terça-feira, 20 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6767: Controvérsias (98): O QP não desapareceu (e eu não fui lorpa), apenas reduziu o seu contributo, porque... não há omeletas sem ovos (Morais da Silva, ex-Cap Art, CCAÇ 2796, Gadamael, 1970/72)


Paisagem, pintura de Augusto Trigo (n. 1938). Em exposição no hall de um banco, em Bissau, o BCAO. Com a devida vénia ao pintor (que vive actualmente em Portugal), ao Rui Fernandes (autor da foto) e à AD - Acção para o Desenvolvimento (que detém os direitos da imagem no seu site Guiné-Bissau). Parafraseando o título do poste do nosso blogue, de 6 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2244: Cusa di nos terra (12): Ainda vi burros em Bafatá (Beja Santos), o nosso leitor (e camarada de armas) Morais da Silva diz que não é nem quer passar por... lorpa. (LG)


1. Mensagem do Cor Art Ref Morais da Silva:

Caro Luís Graça

Confesso-me farto de ser considerado lorpa pois continua a haver quem julgue que a malta do QP não andava de olho em cima das escalas de mobilização para evitar ou, no mínimo, dissuadir os chicos espertos que sempre existem.

Jorge Canhão concluiu agora que, afinal, só a partir de 1971/72 o QP se baldou embora acrescente que esta "reviravolta" coincide com o agravamento da guerra (opinião dele que não minha). É pena que em tempo útil não o tenha dito mas, paciência.

Resolvi ver os números outra vez e rebater o que diz Jorge Canhão.

Se soubesse o e-mail deste, endereçava-lhe o artigo e solicitava-lhe uma resposta (**). Mas como não o encontro,  anexo o que escrevinhei para publicar, se o entender conveniente.

Abraço do artilheiro

MS

2.  A propósito do poste P6374, de Jorge Canhão (**)
por Morais da Silva

Esta é a segunda vez que entro no blogue, acolhimento que agradeço, para esclarecer o que julguei já estar esclarecido.

Levar a cabo o estudo sobre o "Comando de Companhias de Combate em África" (***)  foi uma obrigação que me impus quando deparei com a afirmação de que "os oficiais do QP tinham fugido da guerra". Como já confessei, fiquei atónito, porque tal teria acontecido nas minhas barbas e eu, distraído, tinha andado a dar o corpo ao manifesto enquanto na minha "confraria" vigorava a regra da balda. Em resumo, teria sido um lorpa. Reagi, decidi ir à procura de números fiáveis e recuperei a paz de espírito. Afinal, como sempre pensei, eu não fui excepção antes fui a regra.

Regressado ao estudo e ao remanso do meu site eis que Jorge Canhão me informa:

"Globalmente o QP não fugiu das Companhias Operacionais mas quando a guerra se agravou em 1971/72 o QP DESAPARECEU QUASE POR COMPLETO".

Valha-me Santa Bárbara apesar de, agora, só trovejar na ponta final da guerra mas com a agravante do anátema do "cagaço". Imaginem o meu desassossego. Será que fiz o trabalho direitinho até 71/72 e depois o raio do software que fiz me induziu em erro e afinal fui mesmo um lorpa? Jorge Canhão só diz "Quase por completo". Qual será o valor que atribui a "Quase"? Porquê 71/72? A guerra agravou-se? Mas antes tinha sido uma pêra doce?!

Vamos aos números.

Jorge Canhão resolve tratar a base de dados de que dispõe (e que suponho ser a que foi publicada pelo Correio da Manhã nos Cadernos da Guerra Colonial) no momento da mobilização das companhias operacionais ou seja, em cada ano identifica as companhias que foram mobilizadas e agrega-lhes todos os capitães que as comandaram ao longo da comissão (Cap QP ou Mil).

No meu trabalho digo que, companhias com comando único (mesmo capitão durante toda a comissão), foram 83% em Angola e Moçambique e apenas 66% na Guiné. Face a estes números melhor seria tratar apenas companhias com comando único dada a dimensão da amostra. Mas, adiante.

No conjunto dos 3 TO Jorge Canhão conclui que, em 1971, 53% dos capitães "mobilizados com as companhias" são capitães QP e que tal percentagem desce para 19% em 1972 e para 12% em 1973, subindo para 20% em 1974. Aqui chegado Jorge Canhão conclui: "No entanto, quando a guerra se agravou (precisamente a partir dos anos 1971/72), os Capitães do Quadro Permanente "DESAPARECERAM QUASE POR COMPLETO" dos cenários das Companhias de Combate".

