sexta-feira, 29 de julho de 2022

Guiné 61/74 - P23471: Estórias do Zé Teixeira (56): Amores em tempo de guerra: III - Amores proibidos (2): Binta!... Binta!... (José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381)

1. Segunda parte da história de amor entre Binta e o seu prometido Braima, combatente do PAIGC, enviada em mensagem de 27 de Julho de 2022, pelo nosso camarada José Teixeira (ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada, 1968/70).


Amores em tempo de guerra III

AMORES PROIBIDOS

(2) - Binta!... Binta!...


A Binta ficou perdida naqueles olhos que a mantinham prisioneira, iluminados pelo luar que surgiu repentinamente, enlaçada no pescoço do homem que a envolvia com os seus braços, estreitando-a contra o seu corpo e a beijou ternamente na testa num longo segundo. 

Deixaram-se envolver pelo silêncio das palavras escondidas, esmagadas há tanto tempo nos seus corações. Braima inclinou-se para a beijar de novo e os seus lábios selaram-se ternamente. Sensações novas invadiram todo o seu corpo deixando-a eletrizada, perdida no tempo e no espaço. O passado deixou de existir naquele momento. Um novo presente nascia, há que vivê-lo!

Braima falou, suspirando:
–  Há muito tempo que sonho com este momento – enquanto a pousava suavemente no capim e se deitava a seu lado. Noites e noites sem dormir, vendo-te sem te ver, ouvindo-te sem te ouvir... sonhando contigo, mas a libertação do nosso povo meteu-se entre nós. Agora que não podemos derrotar o passado, que nos afastou um do outro, temos de conquistar o futuro, vencê-lo para que seja nosso, temos de conquistar a liberdade...
–  Braima, Braima, meu querido, esqueceste-te que sempre tivemos liberdade de ser o que somos, mesmo se isso aconteça apenas nas nossas cabeças – disse a Binta pousando os sequiosos lábios sobre a boca do Braima, enquanto lágrimas de emoção lhe lavavam a face. - O medo de te perder, desde o dia em que foste embora, atormenta-me a todo o momento, as notícias que de ti chegam, sempre tarde, são a razão do meu viver, porque o coração vai-me dizendo que continuas vivo e a amar-me. É esta a razão da minha vida, esperar por ti. Agora quero ir contigo. Não te vou perder, nunca mais.
-–  Não me perderás, juro por Alá,  o Misericordioso, louvado seja Ele. Não há bala que ouse tocar-me. Voltarei... voltaremos para viver o nosso amor. Mas tu não podes vir comigo. Os perigos não têm fim, nem escolha possível e é preciso saber fintá-los. Confia em mim e me basta - disse-lhe o Braima, olhos nos olhos, enquanto a cingia tentando fazer dos dois, um só corpo.

Binta estava sem forças. Pranteava e não sabia se de comoção, ou de fúria ao ouvir o Braima negar-lhe a companhia, na árdua luta que ele travava contra o colonialista de Lisboa e não conseguia entender tal recusa.

–  Não! Agora que te reencontrei vou contigo, quero ser tua, de mais ninguém, e a mais sábia maneira de o ser é acompanhar-te nos perigos da luta em que acreditas. Se há uma liberdade a conquistar, conquistemo-la juntos, se for necessário morrer, morramos juntos. Os dois seremos mais fortes. Vou contigo!
– Como eu gostava de te levar comigo, minha querida, ter-te sempre a meu lado, sentir o teu coração a palpitar! Como eu gostava de ter a presença do teu corpo, o teu sorriso, o teu olhar de criança apaixonada que me cativou, sempre a meu lado! Mas, não! Não posso comprometer o nosso amor. Não posso arriscar perder-te. Prefiro contemplar-te apenas com o coração e sonhar contigo a toda a hora. Acredita que esta luta não vai ser muito longa no tempo. Vamos ter uma Pátria nossa. Uma bandeira vai unir o nosso povo e seremos livres. Eu prometo regressar à tabanca, à minha terra amada, casar contigo e vamos ter muitos filhos. Vamos ser muito felizes, porque o amor que nos une tem de dar o seu fruto.
–  Ó Braima, meu tolinho. Ainda acreditas que os colonialistas nos vão deixar? Ainda acreditas que esta maldita luta pela libertação vai ter fim? Loucura a tua! Eles são muitos, estão sempre a chegar. Têm armas e canhões, têm dinheiro e boa comida, têm... A Metrópole ou Lisboa, deve ser o paraíso deles... E nós o que temos?! Tu! Onde dormes?... o que comes?... que dinheiro possuis para comprares arroz?
– Tens de acreditar em mim. Vamos receber armas para abater os aviões que massacram e impedem que avancemos na luta. Depois, atacaremos os quartéis na cidade. Cercaremos as suas posições nas tabancas. Vamos destruí-los e construir a nossa pátria gloriosa, mas esta luta não é para ti. Continua junto dos teus pais e confia.
–  Se acreditas tão piamente na vitória, porque não me deixas ir contigo? Braima, Braima, meu amor! Porquê? Porquê?

