1. Mensagem do nosso camarada Jorge Araújo (ex-Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974), com data de 24 de Setembro de 2014:
Caríssimo Camarada Luís Graça,
Espero que estejas já na plenitude da mobilidade, após a intervenção cirúrgica.
Na sequência do meu comentário ao P13645, sobre a História do BART 3873, do qual fazia parte a minha CART 3494, e conforme prometido, anexo algumas fotos do Natal/1972, para os devidos efeitos.
Porque a gestão do tempo da vida académica não é tarefa fácil, voltarei à V. companhia logo que possível.
Um abraço,
Jorge Araújo.
Fur Mil Op Esp / Ranger, CART 3494
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Nota de M.R.:
Vd. Também o último poste desta série em:
30 DE DEZEMBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10879: O meu Natal no mato (40): O Presépio da CCAÇ 2444 em 1968 em Bissorã (João Rebola)
17 comentários:
Boas, caro Jorge Araújo.
Vejo nestas fotos, um grande refeitório, bem equipado, todos os militares devidamente fardados, com a presença de vários oficiais de altas patentes e incluindo a esposa do CMDT, festejando o Natal 1972, no Xime.
Eu pergunto, estas fotografias forem tiradas no Xime?.
Quando a minha CART 2479 desembarcou no Xime, em Fev/1969, foi como nos parecesse que estávamos 'dentro' do filme 'Apocalipse Now' e vou repetir o que já escrevi no nosso Blog :... Chegamos ao Xime. Xime, zona de guerra, que parecia uma terra de cowboys, só visto no cinema, com uns casebres velhos e esburacados (de ataques?), ruas de terra poeirenta e cães escanzelados cheios de moscas, com os tropas em cabelo, comprido e grandes patilhas, alguns sem camisa, só em calções e chinelos, com uma cor bronze-amarelada, agarrados às pretas, alguns com os camuflados cortados às tirinhas, estilo Bufallo Bil, e sem se notar ninguém a comandar. Grande choque para todos nós....
Agora, vendo estas fotografias fico também espantado e pergunto: será o mesmo Xime ?
Um abraço
Valdemar Queiroz
Talvez valesse todas as penas abrir aqui uns postes com os testemunhos nossos ou das nossas esposas que, tiveram a coragem e o amor, de nos acompanhar na Guiné. Grandes mulheres, quiseram sempre estar connosco.
Sei do que falo. Mesmo quando foi possível, jamais a minha esposa portuguesa quis voar para junto de mim, para os meus braços, com pólvora e sangue à minha volta.
Agora, aos 67 anos, compreendo tudo, mas jamais vou aceitar.
Depois veio a China, com mil sortigéliios e as meninas de jade e de seda.
Abraço,
Antóniop Graça de Abreu
Faço das palavras do Valdemar, meu camarada da Cart.2479, as minhas.
Cuata-me a acreditar que estas fotos no Xime seja realidade. No entanto, eu que passei por lá em FEV.69, como relata o Valdemar, fui pela ultima vez ao Xime em fins de 70,e onde fui por certeza mais de dez vezes,já existia uma estrada alcatroada,vindo de Bambadica, que deve ter dado outra comodidade aos militares.
Como é que havia tantas amarelas, e uma senhora esposa de um oficial, naquele fim do mundo.Desculpem-me a minha observação, mas custa a acreditar.
Conheci muito bem o Xime, entre Junho de 1969 e Agosto de 1971.
As instalações parece que melhoraram e muito.
Foi para mim uma surpresa deparar com o Cap.Luciano Costa, meu velho Amigo e Colega.Não sabia que lá tinha estado.
Abraço.
J.Cabral
Estranho como é possível colocar em dúvida as fotos do Jorge. Estive no Xime na CCÇ 12 de abril de 73 até dez do mesmo ano e confirmo a veracidade das fotos.
António Duarte
Cart 3493 e ccaç 12
Caros camaradas
Este artigo, com as suas fotos e os comentários que já suscitou, permite dizer o seguinte:
A realidade num determinado momento não é (ou não foi) a mesma antes nem em momentos subsequentes.
Isso tem sido dito por aqui, tem-se visto e, em princípio, será de fácil entendimento e aceitação.
Por isso atrevo-me a dizer, em particular ao camarada António Duarte, que na minha leitura ninguém está a por em causa a veracidade das fotos do Jorge, estão assim a demonstrar a sua perplexidade pela evolução, neste caso favorável, e até agradados com o que se vê.
Em complemento devo dizer que passei pelo Xime mas não posso dizer que estive no Xime, já que essa passagem foi quase directa até embarcar na Bor, pelo que não posso atestar a situação em Abril de 71.
