milhazes > 30 de Maio de 2006 > Contributos para a História de Portugal - 6 > A Operação do Experiente na Costa da Guiné

O assassinato de Amílcar Cabral, dirigente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), na cidade de Conacri, capital da República da Guiné, a 20 de Janeiro de 1973, continua envolvido em muito mistério, mas a chave de alguns segredos encontram-se nos arquivos ou nos testemunhos de militares soviéticos que acompanharam esse acontecimento de perto.

Em Novembro de 1972, a pedido do Governo da Guiné (Conacri), no porto de Conacri atracou o contra-torpedeiro soviético Experiente (Бывалый), da Armada do Norte, que devia patrulhar a costa desse país africano. O navio de guerra era comandado pelo capitão de fragata Iúri Ilinikh.

Na noite de 20 para 21 de Janeiro de 1973, entraram inesperadamente no Experiente o comandante das Forças Armadas da Guiné Conacri e o conselheiro militar soviético, o major-general Fiodor Tchetcherin. Eles trouxeram a notícia que, por volta das 23 horas, numa das ruas de Conacri, um grupo de desconhecidos tinha assassinado A. Cabral. A sua esposa e alguns membros do Comité Central do PAIGC foram feitos prisioneiros e levados para lanchas que se dirigiram para a Guiné Portuguesa.

As visitas inesperadas pediram, em nome do Presidente do país, Séku Turé, e do embaixador soviético em Conacri, A. Ratamov, ao capitão de fragata que fizesse sair o Experiente a fim de capturar as lanchas.

Às 0 horas e 50 minutos do dia 21 de Janeiro, o contra-torpedeiro pôs-se em marcha com marinheiros soviéticos e soldados guineenses a bordo. Ilinikh enviou para o Estado-Maior da Armada Soviética vários relatórios, mas apenas recebeu instruções para não empregar armas.

Às 5 da manhã, foram detectadas duas das três lanchas que saíram de Conacri. O contra-torpedeiro aproximou-se de uma lancha e prendeu-a com cordas. A segunda lancha rendeu-se ao ver-se na mira de canhões de 130 milímetros. Soldados guineenses entraram nas lanchas, libertaram os reféns, desarmaram os seus ocupantes e conduziram-nos para o Experiente.

Às 15 horas, o contra-torpedeiro regressou a Conacri, rebocando as duas lanchas. A terceira foi capturada por soldados guineenses.

Primeiramente, Iúri Ilinikh foi afastado do cargo devido a ter actuado sem autorização de Moscovo, mas, depois do relatório do major-general Tchitcherine, Ilinikh recuperou o comando do Experiente e recebeu elogios pelas suas "acções ousadas e decididas".

Fonte da ilustração: Da Rússia > Blogue de José Milhazes (com a devida vénia...)

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Nota de L.G.:

(1) Nota autobiogáfica de José Milhazes:

(i) José Manuel Milhazes Pinto nasceu a 2 de Outubro de 1958 na Póvoa de Varzim.

(ii) Começou os estudos secundários na Ordem Missionária dos Combonianos, mas terminou-os no Liceu Eça de Queirós da terra natal.

(iii) Em 1977, parte para a União Soviética a fim de cursar História da Rússia e assistir à “construção do comunismo”.

(iv) Tendo bem mais sorte do que muitos outros estudantes portugueses que foram mandados para os “confins do Império”, pôde levar a cabo os seus estudos na Universidade Estatal de Moscovo (Lomonossov).

(v) Formado em 1983, constituiu família e ficou a residir na URSS, dedicando-se à tradução de obras literárias (Tolstoi, Turgueniev, Erofeev), e políticas (Brejnev, Andropov, Tchernenko, Gorbatchov), bem como de filmes de ficção de língua russa para português.

(vi) A 8 de Agosto de 1989, escreve a primeira crónica para a TSF e, no ano seguinte, com o lançamento do Público, torna-se seu correspondente em Moscovo.

(vii) Em 2002, começa também a colaborar com a SIC.

(viii) A longa permanência na União Soviética e, depois, na Rússia, permitiu-lhe assistir e participar num dos períodos mais agitados do séc. XX: a queda da “cortina de ferro” e a formação de novos Estados no Leste da Europa.

(ix) O gosto pela História e a vontade de aprofundar o estudo dos “laços entre o Partido Comunista Português e o Partido Comunista da União Soviética” leva-o a realizar trabalhos de investigação nos arquivos soviéticos para o Instituto de Ciências Sociais da Universidade Clássica de Lisboa e Fundação Mário Soares.

(x) Actualmente, nas poucas horas livres de que dispõe, prepara a sua tese de doutoramento na Universidade do Porto sobre as "Influências do liberalismo português e espanhol no movimento dezembrista russo de 1825".

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