terça-feira, 26 de julho de 2022

Guiné 61/74 - P23462: A nossa guerra em números (19): Meios e operações da FAP - Parte I: número e tipo de aeronaves: helicópteros, aviões de combate, de transporte e outros



Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2022)

1. Parece haver menos informação sobre a Força Aérea  (bem como sobre a Marinha) do que sobre o Exército, relativamente à sua atividade operacional e os meios utilizados na guerra do ultramar / guerra de África / guerra colonial. 

Lá teremos de voltar a utilizar a informação recolhida e tratada pelo Pedro Marquês de Sousa, Tenente Coronel, do Exército, na reserva, doutorado em história pela FCSH / Universidade NOVA de Lisboa (2014), autor do livro "Os números da Guerra de África" (Lisboa, Guerra & Paz Editores, 2021, 381 pp.). É uma fonte valiosa, desculpando-se os inevitáveis pequenos erros, lapsos e gralhas que acontecem em trabalhos desta natureza.

Tem este autor cerca de 30 páginas sobre os meios e operações da Força Aérea (pp. 225-258). Interessa-nos apenas a parte relativa à Guiné, como é óbvio. Com a devida vénia, vamos repescar então alguns números sobre esta matéria.

Nos quadro I e II, acima inseridos, e por nós construídos, faz-se um resumo da quantidade e tipo de  aeronaves que operaram na Guiné, comparando-as com o total dos três teatros de operações: 

(i) helicópteros e aviões de ataque (Quadro I):

(ii) aviões de transporte e outros (incluindo de observação e liação como a Dornier DO-27)(Quadro II).


2. No TO da Guiné (bem como nos restantes territórios em guerra), pode-se dizer que sempre houve "escassez de meios aéreos", a começar por helicópteros e aviões de combate. Numa guerra de contraguerrilha (ou "antissubversiva"), o helicóptero era, como todos sabemos, um meio fundamental, em missões não só de transporte (tropas especiais, em especial Paraquedistas e Comandos) e evacuação de feridos como de ataque  (com o helicanhão) e reconhecimento. 

Diz o autor (pág. 243): "Inicialmente, em 1963, a Força Aérea tinha na base de Bissalanca (Bissau)  apenas oito F-86, oito T-6, oito Auster, três DC-3, um Broussard e um P2-V5. Posteriormente recebeu de Angola os pequenos helicópteros  Alouette II (apenas para evacuações)  em 1965, aumentou o seu potencial com a chegada dos Alouette III e, em 1966, com os aviões Fiat, que substituiram os F-86".

Isto quer dizer que houve uma "redução da eficácia da Força Aérea em 1964  e 1965", com retirada dos F-86, por pressão política dos EUA (por serem aeronaves a utilizar exclusivamente no âmbito da NATO), e enquanto não chegaram, em 1966, os Fiat G-91 adquiridos à Alemanha.

De que qualquer modo, a Guiné tinha um quinto dos heli  AL III, nunca teve helis SA-330 Puma (chegados tardiamente a Angola e Moçambique, em 1970), com maior capacidade e autonomia que os AL III. Em contrapartida, só havia Fiat G-91 (n=28) na Guiné (n=12) e em Moçambique (n=16). 

Também estava, a Guiné,  mal servida de aviões de transporte, com destaque para o Noratlas (13%) e o  C-47 Dakota (18%). Proporcionamente estaria melhor em matéria de avionetas Dornier D0-27 que de um total de 100 se distribuíam do seguinte modo, pelos 3 teatros de operações: Angola (41), Guiné (24) e Moçambique (35). 

Também pensavámos  que a Guiné  tinha mais caças-bomardeiros T-6: apenas 9, num total de 80 (com 26 em Angola, e 46 em Moçambique).

Mas os camaradas da FAP terão por certo algo mais para nos dizer e escalarecer, em comentários que serão bem vindos.

(Continua)
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Nota do editor:

Último poste da série > 22 de julho de 2022 > Guiné 61/74 - P23450: A nossa guerra em números (18): o consumo de munições e granadas pelo exército

9 comentários:

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

Aqui ficam indicados os meios da FAP atribuídos ao TO da Guiné.
Seria interessante saber quais foram os critérios de atribuição destes meios, para além da "pressão dos EUA". Claro que a questão "financeira" era determinante e das necessidades de instrução e trino que decorriam na metrópole. Excluindo os meios humanos, insubstituíveis e de difícil obtenção não se sabe o que terá levado a um "equilíbrio" entre o que se queria e o que era atribuído.
Só assim será possível prosseguir na análise deste tema.

Um Ab.
António J. P. Costa

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Como é que um pequeno país suportou, com meios tão limitados (e de mão estendida aos seus aliados...) uma guerra tão longa e desgastante ?

Eu devia ter feito essa pergunta em 1969, quando fui mobilizado para a Guiné... Se calhar fiz, mas não me lembro, ou fiz, mas não tinha 90% da informação que tenho hoje...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Não sei como foi com o Strela, a partir de Março de 1973, mas no meu tempo (1969/71) bastava o "roncar" do velhinho T-6 ou do "Lobo Mau" (helicanhão) para nos dar um suplemento de alma nas longas marchas no mato..., sobretudo no regresso ao Xime, Enxalé, Mansambo ou Xitole...

Antº Rosinha disse...

uma guerra tão longa e desgastante ?

Não era tão desgastante (economicamente) assim, Luís Graça.

No grande território de Angola seria saturante e entediante para os 24 meses de arame farpado dos praças e milicianos, mas não o desgaste (económico), porque este era compensado com as riquezas naturais que dali saiam.

Petróleo, diamantes e agriculturas diversas e pecuária e pescas.