Quanto à sugestão do Graça de Abreu é interessante mas penso que difícil de concretizar. Já vi por aqui algumas colaborações da "Ni", que acompanhou o Henrique Cerqueira e sei que há mais jovens que na ocasião estiveram ou foram até à Guiné, com duração e localização variável, mas não me parece que se consigam 'mobilizar' para descrever essas experiências.
Abraço
Hélder S.
Camaradas...
Sou ex Fur. Milº do 20º Pel. de Art. Manuel Lino, colocado no Xime onde estive de Ago 72 a Jul 74.
Não acho de bom tom colocar em dúvida as imagens e as palavras de colegas nossos que têm prezado pela verdade e realidade dos factos passados no Xime, com a Cart 3494.
Tudo o que está escrito e dito neste post é verdade e eu testemunho pelo simples facto de ser um dos presentes nas fotos juntas.
Um abraço
Manuel Lino
Jorge:
Sem dúvida que o comandante do teu batalhão e sobretudo a sua esposa merecem todo o nosso respeito e apreço... Ir passar o Natal ao Xime era um ato de coragem e de grande dignidade!... È certo que já havia estrada alcatroada, que nos custou, a muitos de nós, sangue, suor e lágrimas... Mas, mesmo assim, o Xime não era pera doce...
É uma foto rara e insólita!
Eu entendo a estranheza e até a perplexidade dos nossos camaradas Valdemar Silva [ou Queiroz] e Abílio Duarte, da CART 2479/CART 11 (mais tardde CCAÇ 11) que chegaram uns meses antes de min, e foram dar instrução de recruta, em Contuboel, aos meus futuros soldados (CCAÇ 2590/CCAÇ 12)...
Eu próprio já aqui relatei, em verso, no poema "Por Esse Geba Acima", o meu choque ao desembarcar, de LDG, no Xime, em 2 de junho de 1969...
O Xime do Natal de 1972 não seria o mesmo do Xime de junho de 1969, mas continuava a ser o aquartelamento mais atacado e flagelado do setor L1...
Aqui vão as minhas impressões do Xime de meados de 1969, subsetor onde minha CCAÇ 12 dei e levou muita porrada, e de que eu próprio as mais duras recordações....
Por esse Geba acima (excerto)
(...) E eis que chegas agora,
ao primeiro porto, seguro,
um porto fluvial,
num sítio chamado Xime,
sem qualquer tabuleta que o identifique,
um pontão acostável,
meia dúzia de estacas no lodo,
caranguejos de um só pata
devorando a íris dos pobres dos mortos
arrastados pela fúria do macaréu,
uma guarnição militar a nível de companhia
com um destacamento no Enxalé,
do outro lado do rio e da bolanha.
Aqui começa o Geba Estreito, o Xaianga,
avisam-te, e mais à frente é o Mato Cão,
que irás conhecer como a palma da tua mão,
um leito de rio incerto, sinuoso, viscoso,
como o corpo de uma serpente,
em que ficas ao alcance de uma granada de mão,
nas curvas da morte…
– Xime, meu amor! – nunca o dirás
em nenhum aerograma,
pela simples razão
de que nunca escreverás
nenhum aerograma a ninguém,
o Xime é uma bandeira das cinco quinas ao vento,
descolorida, esfarrapada,
gente brava, lusitana,
três obuses Krupp, alemães, de 10 ponto 5,
do tempo da II Guerra Mundial,
silenciosos mas ameaçadores,
meia dúzia de casas de estilo colonial,
de adobe e chapa de zinco,
e mais umas escassas dezenas de cubatas de colmo,
poilões e mangueiros,
ruínas dum antigo posto administrativo,
restos de uma comunidade mandinga,
gente que não é de inteira confiança,
dir-te-ão mais tarde os teus soldados fulas,
vestígios de um decadente entreposto comercial,
cercados de holofotes,
arame farpado,
espaldões,
valas,
abrigos,
a estrada cortando ao meio a tabanca e o aquartelamento,
dois irmãos siameses condenados a viver e a morrer juntos…
– Bem vindos, piras,
camaradas,
amigos,
ao primeiro dia do inferno
que vai ser o resto das vossas vidas! –
Alguém, um velhinho, cacimbado,
da CART 1746,
apanhado do clima,
desgraçado,
que ouves com temor e reverência,
escreveu numa daquelas paredes de adobe,
desboroadas,
de cores desbotadas (...)
E o poema prossegue:
(...) E ali vais tu, meio acagaçado, meio curioso,
disposto a salvar o coiro, o corpo,
mesmo perdendo a alma,
alinhado ma non troppo,
desformatado,
violentado na tua consciência,
o quico bem enterrado até às orelhas,
entre filas de velhinhos, brancos e pretos,
de lenços garridos ao pescoço,
com ar de fadistas,
a palhinha de capim ao canto da boca,
como o estereótipo do chulo do Bairro Alto,
fingindo fazer um cordão de segurança no mato,
até à famigerada bolanha de Madina Colhido,
a caminho de Bambadinca,
a próxima paragem… (...)