Ora só se pode dar como desaparecido aquilo que existe mas nestas "coisas" se algo desaparece é preciso encontrá-lo para que sirva de contraprova. Lá parti eu em busca detalhada e olhando para os meus números constatei o seguinte:

"Desaparecimento" do QP em 1972" - O que eu sei sobre este ano

- estão em combate 277 capitães do QP (46% do total de capitães em combate)

- este efectivo em combate representa 31% do stock existente de capitães QP (885 Cap. QP); era de 34% em 1971 havendo pois a registar uma quebra de 3% no empenhamento do stock

- não só não houve promoções a capitão em 1971, para alimentar o stock, como este baixou 149 capitães (1034 em 1971; 885 em 1972). A quebra de 149 capitães nos 1034 representa 14%. Compare-se esta quebra de stock do QP com a quebra de 3% do parágrafo anterior e digam-me lá onde está o desaparecimento

"Desaparecimento" do QP em 1973- O que eu sei sobre este ano

- estão em combate 178 capitães do QP (30% do total de capitães em combate)

- este efectivo em combate representa 23% do stock existente de capitães QP (779 Cap. QP) ou seja há uma quebra de 8% no empenhamento do stock

- não só não houve promoções a capitão em 1972, para alimentar o stock, como este baixou 106 capitães (885 em 1972; 779 em 1973). A quebra de 106 capitães nos 885 representa 12%. Compare-se esta quebra de stock com a quebra de 8% do parágrafo anterior e digam-me lá onde está o desaparecimento

"Desaparecimento" do QP em 1974 - O que eu sei sobre este ano

- estão em combate 119 capitães do QP (21% do total de capitães em combate)

- este efectivo em combate representa 21% do stock existente de capitães QP (580 Cap. QP) ou seja há uma quebra de 2% no empenhamento do stock

- houve promoções a capitão em 1973 para alimentar o stock mas, apesar disso, este ainda baixou 99 capitães (779 em 1973; 580 em 1974). A quebra de 99 capitães nos 779 representa 13%. Compare-se esta quebra de stock com a quebra de 2% do parágrafo anterior e digam-me lá onde está o desaparecimento

Fica demonstrado, mais uma vez, que o QP não desapareceu (e eu não fui lorpa) mas que apenas reduziu o seu contributo porque não há "omeletas sem ovos".

Repito o que já disse mas pelos vistos sem sucesso.

De 1970 a 1974 o stock de capitães do QP passou para quase metade (52%). Se os encargos fixos se mantiveram (unidades, estabelecimentos e órgãos da metrópole; unidades de guarnição e centros de instrução em África) e os de combate também, como não esperar as quebras verificadas?

Por que carga de água se recorreu à formação laboratorial de capitães milicianos e se deu à luz o célebre decreto de 1973 sobre o acesso à AM [, Academia Militar] ? Diversão da tutela ou tutela entalada perante uma Guiné e Moçambique a pedirem mais meios e uma AM a dar conta da sua impotência?

Uma nota derradeira.

Estou pronto a colaborar com Jorge Canhão, se este o desejar, para afinar a listagem das companhias presentes a partir de 1971 e clarificar a razão da pesada discrepância (145 companhias) que aponta: eu contabilizo um efectivo anual presente nos 3 TO na ordem das 475 e Jorge Canhão indica 330.

Discordo completamente dos resultados da pg. 1. Por exemplo, no grupo A, parte dos capitães avançou ainda em finais de 1968, princípio de 1969; a outra parte avançou em finais de 1969. A 1ª fatia regressou no final de 1970 e a segunda nos fins de 1971 tendo sido mobilizados novamente na segunda metade de 1972 (1ª fatia) e início de 1973 (2ª fatia).

Assim sendo o grupo A está mal definido não podendo ser rodado em conjunto e muito menos com o grupo C que é mobilizado em meados de 1971.

A organização dos conjuntos e a sua inserção na fita do tempo está errada pois parte do pressuposto da rotação contínua (mas o pessoal tinha que descansar e preparar nova etapa o que consumia, em regra, 1.5 a 2.5 anos ao longo da campanha).

Definitivamente, tenho dito.

António Carlos Morais da Silva

 antoniocmsilva@netcabo.pt
http://www.moraissilva.com/

[ Fixação / revisão de texto / bold a cor / título: L.G.] (****)

_______________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 14 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6734: Controvérisas (96): No período de 1972/75, a proporção de capitães milicianos, comandantes de companhias combatenntes em África, era de 83 em cada 100 (Jorge Canhão, ex-Fur Mil At Inf Op Esp, 3ª C/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74)

(**) Foi dado, ao Jorge, conhecimento prévio do teor do mail do Morais da Silva. Não foi possível obter um comentário seu em tempo útil. Presume-se que esteja de férias ou ainda não tenha visto a caixa de correio. Recorde-se que o nosso camarada e mui querido amigo Jorge Canhão também conheceu Gadamael, a ferro e fogo, em Junho de 1973.

(***) Vd. poste de 15 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6596: Estudos (1): Guerra de África - O QP e o Comando das Companhias de Combate (António Carlos Morais da Silva, Cor Art Ref) (VI e última parte)

(****) Último poste desta série > 18 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6759: Controvérsias (97): Ainda... muito a tempo (José Belo)

12 comentários:

mario gualter rodrigues pinto disse...

Caro Sr. Coronel Morais da Silva


Será que as Galinhas da capoeira dos Of. Q.P. deixaram de dar ovos!

Ou as galinhas do COM começaram a dar ovos a mais?

Cumprimentos


Mário Pinto

Anónimo disse...

Caro Mário
Aqui vai um conselho de amigo: "Quando nada se tem a dizer o calado é o melhor".
João Mendes

Anónimo disse...