Notícia de última hora: foi encontrada um pedra na região do rio Lukapa uma pedra considerado o maior diamante bruto no mundo nestes últimos 300 anos.(jornais, atenção que os angolanos têm a mania das grandezas)

Só essa região que era na Luanda, distrito do tamanho geográfico de 3 ou 4 Guiné, laborava-se sem proteção militar direta durante os treze anos de guerra.

Estamos a falar da zona da diamang.

A Guiné era a Guiné, e Março de de 61 Norte de Angola, foi o que foi e os dois ultimos anos do norte de Moçambique foi o que foi.

No meio disso tudo, falta contar "muito deixa andar" em muitos cus de judas que iam desde a ilha de Luanda até às coutadas da Gorongoza.









António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

"Uma guerra tão longa e desgastante? Não era tão desgastante (economicamente) assim." Pois claro! Portugal ainda ganhava dinheiro por cima... E foram só 13 anos... Que isso comparado com a Guerra dos 100 anos que durou 116?

Claro que "no grande território de Angola seria saturante e entediante para os 24 meses de arame farpado dos praças e milicianos, mas não o desgaste (económico), porque este era compensado com as riquezas naturais que dali saíam. Petróleo, diamantes e agriculturas diversas e pecuária e pescas". E então daí é que vinham riquezas que nunca mais acabavam. Nem dava par contar o lucro! Nadava-se em dinheiro. Vi gente a morrer afogada em notas de mil, imagine-se...

Esta "Notícia de última hora" chegou tarde talvez porque procurássemos pouco ou mal. Se calhar procurámos mal, digo eu.

E "só essa região que era na Lunda, distrito do tamanho geográfico de 3 ou 4 Guiné, laborava-se sem protecção militar directa durante os treze anos de guerra". Então que iam para lá fazer tantos batalhões? Iam para o SPA da zona da diamang. E o que a malta se divertia!...

Frase lapidar esta e que a História confirmará: "A Guiné era a Guiné, e Março de de 61 Norte de Angola, foi o que foi e os dois últimos anos do norte de Moçambique foi o que foi". o Sr. de La Palisse não diria melhor.

No meio disso tudo, falta contar "muito deixa andar" em muitos cus de judas que iam desde a ilha de Luanda até às coutadas da Gorongoza". Conto com signatário do post para descrever aquilo de que fala, porque é uma realidade que me escapa.

Mas o que é que isto tudo tem a ver com os meios de que FAP dispunha?...
Estamos a falar de aviões e helicópteros.

Um Ab.
António J. P. Costa

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Curiosamente, estou a reler o "testamento" do gen Bethencourt (ou Bettencourt) Rodrigues, inserido no livro "África: a vitória traída" (Lisboa, Editorial Intervenção, 1977, 276 pp.): apenas 3 (!) páginas são dedicadas às "Forças Armadas Portuguesas" (no CTIG) (pp. 129-131), e nelas tem este curtíssimo e lapidar parágrafo sobre a Força Aérea: "Os meios aéreos também não eram os mais adequados ao tipo de apoio que se pretendia e de que se carecia, sobretudo depois do aparecimento dos foguetes Strella" (sic) (pág.131)...

Não esconde, todavia, "a gravidade da situação militar que se vivia na Guiné nº 1º trimestre de 1974" (pág. 140)... E conclui com uma verdade de La Palisse: "Certo é que todas as guerras sempre foram e continuarão a ser lutas de vontades... e não só das vontades dos combatentes" (pág. 142).

É um depoimento que merece ser retomado e analisado com tempo e vagar.

António J. P. Costa disse...

Não li e já não vou ler o tal "Testamento".
A única atenuante que terá é que parece que não havia mais ninguém e alguém tinha que ir para fechar a porta.
Se tiveres novidades avisa, mas fala de aviões que é do que estamos a falar...
Deixa-te das outras "riquezas" e ideais tipo "tava na maula!". "Não nos púnhamos a pau e ainda ganhávamos aquela m***a..."
Um Ab.
António J. P. Costa

Valdemar Silva disse...

A propósito da FAP e "...meios tão limitados...".
Julgo ter sido nos primeiros meses de 1967, ainda não tinha ido pra tropa, apareceram para os lados da Alameda D. Afonso Henriques-Lisboa, dois marinheiros americanos.
Pertenciam a um navio encorado no Tejo, andavam perdidos e meteram conversa comigo e um meu amigo que estávamos à porta do Café Império.
O meu amigo, que falava bem inglês, era cabo especialista da FAP e bastante "exagerado" em tudo o que dizia fazer, e logo entrou com o ser capaz de transmitir em morse não sei quantos palavras por minuto que os américos diziam ser impossível. Então quando lhes disse que um cabo da tropa ganhava 90$00, ninety escudos, eles perceberam 90 contos, ninety thonsand, e não aguentaram mais.
Goodbaye, e lá foram eles Av. Almirante Reis abaixo com os 90.000$00 da conversa.

Pois, meios tão limitados...
com 90$00 + poupadinhos em tudo + material em segunda mão = é só fazer as contas.
(atenção que o resultado pode ter defeito de proporcionalidade)

Saúde da boa
Valdemar Queiroz

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

É evidente que o nosso pessoal ganhava miseravelmente, quer na metrópole quer nos TO de África. Todavia não é essa uma das razões fundamentais da derrota.
Para mim, uma das razões fundamentais é: os "poupadinhos em tudo + material em segunda mão" ou de refugo, quando não era mesmo de má qualidade e inadequado. Isto é válido para a FAP, mas especialmente para o Exército. Era necessário embaratecer a guerra, à custa do uso do material rapidamente substituível e barato: o Homem.

Um Ab.
António J. P. Costa