... Até que chego a Contuboel, o "paraíso" (mesmo que que vai viver em tendas durante mês e meio):
(...) A ti, apanharam-te como um cão, danado,
e soltaram-te nesta terra,
de azenegues e de negros,
para lhes morderes as canelas, em tempo de guerra…
– Dog, dog, if turra comes back,
jampa-lhas às pernas –
diz o calafona que ia a meu lado.
Até o humor do meu companheiro de viagem é deslocado…
Viemos no mesmo camarote, no T/T Niassa,
a tresandar a óleo e a vomitado…
Vais agora mais descontraído,
sem pena nem tema,
numa surpreendente estrada alcatroada,
entre Bambadinca e Bafatá…
Vais gozar as delícias do sistema,
meu safado,
mesmo que o depois de amanhã seja danado:
– Contuboel – dizem-te – é um eldorado…
Guiné, rio Geba, 2/6/1969
Há mais camaradas da CART 3494 que podem validar estas fotos... Por exemplo, o Sousa de Castro, que foi o 1º camarada a formar, comigo, a Tabanca Grande, na altura chamávamos-lhe simplesmente Tertúlia... Ele sempre foi tratado aqui com o tertuliano nº 2...Foi o primeiro a parecer em 2005...
Mas o Jorge Araújo é um camarada que já deu provas mais do que suficientes da sua grande honestidade intelectual e da sua identificação com (e do seu respeto por) as regras editoriais deste blogue...
O João Ruivo Fernandes também deve ter estado nesta ceia de Natal... O Serradas Pereira aparece de costas, de acordo com a legenda...
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2013/02/guine-6374-p11090-tabanca-grande-396.html
Caro Jorge Araújo.
Que fique bem claro que eu não tenho a menor duvida quanto á veracidade dos fotografias do Natal de 1972-CART 3494, no Xime. Era que mais faltava.
Agora reparo que se trata do dia de Natal e não da ceia de Natal.
Mas, o meu espanto continua.
Um abraço
Valdemar Queiroz
Caros amigos,
Antes demais devo perguntar; Como podem avaliar estas fotos dizendo que as instalações são boas? Nas fotos não é o que pareçe, por outro lado ninguém pode por em causa a veracidade das fotos, elas são na realidade feitas no Xime, na 1ª foto vemos o comando com sua esposa que se deslocou de Bambadinca para confraternizar com a companhia mais sofrida do Batalhão, na messe dos oficiais.
SC
Conheci o Xime em janeiro de 73 poucos dias depois desse "lauto" jantar e não sabia que iria ser em breve o meu poiso durante uns meses. A cor da água do rio e especialmente as margens nada tinham de apelativo.Não era um lugar que impressionasse, mas ter o rio aos pés ajudava especialmente quando o vai e vem da LDG quebrava a rotina. Havia sempre a esperança de vir ou ir para a peluda um amigo, um conhecido, um conterrâneo.
Mas o pessoal todo aprumado faz sentido sim senhor! Porque em janeiro de 73, recordo-me que em Bambadinca, sede do batalhão, um major, que acho que era de informações, "recomendou" que às refeições na messe os quadros se apresentassem de farda nº2 com gravata, e dava o exemplo,a gravata devia entrar na camisa entre o segundo e 3º botão. "O que fazia todo o sentido tendo em conta o clima". Eu olhava para o homem sem saber o que dizer daquela ideia que nos meus 22 anos me parecia tão ridícula, tal como hoje a continuo a achar. Felizmente nós, a malta da 12, tínhamos o "estatuto" de ter a messe separada e não tivemos que amochar.
Era desta pequenas coisas que também se fazia a guerra. Hoje, pelo que li aqui, ainda são os pequenos pormenores a criar a polémica. Concluindo, todos os que por lá passamos ficamos marcados pelo Xime. Obviamente uns mais do que outros. É apenas uma questão de sensibilidade, tal como aqui.
joao silva ccaç 12,
1973
Olá Camaradas
Eu não estou nem poderia estar nestas fotos, pois saí do XIME em OUT72.
Estas fotos são autenticas e é visível a roulotte em que eu vivi naquela"bendita" localidade.
O sítio era deveras mau no que respeita a instalações e há largas fotos disso. Não me foi possível melhorar nada ou quase nada por falta de apoios. Havia, como se recordam, nessa altura a ideia de que quem quisesse viver melhor estava armado em barão...
Aos camaradas que duvidam lembro que "cognac é cognac e serviço é serviço".
Por isso e para que o Homem se sinta Homem é necessário ter estas pequenas atitudes. De outra forma ficamos cada vez mais canibais
Um Ab.
António J. P. Costa
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