E o mais bonito!
Vasco Barata

J. Simões (Fur. MIL. em Angola 67-69) disse...

Até parece que é alguma mentira aquilo que o camarada Mário Pinto disse. Hoje é a mesma coisa: muitos bons oficiais contratados mandados embora ao fim de seis anos, só porque não são da Academia.
Ontem e hoje chama-se corporativismo. PONTO FINAL.

Anónimo disse...

Simões, contratos são contratos. Não vão embora porque não são da Academia. Vão embora porque... acabaram o contrato. Dá para perceber que não há corporativismo.?
A Academia, todos os anos, abre as portas aos jovens que queiram concorrer.
Quem tem razão é o Mendes.
Se nada tem a dizer,porque não sabe ou tropeça no ouvi dizer, não "bote bojarda".
PONTO FINAL PARÁGRAFO.

V.Barata

Hélder Valério disse...

Caros camaradas

Para além das afirmações dos pontos de vista pessoais (por mais legítimos que sejam e certamente serão, até porque vivemos em democracia...) há alguma possibilidade de alterar o que se passou e que 'se poderia ter passado', por isto e por aquilo?

Pessoalmente não considero vantajosa esta aparente querela que, sem pretender ou não, parece querer dividir de forma animosa os elementos do QP e os MIL.

É uma inutilidade, na minha opinião, e poderá constituir-se numa brecha por onde entrem os inimigos do Blogue, aqueles que pretendem que não haja unidade dos 'ex-combatentes', já que essas conjungações de vontades podem ser perigosas, podem colocar em causa algum 'estado de coisas'.

Pode-se trocar pontos de vista, discutir argumentos, apresentar 'evidências', ter 'convicções' mas acho preferível que se dialogue em vez de se esgrimir.

Como disse, é a minha opinião.

Abraço
Hélder S.

Anónimo disse...

Hélder
Há mesmo uma querela e esclarecê-la é bom para todos. Mas esclarecer é apresentar argumentos (como o fazem o Jorge Canhão e o Morais Silva). Não é bojardar quando nada há para dizer como é o caso do Pinto e do Simões que têm a mania que são fracturantes!
V.BaArata

Anónimo disse...

E tantos postes a lamentarem o facto de haver poucos ex-combatentes do QP a participar no blogue...
Plenamente de acordo com o Hélder e o Barata (que me parece estarem na mesma linha de pensamento): argumentar e não "combater".
Abraço,
Carlos Cordeiro

mario gualter rodrigues pinto disse...

Caros camaradas

A meu ver quem se expressou em tons de ( ovos, omoletes e lorpas) foi o Sr. Coronel Morais da Silva no seu post, em resposta ao camarada Jorge canhão. Eu limitei-me a comentar no mesmo tom.

Mas já agora para os esclarecidos gostaria de deixar uma pergunta:

Para onde iam os Cadetes da AM quando acabavam o curso, e promovidos a Of.?

Que eu saiba não iam parar ás Companhias de Combate, como Comandantes de pelotão como acontecia aos do COM.
Portanto havia ovos mas não havia omoletes.

Segunda questão:
Quando por decreto do Ministério do Exército, de 20 de Junho de 1970 se criou o Curso de capitães Milicianos, que chegaram a formar 260 Capitães Milicianos por ano por conjugação dos dois métodos existentes(EME,B,1988:321).
Já havia ovos para as omoletes necessárias.

Não havia era Of.QP


Um abraço


Mário Pinto

Anónimo disse...

Durante a guerra os alferes (e tenentes) QP foram mobilizados e sempre para companhias decombate (ver post 6773, como exemplo).
Só parte dos cursos da Academia de 1960, 1961 e 1962 é que o não foram por razões que o Pinto vai ter que descobrir para se entreter com alguma coisa que não seja o bota abaixismo doentio contra o QP.

Cumprimentos
João Mendes

Carlos Vinhal disse...

Camaradas
Tenho estado a acompanhar esta "saudável" e "esclarecedora" discussão.

Por mim podem terminá-la, porque estou devidamente (des)esclarecido. Os oficiais do QP baldaram-se à guerra colonial, ou só meia-dúzia deles (?). Que acrescenta isto a uma guerra que acabou há quase 40 anos? E se discutíssemos as implicações das negas dos colaboradores de D. Afonso Henriques na Batalha de Ourique, a ponto de o nosso herói ter de recorrer a forças celestes?

Quem não se lembra de colegas de trabalho que eram uns baldas a viverem à custa dos que trabalhavam?

Porque não discutimos a disponibilidade dos camaradas do QP que no nosso Blogue colaboram ombro a ombro na feitura das nossas memórias? Qual dos camaradas do QP constante da nossa longa lista é menos digno que qualquer dos milicianos que dela também fazem parte. Digam um nome?

Haja pachorra para aturar os bota-abaixo. A paciência tem limites, pelo menos a minha.

Abraços
Carlos Vinhal

Anónimo disse...

Os bota abaixo têm nome e aos editores compete serem claros no cumprimento do estatuto do blogue.
Atirar ao acaso, metendo todos no mesmo saco,é nivelar por baixo...
Barata