O calor de dois corpos unidos e sedentos de se amar pedia tréguas na conversa. Binta tremia num misto de dor, alegria e emoção. Não conhecera outro homem. Guardara-se para aquele momento com o seu Braima. Ela sabia pela mãe, que os primeiros ritos eram dolorosos para a mulher, mas precisava viver aquele momento. Queria entregar-se totalmente ao Braima, para lhe afirmar com a vida, que era dele, e só dele, mas tremia... sem medo.

O Braima não era um novato nestas coisas do amor. O coração, esse reservara-o para a Binta. Queria continuar a conversa para serenar a sua amada, mas o corpo pedia-lhe a entrega total...

–  Vai com calma, não te apresses, vive o momento – disse a si mesmo.

Sentindo que a Binta estava tensa, estendeu-se a seu lado, apoiado sobre o cotovelo, procurando cruzar ternamente o seu olhar. Voltou a pôr a boca sobre a dela e acariciou-lhe os lábios com a língua num roçar leve, ternurento. Depois contornou-lhe o rosto e mordiscou-lhe o lóbulo de uma orelha, cobrindo-lhe a face e a testa de beijos, enquanto a sua mão acariciava os mamilos enrijecidos.

 – O que é isto que me faz tremer como que estivesse com febre, estes arrepios deliciosos, que eu nunca senti e me fazem feliz? - Interrogava-se Binta, saboreando o momento, numa entrega total de si mesma.

O mundo à sua volta deixara de existir. O mundo, agora, eram eles os dois. Nada mais interessava que não fosse o amor que vibrava no seu corpo, transformando-a na mulher que sempre sonhara ser - a mulher do Braima. As mãos dele corriam-lhe o corpo num bailado estonteante de descoberta de sensibilidades e tensões que nunca sentira.

–  Como é maravilhoso sentir o teu amor! - disse a Binta ao ouvido do Braima no momento em que lhe mordia o lóbulo de uma orelha e pensava nas muitas vezes que os soldados tugas, abusadamente, lhe comprimiram os seios, sem que ela tivesse o mínimo prazer, pelo contrário... sentia ódio e raiva que expressava com o olhar de mulher que se sentia ofendida pelo abuso. Ah! Mas o alferes Barbosa respeitava-a muito e nunca a tocou. Esse era diferente, o Braima branco...

Binta impregnada de desejos libidinosos desapertara o pano que a cobria e afastara-o deixando o seu corpo ao luar, o que fez o Braima perder a respiração. – Oh, mulher! Era uma voz rouca, imbuída de desejos, que ele nunca experimentara. Sentiu que a sua virilidade se expandia desmedida sem controlo. Binta! Binta! Que mulher! – Com extrema fúria, beijou-a na boca entreaberta, enterrando, em seguida, o rosto entre os seis chupando ardorosamente a pele suave. Entontecido, parou e respirou fundo tentando controlar-se.

– Alguma coisa errada? - Gemeu a Binta.
 –  Não. É apenas o meu desejo de te tornar minha. Quero fazer-te feliz e não sei se vou conseguir. És tão bonita, tão mulher...

O rosto de Binta abriu-se num sorriso acolhedor. Então, Braima beijou-a de novo, calmamente, acariciou-lhe o corpo, sentiu o seio farto e rijo, a cava da cintura, o quadril fazendo uma amena curva e a coxa forte e musculada de uma mulher de trabalho. Ela tremia a cada toque acariciador, tanto era o seu prazer. A mão dele continuou numa toada leve e lenta até encontrar os anéis do púbis que afagou com carinho. Sua boca procurou um mamilo. A língua tocou-lhe ao de leve, provocando um grito de prazer em Binta, que o medo de ser ouvido por alguém, logo abafou. A guerra continuava no meio deles, mesmo naquele lugar ermo, alta ia a noite.

...E o amor aconteceu.

(Continua)
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Nota do editor

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2 comentários:

antonio graça de abreu disse...

A política metida um bocado à força numa história de amor. Não acredito que o Braima guerrilheiro se expressasse assim na conversa com a Binta. E eram muçulmanos, importante a considerar nos afectos homem/mulher no mundo islâmico. Mas o Zé Teixeira escreve bem.
Abraço,

António Graça de Abreu

José Teixeira disse...

E por serem muçulmanos não podem expressar o amor, quando o sentem?
1º Esta história é baseada numa história verdadeira que me foi contada em 2008 pelo individuo a quem chamo Braima. Foi apanhado pelo PAIGC nos primeiros tempos da guerrilha com 16 anos, deixando a família e a prometida na tabanca. Acabada a guerra não foi dos que partiu para Bissau à procura de um tacho. Seguiu para a sua Tabanca e constituiu família com a mulher que deixara, ainda jovem, e por lá continuou. Recordamos ataques a Mampatá onde me visitou por duas vezes e numa delas, em novembro de 1968, foi dos que chegou a passar o arame farpado, mas tiveram de fugir, face à nossa reação. Eram duas da tarde.
2º Em 2013, eu, a minha esposa, o Francisco Silva e esposa, participamos, como convidados, num casamento no Xitole em que os noivos se apaixonaram. O pai da noiva ao saber que sua filha estava apaixonada pelo rapaz, foi ter com o pai deste e combinaram o casamento. Acordaram em juntar os bens que deviam dotar os noivos e montaram-lhe a casa.
Creio que o sentimento do amor é transversal à humanidade.
3º Em prosa poética, o autor tem a faculdade de criar.
Obrigado.
Zé Teixeira